terça-feira, 31 de maio de 2016






DRÁCULA & MAIS
Novas séries de William Lagos, 17-26 maio 2016

DRÁCULA I – 18 set 07

As asas são de couro e o corpo leve,
veloz a ponto quase de invisível.
Não come ou bebe mais do que o intangível
e nem olhar-se ao espelho mais se atreve.

Já se fartou da humana vida breve,
mas permanece de forma irretorquível,
sujeito às exigências desse incrível
apetite, ao qual curvar-se deve...

É a fome de viver que o atormenta,
mas para quê, se dorme dias inteiros
e passa as noites em busca de outra presa?

Rápida a vida, na sua morte lenta,
quando ele a rasga e suga derradeiros
os pingos desse sangue que despreza...

DRÁCULA II

Tal como eu, se furta à luz do sol,
não que se queime ou sofra porfiria... (*)
Apenas que é de noite que a energia
mais forte escorre em seu calor de escol...
(*)  Doença real causada pela falta de melanina, em que a luz do Sol queima a pele.

Talvez seja um vampiro no arrebol,
ensurdecido pela voz do dia,
mas que, da noite, a voz mansa aprecia:
talvez seja da Lua um girassol...

É quando os demais dormem que ele rouba
sangue dos sonhos para inspiração
e se empanturra com nacos de memória...

E, quanto mais escuta, mais se arrouba,
na vastidão do sangue da canção,
que desfalece, num fulgor de glória...

DRÁCULA III

Somente agora percebo que estas grades
não me prendem à noite...  Imaterial
se faz meu corpo e, assim, atrás de jades
voa minhalma na brisa e no caudal...

Esparze em cada um beijo mortal
e, ao invés de sangue, no qual nades,
ele nada nos sonhos, em total
desprendimento do bem ou qualquer mal.

Não lhe crescem as presas: seus caninos
são de ectoplasma tornado em filamentos
e a negra capa é tecida de poesia...

Negra essa capa, tal como os destinos
com que te busca, despida de ornamentos,
e assim te torna sua, noite e dia...

DRÁCULA IV

Nesse negror de luz, sempre em teus braços,
de um único ataúde, lado a lado,
sob a mortalha roxa e o véu gelado,
compartilhando o fantasma dos abraços...

Acorda a cada noite e enxerga os traços
de um rosto singular e acinzentado,
os lábios pálidos, o sangue coagulado
e mal se importa que aos dois faltem espaços

nesse estreito caixão, comprido o dia,
cumprida a bênção-maldição antiga,
na milenar certeza desse ensejo...

Como ele exulta então!... De nostalgia,
ao te apertar ao peito, fera amiga,
que a vida e a morte te passou num beijo!...

SONETO INVISÍVEL I – 14 set 2007

EU ME ACORDEI COM A IDÉIA DE UM POEMA
CUJO INÍCIO PRETENDI MESMO ANOTAR...
PORÉM DEIXEI DE LADO... QUIS ADIAR,
PARA MAIS TARDE RECORDAR-ME A SEMA. (*)
(*) Unidade de significado.

DEPOIS... FUI TRABALHAR EM REVISÃO,
PALAVRA POR PALAVRA, LETRA A LETRA,
CINZAS FRASES QUE O OLHAR INTERPENETRA
NO LABORIOSO PLAGIAR DA TRADUÇÃO...

NÃO ANOTEI... E AQUELAS FRASES LOUCAS
PERDERAM-SE NAS FONAS E NAS MIMAS (*)
DO BAÇO CINTILAR DE ESTRANHA GEMA...
(*) Unidades de significado e de imitação; por anglicismo, andam dizendo “memes”.

CALOU-SE A VOZ, SUAS FORÇAS FORAM POUCAS
E LOGO SE EXTINGUIU, MORTAS SUAS RIMAS,
POIS QUE JAMAIS ESCREVI O TAL POEMA...

SONETO INVISIVEL II

É BASTANTE COMUM QUE ME ACONTEÇA,
BEM NO MEIO DA NOITE, ME ACORDAR.
OUTROS O FAÇAM, TALVEZ, PARA URINAR
E ASSIM VÃO AO BANHEIRO NESSA PRESSA...

MAS MINHA VONTADE DE EXPELIR NÃO CESSA,
NÃO DESSE LÍQUIDO O FLUXO JORRAR,
MAS DO LÍQUIDO DOURADO DO CANTAR,
ANTES QUE FRASES LÍMPIDAS ESQUEÇA!

PORQUE SE FOSSE TÃO SÓ O EMUNCTÓRIO (*)
EU O PODERIA FACILMENTE ADIAR,
BASTARIA AO OUTRO LADO ME VIRAR
(*) Produto de excreção humana.

E ADORMECER IGNORANDO O PEDITÓRIO,
MAS ESSA FRASE QUE À NOITE ME ATORMENTA
INTEIRA MORRE SE EM RASCUNHO NÃO SE ALENTA.

SONETO INVISÍVEL III

CHEGA A MANHÃ E A FOLHA DE PAPEL
ESTÁ EM BRANCO, DO MODO QUE A DEIXEI
AO FIM DA VÉSPERA, POIS NADA EU ANOTEI
E ME DISPONHO A TRABALHAR NESSE ARAVEL (*)
(*) TERRENO DISPONÍVEL PARA CULTIVO.

MAS ONDE AS FRASES?  VAZIO ESSE TONEL
QUE A NOITE INTEIRA CONSERVAR PENSEI
CHEIO DE FRASES DE EFEITO QUE CRIEI
E QUE SERVISSEM PARA O SONHO DE FARNEL.

SERÁ QUE AS REDIGI EM OUTRO PLANO?
QUANDO EU ANDAVA PELAS PRADARIAS,
JUNTO AOS FANTASMAS COMPANHEIROS MEUS?

SOU DE TAL MUNDO COMPLETO SOBERANO
E NELE ESCREVO TANTO QUANTO NOS MEUS DIAS
OU A TAIS VERSOS ACENEI FINAL ADEUS?

SONETO INVISÍVEL IV

E NESSA SIMPÁTICA TINTA DE ESPIÃO
CONTEMPLO A FOLHA COM O IDEAL PERDIDO:
BASTA AO CALOR EXPOR ESSE ESCONDIDO
RELATO ESCRITO COM SUCO DE LIMÃO!...

MAS NADA SURGE, CASO O LEVE, ENTÃO
AO BICO DA CHALEIRA.  EM VAPOR TIDO
FICA APENAS O PAPEL AMOLECIDO,
PERDIDA PARA SEMPRE A INSPIRAÇÃO!...

MAS DOU DE OMBROS.  INVISÍVEL QUE ESTA SEJA
E TOTALMENTE VARRIDA DA MEMÓRIA,
NÃO FALTAM OUTRAS PARA UM TAL PAPEL;

E COM A NOVA IDEIA QUE ME ADEJA
RECOBRE ESSA INVISÍVEL, SEM HISTÓRIA,
COM NOVOS VERSOS DOCES COMO O MEL!...

MIASMAS I – 16 jan 07

NO SUDÁRIO APODRECIDO DE MINHALMA,
ENROLEI MEU CORAÇÃO, DE RESSECADO.
PENSEI AINDA ESTIVESSE ENSANGUENTADO,
MAS FORA BEM LAVADO EM MÁGOA CALMA.

BROTANDO DOS CALHAUS POR QUE PISARA,
TALVEZ QUE RETALHADOS, TODO O SANGUE
CORRESSE ENTRE MEUS PÉS, ENQUANTO ENLANGUE-
CIDA, MINHA MENTE SE ESCOARA...

COMEÇA UM ANO NOVO, SEM ESPERAS,
DO ANTIGO APENAS É COMPLETAÇÃO...
MANIFESTOU-SE GOTA A GOTA; E A HORA

DAS PREOCUPAÇÕES FEITAS QUIMERAS
CUMPRIR-SE-Á POR CERTO, NESTE AGORA,
PELA VIRÓTICA MORTE DA ILUSÃO...

MIASMAS II – 18 MAI 2016

A PRECESSÃO DOS EQUINÓCIOS NOS CONDENA!
DE CADA ANO SOBRA QUASE UM QUARTO;
O NOVO ANO TEM APRESSADO PARTO
E AO VELHO PREMATURA MORTE ACENA!...

O ANO REAL AOS POUCOS SE ENVENENA:
EM ALGO MAIS DE SÉCULO ESTÁ FARTO
UM MÊS INTEIRO E NELE ME REPARTO
ANTE ESTAÇÕES QUE SE PERSEGUEM PELA CENA.

ASSIM OCORRE COM ESTE VERANICO,
QUE ANTES CHEGAVA PELO MÊS DE MAIO,
POREM AGORA SÓ APARECE EM JUNHO;

EM PLENO INVERNO A APRESENTAR SEU CUNHO,
QUANDO SÓ DE CAMISA À RUA SAIO,
POIS COM O CALOR MAIS UMA VEZ IMPLICO!...

MIASMAS III

CONTUDO É A ÉPOCA DE MAIOR UMIDADE,
TAL QUAL SE O TEMPO NÃO SE CONFORMASSE
E O PRÓPRIO CALENDÁRIO PROTESTASSE,
MOLHADAS AS CALÇADAS DA CIDADE!...

E SE AREJAR A CASA SE BUSCASSE,
SÓ NAS JANELAS ENTRARIA A INSANIDADE
DESSE MOFO A INFILTRAR-SE, COM MALDADE,
EM CADA CANTO DE QUE SE APROXIMASSE!

NESSES MIASMAS DE UM ANO FANTASMAL
QUE DEVERIA ESTAR AINDA NO FUTURO,
MAS QUE FOI ANTES DE SEU TEMPO CONVOCADO,

SEM CONSEGUIR SE TORNAR BEM MATERIAL,
A DESPENCAR-SE NUM CUIDADO IMPURO,
EM SEU RESSENTIMENTO DESVAIRADO!...

MIASMAS IV

AS DATAS COSTUMEIRAS DESLOCADAS,
NATAL NO INVERNO E PÁSCOA NO VERÃO,
TAL QUAL NO OUTRO HEMISFÉRIO ESTÃO,
DECERTO LÁ TAMBÉM DESENCONTRADAS.

E ASSIM SURGEM PROFECIAS DESVAIRADAS,
COMO ESSES DIAS QUE RESSENTIDOS SÃO
INSERIDOS DOS TEMPOS NA INVERSÃO
TAIS QUAIS MIASMAS DE BRUXAS TRESLOUCADAS!

NATURALMENTE, SÓ PODEMOS ACEDER:
NÃO TÊM OS PAPAS MAIS IGUAL PODER
PARA IMPOR DOS CALENDÁRIOS A REFORMA...

NAS CONFERÊNCIAS CIENTÍFICAS, QUE DEMORA!
MAIS DE UM SÉCULO ESCORRENDO PARA O OUTRORA,
JÁ QUE NINGUÉM NESSA ASSEMBLEIA SE CONFORMA!

(*) SEI MUITO BEM QUE A PRECESSÃO DOS EQUINÓCIOS NÃO É BEM ASSIM, MAS NO POETAR SE TEM PLENA LIBERDADE.

RÉQUIEM PARA MIM I – 17 set 07

Amor, um dia, em gesto lancinante,
busquei da vida arrancar com bisturi.
Quis cortar meu coração e quase cri
tivesse completado a amputação...

Mas transmutou-se a espera palpitante
no zombeteiro piar do bem-te-vi,
que escutei na alvorada e que embebi
na linfa avermelhada da emoção...

E à ânsia azinhavrada dei guarida
no côncavo do peito, em que me enleio
no lugar do coração, assim perdido...

Na saga amarfanhada de minha vida,
que nem sequer posso dizer que odeio,
mas só me deixa... de leve... aborrecido.

RÉQUIEM PARA MIM II – 19 mai 16

Após o órgão arrancar do coração,
percebi que se escondera ali o amor,
ante a cardiotomia dessa dor,
talvez da aorta perdido num desvão. 

Porém sem coração, como a emoção
sentir ainda em verdadeiro ardor?
Meu sentimento desprovido de vigor,
sem batimentos do órgão da paixão!

Nesse oco o pulmão se intrometeu,
o esquerdo tendo inveja do direito...
Por que razão deveria ser sujeito

ao tal espaço menor que se lhe deu?
E nessa ausência cardíaca eu me viro
A transformar cada amor noutro suspiro!

RÉQUIEM PARA MIM III

O cérebro então exerceu o seu esforço,
ante o azinhavre da circulação,
alguns neurônios designando de antemão
para apertar-lhe as bombas nesse escorço

e o sangue corre, qual em antigo corso
pelas artérias em vaidosa exibição,
as roupas novas a mostrar dessa estação,
vermelhas mantas a revestir seu dorso...

Girando sempre em volta dessa praça
da qual o coração foi demolido,
até que venha um assopro do pulmão

e obrigue a essas hemácias, por pirraça,
a percorrer os membros, cujo olvido
já gangrenava da vida a brotação!...

RÉQUIEM PARA MIM IV

Mas esse é um sucedâneo.  E como tal,
deixa o cérebro de cumprir a sua função,
sem que esta outra se complete à perfeição.
Ai, como o coração ausente me faz mal!...

Contudo amor, em um gesto triunfal,
abandonou seu esconderijo de ocasião:
veio instalar-se no lugar do coração
e se pôs a crescer, para, afinal,

restaurada a gentil circulação,
formar um globo de pulsar vermelho,
em que contrai e expande essa emoção,

forjando assim uma nova pulsação,
ao coração antigo, já tão velho,
destinando tão somente à cremação!...

DEMÔNIO DE PASSAGEM I – 20 MAI 16

O QUE SUCEDERIA, SE O CORPO MEU DEIXASSE
E DELE ME AFASTASSE, TÃO SÓ INTEGUMENTO
E AO INVÉS DE O LARGAR EM DESALENTO,
SAÍSSE NUM REFLEXO E À LUZ ME TRANSPORTASSE?

O QUE ACONTECERIA, SE A ALMA ACOMPANHASSE
APENAS ESTA PELE PERDIDA NO RELENTO,
QUE PELOS ARES FOSSE FLUTUANDO, EM SONOLENTO
ABANDONO DA MÁGOA QUE PARA TRÁS FICASSE?

E NESSE CORPO DE TROLL, SÓ BIDIMENSIONAL,
INVISÍVEL DE LADO, ARRASTADO PELO VENTO,
MAIS LEVE QUE UMA PLUMA, ASSIM SE PROJETASSE

E NADANDO NOS CÉUS, TORNADO CORPO ASTRAL,
LUZISSE COMO MANTO DE ESTRELAS EM TORMENTO
E A ALMA IGUAL À CASCA, ENFIM, SE DISSIPASSE?

DEMÔNIO DE PASSAGEM II

SE REALMENTE INVISÍVEL ENTÃO FOSSE,
SUSPEITARIAM TÃO SOMENTE DE UM CLARÃO,
DE UM CORTE NA PAISAGEM, SUPRESSÃO
DA SUGESTÃO DE QUALQUER MÁGOA DOCE.

LEVE PRURIDO, QUE PROVOCA A TOSSE,
QUANDO NO PEITO CAUSASSE CONTRAÇÃO,
EM QUE SE EXPANDA O EFEITO DA EMOÇÃO
DESSE ESPASMO PASSAGEIRO QUE PERPASSE.

LOGO A SEGUIR, PERDERIA ESSA IMPORTÂNCIA,
NÃO MAIS QUE LEVE ARGUEIRO DA VISÃO
E TALVEZ GOTAS DE COLÍRIO DERRAMASSEM;

TALVEZ LAMPEJO A RECORDAR A INFÂNCIA,
NA QUAL SE ACEITA NATURAL A APARIÇÃO
DE QUAISQUER VULTOS QUE SE NOS DEPARASSEM.

DEMÔNIO DE PASSAGEM III

TALVEZ ME INTERPRETASSEM COMO ODOR.
NEM PERFUME NEM MAU CHEIRO, INDEFINIDO,
POUCO MAIS DO QUE UM SUSPIRO PERCEBIDO.
QUIÇÁ ESTERNUTAÇÃO, CERTO ESTRIDOR... (*)
(*) ESPIRRO.

TALVEZ ATÉ SENTISSEM MEU SABOR.
PELAS PAPILAS DA LÍNGUA PRESSENTIDO,
QUALQUER GOSTO REBUSCADO DESDE O OLVIDO,
RECORDAÇÃO DE LONGO DIA DE CALOR.

TALVEZ ME ASSIMILASSEM PELO TATO,
PELA PONTA DOS DEDOS OU NAS LINHAS
QUE SE FORMAM LÁ NO VENTRE.  NADA ÓTICO.

FULGOR DE BREVE NÉVOA NO CONTATO
DAS EXPERIÊNCIAS PERDIDAS, PEQUENINHAS,
NA OLEOSIDADE DO LÍQUIDO AMNIÓTICO! (*)
(*) QUE ENVOLVE O FETO DENTRO DO ÚTERO.

DEMÔNIO DE PASSAGEM Iv

TALVEZ LHES PERPASSASSE UM ARREPIO
DURANTE O BREVE CORTE DA PAISAGEM,
FUGACIDADE QUE NEM CHEGA A SER MIRAGEM,
ATEMPORALIDADE A QUE ME ALIO,

EM MINHA PASSAGEM SENDO UM CALAFRIO,
AO LONGO DE SUAS COSTAS, DE PASSAGEM,
INTERPRETADO COMO EFEITO DE UMA ARAGEM,
RISCO E NOVELO DE UM PERDIDO FIO.

TALVEZ PENSASSEM, COM CERTA ZOMBARIA
NESSE ANTIGO E HUMORÍSTICO DITADO:
“ALGUÉM PISOU SOBRE A MINHA SEPULTURA!”

MAS DEPRESSA A SENSAÇÃO LHES PASSARIA,
A TRATAR CADA UM DO SEU CUIDADO,
FOSSE UM PRAZER INÚTIL OU UMA AGRURA!

DEMÔNIO DE PASSAGEM V

TALVEZ AQUELES MAIS SUPERSTICIOSOS
OU PORTADORES DE SENSITIVIDADE
ACREDITASSEM NA PASSAGEM DE ENTIDADE,
NA INTENÇÃO DE QUAISQUER FEITOS TENEBROSOS!

TAL QUAL DIABO DE ATOS ESCABROSOS,
ALGUMA ALMA CARREGANDO COM MALDADE
PARA ESSE INFERNO QUE SÓ EXISTE A QUEM HÁ-DE
CRER NELE EM SEUS REMORSOS MAIS TORTUOSOS.

OU ENTÃO O SEU REBANHO EXAMINANDO
A FIM DE VER QUEM MELHOR PARA TENTAR
OU ABATER POR VIAS DE ACIDENTE.

DESSE LUGAR DEPRESSA SE AFASTANDO,
PARA UMA VELA ACENDER E SUPLICAR
QUE FOSSE O MAL RECAIR SOBRE OUTRA GENTE!

DEMÔNIO DE PASSAGEM Vi

PORÉM MEU CORPO ASTRAL, QUE SENTIRIA,
AINDA PRESO PELO CORDÃO DE PRATA,
PERCORRENDO ALGUM DESERTO, QUALQUER MATA,
NA LONGA INSENSATEZ QUE O CONDUZIA?

SERÁ QUE O MUNDO TAL QUAL SONHO PRESSENTIA,
PARA DEPOIS RECORDAR MEMÓRIA GRATA,
DA INSPIRAÇÃO PARA POEMAS ESTAR À CATA,
PARA, AO VOLTAR, TRAZER QUANTO COLHIA?

OU REALMENTE SENDO UM DEMÔNIO DE PASSAGEM,
QUE INSENSIVELMENTE UM MAL FARIA,
NA INDIFERENÇA COM QUE O MUNDO PERCORRIA

E EM SEU RETORNO À ADORMECIDA IMAGEM
ARRANCASSE, EM ATREVIMENTO AVENTUREIRO
ESSE CORDÃO, GERANDO UM SONO DERRADEIRO?

DEMÔNIO DE CLORO I – 21 MAI 16

Durante a noite são mais pálidas as luzes
que do corpo se deslocam empós a vastidão,
bem mais tênues as peles da larga multidão,
incoerentes e ágeis, velozes arcabuzes;

em pleno dia, porém, recordam mais obuses,
mais grossos os reflexos que buscam a amplidão,
flutuando lentamente, se esvaem sem paixão,
ancorados que estão a mais concretas cruzes.

Abertos os meus braços, recebo a luz do Sol
e a projeto de volta, liberta de embaraços,
em busca de outras formas, azul inspiração;

mas capturam fotos só os raios do farol
e as mil grafias minhas se perdem nos abraços,
com as sílfides do ar em plena exultação!...

DEMÔNIO DE CLORO II

Também é certo que as árvores e as flores,
todas as plantas úteis ou daninhas
projetam igualmente no ar as suas gavinhas,
imagem especular de todos seus ardores

que o ar percorrem em revoadas multicores,
à estratosfera subindo como vinhas,
mil cachos amontoados como pinhas,
cada vez mais colorindo seus palores,

desbastadas, quiçá, na estratosfera,
nesse inefável turbilhão boreal
a que passaram a chamar de aurora,

almas penadas das flores nessa espera
de se lançarem ao espaço sideral,
até que possam finalmente se ir embora!

DEMÔNIO DE CLORO III

Não é só das flores tal fantasmagoria
clorada, como errantes para o céu,
mas do poder flutuador do macaréu:
algas gigantes cada vaga lançaria

e também peixes voadores, romaria,
corrida verde para o céu de breu,
alguns golfinhos, tubarões, dentes de arpéu,
barracudas e espadartes à porfia;

trazendo guias de algas nos seus bicos,
a tais lençóis de cloro contribuindo,
com seu Fogo de Santelmo reluzindo,

das tempestades tétricas nos picos,
tudo levando, porém tudo deixando,
tão só reflexos em luz se dilatando...

DEMÔNIO DE CLORO IV

E quem diria, parado em tombadilho,
que as  mil oscilações de verde cor,
estremadas fumarolas de calor,
apenas fossem ilusões que forma o brilho

nos olhares já cansados pelo trilho,
seus núcleos neuronais em vasto ardor,
da verdadeira visão breve esplendor,
da indigestão de tabus talvez o filho;

não obstante, tais nuvens invisíveis
sobem aos céus varias vezes diariamente,
indo buscar da estratosfera o foro,

tais como a luz do Sol, inexauríveis,
como espirais de turbilhão impenitente,
amortalhadas em vagalhões de cloro!

DEMÔNIO DE CLORO V

Muito maior esse clorídrico fantasma
que se ascende a acidular constantemente,
amortalhando dentro em si, potente,
dos reflexos de animais cada miasma,

essa surpresa que a atmosfera pasma,
que irracionais percebem claramente,
também crianças de visão mais inocente
e os primitivos a que o temor orgasma...

Nossa razão, porém, civilizada,
obscurece a sensação em Nada,
sem que aceitemos a um Algo perceber.

Durante a noite, somente a Lua é fada
e nossa imagem é menos calcinada,
que a luz leitosa mal se esforça em recolher..

DEMÔNIO DE CLORO VI

Mas quando os braços exponho à luz do Sol,
de minha alma expandem-se os reflexos,
sobem aos céus, em ansiares desconexos,
de seus próprios corais formando atol;

e quando a boca se escancara ao arrebol
sobem fantasmas de palavras, pobres nexos,
anjos sem asas, quebrados os seus sexos,
seus gêneros calcinando um tal farol!...

E quando o faço no meio de um gramado
ou junto ao lado das plantas de um pomar,
sou pelas vagas de cloro amortalhado

e por mais que me conserve em tal lugar,
sinto esse Algo de mim sendo arrancado,
até que a morte venha um dia me buscar!

DEMÔNIO DO PAMPA I – 22 MAI 16

Cá na campanha a vida era mais tranquila,
quando o mate era cevado diariamente
e até palheiro ainda adotava muita gente,
com fumo em rama que custava poucos pila.

Picado com cuidado, deitado numa fila,
palha de milho em enrolar dolente
ou da “mortalha” na brancura assente,
papel fininho como as plum de uma esquila.

E entre o mate e o cigarro consumido
fica o gaúcho a adiar sua dura lida,
para a qual se arremessa no final.

Mas por gaúcho eu sou desnaturado:
não tomo mate, nunca fumei na vida.
mesmo envolvido no “bá, tchê” existencial!

DEMÔNIO DO PAMPA II

Assim, de fato, nem sequer mereceria
o nome de gaúcho!...  Nunca estalo
o rebenque sobre o lombo do cavalo
e de bombacha ou tirador ninguém me via!

Não é por mal.  Quase só tive companhia
de gente da cidade e o campo ralo
pelo constante caminhar sequer abalo,
meu par de botas há longo tempo se perdia!

Mas houve um tempo em que botas já usei,
bem mais fácil de pisar sobre o capim,
faixa de areia ou nesse trilho abandonado;

mas nas calçadas não me acostumei
e nem ao menos quando ando no jardim,
em que não sou por cascavel ameaçado!...

DEMÔNIO DO PAMPA III

Por que falar de demônio nesse pampa?
Foi escolhido na mais pura fantasia
esse título, que natural se seguiria
ao de ontem...  E o arbitrário sempre encanta

de meu jeito de pensar, que estranho encampa
os jogos de palavras, sinalefa e sinafia, (*)
o trocadilho que ao oxímoro seguia,
prosopopeia que a si mesma imanta!...
(*) Corte de uma vogal; divisão de uma palavra para criar rima.

E neste pampa, só faço matadouro
destes sonetos de curtir imorredouro,
bem diferentes dos ritmos normais

que usam em cetegês... Ou seguidilhas,
da linguagem automática curtas filhas,
que para mim não escorrem naturais.

DEMÔNIO DO PAMPA IV

Corre um lenda nos desertos saharianos:
que quando morre um branco, independente
de estrangeiro ser ou verdadeiro crente,
sua sombra encarna em negros africanos!

A alma partirá aos celestiais arcanos
ou sofrerá seu castigo eternamente,
caso quebrou as leis de Allah onipotente
e desprezou os seus comandos soberanos...

Porém a sombra que nessa areia jaz
desce depressa para o subsolo
e se filtra para o sul, rapidamente;

e a criança por nascer é ela que faz
deitar-se escura sobre o escuro colo
da mãe nativa que em amor a amamente!

DEMÔNIO DO PAMPA V

Isso é porque toda sombra é sempre escura:
em nada importam os semblantes, realmente;
também das coisas a imagem que apresente
é sombra negra em radical tortura!...

Já sob o sol não existe sombra pura:
ela se alarga ou se encolhe facilmente;
pela manhã e nas horas do poente
mais longa a perna e o peito que segura!

Que alguém perdeu a sombra existem lendas:
de Peter Pan foi por janela decepada;
a de Schlemihl rendeu um bom dinheiro,

seu dono percorrendo escuras sendas,
que não julgassem ser só alma penada,
com medo a sombra, que lhe fugiu ligeiro!

DEMÔNIO DO PAMPA VI

Mas o que isso tem a ver com meu torrão?
Minha sombra não perdi e a tenho ainda!
Não palmilhei do deserto a areia infinda,
provém da Europa minha antiga geração!

Mas sempre experimentei reprovação
ouvindo a frase que alguém achara linda:
“É um negro de alma branca!” – sempre vinda
de quem pretende oferecer-lhe aceitação...

Mas pode haver qualquer maior racismo?
Por que “ter alma branca” é um elogio?
Quem sabe a sombra de um negro, em corrupio,

vai lavando sob o solo os seus pecados,
a lenda oposta a se afirmar com todo o brio:
viram suas sombras em demônios descascados!

A TOSSE DOS MORTOS I – 23 MAI 16

Há pouco tempo de ler um livro terminei
sobre esse iídiche falado por judeus;
ali seus versos são descritos como os meus
que anteriormente nunca li e nem lerei,

segundo creio, porque iídiche não sei
e muito menos li os versos dos hebreus;
pelo alemão entendo algo dos seus,
mas é possível que jamais o escutarei!

Contudo o livro me parecia descrever
os meus processos de escrita, a demonstrar
minhas alusões e alegorias sem ter fim,

quem sabe exemplos encontrei em meu viver,
mas sobretudo, é preciso respeitar
os muitos outros que morreram já de mim.

A TOSSE DOS MORTOS II

Será que escuto, entre os meus inspiradores,
esses que tossem versos em silêncio,
que em fácil rima e ritmo se encaixem,
quaisquer judeus massacrados no holocausto?

E que essa tosse surgiu de aspirar cinzas
ou o Zyklon B de seus falsos chuveiros,
sem que pudessem escrever os próprios versos
e nem participar do modernismo?

E de repente, cheio de perturbação,
estou aqui rascunhando versos brancos,
depois de tanto tempo afeito a regras!

Será que apanho do ar os perdigotos
e os reproduzo, igual que a tosse seca,
tais quais sintomas de tuberculose?

A TOSSE DOS MORTOS III

Porém é breve esta quebra de costume:
há muitos mortos mais, perto de mim,
desses meus dias passados ao outrossim,
que estão na treva, mas me acendem lume.

Mesmo que alheia revoada ao redor rume
Muito mais podem ao meu redor, enfim,
Meus dias de ontem que espalhei, assim,
Na intermitência de luz de vagalume...

E se outros mortos tossem, tossem mais
essas mil cascas de mim que abandonei
e mesmo ontem derramei no meu passado,

que constituem-se em protetores naturais,
sem que outros tussam o que não autorizei,
somente um espirro ocasional sendo escutado!

VELHAS NOVIDADES I – 24 MAI 16

Ora, tenho meus problemas, certamente,
emocionais alguns, mas financeiros
em sua maioria, que altaneiros
vêm procurar-me ao fim do mês, frequente.

Não que um descuido sobre mim se assente,
que há muito os meus caprichos derradeiros
foram lançados em pântanos brejeiros:
comigo gasto muito pouco, realmente.

Mas os impostos e taxas em ascendência
vão aumentando, sem me consultar,
com exigências da malícia mais impura!...

E quando os vejo chegar, com impotência,
de minhas angústias o final penso buscar
no esquecimento do sumo da datura!... (*)
(*) Planta venenosa, de que se extrai a atropina.

VELHAS NOVIDADES II

Não que pretenda, realmente, terminar
os meus problemas com solução tão fácil;
mas possui a datura flor tão grácil,
que no jardim minha esposa a foi plantar!

E fala às vezes, espero que a brincar,
que as cornucópias de aspecto admirável
e mesmo as folhas e sementes, bem amável,
na minha comida possa um dia misturar!

Na verdade, outras plantas venenosas
há muito tempo já possuía no jardim
e até o presente não me envenenou!...

Mas as mulheres são tão caprichosas!
E certas vezes, indago até de mim:
Não percebi, mas quiçá já me matou...?

VELHAS NOVIDADES III

Ano passado, até pensei que tinha morrido
e não sabia... Foi quando me esforcei,
mas através das paredes não passei,
sem comprovar isso que havia percebido...

Contudo, ainda é possível ter sofrido
para outro plano a mudança... e nem notei.
Sendo fantasmas as paredes que toquei,
passar por elas não teria podido!...

Mas neste dia de Nossa Senhora
subi as ruas, contudo, não pisei
nesses tapetes tão só delineados...

Comprei meu pão quentinho nessa hora
e pelo centro das ruas retornei,
para automóveis os caminhos já fechados!

AGARTHA I – 25 MAI 16

Alexandre St.-Ives d’Alveydre, um ocultista (*)
Francês, que se dizia iluminado,
Foi o primeiro a ter de fato publicado
Os pormenores dessa terra, em longa pista.
(*) Alexandre St.-Ives d’Alveydre

Esse seu texto, de inspiração budista,
Teria talvez nos Himalaias sido achado
Ou pelo menos, o portal ali encontrado
Por quem o seu caminho achar insista.

Dizia d’Alveydre se achar em “sintonia”
Com espíritos de luz que lhe falavam,
Que a história mística deles escutou...

Também sonhei que minha musa sentaria,
Com espíritos de luz que a acompanhavam,
No mesmo assento que ninguém mais ocupou!

AGARTHA II

Há muitos anos que já ouvi falar
De ser a Terra oca, realmente;
Pequeno sol no seu centro se apresente,
Tendo cidades, campos e até mar...

Se bem recordo, chamou Pelucidar
A essa terra dentro da Terra assente
Edgar Rice Burroughs, ali presente
O seu Tarzan, novas lutas a ganhar!...

Seus horizontes, ao contrário de convexos,
Subiam em torno, sem se dissipar,
Num permanente côncavo vibrante...

Porém Tarzan em nada os viu complexos:
Lord Greystoke tudo podia dominar,
Até mesmo nesse mundo contrastante!...

AGARTHA III

Ferdinand Ossendowski publicou também
Um longo livro, por ele intitulado:
“Animais, Homens e Deuses do Passado”,
Em que descreve esse país Aquém.

(Sendo interior, não podia ser “Além”)
Mas ao Hades não foi equiparado,
Nem à Gehenna, em cujo fogo, devorado,
Cada inimigo dos judeus contém...

Ossendowski não jurou ter lá entrado,
Mas garantiu quem lá esteve conhecer:
Lugar perfeito de riqueza e de prazer!...

Porem isento de qualquer pecado,
Ao qual descia cada Iluminado,
Puro Nirvana de invertido parecer!...

AGARTHA IV

Naturalmente, não se trata de Shambhala,
Esse grupo de cavernas tibetanas,
Habitado por Asuras em suas chamas, (*)
Segundo Vajrayana, que de budismo fala.
(*) Gênios hostis aos seres humanos, opostos aos Devas.

Nem é tampouco a Kalachakra, cuja escala
É bem menor que a dos espaços soberanos,
Sem nada de infernal em seus afanos:
Lendas diversas, de diferente gala.

Yelena Blavatska, em sua Sociedade
Teosófica, afirmou sua existência:
Curta é Shambhala, sendo Agartha bem maior

E Helena e Nicholas Roerich, na verdade,
Agartha afirmam com grande reverência:
Nação real formando império de valor!...

AGARTHA V

Para St.-Ives, Jesus ali desceu,
Igual que afirma o Credo dos Cristãos;
Mansão dos mortos de iluminados corações,
Que da Sansara a libertação se deu. (*)
(*) A Roda das Encarnações.

Mas que ao invés de pregar, ali aprendeu,
No Pentecostes transmitindo informações
Aos Doze Apóstolos para suas pregações,
Falando as línguas de quem não era judeu!

Somente quando a humanidade praticar
Os princípios do verdadeiro Cristianismo
E abandonar suas sendas de anarquia

Poderá suas muitas bênçãos alcançar,
Na compreensão final do santo holismo,
Todos os homens em comunhão de Sinergia! (*)
(*) Ação ou operação combinada.

AGARTHA VI

Segundo alguns, são os “discos voadores”
Originados deste mundo paralelo,
Que ao nosso se apresenta como alelo, (*)
A controlar nossas guerras e opressores.
(*) Par, principalmente de cromossomas.

Infelizmente, da ciência hoje os pendores
Não mais permitem ao mundo oculto vê-lo;
A ressonância não mostra o sonho belo,
Porém camadas de magma em estertores...

Assim nos resta o Inconsciente Coletivo,
Em que os arquétipos habitam, recriados
Pelo egrégoro Gnômon mais ativo. (*)
(*) Espírito comum da humanidade.

Hoje é difícil considerá-la material,
Mas se outros níveis estão entrelaçados,
Reside Agartha em qualquer plano espiritual!...

FOGO DA LUA I – 26 MAI 16

Queria ter para mim ponto no espaço
do tamanho de uma mosca, tão somente,
podendo no qual dominar inteiramente
a cada coisa que caiba em seu regaço.

Admito em minha obra ter o traço
dos atributos dessa judaica gente:
mas por que tal qualidade tão frequente
se nunca os li e sozinho os versos faço?

Somente há pouco é que comecei a ler
certa obra sobre tal tipo de poesia,
nessa língua que entre nós não existia.

Raros judeus com quem pude conviver:
mesmo que a Bíblia tenha sido em tradução,
textos hebraicos para mim mistério são!

FOGO DA LUA II

Foi Glatshteyn que teve um dia a ideia (*)
que no seu livro para mim apresentou,
pois tal espaço para mim nunca sobrou:
vivi em terra alheia e fui plateia;
(*) Poeta judeu do século vinte, que escrevia em iídiceh.

a vida inteira excluído da assembleia,
quase nenhuma sociedade me aceitou,
para seus clubes ninguém me convidou,
nem de serviço... e muito menos de porneia! (*)
(*) De difusão ou partilha pornográfica.

Mas pouco importa, caso ganhar o espaço
em que uma mosca vai patinhas agitar,
qual heliporto para o meu voar!...

Porque somente trago em meu regaço
o ponto de partida de algum verso
na tentativa de expô-lo ao Universo!

FOGO DA LUA III

Contudo, já bebi o fogo da Lua,
que desce frio, qual singular cascata,
colher de luz, um fogaréu de prata,
que ao coração se aquece e ali se estua.

Meu corpo inteiro em agitar flutua,
mas breve brisa basta que me abata:
que fortalece o mal que não nos mata
escutei muita vez em plena rua...

Mas de onde a característica me chega
dos jogos de palavras e alusões
assim frequentes em minha lúcida poesia?

Só a um poema minhalma assim se apega:
de Ezra Pound em simples traduções:
bastam seis linhas para a minha imageria?

FOGO DA LUA IV

Creio que não.  Influências não sofri
diretamente de poemas que não li
e esses poucos que em tal livro eu vi
em nada se assemelham aos que faço.

Acredito possuir meu próprio traço,
mesmo me achando no perpétuo abraço
desse fogo que retorna e que retraço,
irresponsável pelo muito que escrevi!...

Mas fui mordido pela mosca da poesia,
que nos desceu no fulgor de meteoro,
seus esporos do cosmos oriundos,

a quem o fogo da lua ainda nutria,
eu próprio sendo não mais do que um esporo,
como célula ansiando por ser mundo!...