ANJOS OU DEMÔNIOS – 11-20/4/17
Novas Séries de William Lagos
(A tulpa do compositor Charles Gounod segundo W. C. Leadbeater)
ANJOS OU DEMÔNIOS I – 11 ABRIL 17
Muitos afirmam ter escutado vozes
ao se encontrarem em plena solidão:
alguns profetas ser se afirmarão,
ordenanças a escutar em longas doses,
ou ao contrário, repreensões desses algozes
que serem anjos ou demônios pensarão;
os que se furtam à dominante religião,
de Marx escutam as ordens mais ferozes.
Também escuto sons, se estou sozinho,
quando recordo da vida o tempo velho,
quando gemem para mim os dias perdidos,
pois com milhares de mim então me alinho,
enquanto em vão eu busco algum conselho
no som do sangue a pulsar em meus ouvidos!
ANJOS OU DEMÔNIOS II
Este diálogo cerebral da parte esquerda
com a direita já é de há muito mencionado;
de muitas formas já foi interpretado:
dizem que a parte direita é bem mais lerda,
enquanto a esquerda carda maior cerda;
tal como alheio espírito ali sediado,
o seu tear com mais frequência é acionado
por um comando que do antanho a gente herda.
Já falavam os romanos em dois manes,
as duas sombras que possui qualquer humano,
eterno espírito abarcando gerações,
enquanto nova alma hoje reclames,
sempre que vida nova ganhe afano
pela constância de mil reencarnações.
ANJOS OU DEMÔNIOS III
Nem mesmo as vozes destes meus poemas
escutarei em minha mansão secreta;
qualquer que seja a inspiração dileta,
ela murmura em doses tão pequenas
que tão somente meus dedos nessas cenas
são acionados para a ação direta
e me surpreende a conclusão concreta
das alegrias sussurradas junto a penas...
Esse diálogo sei bem que me pertence,
não sendo a voz de Deus nem de diabo:
quem serei eu para ter dom de profecia!?
Somente o dom de línguas a mim vence
mas de seus resultados não me gabo,
sem jamais me orgulhar desta poesia.
ANJOS OU DEMÔNIOS IV
Muitos afirmam que tulpas em si abrigam (*)
e com elas em constância se aconselham.
em frequentes decisões então se espelham:
talvez respostas a seus problemas digam!...
(*) Companheiros imaginários criados desde a infância.
Mas são as redes neurais que assim se ligam:
sem esquizofrênicos ardores que se talhem,
nem consciências externas que nos ralhem,
se nos furtamos aos caminhos em que sigam.
Não há lugar para essa estranha emanação
em minha mente. Controlo
esse terreiro,
mesmo que sejam bem frágeis as minhas ripas;
pois são de mim apenas a manifestação,
enquanto eu busco invisível companheiro
e só encontro dentro em mim belas tulipas!...
ALCATRUZ I (Vaso de Barro) – 12 abr 17
Bem mais que nossos próprios genitores
nós somos de nós mesmos mães e pais.
Durante a vida, construindo vais
tuas tendências pessoais e teus ardores.
Tuas experiências te influenciam mais:
o ódio alheio, o desdém, vários amores,
tua relação com patrões e professores
e se as tiveres, as noções espirituais...
Mas tanta vez nos obriga a sociedade
a agir de modo oposto ao que queremos,
obrigações a nos impor a esmo!...
E quando taxas atendo à saciedade
e tudo o mais que evitar já não podemos,
eu me percebo como órfão de mim mesmo!...
ALCATRUZ II
Então conheço ser de barro um vaso
que constituí, amassando argila fina,
porém tendo espessura pequenina,
sujeito assim aos empuxões do acaso.
Meu recipiente cheio fica raso
a cada empurrão com que se inclina
e já maior rachadura me assassina,
senão a vida, ao sonho em que me embaso.
Tenho certeza de não ser apenas eu.
A vida é cheia desses encontrões.
Somente aos poucos teu valor repões,
mas sempre algo precioso se perdeu,
quando menos esse tempo do passado
que não se recupera ao ser vazado...
ALCATRUZ III
Porém se somos de nós mesmos genitores,
não nos podemos guardar na sepultura;
essa orfandade é aparente e impura,
sempre nos podem retornar velhos pendores,
sangue e saliva dalma ainda senhores,
formando pasta a recobrir a rachadura,
como um remendo contra cada agrura,
sem que, de fato, esgotem-se os ardores.
Mas se ao invés, for demasiado o choque,
de tua beirada poderá cair um caco
(isso que chamam de coração partido)
e em tal surpresa, qual de clarim o toque,
fica o caráter a ostentar triste buraco,
tal e qual velho castelo derruído.
ALCATRUZ IV
Até hoje, muitos cacos eu repus,
porém tanto de mim gastei em versos,
nessa farinha de barro tão dispersos,
que já o verniz externo não reluz.
Mas pouco importa, pelas rachas entra luz
e sempre posso espiar mundos inversos,
ver esses pingos que de mim brotaram tersos,
cada fenda a remendar com ponto em cruz.
E assim espero poder ainda ser pai
e por que não? Refazer-me
em mãe também
de almas sensíveis que meus poemas leem,
nos quais parte minhalma e a linfa vai,
já não somente a curar as minhas feridas,
mas por teus sonhos ampliar as vidas.
PALÍNDROMOS I – 13 ABRIL 2017
Quando as palavras que formam um conjunto
podem ser lidas de trás para a frente,
com o mesmo significado equivalente,
de palíndromos classificam ser o assunto.
Existe gente que desgasta o seu bestunto
a lancetar cada palavra em corte ingente;
há até mesmo um programa permanente
que cria palíndromos até para um defunto!...
O mais comum é “Roma me tem amor”,
curta frase que forjaram no passado
sem que a obra me pareça trabalhosa;
outros requerem mais um certo ardor...
tempo não tenho para nisso ser gastado:
fazer sonetos me parece mais gostoso!
PALÍNDROMOS II
Há um outro tipo que denominam “Capicua”,
um raro termo que se tirou do catalão:
“Cabeça e rabo” em inversa situação,
para um número indicar com que se atua,
podendo ser lido ao contrário nessa grua,
alguns deles a provocar superstição,
como o fez “2002”, em sua ocasião,
o fim do mundo alguns temendo como pua!
Mas “a cara rajada da jararaca”
me parece indicar melhores focos
que “Socorram-me, subi no ônibus em Marrocos!”
Pedir ajuda por ter feito essa cacaca
é realmente uma expressão inexplicável,
enquanto a cara da serpente é mais palpável!
PALÍNDROMOS III
Um palíndromo é mais coisa de almanaque
ou mesmo tema para livreto de piadas;
atenção chamam esses pequenos nadas,
sem que eu tua vida diária causem baque.
Alguns nem têm noção que nos ataque,
pouco mais do que expressões desencontradas,
sem ter sentido, quando assim destemperadas,
nada mais sendo que um palíndromo de araque!
Mas para mim será de todos o melhor,
largo sentido assumindo o seu papel,
compreensível a ser de norte a sul,
dos que conheço o mais longo e superior:
“Luza Rocelina, a namorada do Manuel,
Leu na Moda da Romana: “Anil é cor azul”!...
VERDE ONDINA I – 14 ABR 17
Ela se opõe, como Lilith a Eva,
pernas abertas ao invés dos braços,
sutil sorriso a percorrer-lhe os traços,
que ao devaneio simplesmente leva.
Mas é visão de luz e não de treva,
envolta em dobras desses
verdes baços,
plena nudez sugerindo tais espaços:
mais do que exposta, que o imaginar atreva.
Em posição sem nada de hierática,
em pura oposição à Vênus clássica,
porém divina , feminilmente enfática,
sua sedução mais lembrando travessura,
tal qual se fosse uma visão fantástica
seus seios em botão de amêndoa escura!
VERDE
ONDINA II
Não
me recordo que ruivos cabelos
se
mostrassem comuns entre os helenos;
naqueles
restos de pintura, ao menos,
recuperados
de seus ebúrneos selos. (*)
(*) Sinetes de marfim.
Não
eram brancos das estátuas os desvelos,
porém
a chuva e o vento, em seus acenos,
extinguiram
suas cores, quais venenos,
brancos
agora até seus olhos belos,
vazios
e cegos sugerindo sua aparência;
mas
os romanos, querendo os imitar,
seus
mármores preferiram desnudar
de
todo o pigmento; e a potência
dos
olhares com pupilas esculpiram,
em
tal brancor de que a visão retiram.
VERDE ONDINA III
Ela recobre o ventre e seus quadris
com o glauco cortinado, talvez plástico,
num desprezar de qualquer pudor monástico;
freira não é, em suas curvas juvenis,
a despertar, em quaisquer homens viris,
não só desejo, mas sentimento elástico,
mais proteção que ânsia de algo orgiástico,
jovem a esposa em atitudes pueris,
na sugestão apenas de uma entrega
que se faça para a vida permanente,
amor ainda, em parte, brincadeira,
e a verde ondina o coração nos lega,
na transitório esbeltez irreverente,
sem que a possa conservar, por mais que o queira.
LETHARGIA I – 15 ABRIL 17
De argila e poeira é feita a tua memória;
toda recordação não é mais que apenas pó;
o que relembras remasterizaste só,
após rememorar tua antiga história;
prensada foram a caliça e toda a escória,
jungida firme em fardos de cipó,
recolocada sobre a calva, qual chinó, (*)
em falsidade inválida e sem glória.
(*) Peruca.
Já não lembras do que foi, mas da lembrança;
quanto mais virgem for a recordação,
tanto mais próxima do que te sucedeu,
mais o letargo que o interesse não alcança,
os cem retratos quotidianos, sem paixão,
em fiel imagem do que de fato aconteceu.
LETHARGIA II
Assim, a vida lembrada é um despautério,
um desperdício para a nova criação,
salvo em momentos de restauração,
muitos anos perdi com o magistério:
da multidão dos surdos sem critério,
olhos cegos a me ver, sem ilusão,
recordo apenas a mínima ocasião,
sem comprovar um resultado sério.
Pouca coisa me restou.
Alguns amigos,
que me julgavam ser bom professor
(essa escassa meia dúzia que estudava),
convicção a guardar dos dias antigos:
“Ninguém ensina; só o aluno em seu fervor
é que aprendeu, se para tanto se esforçava.”
LETHARGIA III
Dormi demais Cerca de
sete horas,
praticamente o dobro do costume;
ou couros de minhalma num curtume,
são tambores no rufar de minhas demoras.
Recordo noites ricas dos outroras,
em que minha obra se elevava ao cume
e fico agora a remoer meu azedume
destas últimas noites nos emboras,
nas quais apenas respondi correspondência,
sem reservar a mínima paciência
para o trabalho deixado em abandono,
sabendo que remorso eu sentiria
e dias inteiros após lamentaria
todo esse tempo perdido para o sono.
LETHARGIA IV
Sei que mal posso recordar dos sonhos,
em seu onírico e mortal esquecimento,
só ao despertar recordo, por momento,
qualquer mensagem ou avisos mais tristonhos;
versos deixados para trás, bisonhos,
se os recordar, já perderam o sentimento;
pois vez somente se cria o seu portento,
que ogros devoram a seguir, risonhos...
É importante erguer-se e registrar
seus termos tensos, senão os julgamentos:
quando os releio, nem recordo mais sua causa.
Qual foi o amor escondido no sonhar,
qual a importância dos padecimentos,
moinha ao vento após pequena pausa!
LETHARGIA V
E se teus sonhos esqueces num momento,
após o sol te haver o rosto acariciado,
ou qualquer obrigação se reafirmado,
que fim levaram oito horas sem assento?
É um terço de tua vida em negro acento,
só dois terços para o dia atarefado
que acabará por também ser ocultado,
nesse letargo que te rói o pensamento.
Dizem que o cérebro perpétuo é um armazém,
teus dias inteiros sendo conservados,
os sons, os cheiros, o mais simples lampejar,
mas qual memória desses sonhos que se tem,
sob as camadas dos fatos apressados
que os dias inteiros vêm aos poucos te apagar?
LETHARGIA VI
Essa a razão por que teus companheiros
que de um evento igual compartilharam,
do que recordas pouco ou nada relembraram,
tal qual se os fatos não fossem verdadeiros.
E quando insistes, em momentos derradeiros,
até lembram da ocasião em que se acharam,
porém camadas sobre os tais depositaram,
que no final desvirtuaram dias inteiros...
E até parece ser um falso testemunho,
quando eles vêm tua lembrança contrariar,
diversamente do que podes recordar,
que registraste então do próprio punho
cada detalhe, no futuro a duvidar
linha após linha do que pudeste conservar.
TEOREMA I -- 25 jan 2006
Quatorze versos possuem os sonetos,
Unidos quatro a quatro e três a três;
O tema é exposto logo nos quartetos
E nos tercetos seu final tem vez...
Mas não basta escrever quatorze versos,
Unidos pela rima, a dois e dois:
São necessários ritmos diversos
E a métrica acertar logo depois...
Todo soneto tem a grande linha,
Que une as quatro estrofes em conclave:
Um sentimento só que se avizinha
Da solidez robusta de uma trave;
E, da frágil estrutura, a campainha
Brilha feliz, pois de ouro tem a chave!...
TEOREMA II – 16 ABRIL 17
Naturalmente, ainda temos a cesura,
Pequena pausa que convida ao respirar,
Um breve corte, que mal e mal perdura,
Da estrofe o ritmo vindo a completar,
Sem nada a ver, de fato, com censura,
Essa potência de infinito contrariar,
Que se associa a ergástulo e tortura,
O proibido tão somente a ressaltar!...
Que coisa estranha que nos baste um “N”
Para a palavra dotar de outro sentido!
Uma proíbe uma peça que se encene,
Enquanto a outra, desta letra sem,
Nada mais faça que amparar o ouvido
Para melhor se entender o que nos vem!
TEOREMA III
Como “Os Quatro Demônios” se chamaram
Aos insistentes e audazes parelheiros;
Do Apocalipse os Quatro Cavaleiros,
Os infelizes a punir que os descuraram!;;;
Aqueles muitos que nas rimas só pensaram
Na formação de seus versos altaneiros,
Detidos sendo então por patrulheiros
Que suas frases imperfeitas demonstraram!...
Porque, no fundo, poesia é matemática,
Tal e qual composição de sinfonia,
Por natural que nos brote sua temática.
E desse modo, aplica-se um teorema
Na aritmética confecção desta poesia,
A frase áurea se adaptando ao lema!...
TEOREMA IV
Há quem avesso seja ao numeral,
Receio tendo da trigonometria;
Da matemática sua mente se desvia,
Pensando em arte encontrar melhor caudal,
O verso livre a parecer-lhe natural,
Sem perceber-lhe a falta de harmonia
Com a qual sua vaidade ali se enfia:
Falha o teorema para quem o entende mal!
E de igual modo, perde o verso a melodia
Nesse mercado da mediocridade:
Muito mais valem os poemas de cordel,
Cujo vigor nos traz mais energia,
Mesmo nas frases de maior ingenuidade,
Do que essas riscas espalhadas a granel!...
CASSAMYRA i – 19 fev 2006
(Sonetos Nefelibáticos, a serem interpretados como melhor lhe
parecer. Recentemente o termo encontra
nova voga, mesmo em conjuntos musicais, embora com diferentes estilos).
AVÁLIA RODARIZ, SATÉLIA CARMILUNA,
NINÍSSIMA ALAZÃ, PÁLIA TINCERA,
RASSUMA NURA, RADAÇÃO DE ESGERA,
TRELÚDIA MORNA, FIRÇA VARIASSUNA...
PASSIDÉLIA ATORAL, GLOTA ANDIRUNA,
ROTÓIDE FALSIFLOR, TÚLIA MANTHERA,
TOPA TAFER, RADICULA NA ESPERA,
SANDO NEPOTAS, CANDO ME ALARUNA?...
SOVALO ESTÍACO, LESTE MEU SALINO,
DOLENTE MULTIDOR QUE ME APRSSAGA,
NEFÉLIA AZURA, NIÁGINA DE AZIAGA.
RUBATA TASCULAR, MOPRA SARDÍACA,
VANDO ME GAZ QUILER, EM TAL ARPOR
CALÍACA
ANGAPALADA ARDIM EM QUELANTAR
MARTINO?...
Cassamyra ii – 17 abril 17
TROPEU PERLADO, MULTIALGOZ PATERA,
RENTE QUIMERA EM RUSTIDOR PALPITO!
CÃO ZARCO ATRELO A LASCIFLOR REBRITO,
PERLEPTA GRUZINIA, PELUCIDAR FOSFERA!
GENGÍVICO PARTER DE GANGONAR INQUERA,
ARCHINGUINADO PEJO, ENTREPICADO
ATRITO,
CORIOLANO TENSOR, AGRISOLADO AVITO,
ZERPONDO EM MIM A MAIS NIMIA PROCERA!
ALFIM RESUMO, QUAL DEUTERAGONISTA,
O PARSIFAL RESSUMBRO DE CADA
PELARGÔNIO,
MOUCO FRAGOR DE ARCAIZANTE BISTA,
PRÓCORO NARCO DE ENGOLIDÃO PARMENAS,
FASTERA ARGOSSE NESTE PROLEGÔNIO,
RUTIL PERGULHO DE MÚLTIPLAS
GANGRENAS!
CASSAMYRA III
BOSCO PROPUNDO A ASDRÚBALO TERPOR,
EUME REFINO EM PINCÉLICA DOURANÇA,
ESBATINADO EM GÚLPIDA ARROGANÇA,
QUAL DESTINEIA ARQUECÊNICA EM TRAGOR!
EMPEÇO A MULTIFLORA EM RESTRIDOR
NA PERRUÍDA E AURÍFICA AGIGÂNCIA,
FEZ DE TIMBRAZES EM ESTÍLICA
TORCÂNCIA,
ANABATEIO DE CARTUNS EM PERIFLOR...
GARPINDO ALVER CALABREJADA ANGORA,
TEITA DE LUZ A ME DOLER SAFRÉM,
LORTEANDO ABORTE DE SEMISPATA ARTORA,
ENTESSE PÉRIPLA DE CRÓCIDO ENFISANTE,
BATRÁQUIO ARGUTO EM SEU FINAL
TLENCÉM,
COMQUAL REQUINTE DE BÚRPURA BRAMANTE!
CASSAMYRA IV
MACRÓPIO ATISCONTADO, ESCOMBRO
PARAVELHO,
RAINÚSCULO APORCADO EM SÍPIDO
ACORBADO,
ATENASMENTE INFECTO, JADIL
NETRIFICADO,
ALTOQUE DIGITAL DE UM RÚTILO
PARELHO!...
PROTACTÍNICO ESPÓLIO EM LASSIDÃO
PARTELHO.
RESPOSTO A CORPULMÃO EM FROIA
DECEPADO,
TRESMAGO COMPULSOR EM ADÔNICO
AFIRMADO,
GUANTE DE PANSIDÃO EM GRISSITAL ARPELHO...
TOLHAR DE ASPIROS LORPAS, MIRÚRGIA DE
CHARCURA,
MNEMÔNICO PERÓXIDO NA FRAGA DO
ANTIMEDO,
OPULTA CASTIGÁVEL DA PÚLVIDA
PLAUSURA,
PORTILIDADE ANDAVÉM NA PRINJAS DO
NEFASTO,
NA INTENTA AGONIÇAO DE UM AZINHAVRE
ALBEDO,
SOU ÓSCULO VIBRANTE DO ANTIGO
ZOROASTRO!...
A poesia
nefelibática é uma derivação do simbolismo, conforme o Manifesto Simbolista de
Jean Maréas, publicado em Le Figaro; alguns anos depois, Jacques-Paul Marsaing
publicou seu próprio Manifesto Nefelibatista, em 1883, no Mercure de
France. Muitos simbolistas o adotaram
durante algum tempo, entre eles Verlaine, Baudelaire e Rimbaud e até mesmo
Mallarmé, descartando a seguir o sistema de Marsaing, cujos maiores seguidores
foram Villiers de Lisle-Adam e Lautréaumont; No Brasil podemos citar Luis de
Borja, R. Maria, Pinheiro Chagas e Gonzaga Duque. Wittgenstein, o criador da
Filosofia da Palavra, fez uma extensa análise do movimento e Lima Barreto o
mencionou em seu livro Bruzundangas, embora o aplicasse aos poetas que
considerava preciosistas. Os poetas
simbolistas eram acusados de “andar com a cabeça nas nuvens” e assim Marsaing
cunhou o termo, a partir das palavras gregas nephele (nuvem) e batha (lugar em que se anda). Segundo seu manifesto, toda a
assim-chamada "liberdade poética" estava proibida, por não passar de
uma concessão acadêmica. A poesia não deve ter qualquer significado,
porque tem de ter todos os significados, não significa nada e significa tudo. O
poema deve ser como uma melodia sem palavras, e a interpretação do leitor é
sempre certa, para o leitor e nesse momento; dentro de meia-hora, se
interpretar de maneira diferente, de novo estará certo; e a interpretação
totalmente diversa do outro a seu lado, também será totalmente certa. Assim, o essencial do nefelibatismo é o som
dos versos e não seu significado.
Nos
sonetos acima, não mais que um exercício literário, levo o nefelibatismo a seus
últimos extremos, a exemplo de Marsaing, já que a maioria dos seus seguidores
receava adotá-lo totalmente e empregava termos normais na maior parte dos
versos, criando apenas alguns para exprimir um significado alternativo.
PALPOS
I – 20 fev 2006
É
real a carícia: tão real
Qual
se estiveras agora do meu lado,
Qual
se teu corpo assim manipulado
Tiveras
nos meus braços feito ideal.
É
real o carinho: verdadeiro,
Ressaibo
na minha boca e no meu queixo,
Que a
barba já pesponta em meu desleixo,
Quanto
eu quisera o beijo fosse inteiro!
Não
recordara os beijos, tão somente,
E o
toque de teus seios, tua vagina,
Roçada
de meus dedos, levemente...
Mas
recordara o toque de tua pele,
No
corpo e ventre todo, num desvelo
Que
para amor completo me destina!
PALPOS
II – 18 ABR 2017
Já
mencionei o fato de que más recordações
Explodem
na lembrança em clareza surpreendente,
Quando
menos se espera, espasmo de repente,
Do
peito a nos brotar cruéis deformações.
Porém
ao mesmo tempo, milhares de emoções
Que
sempre acompanharam o amor, em diferente
Formato
de prazer, somente se pressente
Como
vasto conjunto em mescla de ocasiões.
É
raro recordar-se um só ato sexual
Que
repetido foi frequente com a parceira,
De
forma claramente definida e individual,
Ao
revisar mil toques em carne tão sensual,
Não
mais que um turbilhão da vida hospitaleira,
Nas
lavas derretidas de vulcão imaterial.
PALPOS
III
A
gente lembra das milhares que ocorreram;
Cada
uma vez, porém, feita irreal;
Nesse
montante de orgasmo consensual
Fica
difícil separar quantos nos vieram.
Sabe-se
bem que diários transcorreram,
Mas é
difícil recordar o individual,
Também
se mescla esse teor espiritual,
Mal
se separam as emoções que nos encheram.
Só
recordar do amor de um dia tal
É
realmente uma tarefa bem confusa:
Como
lembrar cada sopro da procela?
Se
mesmo versos de registro digital
São
abafados por memória tão difusa,
Acumulados
em construção singela...
PALPOS IV
Contudo os dedos de tua mão
recordam
E as palmas de tuas mãos te
facilitam
Os toques dessa pele em que se
agitam
Os tremores e os arqueios que
te abordam...
De teus seios os mamilos já se
acordam
Quando tal recordação de leve
irritam
A calma atual e ao desejo te
concitam,
Mil antigos tricôs que a mente
bordam...
Porém são emoções conjunturais
De longa série de momentos de
prazer,
Correspondida em dura ou pura
entrega,
Sem sequer a regressão
trazer-te mais
Dos suaves palpos que se queria
rever,
Salvo algum deles a que a alma
mais se apega!
FAMÉLICA I – 14 MAI 80
Tateando te encontrei, na mesma
e escura teia,
em que me debatia, contido num
casulo
que mais firme se estreita a
cada gesto e pulo
e mais me tolheria no ardor que
me incendeia!...
Se então não te encontrara,
exposta à mesma sanha,
de uma deusa terrível a serva
revelada,
enquanto de minha deusa a farsa
atribulada
pouco mais escondia que os
palpos de uma aranha!
Que a parca muda e vaga, em
desvelar enfática,
porvir grotesco e amargo então
nos revelava,
não válvula de escape, mas
fauce enigmática,
ansiosa por sugar, desfecho
amargurava
do mesmo drama antigo, ao se
fazer simpática:
a sugar nossa esperança na
chance que nos dava!...
FAMÉLICA
II – 19 ABR 17
Decerto
reconheces, de modo igual que eu
que o bem
e o mal se encontram em pratos da balança;
quando de
um lado algum prazer te alcança,
contrabalança-o
logo um mal que o sucedeu.
Enquanto
as chapas do fiel oscilam sobre o teu
destino
em tal momento de mudança,
pouco
sujeitas aos caprichos da esperança,
que o bem
recorta essa dor que apareceu. (*)
(*) As balanças mecânicas de armazém
oscilavam até que duas pequenas
Chapas de metal atingiam exatamente o
mesmo nível.
Contudo,
vindo o mal, talvez se esperaria
que um
peso igual de bem o viesse acompanhar,
sempre um
consolo do desdém e da saudade.
Mas
parece que essa dor muito menos pesaria
nos
pratos da balança que o bem a se gozar,
o peso do
teu bem sopesando a iniquidade.
FAMÉLICA III
Assim esse
equilíbrio nos parece desonesto:
vê-se nas
nornas uma intenção famélica,
no corte de
teu fio velocidade bélica,
cada
instante de alegria coberto pelo infesto.
Tal como se
julgassem no prazer algo de incesto,
no orgasmo
de um momento certa impiedade fálica,
a roda de
tua vida em rotação esférica,
momento mais
feliz a desmanchar-se presto!
Igual que
essa ilusão que a vida nos preside
nos
encarasse mais com intenção vampírica
e cada
situação de gozo com que lide
depressa
transformasse em egoístico repasto
e sobre nós
mostrasse uma expressão satírica,
um juro a
nos cobrar por cada instante em fausto!
FAMÉLICA IV
Existiria de
fato um tal poder faminto,
que algum
prazer nos dá em forma de ração
e então se
locupleta com maior satisfação,
deixando só
o vazio que dentro dalma sinto?
Igual que do
sabor de cada vinho tinto
só nos
restasse enfim a borra da ocasião
e nos
menosprezasse em final eructação
como um
quadro sem cor que sem pincel eu pinto!
Contudo,
parca ou norna, qualquer outra entidade,
se a
encararmos de frente, não nos pode dominar,
que embora
nos derrubem, podemos levantar.
E assim eu
tenho feito, por mais que seja a fome
do acaso
singular de vasta potestade,
que torturar
me pode, mas nunca me consome!
MELODIA FANTASMAGÓRICA 1
20 ABRIL 17
Por saber que é impossível é que creio.
Se fosse fácil de encontrar em qualquer parte,
Se não me requeresse “engenho e arte”,
Não buscaria possuir o esquivo seio
Dessa mulher que nem conheço e o meio
De encontrá-la, um dom que alfim me farte
Com seu amor de flor, gentil amor, destarte,
Que sei não murchará, igual que vai-se o alheio.
Mas aquela que eu conheço em minha visão,
Eu desconheço por razões de sentimento:
Tudo me leva a meiga musa ainda buscar,
Pois reconheço, dentro ao inquieto coração,
Algures ser possível ser meu o encantamento
Que pela vida inteira busquei um dia achar.
MELODIA FANTASMAGÓRICA 2
Já nem me importa possuir o seu amor,
Caso seu corpo conservar junto de mim,
Desde que minta, diariamente, assim,
Tal sentimento em primordial fervor.
Que ela percorra as posições do amor
E que pretenda gostar mesmo de mim,
Meus próprios gostos a partilhar assim,
No mais sincero fingimento de fervor.
Anos demais aguardei por tal amor
E se o futuro me prosseguir assim,
Receberei sua falsidade com fervor, (*)
(*) Aqui deliberei repetição de rimas.
Desde que tenha a meu lado seu calor,
Mais a promessa de manter-se junto a mim
Até que chegue o meu final torpor.
MELODIA FANTASMATÓRICA 3
Mas caso seja impossível tal amor
Feito de alma, mas só de puro sexo,
Ainda desejo o fantasma desse amplexo,
Tarot singelo de místico fragor.
Que me demonstre em vida tal favor
E que pretenda ter do amor o nexo,
Por mais que seja o seu mentir complexo,
E que a alheio íncubo destine o seu fervor.
Ainda busco o irreal encantamento
E aceitá-lo poderei, qual fragmento
Tão somente de um onírico esplendor;
Mas que o recorde apenas um momento,
Ao despertar, antes que sopre o vento
E me roube essa lembrança sem pudor.
MELODIA FANTASMATÓRICA 4
Pois que me importa que sonho seja apenas,
Se afinal, por toda a vida tal sonhei?
Já se esvaindo enquanto devaneei
Toda lembrança das fantasmas dessas cenas.
Amor me trazem apenas em verbenas,
Que nesta vida real não desfrutei,
Cem braços houve em que amor gozei,
Mas não o amor imortal de antigas penas.
Pois que seja tal amor só fantasia,
Plena minha vida de fantasmagoria,
Nunca esse amor alcançado em plenitude,
A alma ainda a suspirar, vazia,
Pelos fiapos de amor que a vida ilude,
Na solidão voraz de minha poesia!...
MELODIA FANTASMAGÓRICA 5
Porém não creio que as ninfas com que sonho
Sejam de fato lâmias, demônias disfarçadas;
Talvez sequer existam, apenas esboçadas
Pelo rubor onírico que em cada imagem ponho.
E quando beijos de amor em tais bocas deponho,
Nessa ânsia fugaz em que prendem-me, abraçadas,
São fruto de mim mesmo em desejos colocadas,
Memória imperceptível em novo ideal componho.
Contudo, não recordo de qualquer conversação:
Semblante me aparece, perfeito de atração,
E sem impedimento, estende-me seus braços;
Porém bem mais queria que do sexor a ação;
Não apenas me fundir no sonho de seus traços,
Porém seus sentimentos partilhar em profusão...
MELODIA FANTASMAGÓRICA 6
As ninfas de meus sonhos são deusas sempre mudas,
De mármore e marfim, em carne de ilusão;
Não compartilho a sina do infeliz Pigmalião,
Gravando para si amor em pedras rudas,
Na formosura sem par de perfeições desnudas,
Sem nelas encontrar a final aceitação;
Pois acho em minhas fantasmas perfeita volição
De dar-me seu amor nas mais sexuais permutas.
Porém, honestamente, queria muito mais,
Alguém com quem pudesse me abrir inteiramente,
Capaz de responder em idêntica linguagem;
Que assim compartilhassem tais fadas imortais,
Mesmo que apenas fosse em hipnagógico presente,
Comigo a desenharem idêntica miragem!...
REBATE I – 22 abr 1980
Se algo escreves de hoje --- vem, donzela!
Que seja algo de amor --- donzela, vem!
Que seja de esplendor --- em ti também.
Que o coração te aloje --- em clara vela.
Se algo escreves de ontem --- vem, senhora!
Que seja algo de claro --- amor recente;
Que seja do reparo --- (indiferente)
Que ao coração te apontem --- sem demora!
Escrito neste agora --- um desatino!
Uma visão de outrora --- mau destino!
Escrito neste caso --- (um bem seguro),
Uma visão do ocaso --- meu futuro...
Escrita multifária --- tão inglória...
Em hora solitária --- tua vitória!...
CALLIOPE I – 19
fevereiro 2006
What does a muse make?
A passing look,
A smell, a sight, a sigh, a
taste never tasted,
A touch never felt, a kiss
always forsook,
A waiving of hair, a nose, a
chance wasted.
Never again to have, a laugh,
a half-promise,
Never a promise to be, a
sound, a half-embrace,
Never a hug to hold, a smile,
a wrong surmise,
A dream fulfilled in sleep,
though lost in very face.
A shadow, never more, the
lack of substance,
A fool's hope, a yearning,
desire in satisfaction
Never to be accomplished, the
gift of a glance,
A couple lines let out, as
soon as taken back,
A sorrow, a sad grin, a
glint in eyes, an action
Scarcely fulfilled by fate
naughty and black.
PUNIÇÃO I – 03 jul 1979
Meu rosto eu vi de jade, ao fundo de um espelho,
Meu rosto deformado, mutável, transformado
Em rosto desumano, assim transmogrifado
Ao toque de teus dedos, num refletir parelho
De quanto nos meus olhos houvesses percebido:
Embora o cortem fora, meu coração de velho,
Manhoso feiticeiro, ao toque de teu joelho,
Antigas emoções quisera ter sentido...
Pois esse meu olhar, às vezes de ternura,
Por vezes de tristeza, ou de expressão tão pura,
Oculta o abominável demônio do desejo,
Que tão bem retrataste, nas linhas de teu rosto,
Nessa intuição latente, mostrando o teu desgosto
De que, sem nunca amar-me, ansiasses por meu beijo.
BIGORNA I – 07 jul 1979
Existe uma mulher tão dadivosa,
Capaz de compreender meu desatino
E de interpor-se aos golpes do destino,
Escudando-me em beijos, prestimosa;
Ou talvez não compreenda, mas me ame,
E por amar compreenda, sem que entenda,
Ou por amar entenda e não compreenda,
Mas para o amor de novo me reclame,
Deixando assim, nessa ilusão nascente,
De amor no gozo vago e imaterial,
A bênção/maldição de um ser sensual.
Seu corpo me alivia diariamente;
E nesta minha derrama tão frequente,
Eu pingo nela gotas de metal!...
DESAFIO I – 02 set 1979
EU QUERO TE POSSUIR POR VEZ PRIMEIRA
ABERTAMENTE E AO SOM DE UM VIOLÃO;
ALGUÉM QUE TOQUE COM INSPIRAÇÃO
DAS MÚSICAS QUE FIZ A DERRADEIRA.
QUE QUANDO EU TE POSSUA TODA INTEIRA,
EXISTA AO NOSSO LADO ALGUÉM QUE TOQUE,
QUE VEJA O NOSSO AMOR E NÃO SE CHOQUE,
NEM ZOMBE DE PAIXÃO TÃO VERDADEIRA.
ALGUÉM QUE SINTA SEMELHANTE ANELO,
QUE POSSA PARTILHAR DO TÃO SINGELO
ARDOR QUE ATINGE O HOMEM E A MULHER,
SEM FALSA CONVENÇÃO, SEM TER VERGONHA,
QUE POSSA COMPREENDER QUANTO SE SONHA,
NA AURORA DE POSSUIR A QUEM SE QUER!...
Recanto das Letras
> Autores > William Lagos
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