DEGRADAÇÃO E
MAIS – 3 a 12 Ago 2017
Novas Séries de
William Lagos
DEGRADAÇÃO I -- 1980
Amor um dia, em gesto cintilante,
Eu te entreguei, qual áureo recipiente,
De seiva estuante e de esplendor frequente:
Estrela matutina e chamejante.
Meses depois, pediste casuarinas,
Para expor em tua sala à luz mortiça;
E ao deixar de ser bela, quebradiça,
Acinzentou-se em ramas peregrinas...
Não resistindo à geada matutina,
Furtada a estrela pela ventania,
Viçoso fora nosso amor outrora,
Tornou-se cinza, tal que a casuarina:
E como a casuarina, veio um dia
Em que tiveste de lançá-lo fora.
DEGRADAÇÃO II – 3 AGO 2017
Amor também aos poucos se acinzenta,
Vêm bactérias de degradação:
Ciúme, orgulho, talvez nova atração
Possibilidades diversas te apresenta.
Conservar talvez amor a gente tenta
Como uma flor que se guarda em ocasião
Entre as páginas de um livro, em condição
De suas cores conservar tal qual se assenta...
Anos depois, quando a página é aberta,
A flor de antanho meio que esquecida,
Abrem-se as páginas do álbum improvisado.
A adormecida flor então desperta,
Mas cada cor se tornou esmaecida,
Só o arcabouço no livro conservado...
DEGRADAÇÃO III
Assim melhor é manter amor regado,
Com insistência e sem consternação,
Mesmo tediosa sendo essa missão,
Talvez retorne só por ser acarinhado...
Mas o amor que se julga resguardado
Como um poema de antiga devoção,
Vai ressecando, perdida sua atração,
Somente sobra um arcabouço acinzentado.
A casuarina, mesmo seca, ainda sussurra
Quando em seu vaso perpassa alguma brisa;
Amor, porém, guardado em álbum, não murmura,
Que a capa contra a capa amor empurra,
Restando apenas uma lembrança lisa,
Por mais que antes tivesse sido pura.
BRUMA I - 22 set '78
Foi numa noite antiga de neblina,
Enquanto o amor recente se escoava,
Galgávamos os dois verde colina
Que da ilusão o espanto revelava.
E como a carne desejar queria
Mais carne ser que sonho e inspiração,
Transpondo audaz as vestes que me abria,
Sua tenra carne eu lhe afaguei com a mão.
E quando o orgasmo lhe causei num beijo,
Não busquei contentar o meu desejo,
Nem possuir seu abraço de um momento;
Mas bastou-me o perfume: e, em vão deleite,
Lambi meus dedos líquidos de azeite
E à névoa apenas… foi o som de meu lamento!...
BRUMA II – 4 AGO 2017
Ela aceitou minhas carícias como um preito
À flor carmim da feminilidade,
A esse assomo de prazer tendo direito,
Sem ter partilha de responsabilidade.
Amor, entanto, partilhou desse conceito,
Nada esperando em troca, na verdade,
Deu-lhe prazer em “ato jurídico perfeito”,
Furtivo o amor, mais furtiva a castidade...
Por um momento, seus olhos rebrilharam
Ao ver o néctar da consumação
Sendo na bruma sorvido e deslumbrado
E lá no fundo então se consagraram
As fibras rubras de seu coração,
Mais que semente lhe houvera derramado.
BRUMA III
Muitos anos, depois disso, já passaram
E as fibras carmesim dessa emoção
Ano após ano de novo rebrotaram,
Raízes fundas dentro ao coração.
Seus braços noutras noites me enlaçaram
E em surpreendente firmeza, desde então,
Mútuo prazer, enfim, compartilharam,
Muito mais que seu perfume da ocasião.
As décadas dissolvem-se na bruma,
Mas a lembrança na alma não dormiu,
Sem que esse amor em nada se consuma
E de meus dedos o líquido sabor
Tantos milhares de versos seduziu,
Nessa tormenta de azeitonado ardor.
FAIRYDOM – April
24, 2006
To each man comes
the transcendence
His heart
seeks... For a long, long while,
It was religion...
But then the wile
Swayed to the past,
to the essence
Of mythology, and
then to love,
Love requited, as
much as love forlorn,
Then to the
science, wet, newly-born,
Then the crowds
politics would move.
Then emotion
rebelled, and thence
Was brought forth
New Age; and been
The Goddess to
worship, the stars to query.
Yes, to every man
the transcendence
He seeks...
To me, such would be the fairy,
Whom until now I
have never seen.
AMEAÇA I – 13 abril 2006
Nós vacilamos todos, no
mesmo e antigo fio,
Pendulados e inermes, no
estranho desafio
Que a carne faz à
mente; e a mente consagrada
Perfaz de redolente, em
gestos de rocio...
Cristais nós somos
todos, de geadas e de gelo,
Nos prados esparzidos,
no mesmo e ideal desvelo
De ver-nos espalhados na
relva entrecortada,
No mesmo derreter dos
sonhos em degelo...
Bafio singular...
perfumes maculados,
Pelo mesmo oscilar,
fecundo de pecados,
Da espada ao som do fio
atroz de um sentimento.
Bafejo apenas somos, na
aurora condensados
E, em silvo de metal,
nos vemos perturbados
E feitos qual o sopro
que aciona este instrumento.
AMEAÇA II – 5 AGOSTO 2017
E SE NÃO FOSSE
ASSIM? Se fôssemos perfeitos,
Se a dor e enfermidade
não fôssemos sujeitos
E nem sequer da morte
tivéssemos noção,
Das emoções teríamos
idênticos conceitos?
E SE NÃO FOSSE
ASSIM? Se como os vegetais,
Sem ter noção de tempo,
estátuas minerais,
De um dia após o outro,
em simples ilusão
A vida nos formasse como
luzes siderais?
E SE NÃO FOSSE
ASSIM? Será que o próprio amor,
Na ausência de tristeza,
sem partilhar da dor,
Teria entre os humanos
surgido alguma vez?
Se a pura indiferença, completa
de impudor,
Apenas racional carne e
mente em seu pendor
Teríamos concebido os
sonhos em que crês?
AMEAÇA III
É a própria convicção da
transitoriedade,
Da condição de brisa
perdida em tempestade,
Que logo adquirimos,
desde a primeira infância
Que nos faz conceber a
quimera da bondade.
O quebradiço ser da
cristalinidade,
O Sol a presidir e
provocar mortalidade
Enquanto à vida seu
calor convoca em ânsia,
Cubos que somos de gelo
e frialdade...
O QUE SERIA DE NÓS, se
fôssemos constantes,
Joguete sendo apenas de
racionais instantes,
Sem sentir empatia ou
sombra de piedade?
O QUE SERIA DE NÓS, por
egoísmo dominantes,
Em gélida assembleia de
ideológicos orantes,
Irresponsáveis na vida e
perante a eternidade?
ENGENHEIROS I – 25 abr 2006
Se todo mundo dissesse só o que
pensa,
Não haveriam leitos que chegassem,
Nem túmulos também que nos bastassem
Para os mortos nascidos desta ofensa.
Mas em dizer tão só o que a boca
pensa,
Os nossos números seguem aumentando
Destarte a cova à sepultura se ajuntando,
A terra recobrindo de uma densa
Camada destes mortos sem história,
Que mal provaram, desta vida
inglória,
O amor que se destila em mel e vinho.
Assim, melhor seria cavarmos da
ilusão
A cova rasa e meiga, em sonho
pequeninho,
Do que legar à terra inteiro o
coração.
ENGENHEIROS II – 6 AGO 17
O mundo construímos tão só em
fraternidade,
Não se erguem prefeituras sem
colaboração,
Grilhões que sejam conduzindo à
escravidão,
Erguer poucos conseguem na
individualidade.
De uma forma ou outra a engenhosidade
É fruto puro e simples da
civilização,
Fecunda e original seja a teorização,
Sem seguidores jamais se erige uma
cidade.
E desse modo todos nos tornamos
engenheiros;
Operários aos milhares é que erguem
catedrais,
Não abrem alicerces arquitetos sem
pedreiros
E se falássemos todos em idêntica
Babel,
Sem ter submissão a leis feitas por
demais,
Sequer se aprenderia a fabricar
papel...
ENGENHEIROS III
Não obstante, de algum modo se daria
Ao solo pelo menos qualquer
fertilidade,
Largados sobre a terra, sementes de
umidade,
Para o húmus da terra a final
engenharia.
Hoje furtamos ao solo o mineral que
nos nutria;
As necrópoles competem com a
arabilidade,
Os corpos a engavetar nessa
horizontalidade,
Perplexa a natureza ao desperdício
que se cria.
Tudo pensado, porém, talvez não se
ergueria
Qualquer cidade ao mundo sem marcos
funerários,
Dos seres que perdemos um ponto de
lembrança
E em tendas ou choupanas talvez a
gente viveria,
Sem qualquer desenvolver de ideais
humanitários,
Sem mais que o desgastar diuturno da
esperança.
DESVARIO I – 7 AGO 2017
O sono é um fio de seda
multicor
que nos conduz ao paraíso
onírico,
cada paisagem a lembrar
um sonho etílico,
a mente inteira em
psicodélico esplendor.
Com um anzol recolho o
meu ardor
e o manuseio em seu
pendor satírico,
a vida sangra em seu
sonhar umbílico,
que me estrangula qual
jiboia constritor.
Será nos sonhos que de
fato vives?
Ou essas horas de tédio e
zombaria,
na sucessão de vagos
dissabores
tu mesma os cries e a
seguir atives,
pesadelos masoquistas de
agonia,
nada mais que peripécias
multicores?
DESVARIO II
Assim vivemos o controlado desvario;
diz-nos alguém que sonho é alucinação,
mas nosso dia coletivo é a invenção
dos ancestrais, em pegajoso fio,
de que cada geração renova o cio,
dele manchado cada nova geração;
vivem em nós os que não mais estão,
o mundo inteiro forjado por seu brio
a cada década mais sofisticado,
pois quem nos diz que, em tempos do passado,
não fosse realmente a Terra plana?
Mas alterado o inconsciente coletivo,
a pouco e pouco rebelde e mais ativo,
à curvatura do orbe nos conclama!...
DESVARIO III
Será que a célula existia
realmente
antes que Hooke a
revelasse numa lente,
ou era o corpo um todo
permanente
e a celulose vegetal
inexistente?
Será que tempo houve no
passado
em que a bactéria e o
vírus malfadado
não existissem e só a
culpa do pecado
cada moléstia nos tivesse
desatado?
Foram há pouco
descobertos os fractais...
Será que antes existiam,
realmente
ou hoje os criamos,
coletivamente?
Hoje perturbas os espaços
siderais
e achas possível perfurar
o véu
de esferas sólidas de um
mais antigo céu!
DEVANEIO I – 8 ago 17
do tempo em dança na
quina da navalha,
macia e tenra como
pétala de rosa,
na precessão de cada
hora buliçosa,
na inquietação que o
coração entalha,
nos equinócios contemplo
minha batalha
e nos solstícios a vida
perigosa;
cada manhã é alguma
nuvem preguiçosa,
cada crepúsculo o longo
dia retalha;
guardo suas cores antes
que ressequem
nas horas cinza que
nelas se intrometem,
os minutos a luz que a
vida ingratam
e nesses flocos
derradeiros que arrebatam,
perdido o mundo pelo
gume de sua margem,
tal qual a última negaça
de uma virgem.
DEVANEIO II
guardo esses flocos de
luz em minha mochila
e noutro bolso a luz crepuscular,
cinzas de noite em
semente singular,
poeira de estrela
trancada em negra fila;
de minha própria derme
eu faço a esquila,
gotas de pó meu suor a
ressecar;
visto essa luz que
consegui guardar:
os mil retalhos de um
crepúsculo de argila;
já tantas vezes
devanearam ao por-do-sol,
porém meus olhos não
pranteiam o dia morto:
nenhuma missa eu
mandarei rezar,
pois tomo a luz no
apogeu de seu farol,
quando em meus olhos,
num piscar, eu corto
a mortalha e a camisola
do luar.
DEVANEIO III
o que é a vida senão o
pontilhar
de noite e dia, em
sucessão veloz!
uma foice corta o sol
como um algoz,
meia laranja os montes a
ocultar;
mil vagalumes nos ares a
passear,
cricrilam grilos com
insistente voz,
contudo os corvos não
crocitam sós,
que a solidão puderam
sempre devorar
e em cada passo galgo
escada de capim,
pedra que outra a se
aflorar ali;
os fogos-fátuos tomo nos
meus dentes,
marchando em frente com
sua luz em mim,
no rosto bate o vento
que não vi,
na alma a vaga emoção
dos impacientes.
Entrega 1 – 1979
Queria desnudar-me a sós contigo
Da roupa toda, menos do boné,
Desde o calçado que recobre o pé,
Até o bigode, de meu lábio abrigo.
Queria desnudar-me, sem demora,
Desta vaidade boba e tão mesquinha,
Da ânsia de ofuscar, da comezinha
Vontade de ficar, sem ir embora.
Ao desnudar-me todo, por inteiro,
Nesse compasso morno e derradeiro,
Que me forjou por vida um desatino;
E, por modéstia, enverga finalmente,
Ao revestir-se de esplendor frequente,
Um travo de amargor no meu destino.
Entrega 2 – 9 ago 17
Passados tantos anos, desnudei-me,
Mas os bonés conservo na cabeça;
Por retirá-los é preciso que padeça
De uma aflição de que nunca permeei-me.
Foi só na praia que de boné banhei-me,
Mas é preciso que jamais se esqueça
Que uma touca de banho o crânio meça
Nesses chuveiros sob os quais postei-me.
Sem o boné me escapam as ideias,
Igual que o boto tenho um orifício
No cocuruto como respiradouro
E assim conservo minhas epopeias,
Sejam de bem ou para malefício,
Por minha glória ou para meu desdouro.
Entrega 3
A tampa do tesouro é a cobertura
Pois não permite que meus sonhos voem;
Só pelos dedos é preciso que me escoem,
Quer horror causem, quer delícia pura.
E nesses versos da nudez mais dura
Deixo que os sonhos mansamente soem
E os travos de amargor não mais me doem,
Das mãos só pinga o sangue da doçura.
Não desejo que desnudo me observes;
Já fui robusto, mas jamais atleta,
Embora guarde até hoje a energia.
Só gostaria que meus versos nus conserves
Em minha prenhez de prestimoso esteta,
Se alguns apenas trouxeram-te harmonia.
Entrega 4
Completa assim minha própria zombaria,
Talvez mofada de um pouquinho de esperança,
Até o ponto mais verde dessa dança,
No destemor das fragas da ironia,
Algo mais sério quiçá te afirmaria,
Não do boné a usar desde criança,
Nem do sarcasmo agrilhoado em trança,
Porém dessa nudez que alcançaria.
Quase ninguém, de fato, se desnuda
Dessa mortalha chamada pretensão,
Desses deveres que impõe a convenção,
Mas é preciso, ao menos, que me iluda
De um certo módico de autenticidade
Que outros costumam crismar de liberdade.
Entrega 5
Pois liberdade é coisa tão singela
Que a maioria procura e nunca acha;
Qualquer complexidade ali se enfaixa
Mesmo naqueles que mais julgam tê-la,
Tal qual nudez de fome paralela,
Meio de orgulho ou vergonha que rebaixa,
Nos males de Pandora em que se encaixa,
Caçada essa esperança sem retê-la,
Que logo após, acabou por libertar-se
E o próprio mal pelo orbe distribuiu,
A nos cortar inteira a liberdade,
Que da esperança não é possível desfazer-se
E insatisfeita, constante nos traiu,
Sempre acenando com dourada falsidade.
Sufragâneo 1 – 1979 (bispo
ainda não sagrado,
em verso eleito de santos oxímoros).
Quebrada a luz, o som todo apagado,
De um vento escuro, azul, quase abandono,
De chuva verde e seca, aqui ressono
Meu palpitar de sangue, em coagulado,
Aberto coração, flor insincera,
Centelha fria, orgasmo delicado,
Lava desfeita, em pranto deliciado
Pela própria razão dessa quimera.
E eu fico cego, apenas por momentos,
Pois logo eu vejo, ouvidos mui
atentos,
Como a luz se incendeia na cratera
Da órbita vaga e plena desse
instante,
Pois só concebe o verso palpitante
Quem vê na sombra a luz da primavera.
Sufragâneo
2 –10 agosto 2017
Eleito
o sonho por vasta minoria
A
sombra azul reluz dentro do peito,
Cada
falha promovida em amor-perfeito
No
carbúnculo de muda sinfonia.
Sopro
gentil da maior cacofonia,
Os
dotes todos recusados como preito,
Tendo
a desfaçatez pleno direito,
Credo
Apostólico balbuciado em heresia.
A
borboleta devora a aranha que surgia,
Suga-lhe
a linfa no tanger dos ventos
Para
depois lançar à terra sua carcaça
E o
camundongo, em plena valentia,
Gatos
enfrenta sem padecimentos,
Gentil
bondade em mais gentil pirraça!
Sufragâneo 3
O Bispo Roxo desbota-se em Cardeal,
Que eleito Papa, desbota-se em
brancura;
Pesada mitra o crânio lhe tortura,
Será que em Anjo desbota-se, afinal?
E se algum Anjo, em dote triunfal,
Alcançar mais sublime investidura,
Ao ser Arcanjo desbote a fronte pura,
Só revestido de um dourado sideral?
E sendo o Arcanjo eleito Serafim,
Para cantar do Santo Pai a divindade
E então se torne um radiante
Querubim,
Em seis asas desbotado em humildade,
Cores diáfanas assumindo assim
Ao se tornar Dominação ou Potestade?
THE BLACK-TRESSED BUTTERFLY
There is but a way I'll ever leave you:
One day the gods will offer me wings,
And I shall take them.
Leaving you will a dear price to pay be,
But then wings... are wings.
You already have them.
Fly up and meet me there,
Let's dance among the eagles,
Hanging from threads of silvermoon,
Hugging each other across sunbeams,
Kissing among the highest stars.
There your varicolored wings will glow
Though mine will be dunner,
Set together from the pangs I gathered
Through my already too long
a journey.
There my multivoiced soul
will burst a song,
Though thine will be softer,
Come to me, share with me thy wings,
And I'll become lighter.
Come to me, share with me my soul
And thou shalt be eternal.
Not every love song a sonnet must be.
Butterflies have rhymes in their wings,
Black tresses have rhythm in their
waving,
And our metrics will be ours alone,
Puccini will set our love-making to
music.
AYIM HARÁ I – 11
ago 17
Conserva bem a tua
felicidade.
Não a espalhes
inconsciente aos quatro ventos;
só aos que te amam
revela então seus elementos,
que a aceitarão com
vezo de bondade.
Pois de cada
infeliz brota a maldade
e se te veem feliz,
cuidam atentos
como melhor
provocar teus desalentos,
desde o começo de
tua mocidade.
Com olhos verdes
demonstram seu ciúme,
com olhos pardos o
processo de sua inveja,
com olhos rubros te
lançam mau-olhado,
nessa amargura...
inteira feita de azedume,
o sofrimento
provocando que se enseja,
esguio como cílio
em tua íris pendurado.
AYIM HARÁ II
Das muitas lendas
contidas no Talmude
uma das mais
estranhas refere o Ayim Hará,
tristeza violenta
que a inveja causará
no melancólico
desgosto a que se alude,
na insatisfação
geral que se transmude
num infeliz
mau-humor que diário manterá,
sem real causa que
o justificará,
nessa medonha
maldade em que se ilude.
Se tão somente para
si o guardassem,
fruto enrugado do
desapontamento,
e por vontade ou
por ressentimento
a sua mágoa ao
redor não espalhassem!
Contudo, lançam ao
redor o Ayim Hará,
pena e desdita que
aos demais espalhará!
AYIM HARÁ III
Destarte, nunca
esfregues a alegria
no semblante de
qualquer desconhecido:
seu interior, por
orgulho malferido,
esparze aos outros
mágoas e agonia,
que ao ver-te
alegre, se ressentiria
e sobre ti um olhar
envilecido
haverá de lançar,
claro ou escondido:
por que em ti
felicidade existiria?
E por malícia te
prejudicará,
ao ver que tens o
que não pode ter,
quer material, quer
dom de bom-humor;
nada de bom para ti
desejará,
mas teu vigor
ansiará por remover,
mesmo que busques
demonstrar-lhe amor!...
PESCANDO ESTRELAS I – 12 AGO 17
Como todo adolescente, de amores eu
sofri
e tais negaças o peito e alma
feriram,
mas nunca me matei. Ao menos, nunca viram
meus olhos o interior de ataúde em
que vivi!
Meu coração de carne partir não
consegui,
minhas artérias flexíveis bastante se
empenharam,
malhando por sua conta aos poucos me
incitaram
contra a lembrança fugaz das penas
que então vi.
É bem estranho dizer que um coração
se parte.
o meu caiu no chão e só ricocheteou
de volta ao seu lugar que tinha no
meu peito!
Mas tantos vi sofrer e até morrer
destarte;
decerto foi mais frágil o amor que se
formou
ou então foi este meu que tinha algum
defeito!
PESCANDO ESTRELAS II
Contudo, o coração, mesmo jamais
partido,
em diversa intenção assim se
acostumou:
não mais por emoção, mas corpo
desejou
e nessa delinquência foi fácil
atendido.
Não foi apenas um, por vários
acolhido;
um corpo descartado, já outro se
achegou;
a adolescência, entanto, assim se
abandonou,
sem ter fase gentil de amor
correspondido.
Será que foi minha culpa ou meu ideal
desfeito
não mais me permitiu depois me
apaixonar,
mas ao sabor de um beijo somente me
afeiçoar,
a boca contra a boca, o peito contra
o peito,
por mais que lá no fundo ilusão
permanecesse
de haver um amor gentil ao qual eu
pertencesse!
PESCANDO ESTRELAS III
Amor eu tive, enfim, mas não
adolescente
e o tal “primeiro amor como jamais se
olvida”,
no dizer de Neruda, por longa seja a
vida,
um olhar que nos queima de forma
permanente
no fundo da retina, a se esgueirar
ingente,
por vezes olvidado, outra emoção
sentida
de amor de aceitação, de bênção
recolhida,
adulto a se tornar, em dom
subjacente.
Mas lá no fundo os olhos, em terno
pesadelo,
por mais que fosse amor recente em
seu desvelo,
por mais que se apagasse a brasa do
carvão,
por mais que o coração guardasse sua
inteireza,
surgindo em algum momento de irônica
incerteza
do que podia ter sido em vã
lamentação.
PESCANDO ESTRELAS IV
Mas como nunca a Lua se pôde
conquistar,
contempla-se ao redor a mágica de
estrelas;
seu brilho bem menor, não deixam de
ser belas;
luz própria sempre têm para nos
acalentar.
Contudo, aquele amor de apego
peculiar,
que sempre se julgou, quando se pôde
vê-las,
não chega a nos queimar à força de procelas:
são distantes demais no espaço do
orbitar.
Porém pescar estrelas é real
atividade:
são elas mesmas que atraem em sua
direção
o agudo anzol do amor feito em
maturidade
e nessa pesca, enfim, se acha a
liberdade,
na mesma sintonia do amor de aceitação,
por breve se demonstre perante a
eternidade.
HARDSHIP – 22 April 2006
"Love will find a
way". If He doesn't,
Is not intense enough, is but a
whim,
A shadow, a mistake, a sham, a
dream,
A dead-end, alas, something we
mustn't
Follow for long, except when the
lust
Sets us together, man and wife,
And them enjails the both of us
for life,
In that folly law pretends to be
just.
However, if you really for me
cared,
You'd curtail your absences; and
shared
Some of your scarce, precious
time with me.
It could be hard, but if you
felt the urge,
All else you would, with no
regard, purge,
Offset by pleasure, as hard as it
might be.
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