terça-feira, 30 de julho de 2024


 

DEVASHAN I – 3 JUN 024

(MIA FARROW)

Onde me encontro eu?   Em que estrelas me escondo,

nas asas de Perseu?

Onde me encontro eu? Onde me vejo pondo

os pés, sem pouso ter?

Nos tempos do passado, na cinza ou no dourado

arbóreo dos cabelos?

Nos tempos do passados, expondo olhar cansado

na coma dos desvelos?

Mas onde piso agora?  Na fímbria de um embora

que não terá retorno?

Mas onde piso agora? Qual haste que me escora

na ausência de um suborno?

 

Quem me dava seus beijos, na flama dos desejos

com que me confortava?

Quem me dava seus beijos, nos lépidos adejos

e assim me refrescava?

Pesando sobre a terra o mar ainda se abre

no lodo da memória,

Perdido na lembrança que nada mais alcança,

senão o devaneio,

Não mais nuvem rosada margeando a longa estrada

de um morto coração,

Pisando nos calhaus, sem alcançar os vaus

da bênção transitória,

Pisando nos espinhos, vereda dos caminhos,

pranteando sem receio,

Esquanto mais se esgarça na sombra que se afasta

a última canção!....

 

DEVASHAN II – 4 JUN 024

Onde me encontro eu?   E quando me escondeu

o gelo de meu passo?

Onde me encontro eu?  Qual fado que me deu

a teia de um abraço?

E quando se rompeu a flama que acendeu

meu manso turbilhão?

E quando me varreu o vento que escondeu

o forte vergalhão?

 

Serão só indagações que em nada se dispoem

a me satisfazer?

Não acharei resposta, por mais que costa a costa

eu venha a percorrer.

Olhando para adiante, só vejo um viandante

igual que a mim perplexo,

Na estrada sem contorno, o sangue apenas morno

no afã de percorrer

As cadências peregrinas que recobrem tantas sinas

no mais arcano nexo,

Enquanto giro em torno, na saga desse corno

do último dever.

 

DEVASHAN III – 4 JUN 024

Se juntos ainda andássemos, se ambos alcançássemos

a trégua do destino,

Se juntos aind marchássemos, se ambos dominássemos

o trote em desatino

Do tempo embriagado em passo obstinado

de volta para o antanho,

Do tempo marchetado do amor abandonado

em seu primeiro lanho.

 

Se juntos ainda marchássemos, se em sonhos adejássemos

a paisagem puerperina,

Se juntos ainda apressássemos, as faces ainda alçássemos

em confiança placentina,

Se juntos nosso olhar pudesse confortar

as dores que sentíssemos

E assim sem fraquejar a senda a perlustrar

das lágrimas que víssemos.

 

Talvez braços furtando, um a outra culpando

no páramo deserto,

Talvez nos escutando, uma o outro perdoando

na grade da sentença,

Melhor do que isolados, que a mastigar pecados

que ninguém mais queira...

A dor compartilhando, correntes arrastando

de coração aberto,

A carne assim pingando, o solo avermelhando

em lamaceira densa,

O sangue adormecido em tal lugar comprido

que qual rubi se alheia...

 

DEVASHAN IV – 5 JUN 024

E o que seria melhor? Um solitário albor,

ninguém a nosso lado?

E o que seria melhor? Um torturado amor,

em passo atribulado?

Um a julgar por si o ardor do frenesi

do passo descarnado

Ou a julgar a ti, que me julgas ali

e tens a mim culpado...?

O que nos afastou?  Qual força nos dobrou

à força de uma cunha?

O que nos rejuntou?  Qual torno que apertou,

que a lepra nos propunha?

Que tipo de cansaço gastou de nosso abraço

a luz da excitação?

Que tipo de cansaço fechou qualquer espaço

dentro em teu coração?

 

E fomos tanto nós!  Gastados pelas mós

em lento esmerilhar,

Pendeste para a esquerda, total a minha perda,

lançando-me à direita!

Sem encontrar-nos dentro de um abençoado centro

de júbilo indolente...

 

E fomos tanto nós!  Que adagas cortam nós

perfeitos dos abraços !?

Que houve dessa feita a que não mais se ajeita

a pátina perfeita?

Que arestas preencheste, enquanto se enrosca e desce

meu coração fervente?...

 

DEVASHAN V – 6 JUN 024

Ao longo dessa trama, será que ainda reclama

tua alma pela minha?

Ao longo dessa cama, será que ainda proclama,

gentil, a ladainha?

Das sentenças rosadas, das frases delicadas

que amor fazem crescer,

Das palavras encantadas, ternuras completadas

em cada amanhecer?

 

Enquanto amor durava e a carne se incendiava

de idêntico querer,

Enquanto amor valsava e o corpo se embalava,

repleto de prazer?

 

Quão firme a nossa rede, enquanto amor concede

seu cálido fulgor!

Quão firme a nossa rede, enquanto amor nos pede

um último pendor!

 

Quão vasta a solidão, ao ver morta a emoção,

em lento esvaimento,

Quão vasta a gelidez, se nosso amor se fez

em magro sentimento!

 

E quanto nos separa a sensação que aclara

a falta desse cio!

Quão vasta essa bravura de demonstrar ternura

por honra e puro brio!

 

Quão calmo esse tormento de brando assentimento,

julgamento em vã demora,

de que amor cerzido com fio novo obtido

se esgarça nessa hora?

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