sábado, 20 de abril de 2013






VERSOS OCOS I

pelas campânulas
tambores ocos
no suflar argentino dos tufões
no rodopio gentil dos furacões
em que almas dançam na luz atribulada
das luas mortas da estação passada
compassada           compassada
repassada          repassada
repassa          e passa
sai do intelecto
e não da alma
este estertor melífluo do pardal
oximoresco seu pio desnatural
neste desgosto total por novo afeto
que pus de lado e circundei completo
catalepto          catalepto
espectro          espectro
no plectro          do plectro

VERSOS OCOS II

enche a camisa
um vão suspiro
e noutro instante me encarquilha o peito
ponho de lado o sonho sem defeito
na surpresa amarelada do regresso
na cânfora azulada do pregresso
feito ingresso          feito ingresso
progresso          progresso
  engesso          em gesso
bimbalham guizos
verdes prejuízos
qual sino mole de cascas de mogango
meus clarins se enrouquecem e me zango
contra a matéria indolente das cabaças
a chocalhar matracas pelas praças
sem que desfaças          sem que desfaças
asas de traças          asas de traças
o que retraças          como retraças

VERSOS OCOS III

enlanguescido
novo sentido
do catavento transformado em siso
do furacão que mal aciona um guizo
no randômico esbatir aleatório
de sabor pélvico e som circuncisório
perfunctório          perfunctório
fosfóreo          fosfóreo
um foro          no foro
mas não importa
navalha corta
cerceando a voz plangente de meu canto
manifestado mesmo assim contanto
que ainda jorre a glória em borbotão
no retalhar da mente e coração
contradição          contradição
tradição          tradição
na traição         contração

VERSOS OCOS IV

farsa imperfeita
ritmo novo
foge completo ao pendor do corrupio
que me fluía do peito feito rio
nos sabores regulares do soneto
que por feroz que seja escorre quieto
irrequieto          irrequieto
requieto          requieto
   inquieto          no quieto
sussurro manso
sem ter descanso
em surpreendente valor de defasagem
sem covardia mas sem pingo de coragem
varrido de emoção mordaz salobra
como a água que jorra ao fim da obra
amargobra          amargobra
 que obra          sem obra
  na obra          da cobra

VERSOS OCOS V

em histeria
dia após dia
o vagalume chama o olhar do sapo
o fio de ouro se transforma em trapo
a bola de cristal esconde o mal
a ponta de um anzol esconde o sol
o vácuo agarro
a luz amarro
enquanto o sapo pretende iluminar
enquanto o ouro pretende renovar
a aurora cristalina do teu beijo
grafitizado na ausência de um ensejo
 sou caranguejo          qual caranguejo
 então manquejo          num murmurejo 
    e apenas vejo          o meu desejo

VERSOS OCOS VI

no grito histérico
canta a gaivota
a saga moribunda das cocotas
a exultação senil das maricotas
o pipilar zombeteiro dos pardais
os próprios versos que não lerás jamais
esmeraldinos          esmeraldinos
caudalinos          caudalinos
ferinos          ferinos
na praia azul
marcha um leproso
seus pés descalços presenteiam o contágio
quem aprecia das areias o apanágio
quem se estende sobre elas sem reserva
sem proteção sequer de qualquer erva
triste epopeia          triste epopeia
adeus Hygeia          adeus Hygeia
nem faz ideia          nem faz ideia

VERSOS OCOS VII

na franja alada
há um canivete
cortes fundos no tapete voador
o vento silva qual ventilador
o gênio busca a lâmpada sagrada
e a rolha não consegue mais tirar
contaminada          contaminada
desencantada          desencantada
jaula dourada          jaula dourada
não há mais tempo
torna-se humano
porém suas pernas são riscos de fumaça
em passos trôpegos sua senda traça
destruturado da divina providência
obrigado a aceitar a previdência
aposentadoria          aposentadoria
pensão vazia          pensão vazia
triste elegia          triste elegia

VERSOS OCOS VIII

amei a sorte
foi cobra cega
fiz um colar com mil olhos de vidro
tomados de cristais de pura geada
um fio de vento usei para fiada
meu casaco transformei numa pandorga
constantemente          constantemente
ebulescente          ebulescente
efervescente          efervescente
na multidão das hordas
contei os caramujos
é preciso descartar qualquer sentido
que versos loucos tenham conduzido
um barco a vela que abandona oceano
uma carruagem desce às profundezas
emaranhezas          emaranhezas
um tanto tesas          um tanto tesas
nas realezas          das realezas

VERSOS OCOS IX

a caçarola
aleita o azeite
ferve meu coração em minhas entranhas
na busca amarga de vozes mais estranhas
um hipopótamo dança na fogueira
o faquir deixa os pregos pela esteira
abracadabra          abracadabra
cadáver abra          cadáver abra
  redil de cobra          ninho de cabra
serpente morta
não perde casca
o vento já exauriu-se de desejo
fecunda a relva com solerte beijo
os gafanhotos ressurgem no deserto
a colmeia nativa está bem perto
peripatética          peripatética
peripécia          peripécia
profética          profética

VERSOS OCOS X

dentes de serra
aqui me estendo
ao plutocrata meu cavalo rendo
ao oligarca minhas fezes vendo
procuro em vão ficar embriagado
dionyso afastou-se de meu lado
no desperdício          no desperdício
só há resquício          só há resquício
 do viço          do vício
é zombeteiro
o olhar ligeiro
em serenata convoquei trovões
os hipocampos cantam-me canções
estou imerso na dramaturgia
a seca emerge em ácida alegria
na liturgia          na liturgia
desta agonia          desta agonia
a profecia          aqui jazia

VERSOS OCOS XI

na academia
oleosos corpos
eu não pretendo levantar mais peso
meus músculos já tem obrigação
de carregar os males de meus versos
de desgastar-se em velhas ladainhas
ângelus          ângelus
arcângelus          arcângelus
síngulus          síngulus
sem horários
tempos de terços
eu durmo envolto no hábito da data
meu travesseiro é o dia que desata
os meus lençóis dois meses em declínio
o meu colchão manual de latrocínio
meu ordinário          meu ordinário
é um corsário          é um corsário
extraordinário          extraordinário

VERSOS OCOS XII

em pura osmose
desenfreada
a propaganda atiça a mais consumo
meus tristes versos apenas um resumo
do canto alegre de mil flores mudas
na calandra esfalfada em que me escudas
tombadilho          tombadilho
no trilho          no trilho
me ilho          me ilho
perdeu-se o siso
do escaravelho
os versos resmoneiam de degredos
as grades libertaram mil segredos
há elefantes no reino de sião
há mil diamantes no meu coração
num alvoroço          num alvoroço
  após o almoço          após o almoço  
  remoço          remoço  

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