PARADOXO
DE UM TOLO I
Se eu
afirmar ser sempre mentiroso,
saberás
bem que estou mentindo agora;
porém,
se estou mentindo nesta hora,
então
te minto ser sempre mentiroso...
Mas se
mentir ser sempre mentiroso,
então
talvez verdade fale agora;
e se
falo a verdade nesta hora,
bem
saberás que não sou um mentiroso.
Mas se
te minto faltar sempre à verdade,
escondo
que à verdade não te falto;
e, se
não falto à verdade, estou mentindo;
E se te afirmo falar sempre inverdade,
sou
verdadeiro na mentira em que te assalto
ou só
estarei mentiras transmitindo...?
PARADOXO
DE UM TOLO II
Se eu
te disser então que nunca minto,
saberás
que o que falo é uma inverdade,
tão
natural que é a humana falsidade,
que
nem sequer a mim conto o que sinto.
Desse
modo, se te afirmo o quanto sinto,
seja
de amor, de ódio ou de vaidade,
duvidarás
de tal sinceridade,
por
ser mentira afirmar que nunca minto.
Eu te
direi, então, que eventualmente
te
mentirei, quando me for necessário
e um
bom motivo a tal me impulsionar.
Mas
não serei da mentira perdulário:
ser
verdadeiro é bem mais conveniente,
pois
se mentir, irás me acreditar...
PARADOXO
DE UM TOLO III
Se
eu te disser, porém, que sempre brinco,
o
meu brincar não será levado a sério,
por
mais que até pareça despautério
tal
mentira em que ponha mais afinco...
E
da verdade, eu perderei o vinco,
pois
pensarás, de modo deletério,
que
só estou a brincar e um cemitério
de
boas intenções no solo eu finco...
Somente
porque quis, em meu brincar,
esconder
a seriedade de meu sonho,
sem
te negar a liberdade de descrer...
É
assim que fico, nesse deslizar,
sem
me atrever a meu amor bisonho
como
mais sério que a vida descrever...
PARADOXO
DE UM TOLO IV
Se
precisas mentir, conta uma parte
apenas
da verdade e não inventes
histórias
longas, recriar não tentes
o
que nunca aconteceu, porque destarte,
ao
inventares desculpa que descarte
o
que de fato houve, é provocar
mais
uma série de mentiras e buscar
melhor
história que à descrença farte...
Mentir
é trabalhoso. Bem melhor
é
contar a verdade, sempre (ou quase),
porque
mentiras tendem a dar cria...
Mas
esquecendo uma parte, o narrador
para
explicar-se encontra maior base,
por
não lembrar-se de tudo o que fazia...
PARADOXO
DE UM TOLO V
Existem
muitos tipos de mentira;
há,
por exemplo, a mentira caridosa:
"não
tem espinhos", se afirma de uma rosa,
se
em desabono desta algo surgira.
"Deu
negativo", ao julgar que menos fira
o
coração de alguém do que a valiosa
informação
de que é câncer a outra rosa
que
de seu ventre a se nutrir se insira.
Esconder
uma morte ou uma doença,
seria
um jeito de poupar o sofrimento
dessa
pessoa com quem conversamos.
Mas,
de fato, quem se poupa nessa crença
somos
nós mesmos, em egoísta pensamento
de
não vermos sofrer a quem amamos.
PARADOXO DE UM TOLO VI
Existe aquele que sempre se engrandece:
fala de si muito mais do que merece,
para mostrar aos outros que é melhor
do que parece ser -- e o é, de fato...
Assim, do que não mente, até parece
que coisa parecida lhe acontece:
ser mentiroso lhe daria mais favor
que ser o alvo de descrédito e boato...
E o que fazer, se nem nós acreditamos
já ter feito muito mais que a maioria
fez toda a vida, no prazo só de um ano?
Talvez seja melhor quando aumentamos
o que fizemos, como fazem; e a valia
do desconto não nos cause grande dano!...
PARADOXO DE
UM TOLO VII
Porém se eu
te disser que nunca brinco,
que falo a
sério em todos os momentos,
então,
quando eu mentir, teus pensamentos
me tomarão
por mentiroso, com afinco;
mesmo que eu
seja verdadeiro nesse vinco,
serei
julgado por falsos sentimentos,
pois
mentirei nos teus pressentimentos
e serei
falso em tudo em que me finco;
se te
contasse que apenas eu brincava,
ao dizer que
sempre uso seriedade,
talvez bem
mais profundo condenasses;
pois cada
vez que eu falasse, maliciava,
brincando
seriamente com a verdade
e de todo o
meu amor tu desconfiasses...
PARADOXO
DE UM TOLO VIII
Quando
se pensa falar só a verdade,
é
então que mentimos totalmente:
mentimos
a nós mesmos, na indecente
certeza
de não darmos a inverdade,
pois
todos nós, tão só pretensidade
somos
o tempo todo, intensamente:
enganamos
ao redor, diariamente
e
bajulamos nossos poços de vaidade.
Se
nem sequer comigo eu sou sincero,
porém
pretendo ser o que não sou
e
escondo de mim mesmo minhas razões,
o
que direi daqueles em que espero
gerar
confiança em mim, bem onde estou:
nessa
dança de ardis dos corações.
PARADOXO
DE UM TOLO IX
Eu
te direi então, que dissimulo;
que
amor escondi, pela mentira;
que
desamor cantei, pela minha lira;
que
a dor desta mentira, à pena engulo;
e
que a verdade, por amor, anulo:
queimo
a mentira na lenha de minha pira;
vejo
a verdade que, a debater-se, estira;
cada
palavra é sangue em que me açulo.
E
se eu mentir, querendo demonstrar
que
só a verdade na minha alma dura,
mais
me dura a verdade na mentira...
Que
a verdade é cata-vento a revoar,
ao
passo que a mentira de alma pura
volta
no vento, enquanto o vento gira...
PARADOXO
DE UM TOLO X
Dissimulada
assim, essa mentira
ainda
mais dissimula que a verdade:
por
mais contada com sinceridade,
toda
verdade sua verdade estira...
Mas,
pelo vento, tal mentira gira,
enquanto
que a verdade, em falsidade,
por
mais que creia na própria veleidade,
crava
raízes na terra em que se fira...
E
busca em vão amor ser verdadeiro,
pois,
ou esconde o egoísmo derradeiro
ou
dissimula a verdadeira fome,
na
verdade em que a mentira transcorreu,
ao
dar-se amor, talvez amor se tome,
muito
mais do que o amor que a gente deu.
PARADOXO
DE UM TOLO XI
Mentira
então, é o que uma mente tira
de
dentro de si mesma e o olhar esconde;
e
nem sequer a mente sabe donde
se
retirava a tiragem da mentira...
Porque
mentira é o que toca cada lira,
enquanto
bota para fora de seu onde
o
que ainda esconde sem saber aonde,
quando
a verdade tal mentira vira...
E,
se mentira é quanto a mente tira
e
se é, portanto, o quanto a mente bota,
eu
não te conto mentira, mas "membota".
E,
se no fundo, teu bem minha mente mira,
bem
mais verdade existe na mentira,
que
na verdade que eu pingo gota a gota...
PARADOXO
DE UM TOLO XII
Assim
eu minto, se digo que te quero
com
um amor de amigo ou até de pai;
eu
dissimulo -- e em tal mentira vai
toda
a tristeza de meu amor sincero...
E
quando eu minto que não mais espero
por
tal amor por que minha alma esvai,
em
tal mentira novamente cai
toda
a verdade de meu desespero...
As
minhas mentiras são assim constantes,
nessas
verdades feitas de jamais
de
que a mentira mais verdade tira...
Porque
te quero, sim, mais do que antes,
por
esse muito não te querer mais
e
essa é toda a verdade em minha mentira.
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