MANUEL DA BENGALA
(Folclore brasileiro, provavelmente mineiro e de origem portuguesa,
recolhido por Sílvio Romero e
recontado por Monteiro Lobato,
versão poética de William
Lagos, 16/12/12).
MANUEL DA BENGALA I
Era uma vez um rei, que teve um filho
destinado a se tornar um andarilho;
já nascera muito forte e comilão;
só a mãe não bastava dar-lhe o peito;
sete amas de leite foi o jeito
de garantir-lhe a diária refeição...
Em poucos dias, já o leite não
chegava:
ele comia papinha e não bastava;
os dentes lhe cresceram bem depressa;
numa semana, chegara a metro e meio
e as pessoas já o olhavam com receio
por sempre mais querer comer à
beça!...
Assim que o garotinho fez um mês
comia carne e pão mais do que três,
e já alcançara seus dois metros de
altura!
No mês seguinte, já comia um boi
e a preocupação do rei rápido foi
crescendo junto com a imensa criatura!
Ao mesmo tempo, ficava musculoso,
proporcionado e de rosto bem formoso,
mas tinham medo que não parasse de
crescer!
Por sorte, demonstrou-se inteligente,
com três meses lia bem perfeitamente;
domava potros e a lutar foi
aprender...
MANUEL DA BENGALA II
Um dia, enfim, de crescer ele parou,
porém dois metros e vinte ele
alcançou
sem que aumentasse mais seu apetite!
Mesmo assim, ainda era um boi
inteiro
durante o almoço; e ao jantar, o
cozinheiro
preparava muitos pratos, num
agite!...
O rei ficara já bem assustado
por ter um filho assim desempenado,
pois todos os bois do reino comeria!
Além de aves, de arroz e de feijão,
muita batata e quilos de seu pão,
sua despensa a deixar quase
vazia!...
E a seus ministros foi pedir
conselho
porque, afinal, já estava meio velho
e era seu filho que seria o
sucessor!...
E os conselheiros lhe recomendaram,
sendo a única solução que lhe
encontraram,
que mandasse correr mundo o comedor!
Então o rei mandou forjar machado
para o tamanho do filho agigantado,
bem longa foice e de ferro uma
bengala;
depois lhe disse, com a maior
paciência:
“Meu filho, tu precisas de
experiência:
vai correr mundo!” E Dom Manuel se abala...
MANUEL DA BENGALA III
No outro dia, chegou a uma serraria
e os lenhadores corriam a serrania,
mas não davam da encomenda vencimento.
Manuel se ofereceu, a um boi por dia,
que de madeira suficiente a supriria
para manter o serviço em andamento.
O serrador aceitou a empreitada,
pensando que ele queria juntar uma
manada,
porém Manuel só queria a refeição!...
Numa semana, empilhou tanta madeira,
a machadada derrubando árvore inteira,
puxando o tronco com a força de sua
mão!
Logo ficou entulhada a serraria
e a cada vez que alguém seu boi
trazia,
comia-o inteiro, sem nem deixar os
ossos!
E ainda se apresentava no jantar,
comendo tudo que pudessem cozinhar,
sem deixar nada para os outros moços!
Assim, o seu patrão o despediu,
com muito medo... Mas não se ressentiu:
“Cortei as árvores por léguas ao
redor!
Tão cedo, não precisa mais de mim...”
E foi-se embora, cantarolando assim,
como se o mundo fosse feito de
esplendor...
MANUEL DA BENGALA IV
Logo depois, chegou a uma fazenda,
na qual o mato já crescera até na
senda
e ali se ofereceu para a roçar,
em troca apenas, para sua comida,
de um boi inteiro, se levasse de
vencida,
o carrascal que tanto estava a
incomodar...
O fazendeiro concordou, acreditando
que um rebanho ele estava
preparando;
e na hora do almoço, trouxe um boi,
mas sugeriu que se sentasse à mesa.
Manuel aceitou o convite, com
certeza,
e por sua goela a refeição inteira
foi!...
Logo depois, voltou para o roçado:
léguas e léguas deixou tudo cortado
e no jantar comeu seu boi inteiro!...
Ninguém podia acreditar, sequer,
que pudesse comer tudo com prazer...
E apavorou-se logo o fazendeiro!...
Numa semana, ele limpou toda a
fazenda
e comeu sete bois, nessa prebenda,
além de abóboras, couves e repolhos!
O fazendeiro precisou mandá-lo
embora,
cheio de medo, quando chegou a hora,
mas Manuel viu a despedida com bons
olhos...
MANUEL DA BENGALA V
“Eu já rocei esse seu campo inteiro:
com minha foice, eu trabalhei ligeiro;
você não tem mais serviço para mim!”
E lá se foi, muito alegre, carregando
as suas ferramentas e cantando,
aproveitando outra experiência
assim...
Depois abriu uma mina a bengalaços,
as pedras arrancando nos trompaços,
deixando o ouro exposto à luz do
sol...
Eliminou assim trabalho escravo,
mas seu apetite deixou o dono bravo
E o mandou passear no outro arrebol...
Chegou a um porto e reuniu-se aos
pescadores,
puxando a rede sem quaisquer temores,
em vez de boi, comeu um tubarão!...
Mas lhe disseram que pescara muito mais
do que eles precisavam... Era demais!
Para vender iria lhes dar um
trabalhão!
E finalmente, chegou em outra terra,
cujo rei se preparava para a guerra,
seu reino fora assolado por
gigantes!...
Um deles, suas três filhas lhe
roubara...
Um vasto exército aos poucos já
aprestara
e engajaram Manuel em dois instantes...
MANUEL DA BENGALA VI
Porém Manuel subiu sozinho até a
montanha
e no machado empregou força tamanha
que acabou com os gigantes bem
depressa!
Contudo, as filhas do rei não
encontrou.
Comendo um boi por dia, procurou,
sem nada achar, mas de comer não
cessa...
Então o rei também o mandou embora:
“Caso eu precise de você, em outra
hora,
é garantido que o mandarei
chamar!...”
Manuel aceitou de boa vontade a
ordem
e voltou para seu reino, sem
desordem;
ficou seu pai muito contente de o
encontrar...
Não obstante, apesar de sua alegria,
seu coração bem veloz se confrangia,
vendo os rebanhos diminuir ao
derredor!...
Embalde quer o filho ter por perto,
que o campo logo se tornará deserto
e da revolta do povo tem temor...
E de novo os conselheiros lhe falaram
e a única resposta que encontraram
foi mandar D. Manuel para sua
morte!...
Decapitá-lo seria uma injustiça:
pois deveria ser mandado para a
liça,
em que teria de enfrentar má
sorte...
MANUEL DA BENGALA VII
Então lembraram de um bando de leões
que andava atormentando as multidões:
que fosse o príncipe contra eles
enviado!
Manuel pediu por três juntas de bois
atrelados a um carro e foi, depois,
para a floresta, sem ter nada
desconfiado.
Usando sua bengala e seu machado
foi os leões desbaratando para um lado
e logo o maior deles capturou;
deu-lhe carne de ovelha e uma
bordoada,
até a fera ficar bem amansada
e num dos jugos do carro o atrelou!
Tirou o boi e o devorou inteiro,
para depois ir descansar, todo
lampeiro...
No dia seguinte, bem cedo se acordou,
entrou no mato e lá caçou outro leão,
com uma corda, puxão após puxão,
mais uma fera depressa ele domou!...
E colocou-o atrelado em sua carroça,
comendo o outro boi, sem grande bossa,
e de tarde, foi caçar algum veado.
Carneou o bicho e o serviu para os
leões,
(guardando um pouco para as próprias
refeições)
e foi dormir depois, bem descansado...
MANUEL DA BENGALA VIII
E fez o mesmo por mais quatro dias,
deixando os leões bem mansos, sem
manias,
que os açoitava como um bom
verdugo!...
Os seis bois foi comendo, um por um,
prendendo os bichos, sem deixar
nenhum,
perfeitamente sujeitos ao seu
jugo!...
E depois de completar suas
refeições,
obrigou as três juntas de leões
a puxar o seu carro até a cidade!...
Carregado de carcaças de veados,
cujo cheiro os deixava alucinados,
dando-lhes aos poucos uns pedaços,
na verdade.
Chegando à capital, a admiração
de todo o povo o recebeu, em ovação:
“Viva o príncipe! Viva Manuel da Bengala!”
E ele erguia na mão o longo ferro,
incitando os leões com forte berro:
e a multidão delira e não se
cala!...
Porém passada mais uma semana,
em que comia com uma fúria insana,
os conselheiros insistiram com seu
pai.
Mas tinham medo de sua força tão
tamanha:
um regimento sucumbiria à sua
sanha!...
Porém de fome o reino inteiro morrer
vai!...
MANUEL DA BENGALA IX
Destarte, embora muito desgostoso,
disse o rei a seu filho tão guloso:
“Vou ser forçado a te mandar embora!
Não mais comporta a nação teu apetite,
temo que a fome uma revolta incite,
preciso que te afastes nesta hora!...”
Manuel pôs no ombro o seu machado,
a sua foice pendurada do outro lado,
saiu batendo no chão com sua
bengala...
Porém o povo ainda o aclamava,
saudando o príncipe que as feras
derrotava...
Assim partiu, garboso e em grande
gala...
Pelo caminho, em duas pernas de pau,
viu um homem, a quem chamavam
Passa-Vau,
que atravessava toda a gente pelo rio,
mas não queria ao príncipe passar...
Porém Manuel o obrigou a carregar,
e nas suas costas montou com todo o
brio...
E do outro lado, disse: “Meu amigo,
doravante, você virá comigo,
posso encontrar outras águas pela
frente...”
Passa-Vau o acompanhou de má vontade,
pois não queria ser montado, na
verdade,
por um homem tão grande e tão
potente!...
MANUEL DA BENGALA X
Logo a seguir, outro homem
encontravam:
Corta-Cipó era o nome que o
chamavam,
pois toda árvore ele podava em seu
caminho.
E Manuel disse: “Preciso de
você!...”
Corta-Cipó ficou com medo, já se vê
e acompanhou a D. Manuel,
devagarinho...
E mais adiante, acharam
Arranca-Serra,
todo armado e preparado para a
guerra,
que procurou contra D. Manuel
lutar...
Mas o príncipe com a foice o
derrubou
e com o machado então o ameaçou
e Arranca-Serra prometeu o
acompanhar...
Passou o bando por muitas aventuras,
sempre vencendo, mas também agruras,
porque Manuel comia por demais...
Corriam os bosques, sempre atrás de
caça:
Manuel comia couro, osso e carcaça,
sobrando pouca comida para os
mais...
E combinaram cada um caçar sozinho,
trazendo bastante para seu bandinho,
porém comendo primeiro na
floresta...
E o sistema funcionou, inicialmente.
Cada um deles caçava coisa diferente
e os quatro, ao depois, faziam
festa...
MANUEL DA BENGALA XI
Seus companheiros, já meio
satisfeitos,
abriam mão de parte dos direitos
e Manuel da Bengala enchia a barriga!
Mas na sua vez, caçava duplamente,
para sobrar também para sua gente,
sem desconfiar que fosse sua
inimiga!...
Mas um dia, durante a vez de
Passa-Vau,
achou um moleque, com cara de ser mau,
que lhe pediu para o cachimbo fogo...
Passa-Vau não tinha... Então o moleque
moveu o braço ligeiro, como um leque
e lhe deu uma cachimbada, em
desafogo!...
Passa-Vau ficou caído, desmaiado
e só no fim da tarde foi encontrado,
sem que os outros o quisessem
acreditar...
Manual da Bengala foi pegar um jacaré,
que devorou com dente e casca até,
sem esquecer de alguma carne lhes
deixar...
No outro dia, foi caçar Corta-Cipó
e apareceu o moleque, ao vê-lo só,
pedindo fogo para o seu cachimbo...
Corta-Cipó não tinha... E o molequinho,
lhe deu forte cachimbada no focinho,
mandando o outro direto para o
limbo!...
MANUEL DA BENGALA XII
Quando os outros e encontraram
desmaiado,
Manuel achou um urso atocaiado
e o degolou para lhes dar jantar...
Comeu os ossos, os pelos, até as
tripas,
para os outros só deixou umas
farripas,
que mal bastaram para os três
alimentar.
Arranca-Serra falou ser a sua vez
e que traria boa comida para os
três,
mas o moleque ele encontrou
também...
Para o cachimbo, uma brasa lhe
pediu.
Arranca-Serra não tinha... E num
salto de bugio,
derrubou-o com o cachimbo muito
bem!...
Foram achá-lo já ao entardecer...
Manuel da Bengala uma jiboia foi
vencer
e a estrangulou com a maior
facilidade...
Deu um pedaço para seus comparsas,
tragando o resto sem maiores farsas,
pois seu estômago era imenso, na
verdade!
No quarto dia, os companheiros lhe
disseram:
“Nós já caçamos!” “Ora, vocês nem puderam!
Mas muito bem! Vou eu caçar, meu povo!...”
Entrou no mato e lá chegou o
moleque:
“Eu quero fogo!” “Não tenho, pé de
leque!”
E o molequinho o atacou de novo!...
MANUEL DA BENGALA XIII
Só que não pôde lhe acertar a
cachimbada:
foi o Manuel que lhe deu uma bengalada
e com sua foice lhe arrancou a
carapuça!...
Porque era um diabrete e toda a força
ele tinha no capuz e assim se esforça
para pegar de volta, pula e fuça!...
Porém Manuel pôs no bolso o seu capuz:
“Só lhe darei se você agora me conduz
à caverna em que as três princesas
abduziu!...”
“Mas como sabe que fui eu?” disse o
guri.
“Os gigantes eu matei e logo vi
que foi você que ao combate os
induziu...”
Mas não queria se entregar, o capetinha,
lutando em busca de sua carapucinha,
enquanto Manuel lhe pregava
bengalaços...
Até que, finalmente, concordou
e à frente do príncipe, ele marchou,
pensando em conduzi-lo a
tropicaços!...
Mas Manuel era bastante equilibrado
e não ficava nem um pouco atrapalhado,
pulando cada pedra e cada fenda;
e o diabinho desceu por uma gruta,
pela qual mil gemidos já se escuta:
era o Inferno, igual que a antiga
lenda!...
MANUEL DA BENGALA XIV
Foram descendo, cada vez mais fundo;
nem era escuro no abismo tão profundo,
que havia luz de fortes
labaredas!...
Mas passavam mil escravos
condenados,
realizando os trabalhos mais pesados
ou escavando outros túneis pelas
gredas...
E numa cela, que ficava ao lado,
estavam as princesas, com cadeado
firmando as três, sob grossas
correntes...
“Por que estão aqui acorrentadas?”
“É que estão vivas, não são almas
penadas;
se as soltar, se escapam, bem
contentes!...”
“Por que então não escapam os
condenados?”
“Porque estão presos pelos seus
pecados!
Parecem soltos, mas não podem mais
fugir...”
“Mas se as princesas estão vivas,
como foi
que as prendeu aqui?” “Ora, Manuel do Boi,”
disse o capeta, “não procure se
iludir...”
“Todas têm algum pecado... Uma é
vaidosa,
a outra sempre foi muito orgulhosa
e a terceira trata mal as empregadas...
Não é o bastante para serem
condenadas,
mas vão ficando no purgatório
acorrentadas
e com o susto, vão deixar de ser
malvadas...”
MANUEL DA BENGALA XV
“Foi um castigo para aquele rei
teimoso,
que construiu na capital templo
formoso
e nele insiste em ir à missa todo
dia...
Assim aprende a nos dar maior valor
e ao povo todo tratar com mais rigor,
na corrupção que o Demo mais
queria...”
“Está certo... Mas agora, chega de conversa,
Solte as princesas...” disse, com voz
tersa,
Dom Manuel da Bengala. “Vamos logo!...”
E o diabinho meteu um chifre no
cadeado
e o portão assim se abriu de lado a
lado...
As três princesas saíram sem mais
rogo!...
Foram subindo depressa para a luz,
cada uma delas a fazer sinal da
cruz...
Só a terceira é que lhe agradeceu...
“Você viu?” disse o moleque. “São ingratas,
me dê o capuz e vá para sua matas...”
“Pensa que um tolo por aqui sou
eu...?”
“Só lhe devolvo depois de estar lá
fora!...
Com a carapuça, nem me deixará ir
embora...”
“Está certo,” disse o capeta. “Vamos lá...”
Manuel galgou depressa à superfície,
não achou ninguém, mas o moleque
disse:
“Os seus amigos já estão mais
acolá...”
MANUEL DA BENGALA XVI
“Eles pegaram as princesas e
fugiram...
Deixou-as sós e de você se riram...
Agora, dê-me de volta o meu
capuz!...”
“E se você quiser de novo me
atacar?”
“Você me vence de novo, se eu
tentar...
Mas lhe faço um juramento bem de
truz!...”
“E você acha que eu acredito num
capeta?
A sua palavra não passa de uma
treta...”
“Juro três vezes pelo meu Pai de
Baixo!...”
Manuel da Bengala não queria
ceder...
“Escute bem, que um segredo eu vou
dizer:
Sob suas ordens, três vezes eu me
encaixo!...”
“O meu poder vem do capuz, é
certo...
Vire do avesso... Quando estiver
aberto
Verá que por três paninhos é
forrado...
Tire os três panos, igual que fossem
lenços.
Três desejos a eles vêm apensos,
com minha promessa de atender a seu
chamado.”
“Eu lhe concedo qualquer desejo que
quiser,
mas depois que cumprido ele estiver,
o lenço some e então volta para
mim...”
“Ainda que seja, qual é minha
garantia
que contra mim você não se
voltaria...?”
Manuel lhe perguntou, desconfiado
ainda assim.
MANUEL DA BENGALA XVII
“Vou-lhe contar um último segredo...
Mesmo depois que o desejo lhe concedo,
você guarda de cada lenço um
fiapinho...
Caso pense que lhe fiz uma traição,
queime o fiapo com uma brasa de tição
e meu capuz se queimará
inteirinho!...”
“Somos diabos, mas temos nossas leis;
nossas palavras são como as dos reis
e você me derrotou com lealdade...
Mas vou contar, mostrando ser amigo:
quando você derrotar um inimigo,
ficarei dono da alma dele, na
verdade...”
Então Manuel tirou do bolso a
carapuça,
virou do avesso e viu uma tela ruça,
que começou a puxar, devagarinho...
Logo em três lenços ela se desvirou
e em seu bolso todos três ele guardou,
entregando a carapuça ao diabinho...
Este sumiu, numa reviravolta,
num redemoinho, como em rédea solta
e então Manuel percebeu estar
sozinho...
Segurou um dos lenços em sua mão
e desejou aparecer dentro ao salão
das três princesas, em rápido
caminho.
MANUEL DA BENGALA XVIII
Então se viu transformado em
papagaio,
pelas nuvens foi voando, feito um
raio
e logo estava dentro do castelo!...
Ora, aconteceu que seus três
companheiros
haviam roubado as princesas e,
ligeiros,
forjado haviam um plano bem singelo...
Foram dizer ao rei serem os
salvadores
e em recompensa pelos seus labores,
deviam com as princesas se casar!...
E as ameaçaram que, se elas
contassem,
não escapavam sem que as três
matassem:
seria bem fácil a cada uma
apunhalar!;;;
Elas choravam e não queriam se
casar,
mas disse o rei que devia
recompensar
seus salvadores, mediante o
casamento.
Era uma lei do reino, muito antiga
e a sua própria coroa assim periga,
caso tentasse impedir seu
cumprimento!
Mas enquanto a cerimônia preparavam,
o papagaio chegou e se assustaram
com sua chegada, os três
espertalhões.
E quando o papagaio virou gente,
logo Manuel, um herói tão imponente,
maravilharam-se o rei e os
cortesãos.
MANUEL DA BENGALA XIX
Disseram as damas: “Foi este o
salvador:
desses três cada qual é um salteador
e ameaçaram nos causar a morte!...”
Foram atrás de Manuel, a se esconder
e os três bandidos precisaram se
atrever
a atacá-lo, para tentar a sorte!...
Passa-Vau avançou com um varapau!...
Manuel derrubou com a foice o
Passa-Vau,
que sumiu, diante de todos, de
repente!
Corta-Cipó o atacou com uma lança,
mas a bengala de Manuel logo o alcança
e não teve um destino diferente!...
Arranca-Serra o acometeu em sua
armadura,
sua espada afiada, longa e dura,
mas Manuel o derrubou com machadada!
E a sua couraça ali ficou vazia...
Só Manuel soube para onde seguia
esse malvado de alma maculada!...
E desse modo, foi realizado o
casamento
de Manuel com a de maior encantamento:
foram os dois com muitos filhos
abençoados.
As outras duas acharam noivos nobres
e os sinos lhes tocaram novos dobres:
três matrimônios foram consagrados...
EPÍLOGO
E então Manuel exigiu que aparecesse
um novo boi a cada dia em que
vivesse,
sem ao reino precisar empobrecer...
O segundo lenço então sumiu também,
mas o terceiro, Manuel quis guardar
bem,
para de armadilha futura o
proteger...
O rei velho não tardou a falecer
e foi Manuel no trono o suceder.
Correu a notícia até o reino de seu
pai
que em seguida também abdicou:
coroa e trono assim ele entregou
e dos dois reinos um país somente
sai!...
Viveu Manuel em grã prosperidade,
mas conservou os três fiapos, na
verdade
pois queria se guardar de uma
traição...
Algumas vezes, lhe aparecia o
diabrete,
novos desejos em sugestão lhe
submete,
mas Manuel foi sempre adiando essa
ocasião!
E o diabrete lhe contou que
Passa-Vau
passava o dia a apanhar de
varapau!...
Que Corta-Cipó se cortava o dia
inteiro
E Arranca-Serra dia e noite ia
serrando,
cada um deles suas más ações
pagando,
até chegar-lhes o dia derradeiro!...
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