FERIDAS & MAIS
Novas séries de William Lagos – 18/27
nov 2015
FERIDAS I
– 29 JUN 07
É fácil
de encontrar inspiração
por toda
parte. E, no fatal momento,
que te
atinge qual raio o sentimento,
necessitando
a breve ilustração,
contida
em poucas linhas, tal portento
é
soberano raio de ilusão,
que se
condensa em pleno coração
e então
se concretiza em pensamento.
A cada
olhar se vê, em cada flor,
nas
coisas vagabundas, corriqueiras,
até na
brisa de um ventilador...
Nem é
preciso sentir qualquer ardor:
é só
deixar que brote, alvissareira,
nas
pétalas suaves de um odor...
FERIDAS II – 18 NOV 2015
Mas certamente, se existe romantismo,
a fonte principal da inspiração
é o breve assomar de uma emoção
ou o aroma de olvidado saudosismo.
E que emoção produz maior lirismo
que essa de um amor no coração,
seja um amor de plena aceitação
ou o desprezado amor feito de abismo?
Não há poeta que não tenha amado,
seja na glória, seja imerso em mágoa,
que não existe amar sem nostalgia
do quanto usufruiu-se no passado,
do quanto nos atinge na atual frágua, (*)
de quanto amor se espera ainda viria...
(*) Golpes na
bigorna, no sentido de “presente”.
FERIDAS III
A inspiração me chega pelo ar
ou então supura pelas gretas de minha pele;
espero Amor continuamente vele,
qual um bálsamo gentil a me beijar...
A inspiração vem das artérias a brotar,
quando qualquer palpitação me sele,
quando a tristeza uma emoção congele
ou mesmo quando há ódio a fervilhar...
E por límpida que seja a emoção,
brotando sob a derme ou antes vindo
da atmosfera em vasta ebulição,
é sempre dela que brota a inspiração,
de um beijo futuro ou beijo findo,
nessa incerteza que perfaz toda a paixão.
FERIDAS
IV
E que
seria de nós, sem as feridas
que nos despertam
para algo de exterior?
Incapazes
ficaríamos de um amor,
gélida
esteira percorrendo vidas...
E que
seria de nós, sem despedidas
do nosso
tempo que passa em estertor,
do tempo
alheio que escorre sem rancor,
ou das
mágoas mais profundas já sofridas?
Que
triste a vida sem lágrimas nos olhos
para
limpar da visão tantos argueiros,
para
olharmos para os lados sem antolhos!
Que pobre
a vida sem granjear tristezas
que nos
trouxessem apenas passageiros
momentos
breves de fúlgidas belezas!...
E-MAIL
SEM NOME I – 02 jul 07
Engana-me
de novo:
e faz
rosnar em mim esta esperança,
este
sonho pequeno, de criança,
que nem
eu movo...
Torna a
dizer-me
que algo
entre nós dois sempre é possível,
que não
nos restará só o indizível
sonho de
verme...
Mente outra
vez,
para que
eu possa enfrentar a multidão
de outros
desejos, plenos da paixão,
que não
me dês...
Marca
outra hora,
para que
eu possa em tua câmara buscar-te:
ver-me
envolvido em ti, para, destarte,
não ir
embora...
Mas não
te esqueças
que desejos
são humanos e constantes,
inda que
passe momentos delirantes,
sempre
que peças...
Não
deixo, enfim,
de querer
outras mais, múltiplas cores:
pistilos
e estames nestas flores
do meu
jardim...
E assim,
um dia,
por mais
que amor me dê felicidade,
por mais
pretenda ter fidelidade,
também te
trairia...
Porque me
algema a sorte,
mas
minhas vistas para ti relançaria,
quando o
momento assim conheceria,
de nossa
morte...
EMAIL SEM NOME
II – 19 NOV 15
Ilude-me de
novo,
que não me iluda
antes a mim mesmo,
no desperdício
do sonhar a esmo,
sem mais
renovo...
Apenas
parpadeies, (*)
com a rede de
teus cílios venenosos,
sem pretender,
pestanejares inditosos,
com que me
enleies...
(*) Pisques os
olhos.
Em teus
caprichos,
torna-me apenas
haste de teu leque,
tira com as
unhas a lágrima que seque
nos olhos
fixos...
Conta-me apenas
desse amor que
por outrem já sentiste,
derrama-me
ilusões igual alpiste,
secas
verbenas...
E sempre olvida
que algo me
devas por tal ilusão,
pelo prazer de
conservar-me à mão,
funda ferida...
Pois afinal, não
queres
que eu seja teu
em momento cintilante,
mas tampouco
aprecias esse instante
de não me
teres...
E em certa
noite,
quando souberes
que outra eu encontrei,
sintas a falta
do que nunca te dei,
por todo o
açoite...
Com o qual
cortaste
minha esperança
que tanto te buscava
a perceber, na
derradeira oitava,
quanto me
amaste...
EMAIL SEM NOME
III
Se amor
espalhas,
como faúlhas
brotadas do fogão,
por cada ramo de
meu coração,
tal qual
vitualhas...
Queres que
brilhem,
na mais breve
promessa sem sentido,
breve queimor no
coração ferido,
que a alma
encilhem...
Pois se revoam
essas centelhas,
quais sonhos de crianças,
para apagar-me
apenas as lembranças,
não me povoam...
Diziam antigos:
“As meninas
estão indo para a escola”,
cada fagulha
minúscula que esfola,
da acha
abrigos...
Hoje é difícil
reencontrar
grandes fogões a lenha,
a maioria do
povo já os desdenha
por gás mais
físsil...
Mesmo em
lareiras,
lenhas batidas
pelo atiçador
não espalham
tais chispas com ardor,
nem
churrasqueiras...
Elas saltavam
devido à
diferença de calor,
a boca do fogão
num estreitor
de que
brotavam...
Ficou difícil
ver acendalhas a
brotar de ti;
apenas lembro
teu calor aqui,
antigo míssil...
E-MAIL
SEM NOME IV
Pois me
lançavas,
igual fagulhas
a brotar dos olhos,
vagas
traiçoeiras escondendo escolhos:
a alma
rasgavas...
Já não
percebo
as mil
faíscas desses teus enganos,
lançadas
a nutrir sonhos insanos
de um
vate cego...
Ainda
queria
que de
teus lábios a suave comissura
lançasse
ainda uma mentira pura
que me
iludia...
Ainda
quero,
mas estás
longe, outra ilusão perdida
que só
dentro de mim mesmo tem guarida,
em calmo
desespero...
Quero as
algemas
dessas
promessas não mais que sugeridas,
desses
quiçás pertinentes a outras vidas,
distantes
semas...
Quero as
traições
que
apenas dentro em mim é que existiram,
sem as
falácias que dentro em ti não viram,
murchos
balões...
Quero as
mentiras
que não
chegaste nunca a proferir,
os
juramentos ocos do teu rir,
queimadas
piras...
E finalmente
retornarei
para o peito meu vazio,
falso
triunfo do qual eu mesmo rio
no meu
presente...
COMO
SIMPLES TROCA I – 6 jul 07
És para
mim aroma de petúnia,
leve e
discreto, muito mais que a rosa.
Quando te
vejo, a vida é mais ditosa
e guardo tais
momentos qual pecúnia... (*)
(*) Dinheiro, bens.
Mas te
encheram os ouvidos de calúnia:
te
afastaram de mim, já temerosa,
sem
desejar tornar-te numa esposa,
capaz de
ser fiel como Calpúrnia... *
No
entanto, todo o tempo eu só queria
que sentisses
a meu lado plena calma
e, para
isso, tanto me esforcei...
Fui
gentil, fui atencioso e te ajudei
o mais
que pude... E só pedi tua alma,
porque a
minha há muito tempo já te dei...
(*) Na história romana são referidas
três Calpúrnias, todas modelos de virtude. A primeira cometeu suicídio quando
seu marido foi executado por razões políticas; a segunda estava tão apaixonada
por seu marido filósofo que se escândia atrás de uma cortina para escutar suas
lições dadas a rapazes, das quais as mulheres eram excluídas e aprendeu mais
que qualquer deles; a terceira foi a esposa do naturalista Plínio, o Jovem e
decorou um a um todos os seus trabalhos sobre ciência, filosofia e poesia;
destarte, “calpúrnia” entrou em nossa linguagem como sinônimo de “esposa fiel e
leal”.
COMO SIMPLES TROCA II – 20 NOV 15
És para mim aroma de azinhavre,
um toque de fulgor, algo metálico,
ternura de saudade, algo de fálico,
charrua aguda que meu peito lavre.
Um tanto de paixão que me consagre,
um traço de tanino, algo de málico, (*)
um laço de espanhol, algo de gálico,
no aroma puro e agreste do sumagre. (+)
(*) Ácidos da banana e da maçã. (+)
Arbusto de flores esverdeadas
Não de vinagre, que teu sabor é vinho,
do mais suave, não do capitoso,
algo de acerbo em moita de azevinho,
amor que oscila inquieto na balança,
enquanto o sonho zune, vigoroso,
na teia cinza de transitória dança...
COMO SIMPLES TROCA III
És para mim aroma de azeviche:
troquei contigo tantos feromônios,
sem de fato ocorrer troca de hormônios,
áspera prenda que o coração me lixe;
troquei riquezas por sabor de piche,
mil esperanças por sutis harmônios,
vagos sibilos de feros demônios,
vastos tesouros por recompensa miche.
Se nessas trocas fui acabrunhado,
é minha a culpa por tanto buscar
onde, de fato, pouco ou nada havia;
se nessas trocas tornei-me desditado,
culpa foi minha por querer amar
um coração que por mim nada sentia.
COMO
SIMPLES TROCA IV
És para
mim o aroma de meu pranto,
que como
pérolas valiosas te fingi,
mas meu
embuste nunca te impingi,
que o
repeliste igual que ao estrofanto; (*)
(*) Flor malcheirosa.
contudo,
inda louvei-te no meu canto,
como a
mais nobre esperança que nutri,
sonho das
noites em que nunca dormi,
pensando
em ti, num derradeiro espanto;
assim, de
fato, foram trocas de mim mesmo,
intercambiando
amor com meu fantasma,
em que a
própria ilusão segui a esmo...
Mas que
troca tem maior veracidade
do que
esta em que alma inteira pasma,
ao
contemplar-se no espelho da inverdade?
MORFOSSINTAXE
I – 08 jul 2007
A vida
para mim é paralaxe (*)
de
estrelas, pelo céu embriagadas,
que se
dispõem a saltar, atribuladas,
sobre a
Terra... na busca da sintaxe.
(*) Diferença aparente de localização.
Ao mesmo
tempo, é sombra de solstício; (*)
ponderada
não é: não deixa trégua.
Não se
demarca um sentimento a régua:
gasta-se
em prece e se redime em vício,
(*) Os dias mais curto e mais longos de
um ano.
na
constante precessão dos equinócios... (*)
Sempre
que assisto de Afrodite o trânsito, (+)
já me
emurchece um pouco desse Sol,
(*) Os dias de extensão igual que as
noites. (+) A passagem de Vênus.
que, às
vezes, recrudesce, mas seus ócios
logo
explodem em manchas, nesse âmbito
com que
se espelha a galáxia, em caracol...
MORFOSSINTAXE
II – 21 nov 2015
Porque,
no fundo, tudo está na grande síntese,
que em
cada humano perfaz o microcosmo,
daquela
teurgia de outro cosmo, (*)
que só a
imaginação consente pinte-se...
(*) Magia auxiliada pelos anjos.
E as
células dos deuses adoentados
se
cancerizam em tais cosmogonias,
se
metastizam em tais telegonias (*)
que
possam conceber os mais drogados
(*) Fecundações provocadas por mais de
um macho.
filhos
dolentes da papoula adormecida...
Pois
quando deuses morrem, morrem mundos,
rememorados
somente em pobres versos...
Assim,
talvez também, ao fim da vida,
quando
meus átomos dispersem-se profundos,
também se
extinguirão meus universos...
MORFOSSINTAXE
III
Por isso
apenas meus poemas distribuo:
para que
criem raízes noutras mentes,
almácegos
de sonhos mais potentes, (*)
quiçá
rancores originando amuo,
(*) Criadouros de mudinhas
nessa
falsa esperança que usufruo,
que a
vida é fruto de vagas inclementes,
mil
círculos concêntricos dolentes
para
manter imortal o amor que estuo...
Ai,
quanta melodia foi perdida
pela
memória de novas gerações,
todas
ansiando por dominar a vida!...
E como
posso então ter a certeza
de que
meus versos despertem emoções,
mesmo que
sejam cirandas de beleza?
MORFOSSINTAXE
IV
Sendo
filho de um Deus, também partilho
do meu
minúsculo teor de divindade,
causa
inicial de qualquer felicidade
que brote
solitária no meu trilho...
Como
filho de um Deus, os dentes rilho,
pela
certeza da transitoriedade;
muito em
breve serei cinzas sem maldade,
incapaz
de refletir o arcano brilho...
Mas
enquanto compartilho a criação,
compartilho
também da eternidade
e sou um
deus na frágua da emoção,
por mais
que saiba que a criação me é dada
e que no
campo da poética verdade
nada mais
sou que o portador da enxada!
ACENDALHAS 1 – 22 NOV 15
Eu bem queria que esta noite fria,
Me retornasse e suave me abraçasse;
Que se afastasse e em breve me deixasse
Essa agonia do calor do dia.
Eu desejava e, se pudesse, cumpriria,
Que o condenasse e pronto o executasse,
Que o sufocasse e logo o exterminasse:
Verão sem alma de que mormaço sumiria.
Assim vivera com mais satisfação,
Em temperatura mais amena e pura,
Para mim melhor amar sem mais torpor;
Mas sei que a expectativa é uma ilusão,
Que cada estio só me traz mais amargura,
Na ebulição da pele em seu ardor...
ACENDALHAS 2
Percebo a alma em gravetos transformada,
Que o Sol vem-me lançar para a fogueira;
Quebra-me os ramos da alma na fagueira
Entropia em dispersão desmesurada...
Não sei se o Sol quer água preparada
Para ferver seu próprio Mate, com certeira
Capacidade de me sugar a mente inteira,
Por uma bomba de ponta nacarada...
Até que ponto é o Sol daqui gaúcho?
Será apenas um opressor vindo do norte,
Com nacos de meu peito a encher o bucho?
Rebelde eu sou ante a fragosa inconveniência,
Mas anualmente ainda enfrento a amarga sorte,
Enquanto aguardo o meu outono com paciência...
ACENDALHAS 3
Queria ter só nalma o meu verão,
Que me aquecesse o espírito erradio,
Que me assoprasse qualquer verso vadio,
Na brisa morna de toda a inspiração;
Queria apenas o estio de uma emoção,
Feita de amor, sem calidez, nem frio,
Num ardor manso, úmido esse estio,
Por chuvas breves abrandado em sua paixão.
Porque ao vir de dentro esse calor,
Em mil versos gentis eu o sudaria,
Dessedentando mil almas de sedentes,
Mas jamais essa canícula e rancor,
Que inspiração tão só enfraqueceria,
Estiolando meus versos sob os ventos...
COLUMNEIA I – 23 NOV 15
Será que um dia me acharão tão importante
que esses milhares de rascunhos sem destino
serão achados por futuro peregrino
e retirados do pó tal qual diamante?
Será que essas promessas de um descante
serão examinadas com algum tino
por adulto ou adolescente ao Sol a pino
e decifradas num futuro bem distante...?
Será que alguém achará que valha a pena
todo esse esforço de descascar mortalha
e examinar o cadáver de meus versos?
Contemplarei o inesperado dessa cena
e meu fantasma, ao ver quanto se espalha
balançará da barba os fios dispersos...?
COLUMNÉIA II
A columneia, naturalmente, é uma flor,
mas já não foram comparados tantas vezes
os versos de poetas que assim peses
com simples flores de um canteiro multicor?
Que seja o meu jardim do mesmo ardor,
mesmo adubado por nojentas fezes;
(é necessário que descansem alguns meses,
antes que sejam puro adubo de valor.)
Pois afinal, mesmo do lodo brotam
as columneias que hoje e aqui redijo
e que os ares com perfumes dotam;
e por piores que sejam os sentimentos,
sempre um fulgor de estrela ainda alijo
em meu jardim forrado de excrementos...
COLUMNEIA III
Caso algum dia, em breve ou no futuro,
depois das cinzas serem dispersadas,
em picumã derradeiro derramadas,
brotos de flor se erigindo do monturo,
eu não farei a ninguém um esconjuro:
pois que remexam em minhas folhas já mofadas:
remisso eu fui, não foram publicadas,
vaidade inglória ou orgulho do obscuro.
Conforme disse, tão só observarei,
do valor do que escrevi ainda descrente,
que o apreciem me surpreenderei,
e tão somente minha barba cofiarei,
em meu espanto, sem sentir ânsia premente,
e ao me ver reconhecido, sorrirei...
BERLOQUES I – 24 NOV 15
FAZER QUARENTA POEMAS
NÃO É DAS COISAS MAIS FÁCEIS
POEMAS SOB ENCOMENDA
POEMAS DE CORES GRÁCEIS
POEMAS POSTOS À VENDA
ENFRENTAR QUARENTA TEMAS
NÃO É COISA MAIS DIFÍCIL
DERRAMAR EM CADA SENDA
CANÇÕES DE MATÉRIA FÍSSIL
QUE AFINAL NEM EU ENTENDA
MAS POLIR QUARENTA GEMAS
POEMAS FEITOS DE AURORA
TODOS BELOS REALMENTE
COMO FIZ TANTOS OUTRORA
É COISA BEM DIFERENTE!
BERLOQUES II
DE FATO A PRIMEIRA VEZ
EM QUE REALIZEI TAL FEITO
MUITOS ANOS NO PASSADO
TOMADO O PRIMEIRO JEITO
FUI POR MIM IMPRESSIONADO
CERTO ORGULHO EM MINHA TÊS
COMO POSSA TER ESCRITO
TANTA COISA DIFERENTE
SOMENTE POR ANDAR AFLITO
NUM SÓ DIA ALVINITENTE
MAS PENSO QUIÇÁ NÃO CRÊS
QUE DOBRASSE TAL FAÇANHA
É TUDO QUESTÃO DE TEMPO
NO CUMPRIR DE OBRA TAMANHA
TUDO O MAIS É CONTRATEMPO!
BERLOQUES III
NÃO SEI PORQUE A TOLICE
DESTA BOBA LOUVAMINHA
SEJAM OUTROS QUE SE ESPANTEM
COM SUA PRÓPRIA LADAINHA
DESSES VERSOS QUE ME CANTEM
NÃO É TÃO SÓ GABOLICE
VÁRIAS VEZES JÁ CUMPRI
AS LONGAS LISTAS DE VERSOS
QUE DEPOIS SEQUER EU LI
RUMAS DE RIMAS... CONVERSOS
MEUS TEMORES EM SOLSTÍCIOS
MEUS AMORES EM TERNURAS
MEUS SONHOS INQUIETAÇÕES
MEU FALO EM RIMAS IMPURAS
CONSPURCANDO CORAÇÕES!
MAÇÃS DE CERA I – 25 NOV 15
Não creio que pecado haja no sexo,
desde que seja inteiramente consensual,
entre adultos, sem desvio para o mal
do masoquismo ou sadismo ou falso nexo.
Na transmissão da raça é puro amplexo,
na semente trazida do ancestral,
na busca de um futuro perenal
deste presente transitório em seu reflexo.
É no instante que tudo o mais apaga
que dois se tornam por instante mais que amantes,
em seu trânsito do mar em caravelas,
nessa explosão que mente e corpo alaga,
nos mil contidos momentos delirantes,
quando sua carne se derrete na procela.
MAÇÃS DE CERA II
Já muitas vezes se disse que o primeiro
a demonstrar inteiramente o amor
foi Nosso Pai, o Deus Nosso Senhor,
que trouxe à luz o Universo por inteiro,
em seu Amor, no Canto mais fagueiro,
o mundo a fecundar com seu Sexor;
(se foi a Deusa, a Quem hoje dá-se honor,
foi fecundada em igual brilho seresteiro.)
Mesmo que Deus a Si Mesmo fecundasse,
toda a galáxia a criar de Sua Essência,
demonstraria em tal amor a Criação,
igual que o sexo que um dia nos legasse,
para podermos criar, breve potência,
seja na arte ou em qualquer fecundação.
MAÇÃS DE CERA III
Na alegoria do perdido Paraíso,
fruto provaram para o Bem e para o Mal;
durante séculos, arbitrário esse caudal:
maçãs pintaram, sem verdadeiro siso;
pois é certo que as macieiras a que viso,
gloriosos ramos do reino vegetal,
surgiram bem depois que, triunfal,
ao mundo subjugasse o humano riso.
Foi outro o fruto, mesmo em alegoria
e certamente foi tampouco a descoberta
do sexo. Filhos já tinham, cumprido o mandamento
e da infração o castigo é que se via
e o próprio Deus comentava em outro alerta:
que a eterna vida não devorem num momento!
SALVAS DE BARRO I – 26 NOV 15
Eu vou reunir a assembleia de meus sonhos,
para esmagar no almofariz de minhas quimeras;
sua polvadeira lançarei pelas esferas,
na formação dos cometas mais bisonhos...
Somente crio os arcabouços mais tristonhos,
em esculturas tão só feitas em cera:
qualquer calor a imperfeição lhes gera,
qualquer hesitação os faz medonhos...
E como é fácil permitir à complacência
baixar o nível dos sonhos na poesia!...
Qualquer efeito, por menor, nos assedia
à rima fraca e simples dar leniência,
enquanto a jóia que a luzir nos atraía
se torna opaca e sem luminescência!
SALVAS DE BARRO II
“Maçãs de ouro em salvas de prata” sugeria
salmista antigo, segundo as Escrituras;
metáforas a descrever palavras puras,
nas quais o acorde da harpa reluzia...
Quem sabe a alegoria lhe surgia
que o fruto paradisíaco das lonjuras
fosse a maçã… Talvez essas texturas
já mencionasse qualquer que nunca as via...
Mas se acaso ao Paraíso um dia fosse,
veria antes a fronde das figueiras
ou as gavinhas retorcidas das parreiras;
se Adão e Eva, após tomarem posse
do primal conhecer do Bem e Mal,
tangas fizeram... Foi com esse material!...
SALVAS DE BARRO III
Mas são de cera apenas minhas maçãs
e não de ouro, decerto por ser caro
e a salva a suportá-las em amparo
não tem da prata as breves luzes chãs;
salvas de barro não me refletem cãs, (*)
nessa ilusão de que conservo o raro
vigor altivo da mocidade e o faro
e não a barba atual em fios de lãs!...
(*) Cabelos brancos.
Destarte, eu te ofereço, em minha vaidade,
versos de cera, de sabor bizarro,
sobre salvas que moldei em argila e barro,
sem pretender-te um desrespeito, na verdade,
mas em minhas tristes dádivas hoje venho
oferecer-te o melhor pouco que ainda tenho...
MULTIMARES I – 27 NOV 15
É o poder a fonte da magia:
todos os seres e coisas têm poder
que de algum modo lhes passou a pertencer,
nada mais que transferência de energia,
na maior parte que do Sol fluía,
capturada assim por cada ser
e transmutada diariamente sem se ver
em movimento que natural nos parecia;
mas a magia apressa a transferência,
concentrando a energia em um momento,
o domínio do tempo a controlar,
mesmo do espaço transferindo sua potência,
em rapidez quase igual ao pensamento,
na subitaneidade do espantar...
MULTIMARES II
Existem vastos mares de energia,
completamente a percorrer todo o vazio.
Que linhas cruzam, qual será o fio
que lhes permite assim vogar em harmonia?
Em devaneios, muita vez eu cria
também poder controlar seu passadio,
magicamente moldar, em desafio,
um mundo inteiro em que o Belo reluzia!
Tentei, é certo, porém mago nunca fui:
sempre encarei com desconfiança tais arcanos
e nem sequer no zodíaco acredito;
mas ainda sinto a energia eu me flui
por entre os dedos, quando versos soberanos
lanço ao redor e em tal flutuar incito...
MULTIMARES III
Correm assim de meus dedos os regatos:
são mil palavras rasgadas da harmonia,
que a lira desde sempre a alma tangia,
quimeras transmutando nesses fatos;
vasto tropel de cantos e boatos,
boatos de ilusão em tropelia,
tropelia que no espaço reluzia,
formando mares, desnuda de recatos...
Meus multimares pela rede fluem:
alguns se afogam, outros neles nadam;
de quando em vez, comentários me refluem;
mas tal poder é energia que me rói,
sem que reservas iguais hoje me invadam,
voando o cérebro, enquanto a alma me dói!...
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