DEVASHAN
I – 3 JUN 024
(MIA FARROW)
Onde me encontro eu? Em que estrelas me escondo,
nas asas de Perseu?
Onde me encontro eu? Onde me vejo pondo
os pés, sem pouso ter?
Nos tempos do passado, na cinza ou no
dourado
arbóreo dos cabelos?
Nos tempos do passados, expondo olhar
cansado
na coma dos desvelos?
Mas onde piso agora? Na fímbria de um embora
que não terá retorno?
Mas onde piso agora? Qual haste que me
escora
na ausência de um suborno?
Quem me dava seus beijos, na flama dos
desejos
com que me confortava?
Quem me dava seus beijos, nos lépidos
adejos
e assim me refrescava?
Pesando sobre a terra o mar ainda se
abre
no lodo da memória,
Perdido na lembrança que nada mais
alcança,
senão o devaneio,
Não mais nuvem rosada margeando a longa
estrada
de um morto coração,
Pisando nos calhaus, sem alcançar os
vaus
da bênção transitória,
Pisando nos espinhos, vereda dos
caminhos,
pranteando sem receio,
Esquanto mais se esgarça na sombra que
se afasta
a última canção!....
DEVASHAN
II – 4 JUN 024
Onde me encontro eu? E quando me escondeu
o gelo de meu passo?
Onde me encontro eu? Qual fado que me deu
a teia de um abraço?
E quando se rompeu a flama que acendeu
meu manso turbilhão?
E quando me varreu o vento que escondeu
o forte vergalhão?
Serão só indagações que em nada se
dispoem
a me satisfazer?
Não acharei resposta, por mais que costa
a costa
eu venha a percorrer.
Olhando para adiante, só vejo um
viandante
igual que a mim perplexo,
Na estrada sem contorno, o sangue apenas
morno
no afã de percorrer
As cadências peregrinas que recobrem
tantas sinas
no mais arcano nexo,
Enquanto giro em torno, na saga desse
corno
do último dever.
DEVASHAN
III – 4 JUN 024
Se juntos ainda andássemos, se ambos
alcançássemos
a trégua do destino,
Se juntos aind marchássemos, se ambos
dominássemos
o trote em desatino
Do tempo embriagado em passo obstinado
de volta para o antanho,
Do tempo marchetado do amor abandonado
em seu primeiro lanho.
Se juntos ainda marchássemos, se em
sonhos adejássemos
a paisagem puerperina,
Se juntos ainda apressássemos, as faces
ainda alçássemos
em confiança placentina,
Se juntos nosso olhar pudesse confortar
as dores que sentíssemos
E assim sem fraquejar a senda a
perlustrar
das lágrimas que víssemos.
Talvez braços furtando, um a outra
culpando
no páramo deserto,
Talvez nos escutando, uma o outro
perdoando
na grade da sentença,
Melhor do que isolados, que a mastigar
pecados
que ninguém mais queira...
A dor compartilhando, correntes
arrastando
de coração aberto,
A carne assim pingando, o solo
avermelhando
em lamaceira densa,
O sangue adormecido em tal lugar
comprido
que qual rubi se alheia...
DEVASHAN
IV – 5 JUN 024
E o que seria melhor? Um solitário
albor,
ninguém a nosso lado?
E o que seria melhor? Um torturado amor,
em passo atribulado?
Um a julgar por si o ardor do frenesi
do passo descarnado
Ou a julgar a ti, que me julgas ali
e tens a mim culpado...?
O que nos afastou? Qual força nos dobrou
à força de uma cunha?
O que nos rejuntou? Qual torno que apertou,
que a lepra nos propunha?
Que tipo de cansaço gastou de nosso
abraço
a luz da excitação?
Que tipo de cansaço fechou qualquer
espaço
dentro em teu coração?
E fomos tanto nós! Gastados pelas mós
em lento esmerilhar,
Pendeste para a esquerda, total a minha
perda,
lançando-me à direita!
Sem encontrar-nos dentro de um abençoado
centro
de júbilo indolente...
E fomos tanto nós! Que adagas cortam nós
perfeitos dos abraços !?
Que houve dessa feita a que não mais se
ajeita
a pátina perfeita?
Que arestas preencheste, enquanto se
enrosca e desce
meu coração fervente?...
DEVASHAN
V – 6 JUN 024
Ao longo dessa trama, será que ainda
reclama
tua alma pela minha?
Ao longo dessa cama, será que ainda
proclama,
gentil, a ladainha?
Das sentenças rosadas, das frases
delicadas
que amor fazem crescer,
Das palavras encantadas, ternuras
completadas
em cada amanhecer?
Enquanto amor durava e a carne se
incendiava
de idêntico querer,
Enquanto amor valsava e o corpo se
embalava,
repleto de prazer?
Quão firme a nossa rede, enquanto amor
concede
seu cálido fulgor!
Quão firme a nossa rede, enquanto amor
nos pede
um último pendor!
Quão vasta a solidão, ao ver morta a
emoção,
em lento esvaimento,
Quão vasta a gelidez, se nosso amor se
fez
em magro sentimento!
E quanto nos separa a sensação que
aclara
a falta desse cio!
Quão vasta essa bravura de demonstrar
ternura
por honra e puro brio!
Quão calmo esse tormento de brando
assentimento,
julgamento em vã demora,
de que amor cerzido com fio novo obtido
se esgarça nessa hora?
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