quinta-feira, 8 de agosto de 2024


 

(GINGER ROGERS) 

ESCANDIR I – 15 JUN 2024

 

HÁ MUITOS ANOS OS SONETOS ADOTEI

COMO O ELEGANTE FORMATO DE POESIA;

SONETOS RASCUNHEI DIA APÓS DIA

E NESSA GENTIL TAREFA ME EMPENHEI.

Por certo a fúria da corrente eu enfrentei,

Que a pouca gente o meu ideal servia,

Menos ainda que sonetos conseguia

Realizar  na perfeição que conformei.

EXISTE MESMO ESSE DITADO ANTIGO,

SEJA: ”PIOR A EMENDA QUE O SONETO”,

QUANDO ALGUÉM BUSQUE OS VERSOS CORRIGIR

 

Que em tal ação sempre existe algum perigo,

Há um Poltergeist escondendo albor secreto,

Que à rima nova busca sempre confundir!

 

ESCANDIR II

 

JUSTO PROBLEMA É GRAMÁTICA DIVERSA

E BEM MAIS FÁCIL RABISCAR VERSOS SEM RIMA

E DIZER QUE TUDO A VERSO LIVRE SE DESTINA,

QUANDO DE FATO É A INDOLÊNCIA ALI DISPERSA,

Em linhas frouxas há displasia diversa,

Pensando assim que a outro ideal se afina

E que no texto se encontra a pura sina,

Com a desculpa de que a rima é adversa

E QUE ATÉ MESMO RESTRINGE O PENSAMENTO,

MAS É MAIS FÁCIL SE EXPRESSAR O SENTIMENTO

QUANDO O VERSO NOS CANTA SIMPLESMENTE,

Nessa textura que se vê no firmamento,

Cada estrela a agrilhoar em constelação,

Melhor podendo controlar sua multidão.

 

ESCANDIR III

 

MAS DE FATO ONDE SE ACHAR O ROMANTISMO

EM SIMPLESMENTE SE FORÇAR O CONSTELAR?

NÃO SE ENCONTRA EM CADA TERMO ALGUM BRILHAR,

MESMO NA ÊNFASE TEMPORAL DE ALGUM MODISMO.

O que ao soneto confere o brilhantismo

É a obediência a seu ritmo estelar,

Fácil ali alguma cesura se encaixar,

Sem recair de alguma censura ao nihilismo.

NÃO É A RIMA QUE ALCANDORA ALGUM SONETO,

CADA SÍLABA DO VERSO EM SEU BAILAR

E FINALMENTE UM NOVO OLHAR A SE ENCONTRAR

Em qualquer tema que se tome em objeto,

Essa a magia que ao poema faz secreto

E em campo santo faz miragem cintilar.

 

REVANCHE 1 – 16 JUN 24

 

QUANDO EU MORRER, CONSOANTE A LEI DA VIDA,

QUE ADVIRÁ EM DEZ, TALVEZ EM DOZE ANOS,

A SE CUMPRIR DA CIGANA OS DONS PROFANOS,

QUE OCORRERÁ COM TANTA COISA RECOLHIDA

Mesmo da vida somente a dádiva contida,

Quanto perdi em seis lustros arcanos,

Pelos incêndios e demais causas de danos,

Por mais de um súcubo minha semente consumida,

AINDA ASSIM ME ESFORCEI E BEM AOS POUCOS REJUNTEI

NOVOS LIVROS E DISCOS PARA OS QUANTOS EU PERDI

E OS QUE DEIXEI À BEIRA SENDA FLORESCER

Nesses mil versos em que meu sangue derramei

E em minhas artérias mais tutano em produzi,

Para adubar os cens de orgulhos que em aflição gerei.

 

REVANCHE 2

 

A POUCO E POUCO E COM MUITO SACRIFÍCIO

REUNI MEUS SELOS COM ESFORÇO E COM VAIDADE,

SEM DÚVIDA EM MAIS VASTA QUANTIDADE

QUE OS PERDIDOS EM FOGOS DE ARTIFÍCIO

E os livros fui reunindo em tal ofício,

De segunda e terceira mão, é bem verdade...

Mas de quem provém esta vasta variedade,

Quem contribuiu para satisfazer meu vício?

MUITOS EM PONTA DE ESTOQUE, NUNCA LIDOS,

MUITOS COMPREI SEM SEREM ANTES OUVIDOS

E ACONCHEGO LHES DEI DENTRO EM MEU LAR

Mas anos passam e já não posso mais comprar,

Minhas estantes seus deveres já cumpridos

Sem que de fato ainda sobre algum lugar...

 

REVANCHE 3

 

E VEJO AGORA QUE SE INSURGEM OS SONETOS

ANTE A INVASÃO DE OUTROS TIPOS DE POEMAS,

SEM SUBMETER À GUILHOTINA AS SEUS ALFENAS,

BROTAM DE UM POÇO SEUS SONHOS MAIS SECRETOS,

Visto de fato serem os cantos mais diletos,

De minhas células rebrotam essas penas,

Querem mostrar-se quais veritáveis gemas,

Iridiadas as suas asas como insetos.

E MESMO ASSIM, O QUE PODERÁ OCORRER,

MORTOS MEUS DEDOS, RESTANDO SÓ OS ANÉIS,

O QUE FARÃO COM MEU TESOURO SEM VALOR?

Talvez em sacos os ponham a vender

Para confete fabricar sem ouropéis,

Serpentinados do que sobrou do meu amor.

 

INCUNÁBULOS I – 17 JUN 2024

 

“LI, CERTA VEZ, NUM ALFARRÁBIO ANTIGO”,

HÁ TANTAS DÉCADAS ESCREVEU-NOS ZIVER RITTA,

SEM QUE EU ESQUECESSE JAMAIS FRASE BENDITA

DESSE POETA QUE NÃO CHEGOU A SER MEU AMIGO.

Mas em minha mente dei a tal verso seu abrigo,

Sem jamais, contudo, fazer-lhe outra visita.

Em um álbum que protegia simples fita,

Mas que de fato mais reler jamais consigo.

TENHO UM LIVRO DE ZIVER, QUE FOI TALVEZ

O ÚNICO QUE ELE CHEGOU A PUBLICAR,

TIPOGRAFADO, AFINAL, EM OUTRA CIDADE.

Mas nunca mais encontrei tal soneto uma só vez.

Bem que eu queria sua pena contemplar,

Pelos sonetos que redigiu em quantidade.

 

INCUNÁBULOS II

 

TODO SONETO É PROFECIA EM REALIDADE,

VATE SINCERO DE DIONÍSICA POESIA,

NATURALMENTE CONTÉM NELE PROFECIA,

AMBAS PALAVRAS GEMINADAS NA VERDADE.

Talvez Dionyso nelas mesmas falaria,

Provocações a atiçar em quididade:

Busco as palavras em imortal profundidade,

Ou elas vêm por forçar-me a parceria.

MORREU ZIVER E EU MORREREI UM DIA,

SEUS VERSOS MAIS DE CUNHO RELIGIOSO,

NEM SEI DE AMOR CHEGOU A VERSEJAR.

E o que farão com minhas sagas de heresia?

Talvez somente um ideal sensaboroso,

Que a muito poucos conseguirá contaminar.

 

INCUNÁBULOS III

 

QUERO OS SEGREDOS NOS VOCÁBULOS CONTIDOS,

ESSAS HERANÇAS QUE ULTRAPASSARAM GERAÇÕES,

AORTAS ARTÉRIAS A ABRAÇAR OS CORAÇÕES,

ANTIGOS DEUSES NEM SEQUER HOJE LEMBRADOS.

Sempre julguei ter meus versos inspirados

Pelo Paráclito que consola as multidões,

Que há dois mil anos foi legado às solidões,

Mas que em minhas linhas percebo desbotados.

VEJO OS POETAS A VAGAR NOS DESCAMPADOS

CAMPOS-ELÍSEOS ANTES DO CRISTIANISMO,

QUE MINHALMA PODEM AINDA ENFEITIÇAR

E ali viajarei após ter divorciados

Meus próprios membros da alma em fetichismo,

Como em grimórios bruxedos revelar.

 

INCUNÁBULOS IV

 

QUE COISA TRISTE ALGUM POETA DE TALENTO,

QUE HOJE EM DIA SEQUER SE PODE RELEMBRAR,

QUE EM VIDA A FAMA NEM SEQUER PÔDE ALCANÇAR,

SEU CORPO ASTRAL TIRITANDO NO RELENTO

Que em meu olhar se fixou um só momento

E de suas íris conseguiu-me projetar

Réstias de luz minhas pupilas a queimar,

No meu quiasma a gravar seu sentimento.

EM MEU PORVIR AINDA SEREI ALEGORIA,

A ME OCULTAR EM QUALQUER GOTA DE ORVALHO:

TENHO O DEVER DE ESCREVER O QUE MANDARAM,

Por mais opaca essa luz que em mim luzia,

Em meu manto de fragmentos ainda me espalho,

Pobre reflexo dos mil dons que me alcançaram.


quarta-feira, 7 de agosto de 2024


 

 

RAWALPYNDI 1 – 12 JUN 2024

(Eleonor Tomlinson)

 

Muitos sonetos escondem-se secretos,

Embuçados no céu de Castro Alves,

Especialmente no momento atual.

Saem a fórceps, às vezes, tais sonetos,

Tropeçando nas vulvas do momento,

Na rebeldia das rimas.

 

Houve o terrível catastroformismo

Que acometeu o meu rincão natal,

Do qual eu nunca me mudei.

Por sorte, minha cidade foi poupada,

Mas a Internet e a telefonia não o foram,

Passei muitos dias sem sinal.

 

Pior ainda, por motivos complicados,

Meu pobre computador foi afetado,

Mandei limpar o interior do gabinete,

Comprei um novo mouse, bom ratinho,

Já me contemplo em novo monitor,

Sem conseguir com frequência trabalhar.

 

RAWALPYNDI 2 – 13 JUN 2024

 

A cada problema, dois ou três dias de espera,

Os meus rascunhos se acumulando,

A par com mil antigos empoeirados

E mais os versos realmente do passado,

Guardados foram tão só datilografados

Pelos cuidados de minha esposa amada.

 

De fato, eram as cópias que lhe dei,

Impulsionado pelo amor que lhe sentia,

Que as primeiras vias se queimaram,

Durante meu holocausto de 1988,

Com minha biblioteca e com meus discos,

Meus quadros, tapetes e instrumentos.

 

Como se não bastasse, desabei

De meus oitenta anos ainda no aguardo,

Não uma só, porém por sete vezes!...

No último mês, mais duas completei,

Em um total de nove as minhas quedas,

Meu braço sofre de sarcopenia!...

 

RAWALPYNDI 3 – 14 JUN 2024

 

Por sorte de ossos fortes, em nada me quebrei,

Mas perdi a liberdade de meus movimentos,

Fica difícil até mesmo digitar,

Estendo os antebraços, doem os ombros

E aqui estou, pobre tolo, a lamentar,

Quando devia por me dar feliz.

 

Até a escada rolei de cima a baixo,

Rasguei bastante o couro cabeludo,

Meio litro de sangue derramei...

Com algum auxílio, enfim me levantei,

Com fisioterapia já um tanto melhorei,

Porém os braços ainda controlo mal.

 

Feito palhaço, me estou a justificar,

Porque tão pouco tenho digitado

E por estar de mal com meus sonetos,

Que em pilhas permanecem empoeirados

Ou na pasta de minha esposa ainda guardados,

Até o momento em que os enfrentarei.

 

De fato, quem mais sofreu foi minha esposa,

Ao ver algum diabo me empurrar,

Escada abaixo, sem poder me segurar...

Por uma quinzena me ficou a vituperar

Em seu carinho que tudo compensou

E só este título absurdo resultou!,,,

quarta-feira, 31 de julho de 2024


( MAMIE VAN DOREN)

 

MAHENDRA I – 7 JUN 2024

Como é comum o véu que o dom do solidéu

apaga num instante!

Como é comum o arpéu que à bênção desde o céu

revoga o celebrante!

Quão breve é o casamento, apenas um momento

de permissão legal,

mais longo o julgamento que surge em seguimento

do tédio natural.

 

Amor é frágil flor, precisa o seu vigor

ganhar constante rega,

Amor quão frágil flor e o adubo desse ardor

é o carinho que se lega,

Enquanto o matrimônio, igual que o patrimônio

precisa ser cuidado,

Enquanto o matrimônio, por artes do demônio,

é logo destroçado!

Envolve-se em sudário se não for solidário

o mútuo sentimento

E desce ao ataúde, quando o casal se ilude

de que tudo já está feito...

 

A cerimônia é breve e a gente até se atreve

a pensar em eternidade:

Qualquer frase desatenta a taça fragmenta

em amargo julgamento

E surge a dura, lenta, amarga essa disputa

nos palpos do direito,

Enquanto o bem se esquece, veloz como uma prece

envolta em falsidade!

 

MAHENDRA II – 8 JUN 2024

E mesmo nessa ausência, sacramental potência,

carinhos se requer,

A chave do favor, que não se arranca amor

do peito da mulher,

De fato, amor se planta, enquanto se descanta

e molha diariamente;

Na ausência do regar só poderá murchar

a haste mais potente.

 

Mas sem a garantia, o ciúme desconfia

do valor desta ternura

E para não o perder, há esforço que fazer

para evitar agrura

E assim de parte a parte, evita-se o descarte

fugaz de algum desejo,

Demonstração de apego, não mais o amor cego

que nos traz primeiro beijo!

 

Mas quanta vez ocorre, depois que nos decorre

o vale e a assinatura,

Que amor tenha descanso apenas num remanso,

envolto em aconchego,

Que se pense em direito após o ato perfeito,

falácia só de apego!

E mesmo nessa ausência, sacramental potência

da ternura se requer,

A chave do favor, esse eliciar do amor

do ventre da mulher

E assim amor se planta, quando o sexor descanta

igual que diária ordenha,

Na ausência desse amor, partilha de vigor,

num ato que nos venha.

 

E ocorre o esvaimento, em lento descaimento

da emoção mais pura,

Cada um no seu trabalho, na força do ato falho,

qualquer descaso cego

E a cornucópia de ouro se perde no desdouro,

estilhas de loucura!

 

MAHENDRA III – 9 JUN 2024

Por onde andará o amor no pálido estridor

da vida em separado?

Por onde andará o amor na vida sem pudor

do sexo apressado?

O que fará Cupido, ao ver-se desmentido,

assim diariamente?

O que fará Cupido, ceguinho desvalido,

no fervor concupiscente?

 

Por onde andará o amor, se a rega do escritor

foi toda desmentida?

Por onde andará o amor, se o seu maior valor

é apenas descumprido?

Quem nos dirá então que exista coração

no sexo hormonal?

Quem nos dirá então se existe assim paixão

no sexo comunal?

 

E quando assim nos vemos, condenar sequer podemos,

só ter perplexidade,

Nas práticas tribais das seitas canibais

de total carnalidade,

Os piercings e as tatuagens a demarcar visagens

em cada corpo e face,

Tal qual se a tecnologia a nós humilharia

em falsa humanidade.

 

Um tipo de terror, a queda desse andor

por práticas perdidas,

Nas noites temporais retrograções fatais

das carnes esquecidas?

 

MAHENDRA IV – 10 JUN 2024

Por onde o romantismo perdido nesse abismo

da desintegração?

Por onde o romantismo, não mais que o saudosismo

de minha obstinação?

Renovada a violência, tomada de impaciência,

sempre a me acompanhar,

Renovada virulência, ao ritmo da ciência

pretendemdo ultrapassar?

 

Por onde a esperança, que o antigo ideal alcança

de haver paternidade,

Por onde a esperança, que causa essa pujança

de Beethoven em surdidade?

Foi apenas letra morta o ideal que assim comporta

de Schiller a patena,

Foi apenas letra morta que à geração conforta

de Napoleão a pena?

 

Por todos os amores, teremos ditadores,

teremos genocídios,

Por todos os amores, até os reais horrores

de morte e fratricídios,

Por todos os ideais de poetas imortais,

nada irá nos resultar?

 

Assim como o lemingue que o suicidio extingue

na falta de homicídio,

Vitoriosos fanatismos em troca de humanismos

nas lutas redivivas,

Que mais posso fazer, ritornello a conhecer,

que ao início retornar?

 

MAHENDRA V – 11 JUN 2024

Por onde andará ela?  A luz de sua janela

para outro se abrirá?

Por onde andará ela?  A face que encastela

sorriso mostrará

A outro além de mim?  Que meu sonhar, enfim,

não é mais que fantasia...

A outro além de mim... Que seu amor, assim,

final entregaria?

 

Com quem andará ela?  Quem hoje pode vê-la

na saga do desejo?

Com quem andará ela?  Quem hoje pode tê-la,

no mosto de seu beijo?

A quem sopra esse vento?  Em trânsito o portento

a quem hoje a destina?

A quem sopra esse vento?  Anseio um contratempo

que a meu rival malsina!

 

Será que me recorda?  Suspira quando acorda

e vira para o meu lado?

Será que me esqueceu? E o beijo que foi meu

no ar se evaporou?

Com quem ela conversa? Com quem memória tersa

hoje vai compartilhar?

 

Só lembro em minha vergonha a memória que reponha

meu peito descuidado,

Que embora não a esqueça e hoje ainda padeça

a outrem dá o sexor?

Ao ver tão transitória a fidelidade inglória

na insensatez do amor.