AMORES VIOLETA – 29 SET—8 OUT16
Novas Séries de William Lagos
PICADAS VIOLETA I – 17 OUT 2007
Se te farei sofrer, não quero mais
o meu amor de víbora, a peçonha
que em ti derramo, no amor que ponha
o meu prazer, sem retribuir jamais.
Se dor te causarei e for demais,
meus anelos contrario: que deponha
prazer o meu amor quanto ela sonha:
centelhas de ilusão em mil torchais...
Pois sempre foi o que mais me
atrapalhou:
que assim sofresses dor, enquanto davas
o gozo multicor e me aliviavas,
por um breve momento, o meu sofrer...
Mas que prazer teria, se não dou
um gozo igual ao que me faz
viver...?
PICADAS VIOLETA II – 29 SET 16
Sofrer por dor é muito relativo:
existem dores que ferem bem profundo,
outras que o peito tornam iracundo,
outras que criam rancor bem mais ativo,
outras de efeito bem pouco sensitivo;
há dor ridícula que te faz jocundo, (*)
há dor solerte que te deixa imundo,
há dor tão leve que mal passa no crivo
(*) Que te faz rir.
do sentimento. Há quem seja mais sensível,
que por um quase-nada se magoa,
fervendo em raiva ou lançada em
depressão,
enquanto a pele de outra é
intransponível
e até o maior insulto é coisa atoa,
que não lhe toca, nem de leve, o
coração.
PICADAS VIOLETA III
A dor moral, portanto, muitas vezes,
dói muito mais em quem a provocou
do que neste ou naquela a quem picou,
traz um remorso que dura muitos meses
ou mesmo mais, pois julgas que lhes
deves
por tua palavra dura que brotou
ou pela indiferença que insinuou
maior rancor com que de fato os leses...
Eu sou assim. Por mais que uma ferida
tenha sido perfurada dentro dalma
rói muito menos que se eu a provoquei.
E mesmo tendo logo a escusa concedida,
meu peito arde e não encontra a calma,
visto que eu a mim mesmo não perdoei.
PICADAS VIOLETA IV
Assim, se te magoei e me perdoaste,
terei de mim um maior ressentimento:
não me absolvo nesse julgamento,
sofrendo menos quando me magoaste.
Mas, em geral, foi involuntário engaste
que te feriu, descontrole de um momento,
involuntário totalmente o movimento,
porém de tua vingança não cansaste.
E desta forma, quando revidaste,
foi por ação totalmente desejada,
em imediata ou planejada ação;
pelo desdém percebido esse desgaste,
a repetir por dez vezes a picada
que te causei sem ter tido a intenção!...
PELÚCIA VIOLETA I – 18 OUT 2007
Prefiro ser magoado que ferir.
Primeiro, por estar acostumado,
porque sensível sou, mas calejado
de antigas mágoas: das quais possa
rir...
Mas sei que outros não têm esse talento.
Às vezes, sem querer, sou magoador
e causo o mal, buscando dar amor,
por mais pureza tenha em pensamento...
Isso porque aprendi, no sofrimento,
a transformar desejos em poesia.
Poucos conseguem sublimar humilhações.
E julgo então, no meu ressentimento,
que os outros são iguais, mas como é
esguia
essa pele que protege os corações!...
PELÚCIA VIOLETA II – 30 set 2016
Frequentemente a alma da mulher
por algures vagueia, simplesmente,
em preocupações de inverso ambiente,
praticamente alheia a seu mister,
só pelo hábito a praticar o quanto quer,
porém sua mente noutra parte ausente
e até se queima os dedos, de repente,
quase nem nota a crua dor sequer...
Quando no mundo do possível se
apresente,
em pensamentos desconcatenados,
interrompidos pela lancinante dor;
só então se arranca da fantasia ingente,
tais pensamentos já mal e mal lembrados
em sua quimera amorosa ou de estertor.
PELÚCIA VIOLETA III
E quando seu marido ou seu amante
com essa intermitência se ressente,
a sua surpresa é plena e transparente,
mal se recorda do derradeiro instante,
mas por tal interrupção raiva vibrante
lhe sobe à tona, rasgado o peito e a
mente,
que ao mundo em torno se achava
indiferente,
concreto ambiente que a cerviz lhe
espante. (*)
(*) Testa = Cabeça, mente;
Nessa impaciência, suas raízes
decepadas,
sem nem saber porquê exatamente,
meio magoada por ter sido interrompida,
tais quais artérias do coração cortadas,
toda arranhada a sua pele translucente
por tal retorno indesejado à vida!...
PELÚCIA VIOLETA IV
Por isso, é necessário ter cuidado,
essa pelúcia é mais fina que veludo,
esgarçada, rasga fundo, não me iludo,
involuntário seja o corte e sem pecado.
Não obstante, é ferimento atribulado,
não é mais que um terciopelo seu escudo,
no suprassumo de um desejo mudo,
que nem sequer a si mesma é confessado!
Quantos meandros precisou então cruzar
a sua mente, a se esfolar nos
escaninhos,
cheios de curvas, com ásperas esquinas,
na crueldade desse ingente despertar,
que não compensam os mais meigos
carinhos,
que mais irritam tais paredes finas!..
REGRAS DA VIDA XLII (42) – 18 out 2007
O que mais vale na vida é a qualidade
e não o preço que vais pagar por ela.
Enquanto não tiveres liberdade
de comprar a tessitura de uma estrela,
não te contentes com luz fluorescente.
Economiza, luta, até que possas
adquirir aquilo em que te endossas
como sendo o desejo permanente...
Assim no amor, procura o mais real,
o duradouro e não o LED sucedâneo
e nunca abraces tão só por solidão.
Amor não é somente um festival:
é para a vida inteira o sufragâneo (*)
de ti, que te preencha o coração!
(*) Eleito, mas antes de assumir o
cargo.
CUIDADOS
VIOLETA I – 19 out 07
Não
há palavra mais longa do que "sempre",
nem
som mais breve que a palavra "nunca".
São
palavras sem rima, não se cumpre
tempo
mais longo que “sempre” e nem se junca
por
mais que se acumule no "jamais",
tempo
mais curto... Exceto no "talvez",
que
nem sequer é tempo, nos anais
da
eternidade, pois em tempo mal se fez...
Porque
o "sempre" se espera ser eterno,
enquanto
o "nunca" se julga nem sequer
viver
no tempo inteiro... Ou no "também".
E
assim eu fico, em tom amargo e terno,
pois
sempre hei de querer essa mulher,
mesmo
que nunca venha a ser "meu bem".
CUIDADOS
VIOLETA II –1º out 2016
Contudo,
um “sempre” nunca é “nunca-mais”,
nem
nunca o “sempre” nos traz gozo perenal,
melhor
“talvez”, coisa bem mais habitual,
mescla
de eternos com laivos de jamais.
Sempre
o “sempre!” se reverte nos totais
e
nunca o “nunca!” é totalmente material,
nunca
o “sempre!” é inteiramente perpetual
e
o “nunca!” em breve encontra os ademais...
Cada
“entretanto” ao “sempre” desafia
e
o “doravante” vai ao “nunca” limitar,
só
o “talvez” é que possui perpetuidade...
Cada
incerteza ao vasto “sempre” esfria,
todo
o “quem sabe” ao “nunca” vai quebrar,
que
nada humano alcança a eternidade.
CUIDADOS
VIOLETA III
Mesmo
que o “nunca!” seja maior que o nada,
enquanto
o “sempre!” é bem menor que o todo,
pois
cada “nunca!” seu fim alcança ao rodo,
e
cada “sempre!” tem duração quebrada...
Esta
é uma regra que não pode ser mudada,
por
mais que o “sempre” se embarace em lodo,
por
mais que o “nunca” enfrente algum apodo,
pois
nunca é eterno; todo “nunca!” é quase-nada.
E
sem o “sempre” será sempre conservado;
só
existe sempre na sempiternidade
e
sofre o “sempre” aos poucos seu desgaste.
E
pelos séculos dos séculos desprezado
será
o “nunca”, por não ter ubiquidade,
nem
para encher o “nada” nunca baste!...
CUIDADOS
VIOLETA IV
E
que fazer com tal “sempre” sem rima,
se
algum amor vem sempre nos tirar?
Ai,
como é curto o “sempre” desse amar,
Ai,
como é breve a juventude da menina!
E
que fazer, quando o “nunca” desatina,
a
sempre e sempre nunca se afirmar
e
nunca e nunca para sempre continuar
tal
nunca-sempre que nos governa a sina!
Só
uma coisa é certa: é que jamais
se
pode depender de um “sempre!” exato
e
nem de um “nunca!”, por definição,
ambos
perdidos na corrente do ademais,
sem
ser o “sempre” um permanente fato
e
nem o ”nunca” uma total separação!...
DEALBAR EM VIOLETA I – 19 out 2007
Tudo acontece quando ocorrer deve,
nem antes, nem depois, sem qualquer
dúvida...
a cornucópia só se mostra túrgida
quando a inclinam os deuses, numa breve
e risonha carícia caprichosa...
se ocorrerá de novo, nem te atreve
a prever, pois são cristais de neve,
hexágonos de luz semipreciosa...
Essa é a graça dos deuses. Se concedem,
é quando querem e não quando desejas:
estende as mãos e colhe as chuvas
mansas...
E beija o sol, quando os raios se
despedem...
não importa se a miragem nunca beijas,
tens a lembrança dela e não te cansas...
DEALBAR EM VIOLETA II – 02 OUT 16
É tão estranha essa palavra “dealbar”,
que mais parece denotar a conclusão,
embora indique de fato a iniciação
de qualquer dia que a noite vem
quebrar...
Também estranha essa palavra “amar”,
que nos inspira sempiterna ação,
mas quanta vez acha completação
no reverso da medalha, que é o “odiar”.
E como é estranha a bênção da
“esperança”,
pois é de fato não mais do que abstrata,
embora digam: “quem espera sempre
alcança”.
Tão estranho é o dealbar, pois sabe a
mente
que esse dia facilmente se desata
quanto o amor que alma a alma entrança!
DEALBAR EM VIOLETA III
Eu bem queria amor a proclamar
como essa flor de florilégio eterno!
Que todo o seu vigor de espanto terno,
nesse momento de ansioso despertar,
tal qual a aurora que se pode contemplar
numa explosão de dote sempiterno,
especialmente nos frios dias de inverno
que em hora breve a luz nos vem cortar!
Contudo é a aurora, até mesmo no verão,
somente o arauto do dia transitório,
por longo seja o crepúsculo estival.
Destarte o amor te confrange o coração,
trazendo o aviso, assaz peremptório,
que cedo ou tarde há de perder o seu
fanal!
DEALBAR EM VIOLETA IV
Embora o dia nos chegue na hora certa,
nunca chega à mesma hora todo dia:
algumas vezes mais cedo se inicia,
outras mais tarde seu dealbar desperta.
Assim o amor também nos desconcerta,
a nos brindar na hora em que queria
e não naquela em que a gente se iludia
dever o encanto explodir na mente
aberta.
Pois entre o amor e a aurora a mente
oscila,
tudo pensado, sempre descontente,
por chegar cedo demais ou muito tarde!
Dos equinócios nos afasta a longa fila
(*)
dos dias longos ou breves tão frequente,
enquanto o amor esfria e o peito arde...
(*) Duas datas anuais em que o dia e a noite
são iguais.
RESSUMBRAR I (sem data)
Monótono é este som. Escuto em paz
revirando as moléculas do ar,
acompanhando a melodia alvar,(*)
enquanto espero a hora que me traz
(*) Boba, tola.
os universitários... As horas más
do desperdício. Sei bem não vou ensinar
absolutamente nada. Só mostrar
a quem quiser aprender como se o faz.
Pelas janelas escuto este batuque,
num ritmo neurótico, sem métrica,
acompanhando um girar entontecido,
então concebo, por um estranho truque,
estar a ver derviches em sua estética
busca de Alá em tal ritmo perdido...
RESSUMBRAR II –
03 OUT 2016
Os meus motivos para escrever são vários
e não se esgota nunca a inspiração;
a meu redor, a flutuar, vejo que estão
almas perdidas de mil escriturários...
Este soneto sobre os universitários
quase em bolor descobri nesta ocasião,
esfarrapadas suas margens sem perdão
(por sorte traças não guardo nos
armários!)
Bem certamente, esta ocasião passou,
que há vários anos cessei de lecionar,
restrito apenas a minhas traduções,
mas a lembrança de novo ressumbrou
das longas horas por eles a esperar,
quando faziam algures suas reuniões!
RESSUMBRAR III
Na maioria, meus amigos permanecem,
alguns procuram me abraçar nas ruas,
outros escrevem, quando estão “de luas”,
alguns rancores, contudo, ainda
acontecem.
Especialmente quando esperanças crescem
de serem reconhecidos pelas suas
fisionomias, nas quais solertes gruas
calvície e rugas indesejadas tecem...
Eu cuido os olhos, que pouco se
transmutam,
mais facilmente relembrando seus semblantes,
porém seus nomes a girar em labirinto,
pois quantas listas de presença se
permutam
nesses rostos tão mais velhos do que
dantes,
mas nos quais cordialidade ainda
pressinto!
RESSUMBRAR IV
A revolver os escaninhos do passado,
lamento não possuir memória eidética;
(*)
meus dias se confundem nessa estética,
imagens pingam em ritmo apressado.
(*) Recordação total.
Sem qualquer dúvida, cada dia é
recordado,
mas foi tão repetitiva essa profética
de novos dias a gastar na mesma ética,
nessas veredas a pisotear meu passo
andado!
Foi meu costume quase sempre caminhar
após as aulas, em meu retorno a casa,
algumas sendas a cobrar-me mais de
hora...
Os rostos rotos em centelhas a brilhar,
de cada face em carvão perdida a brasa,
tanto do antanho para mim jogado
fora!...
vazio
violeta 1 – 04 out 16
a cada
instante fabricamos o passado,
camada
após camada em nosso antanho,
nem
sempre equilibrado o seu tamanho,
como
estrato geológico encontrado.
um bom
geólogo examina o seu achado
e vai
dizer, pela extensão de cada lanho,
quantos
séculos acumula no seu ganho,
destarte
um novo conhecimento acumulado.
mas as
camadas superpostas na memória
são
afetadas por constante vazamento,
novas
lembranças a mostrar supuração,
intercaladas
de forma peremptória
pelas
lembranças de lembranças do momento
nesse
mosaico em perpétua mutação...
vazio
violeta 2
nossa
memória se colore em violeta,
nem roxo,
nem azul ou avermelhado,
gotas de
arco-íris na panóplia do passado,
gotas de
olvido que o coração secreta...
lembranças
há que a alma só completa
com os
retalhos que tomou do resultado:
outras
lembranças de teor acidulado,
na
imposição de qualquer dor mais indiscreta.
como
equimoses que a pele avioletam
ou
arroxeiam, enegrecem e amarelam,
as más
lembranças insistem em voltar...
enquanto
aquelas que mais prazer concretam
se
amalgamam entre si e se revelam
tão
difíceis para a gente recordar!...
vazio
violeta 3
boas
lembranças se entreveram e misturam
nessa
nuvem de prazer enovelado,
algum
orgasmo apenas relembrado
na multidão
dos outros que perduram.
alguns
fracassos, contudo, nos torturam,
a culpa e
a humilhação nesse ampliado
caleidoscópio
de pedrinhas marchetado,
que ao
invés de flores quais tristezas duram.
nossos
demônios favoritos vêm de novo,
inesperadamente
à superfície,
como um
lodo que não chega a se assentar
e ali
quedamos, sem querer, vendo o renovo
de uma
mágoa qualquer ou de estultície,
sempre do
vácuo violeta a tocaiar!...
LÁGRIMAS
VIOLETA I – 5 OUT 16
Por que
não para o mundo quando amor parou?
Por que
não morre a Terra quando amor morreu?
Parou o
amor, mas dele o mundo se esqueceu,
Morreu o
amor, mas dele a Terra não lembrou.
Indiferença
sempre a vida demonstrou
Perante
as mágoas que o coração sofreu:
Foi esse
o meu destino e foi o teu,
Fado perpétuo
que a todos nos tocou...
Existe
até quem se mostre solidária,
Quando
queremos lamentar o desamor,
Porém em
breve já acredita ter direito
De nos
roubar a hora perdulária,
A
confessar longamente o próprio ardor,
Inda mais
fundo a perfurar o nosso peito.
LÁGRIMAS
VIOLETA II
Ou vem
alguém a nos dar algum conselho,
Que o
real consolo está na religião,
Ou numa
ação comunitária, então,
Nossas
mágoas ampliando qual espelho...
Ou nos
indica um alfarrábio velho
De
autoajuda, para nos dar consolação,
Quando de
fato, só buscamos a ocasião
De às
chibatadas fugir do veloz relho.
O fato é
que mal de amor é tão comum!
Quem
nunca teve algum sofrer profundo,
Qual
realmente jamais alguém esquece?
Sem que
se possa encontrar consolo algum:
Se amor
acaba, não termina o mundo
E nem
amor ressuscita qualquer prece!...
LÁGRIMAS
VIOLETA III
Pensando
bem, por que parar devia
O mundo
inteiro por nosso sofrimento?
Por que,
na pena de nosso entendimento
Sequer a
Terra por momento morreria?
A dor é
nossa e tão mais se sentiria
Quanto
mais fundo nos cortou o sentimento
De sermos
centro do mundo em tal momento,
Quando só
estamos em sua real periferia...
Muito
melhor toda dor tornar poesia,
Que
sempre pode ser literatura
E que nos
outros só recorda a própria dor,
Quando em
segredo sua lágrima vertia,
Nesse
crepúsculo de violeta pura
Que então
demarca o fim de cada amor.
OMPHALOSKEPSIS I – 06 OUT 16
JÁ MUITAS VEZES QUASE ADORMECI
PARA MEUS FILHOS A CONTAR
HISTÓRIAS,
RETRANSMITINDO DOS HERÓIS AS
GLÓRIAS,
CONTOS DE FADAS QUE EM MINHA
INFÂNCIA LI.
MAS EM OUTRAS OCASIÕES, QUANDO OS
REUNI,
SEMPRE EVITEI, POR RAZÕES
CONTRADITÓRIAS,
QUE NO PRESENTE ME FOGEM DAS
MEMÓRIAS,
LHES REVELAR AS HISTÓRIAS QUE EU
VIVI.
O
MAIS ESTRANHO FOI FORÇAR-ME A ESQUECER,
POR UM PERÍODO DE QUASE TRINTA
ANOS,
DE MINHA VIDA UM SINGULAR EVENTO,
POR NUMA LÁPIDE MEU NOME UM DIA
VER,
MORTO NA GUERRA DOS HERÓIS
INSANOS,
MORTA FAMÍLIA DE FANTASMAS TENDO
ALENTO.
OMPHALOSKEPSIS II
SOMENTE AO ESCUTAR DE UMA CANÇÃO,
QUE MEU FILHO, DE PRESENTE, ME
GRAVOU,
VELHA LEMBRANÇA ENTÃO SOBRENADOU
DA AMARGA GUERRA CHAMADA
SECESSÃO.
QUE DESTE FATO PROVOCOU A
REPRESSÃO
É UM ENIGMA QUE A MENTE ME
ASSOMBROU,
POIS NO FUNDO DE MINHALMA SE
OCULTOU,
NESTA MINHA VIDA DE CONSTANTE
AGITAÇÃO.
NA QUAL A TANTO FATO ALHEIO DEI ABRIGO,
MIL ESCANINHOS DE CULTURA INÚTIL,
MAS QUE HOJE SERVE FORRAGEM A
MEUS VERSOS,
MUITO DIVERSA DE CONTEMPLAR O MEU
UMBIGO,
QUE OLHO APENAS QUANDO O SABÃO
DÚCTIL
SUA COVA RASA FAÇO LIMPAR COM
DEDOS TERSOS!
OMPHALOSKEPSIS Iii
TERIA O BUDDHA A CONTEMPLAÇÃO DO
UMBIGO
INSPIRADO A SEUS TANTOS
SEGUIDORES;
COMO ONFALOSCOPIA OS ESCRITORES
MAIS DEFENDEM TAL CONCEITO SEM
PERIGO.
MAS RARAMENTE EU MEDITAR CONSIGO
DE MEU PASSADO NOS MORTOS
ESTERTORES,
SOMENTE ESPIO ALI VELHOS AMORES,
NO MEU DESEJO DE TORNAR AO SONHO
ANTIGO.
FAÇO DE CONTOS DE FADAS MEU
ABRIGO,
JÁ DUAS CENTENAS E MAIS A
VERSEJAR,
QUE PARA OS FILHOS E NETOS ALGUÉM
CONTE!
MESMO DEPOIS QUE ME ACHE EM MEU
JAZIGO,
QUE SE POSSAM TAIS HISTÓRIAS
RECORDAR,
TALVEZ MEU NOME EM OUTRA LÁPIDE
REPONTE...
OUTIS (Ninguém) I – 7 out 2016
Tu te recordas, pois já te
apaixonaste,
(não há no mundo quem não sofra
desse mal)
alguém amaste, não importa qual,
e as mesmas dores em egoísmo
experimentaste.
E se ao ler o que escrevo,
recordaste,
toque de ardência nos olhos
natural,
de cardíaca contração o temporal,
eu não lamento se neste dia
choraste,
porque não foi a minha dor que te
feriu,
mas aquela dor antiga mal
coberta,
sua cicatriz revolvida e que
desperta...
Mais infeliz, porém, quem não
sentiu
um vasto amor, caminhando pelo
céu,
a Terra inteira algodoada em
branco véu...
OUTIS II
No velho mito do Ulisses
marinheiro,
capturado certa vez por Polifemo,
o cíclope canibal, sorte de demo,
seus companheiros a devorar
ligeiro,
com um pouco de mosto
alvissareiro,
suco de uva, nesse transe
extremo,
em vinho transformado, não
pequeno
esse ardil do Odisseus de peito
arteiro...
Depois o espeto com que a carne
atravessava
do gado humano de que se
alimentava,
firmemente endureceram sobre o
fogo,
que logo a vista do gigante
perfurava!...
Mas indagando quem tal vinho lhe
brindava,
“Eu sou Ninguém!” – foi resposta
de tal rogo.
OUTIS III
“Meu nome é Outis!” – esse
Ulisses proclamou,
que por “Ninguém” o português
traduz;
com sua esperteza o perigo assim
reduz,
contra a vingança que tal cíclope
tramava...
Pois disse ele: “Pela bebida que
me dava,
à minha boa-vontade hoje o
conduz:
será Ninguém o derradeiro nesta
cruz
de meu espeto que refeição me
assava...”
Assim, quando outros cíclopes
indagaram:
“De quem te queixas, irmão
Polifemo?”
“Dos meus olhos Ninguém tirou a
luz!...”
Seus irmãos todos em zombaria
gargalharam:
“A ti causaste um tal dano não
pequeno?
Aguenta o mal que tua própria mão
produz!”
OUTIS IV
E embora Polifemo a Outis
persiga,
por sobre o mar a arremessar
rochedos,
sobre ninguém tombaram tais
penedos,
nessa cegueira que para sempre o
siga!
Da qual livrar-se é certo não
consiga,
talvez da fome morresse nos
degredos,
as pontas a morder dos próprios
dedos,
por mais que a Outis em cólera
maldiga!...
Com mais frequência se menciona
Nemo,
Outis-Ninguém se traduziu em
latim,
língua que o mito nos transmitiu
de Polifemo.
E com tal nome batizou seu
capitão,
Jules Verne, de seu Náutilus
assim,
influenciando muito mais que
geração...
OUTIS V
Se te recordas de tal nome, pouco
importa,
já foi demais a Odisseia
recontada,
em versão filmográfica aleijada,
mas numerosa interpretação ainda
comporta,
na mente humana que se poder
entorna.
Foi como arquétipo há milênios
conservada,
Ninguém ou Outis a tornar visão
truncada
desse gigante que sequer alguém
conforta.
Pois nos relembra que um só ponto
de vista
não nos permite ter visão
estereoscópica;
com duplo olhar nos dotou a
evolução;
e facilmente Ninguém tem a
conquista
de quem o encara em projeção miópica,
vendo no outro sua própria
inclinação...
OUTIS VI
Também recorda de como te cegaram
pela promessa de qualquer paixão
eterna
ou pelo vinho de límpida
cisterna,
ambos teus olhos é que se
apaixonaram...
Tal qual se agulha na testa te
cravaram,
até o quiasma que a visão
governa,
esse ciclópico olho que se
alterna
com o Bindi que os hindus imaginaram.
Mas como foi feliz essa cegueira!
lado a lado um casal na
embriaguez,
sem de sua vida temer cruel
espeto!...
Até cortar-se o amor por vez
primeira,
nessa terrível dor, que assim se
fez
definitivo o perfurar de teu
afeto!
NIGREDO
I – 08 OUT 16
Em
Sexta-feira Treze escrevi treze
Sonetos
num só dia, sem espanto
Que
um dia fiz cinquenta nesse encanto
Que
a alma devorou posto que reze,
Sem
que seja maldição que a mente lese;
Não
é mais que um canal feito de pranto;
Gotas
de espinhos teceram já meu manto,
Nessa
unção tormentosa que me pese.
O
esforço é sensual, lânguido até,
Aproveita
intervalos, rabiscando
Canções
sem tom, melodias sem sentido
E
vivo assim, erguido no sopé
De
vasto monte, descaso só ganhando
De
tantos sonhos em que encontro-me perdido.
NIGREDO
II
Canta
o Nigredo a morte espiritual,
Tão
longo ansiada pelos alquimistas,
Sempre
aplicados às estranhas pistas
Da
Pedra mística, dita Filosofal!...
Seus
ingredientes prepararam em ritual,
Primeiro
ansiando por tais negras conquistas,
Até
alcançar o despertar do Citrinitas,
Terceira
fase de seu esforço contextual.
Seria
o Nigredo primeiro transformado
Na
purificação chamada então Albedo,
Com
frequência obtida em seus cadinhos,
Depois
de ser o Citrinitas conquistado,
Esse
estágio final, dito Rubedo,
Iluminado
à força de carinhos.
NIGREDO
III
Nesse
prélio persistente, os alquimistas
De
seus processos nunca duvidavam;
Somente
a hora experimental variavam
Por
cem razões arcanas e ocultistas,
Sob
a influência dos ritos zodiacístas,
Um
decanato novo então buscavam,
Um
ascendente então determinavam
Que
ao resultado dê razões horoscopistas...
Mas
se a Pedra Filosofal tanto buscada
Foi
por qualquer alquimista conquistada,
De
fato é algo que nunca se provou,
Que
em seu laboratório bem trancado,
Se
tal prêmio descobriu esse Iniciado,
Sendo
Ocultista, os resultados ocultou...
NIGREDO
IV
Já
meu processo não é muito diferente,
Pois
sempre nele insiro o meu empenho
Ante
o papel, com meu cerrado cenho,
O
meu trabalho é constante e persistente.
O
fogo acendo sob o cadinho ardente,
No
almofariz meus ingredientes tenho,
Num
alguidar meu próprio sangue venho
A
derramar em coagular frequente.
Morre
primeiro a ação conjuntural.
Nesse
Nigredo ali subjacente
Que
a seguir purifico em meu Albedo,
No
Citrinitas meu vigor conceptual,
Meus
sonetos a ferver em tal momento
Da
final luminescência do Rubedo!...
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