segunda-feira, 19 de março de 2018





SOMBRAS LONGAS & MAIS
WILLIAM LAGOS -- 18-25/12/2017

SOMBRAS LONGAS -- 18 DEZ 2017
SOMBRA MUTÁVEL -- 19 DEZ 2017
SOMBRA ENJAULADA -- 20 DEZ 17
CANTO DE CISNE -- 21 DEZ 17
LADRÕES DE SESTA -- 22 DEZ 2017
TECNOLOGIA -- 23 DEZ 2017
ATRÁS DA JANELA -- 24 DEZ 17
MAGIA DE NATAL -- 25 DEZ 2017

SOMBRAS LONGAS I -- 18 DEZ 2017

na púrpura almofada do poente,
quando a sombra se alonga e o escuro vem,
meu corpo ali se alongará também,
sobre tua sombra a se fazer presente.

essa tua sombra que me fora indiferente
será abraçada, em lento vaivém,
por essa sombra que de mim provém,
numa emboscada que mal se pressente.

porque verás tua sombra projetada,
sem ninguém mais encontrar-se do teu lado,
porém minha sombra se inclina de mansinho
e mesmo sendo por mágica alongada,
essa tua prenderá, bem apertado,
no surpreendente lusco-fusco do carinho.

SOMBRAS LONGAS II

hás de pensar: mas como isso acontece?
e minha sombra afastar num safanão,
mas muito firme é o abraço em que estarão,
sombra de amor qualquer sonho enobrece.

esse evento que a outrem enlouquece
subirá desde teus pés em invasão.
se for romântica tua imaginação
e aceitares o amor que se oferece.

talvez queiras então acariciar
essa sombra indolente qual gatinho
que parece quer apenas se esfregar,
mas que a alma te conquista de mansinho
e a única ração que podes dar
é uma tigela cheia de carinho.

SOMBRAS LONGAS III

será sinuosa sombra como cobra,
mas só de amor será o seu veneno,
a germinar em ti amor pequeno:
mais do que sombra é algo que me sobra.

e sobre a sombra insidiosa se redobra:
só bem de longe eu te farei aceno,
essa sobra de mim convite pleno,
e pouco a pouco tua própria sombra dobra.

como evitar uma tal curiosidade
quando essa sombra projetada por magia
só teu olhar de sombra atingiria
a sobra minha em tal complexidade:
talvez não deixes que a ti meu corpo abrace,
mas a sombra aceitarás que te perpasse.

SOMBRAS LONGAS IV

porque tua sombra se sentirá curiosa.
a se arrastar empós os pés que estão
da sombra minha fazendo a projeção,
sombra grosseira a dominar a sombra airosa.

e nessa varredura preguiçosa
de repente notarás não mais estão
as duas sombras na mesma posição,
mas se moveram; agapanto e rosa,

até se enovelarem a meus pés
e de tua sombra seguirás empós,
até encontrares quem a outra projetou,
tímida ainda, sem me dar-me as fés,
mas nesse instante nos acharemos sós,
e tua sombra escutará a quem te amou.

SOMBRA MUTÁVEL I -- 19 DEZ 2017

depois que te encontrar, vais-me pedir
um leão encantado e sem defesa
eu serei, contra a própria natureza,
o teu leão -- e saberei rugir.

quando eu me levantar, vais-me pedir
uma águia dourada em sua grandeza
e eu serei essa águia, com certeza:
sobre o telhado de tua casa irei dormir.

eu serei tudo quanto me pedires;
dito melhor, a quanto me forçares
em teu desejo ou por teu desespero.

eu serei tudo quanto permitires
e te darei todo o bem que precisares:
só não conseguirei ser o que quero...

SOMBRA MUTÁVEL II

quando eu te procurar, me pedirás
um tigre caçador, branco e vermelho
e eu serei esse tigre em meu conselho
e os demais tigres me farejarão.

assim serei, em transmogrificação,
um tigre-fera até meus dias de velho
e a ninguém mais deixarei meter bedelho
na minha vida, nem cortarem-me ilusão.

pois foi um erro desejarem-me felino
e me empurrarem além de meus limites,
todos exigem, ninguém nunca me dá nada

e se a vida me tiraram, já menino,
como tigre viverei, se assim me incites,
mostrando garras e presas na calçada.

SOMBRA MUTÁVEL III

por ti serei assim o que quiseres,
mas para descobrir, por meu desgosto,
que mesmo feito amor após o mosto,
para o que espero de ti em nada alteres.

por desfastio, talvez, o que fizeres,
será ser sombra mutável ao sol posto.
porém sombras são negras, não têm rosto
e embora tenhas de mim o quanto esperes

eu só terei de ti o que me deres,
a carne e a sombra irás me controlar,
lançar-me-ei como risco à tua vontade.

serei silhueta submissa a teus prazeres,
sem ter jamais certeza desse amar
poder de ti recolher em saciedade.

SOMBRA MUTÁVEL IV

ao projetar-me corri um grande risco,
sem saber o que tua sombra desejava,
como esse olhar de sombra contemplava
a sombra minha em parpadear e pisco.

e ao chegares, enfim, girado o disco,
enquanto a carne tua me abraçava,
era tua sombra somente que me amava
e a vida minha tomou-me como o fisco.

não foi minha carne que tua carne amou,
sendo minha sombra amada pela tua,
quando a carne enlaçou-me em zombaria,

porém minha carne para ti se transformou,
mil silhuetas a mostrar a sombra nua,
enquanto a alma inteira te servia.

SOMBRA ENJAULADA I -- 20 DEZ 17

o que me vem às mãos, assim escrevo.
passei anos me iludindo ser idônea
essa mulher que amava, essa begônia
de esplendor a que amar ainda devo.

confesso que eu errei nesse meu frevo
de agradá-la sempre, sua antimônia
intermitência entre mel e amônia,
promessa de um futuro, em que não levo

a menor parte.  garanti o seu conforto
a expensas de mim, que tudo pago
e ainda julga que me pode repreender;
por agradá-la da poesia fiz aborto
por longos anos, em troca de um afago
que seu capricho custava a conceder.

SOMBRA ENJAULADA II -- 20 DEZ 17

mas como pode ter sombra uma ilusão?
sobra intangível, sobra do corporal,
não tenho a força de um ente material,
sombra vazia do próprio coração.

quando minha sombra provocou essa paixão
na sombra dela e não nela, afinal,
que poderia se esperar do amor carnal,
somente sombra a compartir dessa emoção?

e por mais que o carnal se realizasse
quando juntos estivéssemos no leito,
nenhuma sombra existia nos lençóis.
em que apenas pele branca se mostrasse.
sem sombra negra em perpétuo ajeito,
feita afinal da interrupção dos sóis.

SOMBRA ENJAULADA III

assim a sombra é apenas testemunha,
abraçada a outra sombra no seu canto;
extinta a luz, não têm sequer o pranto,
triste consolo de quem mais se acabrunha.

no sonho meu talvez encontrem cunha
e ali se mostrem como negro manto,
sombra na sombra, num abraço santo,
logo perdido se o corpo se estremunha.

contudo, se me ergo, solitária,
ressurge a sombra que de mim provém,
mas ela ainda se abraça ao travesseiro
e sua sombra não se mostra solidária,
ainda sozinha esta sombra que me tem
por mãe e pai e também seu carcereiro.

SOMBRA ENJAULADA IV

e embora a sombra se projete afora,
contra a sola de meus pés acha grilhão
ou algemada na palma de minha mão
e jamais de seu presídio vai-se embora.

por liberdade algumas vezes chora,
quando estou longe da sombra de paixão,
a sombra dela a que deu seu coração
e dela aproximar-me então me implora.

mas no dia em que eu morrer, morre comigo;
eu poderei ascender sobre o jazigo,
mas não me consta que sombra tenha alma
e assim fica essa sombra acorrentada,
tão infeliz porque a fiz enamorada,
na tumba escura sem jamais encontrar calma.

CANTO DE CISNE I -- 21 DEZ 17

Quando eu morrer, pedirão do cisne o canto,
       meu pescoço estendido na fumaça
       de minha cremação, que assim retraça
o quanto me queimei sem molhar pranto.

Quando eu morrer, dirão que fui um santo.
       apesar da zombaria e da pirraça
       de que fui alvo, da mordida dessa traça,
qual é a humanidade em seu encanto...

Pois de cisne esse canto eu não terei:
       o que eu queria é ser igual a Zeus
e possuir Leda o quanto mais quisesse...

Sei que não posso; mas em versos eu direi
       o meu bom-dia, boa-tarde e meu adeus
a quantos nadas que a morte me trouxesse...

CANTO DE CISNE II

Quando eu morrer, só quero que me espalhem
       por sobre o mar ou sobre qualquer serra,
       que ninguém sobre meus ossos faça guerra
nem que meu pobre deeneá então retalhem...

Até mesmo em galinheiro não me falhem
       de distribuir.  Ou no esgoto de minha terra,
       que não se guarde a cinza que me encerra:
se vértebra sobrar, então que a malhem!...

Quer haja ou não qualquer ressurreição
       ser-me-á indiferente após a morte:
meu corpo é certo que não se erguerá,

mesmo da última trombeta em aclamação:
       só poderá conclamar para essa sorte
esse meu resto espiritual que sobrará!...

CANTO DE CISNE III

O que não quero é a queimação dos versos,
       tal qual fizeram com Camilo Rocha,
       pobre infeliz, consumido pela torcha
da "tísica", seus pulmões assim conversos.

Tudo queimaram, em tempos tão diversos,
       como a carne de ovelha que se escorcha
       a colocar no espeto em que se enforcha,
de seu pelego os músculos inversos...

Mal se sabia que a causa da doença
       se transmitia quase sempre pelo ar
e que os bacilos não viviam no papel;

e assim eu falo, sem querer causar ofensa:
       foi pior bacilo o infeliz que foi queimar
seus pobres versos num descarte de ouropel...

CANTO DE CISNE IV

É natural que não o afirme, porém penso,
       vendo as linhas a escorrer tão facilmente
       que a morte dele e de outros eu alente,
ao derramar na folha um verso tenso.

Queimaram os perdigotos de seu lenço,
       a que o sangue corrompera, mas realmente
       tuberculose não se faz sobrevivente
nas muitas laudas de conteúdo denso.

Talvez, quem sabe, voltejando pelo ar
       esses versos transformados em fumaça
só se acalmaram ao pousar em mim.

Ou de Lucena ou de Wayne, o seu lugar
       perdido sob o Sol ou em sombra escassa
em meus ouvidos achassem pouso, enfim...

CANTO DE CISNE V

Mas tudo isso não é mais que fantasia,
       como saber se os versos alma têm?
       Ou que, perdidos, encontrem-me, também
para pousar em quem os acolheria?...

Verdade sendo, não me surpreenderia:
       do inconsciente coletivo é que me vêm;
       se a alguém mais pertenceram é um porém;
se a ninguém mais, não me desapontaria...

Mas qual é o canto de cisne dos poetas?
       São os que vivem que o afirmam escutar,
nas finais frases de seu elaborar,

no compilar das obras incompletas...
       E assim me esforço, se tenho uma ocasião,
de a meus rascunhos enfim dar redação!...

CANTO DE CISNE VI

Não que acredite um dia alcançar fama,
       acadêmico me tornar ou ser nobel
       ou após a morte, enfim, darem quartel
para meus versos de incontável gama.

Eu só desejo é que a alma que os reclama
       possa das linhas lamber favo de mel,
       cada soneto reluzindo no burel
de um monge puro que seu valor proclama.

Não para si, mas para distribuir
       gratuitamente, pois foi dom gratuito,
quer pintado de ouro, quer de tisne

e que no próprio coração possa sentir
       uma esperança ou consolo mais fortuito
que eu te entoar qualquer canto de cisne...

LADRÕES DE SESTA I -- 22 DEZ 2017

Quando ao crepúsculos, em límpido letargo,
       as sombras descem em sua pura languidez,
       do que se fez e de quanto não se fez
chega a memória como atroz embargo.

Recordar o passado é duro encargo,
       melancolia cortante em seu jaez,
       a modorra a perturbar-nos por sua vez,
os sonhos maus chegando a passo largo.

Numa tocaia à espreita, em emboscada,
       escondida no bochorno da modorra,
quando o calor não nos permite nada.

E esses duendes do passado se alimentam
       e nos agarram por mais que a gente corra
e novamente a nos sugar o sonho intentam...

LADRÕES DE SESTA II

O que a gente preferia é um sonho erótico:
       mesmo os parceiros sendo evanescentes,
       no devaneio sempre estarão presentes,
do imaginar em seu poder despótico...

Já o sonho do sono é estrambótico,
       de nós zomba nos instantes mais prementes;
       algo nos faz despertar semi-inconscientes,
só um fantasma ainda habitando o nervo ótico...

Mas é tão raro conseguir-se retomar
       ao sonho bom depois que se findou;
retorna o sono, mas sem ser o sono REM

ou então outra quimera a nos brindar,
       bem diferente da que se procurou,
em nova traça a zombar de nós também...

LADRÕES DE SESTA III

Porém na sesta algum controle existe,
       são imagens a correr em devaneio,
       talvez do livro que inda há pouco eu leio,
talvez de um abantesma que se inquiste...

Mas é possível causar o seu despiste,
       outro fantasma a buscar em nosso seio,
       até um mais forte surgir-nos de permeio,
a quem nossa defesa não resiste...

É nesse instante que nos vem o sonho mau,
       uma lembrança de qualquer humilhação,
algum lamento pelo que nunca se fez...

E nos desperta qual golpe de um pau,
       nesse delírio de conturbação,
clara deixando a lembrança de sua grês...

LADRÕES DE SESTA IV

Pois mesmo quando vai depressa embora,
       deixa em nós suas garras e gavinhas:
       perdes o sono que anteriormente tinhas,
por mais que a languidez em ti se ancora...

Mas a canícula ainda forte lá fora,
       ali ficas repetindo as ladainhas,
       ou contando carneirinhos, longas linhas
mais de churrasco que da lã de outrora...

E nessas tardes quentes do verão
       é bem mais fácil conservar a percepção
do rebanho das gotas de suor,

a escorrer em lenta perspiração,
       lançada a sesta a qualquer outro rincão,
mesmo que o corpo esteja sem vigor...

TECNOLOGIA I -- 23 DEZ 2017

Com a impressora solidifico o medo
e assim posso guardá-lo em prateleira;
não mais me assalta em hora passageira,
posso afastá-lo com a pressão de um dedo.

Afinal, se a digital guarda um segredo
e hoje até para eleição se a quer inteira.
deve ser muito mais forte que se queira
e com leve pressão ao medo enredo...

Nos maranhos dos laços das papilas,
posso esse medo manter a meu alcance
e submetê-lo com pequeno toque...

E meus temores de 3D em longas filas
contemplarei sem que o olhar se canse,
até podendo-lhes fazer algum retoque...

TECNOLOGIA II

Pois comprarei uma impressora de 3D,
depois mandar escanear meu coração
e num átimo imprimir à perfeição
o meu amor, que no peito não se vê...

Pois certamente haverá algum portão
para acessar qualquer espaço em que se dê
dos abstratos a presença e que se lê
para enfim viralizar essa emoção...

Porque, afinal, é uma questão de fé
a existência do amor e da saudade.
Quem guardar pode em sua mão felicidade?

Onde a inveja possui de fato a sé?
Será possível trolar toda a vaidade
que impura paira sobre a sociedade?

TECNOLOGIA III

Se nossa fé é a crença no impossível,
será que posso digitar um santo
a quem já enviei preces e pranto?
E que aspecto teria, se possível?

Não esse gesso fabricado em inexaurível
artesanato que se acha em cada canto.
Seria um vulto recoberto por um manto,
pela 3D tornado agora bem tangível?

Naturalmente são fac-símile as imagens,
concretizadas por lêiser e impressora,
mas quem sabe surgirá qualquer magia

que as interligue com essas paragens
das emoções internas de quem chora
por ter somente tal tecnologia...

TECNOLOGIA IV

O problema é que depressa irá surgir
(Sempre aparece algum espertalhão),
um hacker digital e charlatão,
algum pobre coração sempre a iludir...

E as emoções que poderíamos assistir
concretizadas em científica noção
as verdadeiras nossas não serão,
porém de outras roubadas ao dormir...

De tal modo na impressora confiarei
que conserve bem segura no escritório
para só nela concretizar a minha paixão...

E numa caixa de bom-bons a enviarei,
seu invólucro de seda só ilusório,
falha deixando em meu próprio coração...

ATRÁS DA JANELA I -- 24 DEZ 17

O celular é uma porta para o mundo
e tantas coisas permite realizar;
aos solitários promete acompanhar
caso saibam controlar seu dom fecundo.

Mas o que vejo e me faz mesmo iracundo
é que as pessoas se permitem dominar;
muita gente já se deixou atropelar,
olhos grudados nesse painel rotundo.

Pois não olham sequer por onde vão,
facilmente deixando-se assaltar,
sem conversar nas rodas dos amigos.

E roubado o celular... que maldição!
Já coisa alguma conseguem realizar,
sem suas redes sociais de mil perigos.

ATRÁS DA JANELA II

Sua agressividade pensam garantida,
mesmo que mostrem qualquer fotografia,
imagem falsa que se colocaria,
já retocada a face antes possuída...

Tornou-se um vício a que se dá guarida,
uma artimanha em que a gente consentia,
que sem teclar viver não mais podia,
para seu tablet a alma já vendida...

Um meio-ambiente realmente endemoniado,
hoje o domínio de mil espertalhões
dados roubando dos mil inadvertidos

e que permite a qualquer um ser enganado,
como nunca as anteriores gerações,
facilmente a seu prejuízo seduzidos...

ATRÁS DA JANELA III

Porque, de fato, ninguém sabe realmente
quem a espia por detrás dessa janela,
um impostor se passando por donzela
e as tuas contas invadindo facilmente.

Essa mania tornou-se tão premente
pela ambição comercial oculta nela;
cada mensagem transmitida pela tela
causa despesa ao povo indiferente,

que a maior parte do tempo não precisa
desse intercâmbio, que deveria ser útil,
mas que de fato serve ao povo escravizar.

E os satélites congestiona na imprecisa
repetição de tanta coisa fútil,
sem coisa alguma, na verdade, melhorar.

ATRÁS DA JANELA IV

Sei muito bem estar sendo impopular,
mas bem podia haver racionamento;
só as mensagens de maior merecimento
deveriam transitar por celular.

À medicina e à segurança dedicar
o que fosse necessário no momento,
nas emergências o necessário assento
ou alguma forma de informações buscar.

Não um veículo para se fofoquear
ou para vigarices se empregar,
algum limite de mensagens, diariamente,

que se pudessem os negócios completar,
mas a vida a viver de anteriormente,
em que aos amigos se iria visitar...

ATRÁS DA JANELA V

Não sou contrário à comunicação,
o que me assombra é esse desperdício,
o que me abala é ver tornado em vício
o que criaram para nossa diversão.

E que serve hoje para a separação,
e que provoca, de fato, um malefício,
sem ser cumprido seu verdadeiro ofício
de à vida humana apenas confortar.

Foi transformada em banalização
essa janela, que realmente te limita,
levando a vida mais como um empréstimo,

sem buscares novos meios de atuação,
uma leitura ou um esporte que te incita
a retomar de cada dia o inteiro préstimo.

ATRÁS DA JANELA VI

Nisto que falo me mantenho coerente,
pois até hoje não comprei um celular,
por propaganda não me deixo manobrar,
procuro sempre controlar o meu presente.

E se comprasse algum desses, finalmente,
não deixaria esse deusinho me assombrar,
só o ligaria quando fosse precisar,
seria de fato o meu servo onipotente.

Mas até hoje não vi tal necessidade,
ainda prefiro até um banco caminhar,
fazer minhas compras e as contas a pagar,

pessoalmente, com plena liberdade,
sem ser exposto assim a uma artimanha,
ou ser roubado por alguém que me acompanha!

Magia de Natal 1 -- 25 Dez 2017

No mundo, antigamente, havia magia.
Era possível aos deuses invocar
Os aos demônios poder ameaçar,
Mediante o poder mágico que havia.

Com preces, sacrifício ou homilia
Se poderia aos deuses propiciar
Ou mediante talismãs se dominar
Um mau espírito que mal fazer queria.

Nem todos tinham, é claro, tal poder.
Eram os magos e também as feiticeiras
Que com demônios até mesmo consorciavam

E por meio de ritual, dor ou prazer,
Submetiam as criaturas sobranceiras
Que à sua própria vontade se curvavam.

Magia do Natal 2

Com uma vassoura facilmente se voava,
Dava uma bola de cristal longa visão,
Porvir e antanho se manifestarão,
Em búzio e cartas vaticínio se encontrava.

Mediante uma boneca por Vodu matava,
com Abre-te Sésamo cruzava-se portão,
Lâmpada Mágica ou por límpida poção,
Filtro de Amor perfeito se alcançava.

E havia Fadas e Faunos na paisagem,
Quaisquer maléficos, outros benevolentes,
Não nos feriam, a alma sendo pura;

Mesmo gigantes canibais de má visagem
Seriam banidos pelo poder dos crentes;
Ver uma Ninfa ou um Elfo se procura...

Magia do Natal 3

Era outro mundo, bem diverso deste agora.
Talvez houvesse menos segurança.
Ventos sopravam de Éolo na dança
Hélios brilhava para nós no outrora...

Num aeroplano hoje chegamos sem demora.
A eletricidade a toda casa alcança:
Luz, micro-ondas, água quente avança
E a geladeira funciona a qualquer hora...

Mas que magia existe nesses fatos?
E nem paramos no milagre a refletir,
Eletricidade, de fato, não se entende.

Mas há certeza ao se ligar esses contatos;
Faz-se monótono o computador a reluzir,
Um automóvel dirigir fácil se aprende.

Magia do Natal 4

Mas qual a graça da tecnologia?
Por imprevisto, nos cortam a água ou a luz,
Mas logo voltam, passada a breve cruz:
Perdeu-se o mágico que antes existia...

Já ninguém pensa que a fotografia
Ou o cinema ou um vídeo que seduz
Ou a gravação que à voz de um morto nos conduz
São maravilhas a nos compor o dia-a-dia.

Ninguém se espanta com o retrato dos avós
Nem com a reprodução de sinfonia,
Pavarotti a gente escuta em um Cedê.

Com celulares nunca ficamos sós,
Sem nem notar a ciência que trazia.
Coisas comuns -- se conhece e não se crê.

Magia do Natal 5

Hoje domina o Deus Civilização,
Pela Deusa Ciência acompanhado
E no intermédio, ainda atribulado
Permanece o nosso humano coração.

Mas à ciência ainda faz competição
Essa busca constante do sagrado:
Que a Santa Virgem perdoa o teu pecado,
Que qualquer santo atenda a tua oração.

Porque na falta dos deuses ou magia
Nada no mundo podemos controlar,
Que a Energia, de fato, nos sujeita,

Mas cada vez que algo a interromper,
Para algum santo é inútil apelar,
Como os antigos faziam em cada feita...

Magia de Natal 6

Com franqueza, até a gente preferia
Poder anjos ou demônios controlar,
Nossas ordens obrigados a aceitar,
Por um poder que a nós somente pertencia...

Dois mil anos atrás, nos explodia
Supernova que se pôde observar;
Três Magos se animaram a jornadear,
Para os Pastores só uma gruta os atraía...

Hoje o Natal é uma festa comercial,
Dedicada a esse bom Papai Noel:
Descrendo dele, quanto em Deus perdeu a Fé?

Que perdurasse essa Magia do Natal!
Para as crianças... Mas que esse pão-de-mel
A vida inteira se saboreasse até!...

William Lagos
Tradutor e Poeta – lhwltg@alternet.com.br
Blog:
www.wltradutorepoeta.blogspot.com
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