A RAINHA DO MAR
IX
E o mais velho,
temendo o seu trespasse,
Levou a jovem
para seu próprio lar,
Pedindo à
esposa que então dela cuidasse...
Esforçou-se a boa mulher para a curar
E muito em breve, a saúde recobrou:
Mas sem cabelos e sem nada enxergar!...
Porém toda a
sua história ela contou
E na cidade, já
cheia de boatos,
Depressa o povo
nela acreditou!...
Mas encarando com cuidado os fatos,
Não se atreveu a mulher do pescador,
Meio por medo e meio por recatos
A levar a pobre
ao castelo do senhor:
“Nosso rei já
marcou seu casamento
Com a tal
donzela feia que é um horror!
“Para nós, pobres, o melhor procedimento
É ir à igreja, para uma graça suplicar!”
E decidiram ir à missa em tal momento...
E quando Inês se
aproximou daquele altar,
Em cuja santa suas
feições reconhecera
O seu irmão,
ajoelhou-se a suplicar...
A congregação reunida percebera
Que a pobre cega queria ver de novo!
E muita gente por ela intercedera...
Então ali, em frente a
todo o povo,
Duas cascas caíram de
seus olhos,
A sua visão retornando
num renovo!
As suas lágrimas carregando como espólios
Essas feridas que lhe fizera a feiticeira,
Desprendendo-as, qual se fossem dois antolhos!
Foi comentada a
notícia alvissareira
Por praça e
rua, em toda a capital,
Até o palácio
chegando, derradeira!
Quis o Conselho ver o milagre, é natural
E a bela Inês ao palácio convocaram,
Pobremente vestida, porém sem qualquer mal!
Nesses três
meses, seus cabelos encompridaram,
A cabeleira já
batia em seu pescoço,
Madeixas louras
que a todos deslumbraram!
Ao rei chamaram, com grande alvoroço,
Que reconheceu a imagem do retrato,
Com seu rosto perfeito e o rosto moço!...
Esclareceu-se
logo o estranho fato
E o rei mandou
prender a impostora,
A Inês mandando
vestir com mais recato...
A RAINHA DO MAR
X
E aconteceu que
a feiticeira aliciadora
Foi ao chegar
logo reconhecida,
Antes de ser da
tempestade a condutora...
Foi a bruxa algemada e conduzida
À presença do rei, negando a filha:
“Nunca vi uma tal feiura na minha vida!...”
Furiosa porque
a mãe não a perfilha,
A falsa Inês
tudo contou na acareação,
Uma à outra
jogando na armadilha!...
Logo a seguir, chegou a embarcação,
Trazendo ilesa de Dona Inês a parentela:
Reconheceram-se, cheios de emoção!...
“Faça-se o
mesmo que foi feito a ela!”
Decretou o rei,
entre furioso e aliviado
Por ter agora
esposa assim tão bela!...
E cada um dos dois caixões foi atirado
Desse penhasco de que caíra Inês,
Mas nos rochedos sendo espatifado!
Contra as malvadas
justiça assim se fez
E logo após foi
celebrado o casamento,
O povo inteiro feliz
por tais mercês!...
Pois o Arcebispo não pôs impedimento,
Já que os proclamas antes anunciados
Eram os de Inês e tudo achou a contento!...
Os seus cabelos já
longos e penteados,
Com um vestido de
pérolas bordado,
Sapatinhos de camurça
e fios dourados!
Nenhum casamento tão belo celebrado,
Nem antes, nem depois, naquela terra,
Nem outro par igualmente apaixonado!...
Um dos irmãos
voltou para sua serra
Para na granja
continuar a trabalhar,
Como os avós,
cujos ossos ela encerra,
Porém os outros preferiram se casar
Com moças da nobreza e se alistaram
Na marinha ou no exército, para lutar
Pelo reino,
quando inimigos ali chegaram,
Todos sendo
facilmente derrotados
E de atacar
finalmente se cansaram...
Dom João e Inês continuando enamorados,
Diversos filhos trazendo à dinastia,
Todos rapazes muito bem apessoados...
Anos passados,
o povo ainda dizia,
Como sendo a
maior realidade,
Que Inês da
santa de algum modo descendia!
EPÍLOGO
Recompensados
os dois bons pescadores,
Deram títulos
de nobreza aos doze irmãos,
Porém seu pai a
tudo recusou
E para a velha
granja retornou...
A linda história
ficou anos a contar
O povo inteiro,
à luz de seus fogões
E recordando as
peripécias que passou,
Sempre a
chamavam os muitos narradores
Como “A Rainha
que Saiu do Mar”!...
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