segunda-feira, 5 de junho de 2017






                               (JANE TARZAN)

JANE TARZAN &+ -- 21-30 ABRIL 2017
Novas Séries de William Lagos

JANE TARZAN I – 21 ABR 17

Jane Tarzan queria ser atleta,
as Olimpíadas vencer quadrianuais,
e até obteve sucessos corporais,
pretendendo virar campeã completa,

a vencer qualquer disputa em que se meta
e o fez nos jogos intercolegiais;
a universidade recebeu-a mais
por tal capacidade física que a afeta.

Ela vencia em luta livre e até em judô,
no atletismo os resultados excelentes,
ganhou medalhas mesmo em natação;

as Olimpíadas, porém, não conquistou,
foi superada por atletas mais potentes
nos pódios nunca a alcançar exaltação!...

JANE TARZAN II

Ela treinou com um afinco verdadeiro,
ganhando vários campeonatos estaduais,
jogos olímpicos a exigirem muito mais,
nenhum recorde conseguiu quebrar inteiro!

Nunca em corridas conseguiu chegar primeiro,
por já ser grande e pesada por demais;
dos treinadores as decisões bem consensuais:
“Ela é excelente, mas encontra um mais ligeiro!”

Sofreu assim só desapontamento,
medalha olímpica nunca conquistou,
porém um corpo muito belo modelou,

quase uma estátua de olímpico portento,
e aceitando algum convite, nua posou,
para escultor a trazer contentamento!

JANE TARZAN III

Conforme é praxe, nos anos mais recentes,
foi por ele muita vez fotografada
para a melhor pose ser selecionada,
mais uma vez, com resultados excelentes!

Ele a esculpiu em escalas surpreendentes,
imagens feitas com resina bem sovada,
como atleta fisicamente consagrada,
mas sem troféus por sucessos mais potentes...

Nova carreira então lhe propuseram:
ser modelo de revista masculina,
dessas que expõem cada parte nua e crua!

E como um bom dinheiro ofereceram,
aos tais vendeu a sua aparência feminina,
a sua vaidade assim expondo toda nua!

JANE TARZAN IV

Mas por tornar-se muito forte e musculosa,
foi preferida para o fisioculturismo,
vasto sucesso alcançando em tal modismo,
cada triunfo a torná-la mais ditosa...

E por sua robustez bem poderosa,
“Jane Tarzan” adotou, com preciosismo,
para seu Nome de Combate no atletismo,
um justo nome por ficar tão vigorosa!

As suas fotos hoje correm mundo,
até em série se mostrou como guerreira,
seios expostos de amazona em bege argila!

Porém despeito causou demais profundo
e nem Tarzan a escolheu por companheira,
sendo obrigada a se casar com um gorila!...

VATICÍNIO SEM VALOR I – 22 ABRIL 2017

Canto a explosão do prazer inexorável
que se obtém na conquista da mulher
a quem na vida se quis e mais se quer,
depois detê-la nos braços, incansável!...

De todo amor, este é o mais formidável,
que não se abrande o desejo e nem sequer
se o veja adiado por ocupação qualquer,
mas permaneça, dia a dia, inquebrantável.

Mas nunca inconquistável, por ser tido
nesse prazer de dois corpos engastados,
sem por qualquer outro alvitre superados,

apogeu novo a cada orgasmo conseguido,
sem que nada ultrapasse essa atração,
enquanto ainda nos bata o coração!...

VATICÍNIO SEM VALOR II

Não é apenas esse amor de um ano só,
que se costuma associar à lua de mel;
segue o dedo bem firme nesse anel,
oito membros em firmeza de cipó,

sem da inveja de um alheio sentir dó,
rodando a mó em faina diária no ariel,
por toda a vida sem achar outro quartel,
espirais doces igual que um pão-de-ló.

Nem o cuidado dos filhos no intermédio
corta essas horas reservadas para o amor,
puro desprezo e desdém por cada assédio,

novas vidas a produzir com abandono
nos mais aflitos instantes de estertor,
olhos nos olhos a despistar o sono.

VATICÍNIO SEM VALOR III

Por tanta gente é proferida a profecia
de que não possa amor assim durar,
que ainda se queira inteiramente o par,
ano após ano, em conubial orgia...

Nenhum de nós no vaticínio, porém, cria,
e repetiu-se essa experiência singular,
um contra a outra a repetir igual cantar,
sem que as décadas retalhassem a harmonia.

E não se diga, num impulso de descrença,
ser isto apenas romantismo em afirmação,
não mais que espasmos desta imaginação,

já que isto ocorre bem mais vezes que se pensa,
quando o amor supre a falta de desejo
e ainda explode tal e qual primeiro beijo!...

ESCULTOR DO VENTO I – 23 ABR 17

Não é poesia apenas frase redigida
a macular qualquer folha de papel,
nem pensamento, seja doce ou fel
que se recolha em ocasião perdida.

Não passam esses da marca recolhida
do raciocínio mais intenso que ouropel,
caleidoscópico, um arcano cromatel, (*)
reverberando no talhar dessa ferida.
(*) Multiplicação cromática.

Papel algum jamais pôde registrar
a infinidade de quanto nele é escrito,
quer seja um lindo som ou quer maldito,

na humildade pura e simples de aceitar
a humana alma que cada um expressa
e conservá-la como um guardião sem pressa.

ESCULTOR DO VENTO II

Mas a poesia não se prende nessa imagem:
são apenas os caprichos do cursivo
ou em letras de forma, redivivo
esse primeiro encontro na passagem

das letras do alfabeto, cada qual a simples pajem
para as ordens receber, ou arauto altivo,
a proclamar às claras ou em furtivo
registrar manso das formas da paisagem.

Das palavras não são mais do que elementos,
mas cada termo não é mais que a sugestão
dessas mil coisas que em tua mente estão.

Registra a página os teus sonhos desatentos,
que de outro modo seriam esquecidos
e quando lidos, raras vezes compreendidos.

ESCULTOR DO VENTO III

O que se escreve, por mais bem elaborado,
não é mais que um marca-passo de ilusão,
veias safenas reativando o coração,
o tempo morto em mortalha assim guardado.

Um sentimento em algo real falsificado,
que não se pode desenhar uma emoção,
mesmo no instante de sua palpitação
algo se perde – e o racional é o registrado.

Mas pouco importa o que sentiu o escritor
quando as folhas perfurou, ato imperfeito,
mas sim aquilo que de tais folhas brotará;

não vem da mão, mas da retina do leitor,
que à emoção de seu momento está sujeito
e tão somente o quanto sente entenderá...

ESCULTOR DO VENTO IV

Cada estrofe é um sopro só de vento,
feito umidade em sua expiração,
na fumarola de cada inspiração,
hálito apenas, não mais que seu alento,

pois tanta coisa se sente em tal momento
que as palavras nem sequer registrarão!
Não existe tempo para tal compensação,
teias de brisa em seu gentil contentamento!

Caso um escultor ataque a pedra fria,
com essa imagem que pretende registrar,
para trás deixará sempre o resultado;

o interpretar essa figura esgotaria:
mesmo que outrem ali fosse algo enxergar
a partir do próprio ego atribulado.

ESCULTOR DO VENTO V

Porém palavras não dependem de um buril
ou de um escopro em seu talho compassado,
que a escultura na pedra é o resultado
de uma paciente bordadura varonil.

Mui lentamente esse granito vil
cede ao escultor registrar seu sonho airado,
mas nada muda do que ali foi conservado,
salvo a pátina que lhe flui de olhares mil;

contudo a estrofe é muito mais volúvel,
pois sendo vento, escorre como aragem,
não é questão de paciência e nem de pressa,

antes que voe para o imponderável,
capturada com reticular coragem
dessa corrente que de fluir não cessa!...

ESCULTOR DO VENTO VI

Assim percebo ser do vento um escultor,
sendo a esfera da caneta o meu cinzel,
o vento um monge envolto em seu burel,
um testemunho, afinal, de seu pudor.

Porém do vento eu roubo o seu ardor,
ao menos quanto guardar posso no papel,
marcha perene sem retorno a meu quartel,
sobre mim paira em artimanha de condor!

Contudo, a escultura é imprevidente,
nessa esperança de obter o teu olhar
sobre esse pouco que aqui posso registrar;

sem ser poeta, nada mais que um impaciente
pela poesia revelar que existe em ti,
ressuscitada em tua passagem que eu nem vi!...

EUFÓRICA I – 24 ABR 17

Eu preferia que houvesse só outono,
esse tempo que desperta mais virtude,
quando um resto de verão ainda ilude,
sem que o calor se imiscua no meu sono.

A primavera me traz outro abandono,
um módico até mesmo de inquietude,
sendo a promessa de um verão mais rude,
em que a canícula domine sobre o trono.

Ao invés, o outono me anuncia o inverno,
um tempo que me traz maior estímulo,
gotas de névoa, de geada e de granizo,

embora o outono pareça-me mais terno,
que é nesse época que encontro o simulo
de um futuro bem mais firme que hoje piso.

EUFÓRICA II

Hoje sinto que o outono se anuncia
nos derradeiros espasmos destes abril,
minha garganta a abrir como um buril,
dela forçando o inesperado da harmonia.

De fato, sempre o calor me contraria
e quando ouço como encara o inverno vil
tanta gente, em seu terror tão feminil,
os seus lamentos fico a olhar com ironia...

Naturalmente, se parado, eu me enregelo,
porém basta que me ponha em movimento
e de minha testa já brota algum suor...

Assim do outono é que sinto mais apelo,
sem revestir-me de algum grosso integumento,
que após descarte por sentir calor...

EUFÓRICA III

Mas quando chega o final de cada ano,
justo na época em que o bom Papai Noel
vê-se obrigado a envergar rubro burel,
com bainhas de algodão, por puro afano

de imitar um setentrional arcano,
cujo gélido esplendor é mais cruel;
e lhe requerer escutar essa babel
de pedidos de crianças, sem engano,

é quando broto suor igual que o ator,
obrigado a gargalhar riso cordial,
na indumentária de seu cerimonial;

mas por sorte, ligo meu ventilador,
com um alívio que me dá certa euforia,
de meus dedos a escorrer tão só poesia!...

CIMITARRAS DE MARFIM I – 25 ABR 17

NÃO HÁ MOTIVO PARA SE NUTRIR PAIXÃO
E O TRANSITÓRIO BEM QUE ATRAIRÁ,
QUE BEM DEPRESSA SE DISSIPARÁ
NA NÉVOA PÁLIDA DA DESILUSÃO;

MOTIVO EXISTE PARA TEU CORAÇÃO
AMAR A QUEM AMANDO O BUSCARÁ,
QUEM PELO AMOR QUE DÁS O SEU DARÁ,
NUMA PARTILHA DE LONGA DURAÇÃO.

PORÉM É GRANDE A MARAVILHA DO MOMENTO,
POR MAIS QUE TRANSITÓRIO ASSIM NOS SEJA,
EM QUE A PAIXÃO NOS ESCOA PELOS DEDOS,

COMO ÁGUA E SANGUE, ETERNO MOVIMENTO,
SEMANA OU MÊS APENAS QUE SE ENSEJA,
NESSA CADÊNCIA INCONSÚTIL DOS SEGREDOS.

CIMITARRAS DE MARFIM II

TEU AMOR PARA MIM FOI INSTIGANTE,
FOI A AGULHA DE OURO QUE MINHALMA
IMPELIU PARA A FRENTE, FOI A PALMA
QUE TRANSFORMOU-ME A VIDA EM UM INSTANTE,

TEU AMOR A REFLETIR NO MEU SEMBLANTE
A PURA EXALTAÇÃO, A LUZ QUE EMBALMA,
DO GÉLIDO SUDÁRIO A ESTRANHA CALMA
E ROMPEU-ME AS LIGADURAS EM ELEGANTE

INSPIRAÇÃO SONORA DE UM MOMENTO:
MESMO FORÇADO AO EMPUXE DA CARRUAGEM,
ROMPEU-SE A CALMARIA E ASSIM CONSIGO

MANIFESTAR O MEU DESLUMBRAMENTO
NESSA IMENSA COVARDIA DA CORAGEM
DE REVELAR AO MUNDO O QUANTO DIGO.

CIMITARRAS DE MARFIM III

PARTE CONSTANTE DA POESIA SÓ A INCONSTÂNCIA,
QUALQUER OLOR, LAMPEJO OU MOVIMENTO,
O FARFALHAR DE FOLHAS SECAS SOB O VENTO,
A ÁGUA QUE BORBULHA NESSA INSTÂNCIA

EM QUE SE PISA A SERAPILHEIRA QUE BALANÇA,
DE UMA POÇA A OCULTAR O IMPEDIMENTO,
OS PÉS MOLHADOS EM BREVE DESALENTO,
FUGAZ FRIOR QUE ATÉ A ESPINHA ALCANÇA.

QUALQUER COISA INESPERADA NOS ATIÇA
E DE ALGUM PONTO DO CORAÇÃO NOS TIRA
UM FRÁGIL VERSO PARA NOVA LIÇA...

E QUE DIZER, ENTÃO, DE UMA EMOÇÃO
QUE O OLHAR PERFURA E A MENTE NOS DELIRA,
NO ESPECTRAL ARREMEDO DA PAIXÃO?

CIMITARRAS DE MARFIM Iv

TEM CORTE AGUDO, FEITO CIMITARRA,
MAS NÃO SE ATÉM A ABRIR FERIDA ASSIM,
QUE AMOR PAIXÃO É FEITO DE MARFIM
E NÃO DE UM AÇO FRIO DE FINA GARRA;

MAIS QUE CORTAR O PEITO, ELA SE AMARRA,
RASGANDO EM VOLTA AS FLORES DO JARDIM,
NUM AMOR QUADRICULADO DE ARLEQUIM
QUE SE DISSOLVE EM CANÇÃO DE PURA FARRA!

MAS AI DE QUEM SE ENTREGA A TAL DELÍRIO,
ALGUM PERFUME RESTANDO SOBRE A PELE,
PORÉM NA ALMA SE INSTAURANDO A CICATRIZ,

EM BREVE EXTINTO, IGUAL QUE RUBRO LÍRIO,
FERIDA FUNDA QUE O PENSAMENTE GELE
TODA A ESPERANÇA QUE ALI DEPOR SE QUIS!

VENTANIA I – 26 ABR 2017

Se houvesse amor em cada sentimento
que por preguiça é assim classificado,
seria o mundo um vale alcandorado,
no qual só felicidade teria assento.

Mas esse termo, “amor”, esse portento
que os olhos enche e o coração sagrado
deixa de luz e som, condecorado
desses troféus de desvario e encantamento,

é apenas máscara para o facho de emoção
desencontrado e vário; até o ódio,
por mais contraditório na aparência,

por mais que te enegreça o coração,
encontra seu lugar no alto do pódio,
no espocar de champanha da impudência.

VENTANIA II

Não deveria ser assim; contudo
o amor é um sentimento bem egoísta;
quando amor-próprio no coração se enquista
é para si que envida por ter tudo;

e quando é amor por outrem, não me iludo,
por maior o assanhamento quando avista,
pouco mais é que o assombro da conquista,
seja aleatória ou angariada com estudo.

E quando amor com outro amor se paga,
serão dois contra o mundo, indiferentes
ao que desejem os outros que os rodeiam,

que amor apenas em outro amor se afaga,
amortalhado em róseas nuvens transparentes,
sem se importar com os ódios que incendeiam.

VENTANIA III

Pois já foi dito – e com excesso de frequência
que quando a dois o amor torna felizes,
a seu redor se multiplicam infelizes,
ao menos um! -- a sofrer dessa impotência.

Não tens então para ti a redolência,
nem o olhar de amor que mais precises,
movediça toda a areia que assim pises,
na tentativa de o tomar em vã ardência.

No real amor não coexiste caridade:
só dois se amam e nem a deve haver,
que a natureza prendeu-os em armadilha,

sem que a possamos esperar, em ingenuidade,
que amor é egoísta e descarta outro dever,
aos mais deixando para trás na trilha...

VENTANIA IV

E sempre existe essa possibilidade
de que não seja verdadeira a sua tristeza,
não mais que inveja em toda a sua vileza
do que parece alheia ser felicidade.

Se te abalanças a demonstrar piedade,
teu próprio amor sofrerá certa incerteza,
quem te acompanha a mostrar menor beleza,
em seu olhar algum despeito e até saudade

dessa certeza de seu amor egoísta,
amarfanhada em parte a sua conquista,
vendo alguém mais em teu peito ter lugar,

nessa tolice disfarçada de bondade,
sem tornar o outro feliz, na realidade,
ao ver a mágoa de quem quis te acompanhar.

VENTANIA V

Que seja assim, portanto, amor egoísta,
o seu dever é obedecer à natureza;
os animais no cio vão, com certeza,
travar combate em sua ânsia de conquista.

Mas entre nós, quando um casal se avista,
é de esperar-se que um da outra seja a presa,
não que a reparta por estranha gentileza,
nem matar outrem que em interferir insista,

que o amor egoísta apenas se reparte
com o certo resultado desse amor,
da natureza satisfeitas as exigências,

cada filho a receber do amor a parte
que lhe compete, em seu ninho de calor,
dos pais ganhando alimento e conveniências.

VENTANIA VI

Mas admito que, em certas sociedades,
que a morte ronda sem menores dós,
tal como era entre os antigos esquimós,
partilha possa haver de intimidades,

força buscando nessas variedades,
nos seus iglus, em isolamento sós,
algum instinto atando ali seus nós,
valor nos gens de diversas validades;

ou como hoje, ainda em plagas africanas,
imposta a cada mulher circuncisão,
para que o sexo não lhe dê prazer,

alugadas por suas práticas levianas,
sem amor, não mais que obrigação,
a que a mulher se entrega por dever.

SÃO BARTOLOMEU 1 – 24 AGO 1981

Nascido de mulher, igual como tu és,
Eu tenho teus suores, teus medos, teus receios,
Sou vesgo como tu: zumbaias, devaneios
Compõem-me a liturgia das mais perdidas fés.

Nascido eu sou do esperma, nascida és tu também,
E o mesmo ovulejar repete a nossa vida
Falópico trajeto, na trompa adolescida
Ao útero saltar, em nosso amor que vem

Tanger-se de placenta em plena madurez,
Nutrir-se em alheio sangue, de alheia fluidez.
Nos anos que assemelham, em seu nutrir de feto,

O mesmo sonho humano fervido no embrião,
Que a nós nos refecunda, em tangencial afeto
E à morte nos expulsa ao fim da gestação.

SÃO BARTOLOMEU 2 – 27 ABR 17

Esta data fatídica evoca maus eventos.
Talvez de todas a maior carnificina,
Ocorrida na França, por razão beneditina,
Massacre impuro desses dias turbulentos.

Conforme registrado nos históricos assentos,
O Almirante Coligny ali enfrentou sua sina,
Traiçoeira morte da adaga que assassina.
Com milhares de huguenotes em tais momentos,

Quando essa igreja de católica chamada
Pretendeu exterminar os protestantes,
Pelo perigo à sua riqueza e a seu poder,

Sem religião de fato ali invocada,
Mas só desculpa para os atos infamantes,
Cobiça e inveja no mais puro malquerer.

SÃO BARTOLOMEU 3

Também entre nós a tragédia aconteceu:
De Getúlio Vargas assinala a morte,
Oficialmente por um suicídio o corte,
Mas na verdade, outra coisa sucedeu,

Que ao interesse dos corruptos ofendeu,
O que lhe acarretou a dita sorte,
Pela mão de apaniguado que lhe aborte
A vida ínclita pelo rancor que o acometeu.

Tal qual se afirma, o velho Presidente
Não estava implicado em Mar de Lama,
Como foi então chamada a roubalheira;

E a tal carta, que se reproduziu frequente,
Foi pela mão de sua filha, se proclama,
Escrita um dia pela vez primeira!...

SÃO BARTOLOMEU 4

Contudo ocorre, em São Bartolomeu,
Igual que em todos os demais dia do ano,
Esse massacre que vem do tempo arcano,
Nessa explosão de cada esperma que verteu,

A cada vez que algum orgasmo sucedeu,
Tantos milhões a ser lançados em afano
Os soldadinhos da vida em jato humano,
Dos quais, com sorte, apenas um sobreviveu!...

Os nossos gêmeos morreram nascituros,
Sem receberem túmulos nem preces,
Sonhos lançados ao esgoto, simplesmente,

Talvez perdidos nossos gens mais puros;
Talvez por causa disso ainda padeces
Pelo remorso a afligir sobrevivente...

SÃO BARTOLOMEU 5

Esta a razão para a escolha deste santo,
Que como mártir realmente padeceu:
Morte terrível que a tradição nos deu,
Sendo esfolado vivo, em algum recanto

Da terra asiática do Daguestão, um tanto
Discutido por quem tal lenda descreveu,
Pois foi a Europa Oriental que converteu,
Antes de a vida perder com o carnal manto.

Horrível morte, por certo, e dolorosa,
Porque obrigavam a correr o esfolado,
Até seu sangue ser inteiro derramado,

Mesmo a lama mais macia a ser penosa
(E em certa igreja afirmavam ter guardado
Seu pele inteira, qual relíquia tenebrosa!...)

SÃO BARTOLOMEU 6

Não é, pois, de espantar que este martírio
A portentosas tragédias desse origem,
Se bem que tantas a humanidade afligem,
Em seu tétrico registro de delírio.

Quantos infantes pereceram como um lírio
Pelas moléstias que nos berços os afligem!
Quantas crianças ao sepulcro se dirigem,
Vidas mais breves que a chama de algum círio!...

Segundo afirmam, ele é o Natanael
De que registra a longa conversação
Tida com Cristo, o Evangelho de São João,

Enquanto outros lhe atribuem vida fiel
Por ser o cego Bartimeu, que foi curado,
Tornado apóstolo pelo dom que lhe foi dado.

A ÚLTIMA RIMA I -- Wm. Lagos, 28 AGO  96

O velho ergueu-se e acendeu sua lâmpada
Por entre as sepulturas; toma a enxada
E lentamente move a espinha arqueada
E a terra fende, expondo a campa da

Mulher que um dia fora desejada;
E agora jaz imersa sob a tampa da
Morada última, derradeira rampa da
Vida enfim, ao gozo consagrada;

E, pá a pá, a terra é retirada,
Expondo os restos quase inexistentes:
Um crânio alvo e as tranças comoventes

A superpor-se às órbitas vazias;
E, num suspiro, as guarda em salmodias
Do amor que já se foi e agora é nada.

A ÚLTIMA RIMA II – 28 ABR 2017

Talvez quisesse de si guardar mais perto
Esses restos pelos vermes devorados,
Que exumados, seriam então lavados
De qualquer resto de terra mais incerto.

Que não lhe fora permitido é quase certo.
Por que à noite os páramos assombrados
Iria enfrentar, vinte espíritos penados,
Na escuridão, a percorrer solo deserto?

Por que não o fazer durante o dia,
Assistido nesse afã pelo coveiro?
Ao esqueleto não possuiria direito?

Qual o drama de amor que o levaria
Da sepultada a perturbar o paradeiro,
Em seu gentil, porém macabro feito?

A ÚLTIMA RIMA III

Decerto a morta a algum outro pertencia
E nesse desventrar da terra fria
Queria ter o que em sua vida não podia,
Nessa morte que a ossamenta permitia...

Nesse triste cemitério de campanha,
Corpos deixados à sempiterna sanha
Desse barro que, afinal, nos acompanha,
Que tanto sangue coagulado banha...

Depois dos olhos verem tanta morte,
Ou a morte velha ou inesperado corte,
Nessa certeza da mais incerta sorte,

Superstição seu medo não arrima,
Guardada apenas a ânsia peregrina
Desse arcabouço em derradeira rima...
 
A ÚLTIMA RIMA IV
 
Este ritual, por romântico que fosse,
Seria impossível, caso houvesse cremação,
Roubada a urna, sem haver confirmação
De realmente das cinzas tomar posse;
 
Da madeira, carvão, óleo que a engrosse
Encontraria bem maior composição;
Assim no Ganges se faz a projeção
Que lega ao mar o pó que ao mar adoce.
 
Mas há poesia nesta farsa benfazeja
Que ouvi contar enquanto adolescente
Sobre o amor de um peão pela senhora,
 
A quem possuir somente a morte enseja,
Em redondilha de um esquecer crescente
E que aqui busco resgatar de meu outrora.  

CASAIS I – 17 fev 1981

Não basta a meu cantar de mariposas,
falenas ou libélulas vibrantes.
Cantar de grifos vou, de cintilantes
acoplares dos ventos -- por esposas

as mágicas doçuras das florestas,
o sibilar das ondas por madeixas,
por olhos de estertores, duas ameixas,
faunos e ninfas, nas mais doces festas.

Na cópula dos ventos, sem segredos,
Na cópula dos montes, frescos dedos,
da geada sobre as fendas dos penhascos;

priápicos coqueiros em degredos,
E a natureza toda, quase em ascos,
pela estéril pureza dos penedos...

CASAIS II – 29 abril 2017

“Crescei e multiplicai-vos!” – é o que diz
o mais antigo de tantos mandamentos
que Jehovah proclamou nos versos lentos
daquele Gênesis que Moisés redigir quis.

“Enchei a Terra e sua plenitude!” – som feliz,
recolhido algum dia nos portentos
da sarça ardente ou nos fulgores bentos
sobre o Monte de Sinai a explodir giz.

Por isso a vida se expandiu do mar
para nas praias acoplar róseas areias,
depois subindo, a pouco e pouco, pelas dunas,

as algas contribuindo para o ar
tornar viável para as verdes veias
e para o sangue vermelho em que te enfunas.

CASAIS III

Eventualmente os priápicos coqueiros
as suas estipes ergueram desde o solo,
novas mudas a brotar de cada colo,
para seus brotos vegetais hospitaleiros.

As gimnospermas, quais gigantes altaneiros,
os seus estróbilos dissipando sem consolo; (*)
de coníferas s chamam e sem dolo
são os pinhões cozinhados nos terreiros.
(*) Cones.

As angiospermas, com multidão de flores
para mais fácil difundir as suas sementes
e mais os frutos de polpas deliciosas;

plantas casais ou plantas sem amores,
perante o pássaro e a abelha onipresentes,
enchendo a Terra com mil verdes, caudalosas.

CASAIS IV

E em seu devido tempo, os animais,
igualmente oriundos desde o mar,
seus casais já preparados para amar,
sem o egoísmo brotativo dos corais.

Alguns se expandem de formas naturais,
após o ovo mole ou duro se mostrar,
ao macho apenas a função de derramar
sobre as ovas seus espermas seminais.

Depois, enfim, da cópula a invenção,
algum probóscide a desvendar receptáculo,
lançando o sêmen direto em seu lugar,

vermes e ofídios, dos insetos profusão,
então as aves em arco-írico espetáculo,
batráquio e sáurio sobre a Terra a dominar.

CASAIS V

E de repente, em nova mutação,
já encontramos dos mamíferos a coorte,
a partilhar dos vegetais a sorte,
ao devorá-los, nova vida em gestação,

nesta intrincada e ecológica função
que os pessimistas encaram como a morte,
mas na qual quem devora é só consorte,
novos esporos a espalhar em profusão.

E bem no fim, exsurge o ser humano,
mediante inesperado encadeamento,
formando o cérebro de cinza cortical,

para tornar-se sobre todos soberano,
através de longo esforço e sofrimento,
para cumprir o mandamento consensual.

CASAIS VI

E assim se expande, até pelos penedos,
pelas areias inconstantes dos desertos
e pelos campos de neve, sempre abertos
do vento ao sopro gélido dos dedos.

Hoje proclamam alguns, talvez com medos,
quiçá por pura malícia recobertos,
a inveja firme em corações incertos,
que o ser humano provocou vastos enredos,

não somente ocasionando as extinções,
porém a interferir no próprio clima,
na pretensão de um desconhecimento.

sem haver humanos a extinguir mil gerações,
a que a tribo dos sáurios já se inclina,
pelas periódicas oscilações do aquecimento.

MURMÚRIO I – 26 FEV 1981

Teu púbis é uma flor de negras alcatifas
Forjadas em botão, de carnação rosada
E as frases que murmuras, aos beijos apressada,
São hera e musgo azul, nessa imortal carícia.

A mim se me afiguram raízes, castas hifas
A trescalar aromas, vingança delicada,
Que faz por demonstrar ternura consagrada
Na mesma e verde ausência, em triunfal malícia.

Não sabes como o beijo a mim transtorna e dói,
Talvez melhor me fora que beijo algum gozasse,
Que ter os teus apenas tão raros e roubados;

Que o gosto de teus beijos ao coração me rói,
Pois tanta vez quisera nos braços te enlaçasse,
Quão raras são as vezes quedamos enlaçados...

MURMÚRIO II – 30 ABRIL 2017

Guardo memórias de um arcano romantismo,
Que para outros ser tolice pareciam:
Qualquer abraço casual que os lábios viam,
Que outros diriam não ser mais que lascivismo.

Mas cada amplexo ainda recordo em saudosismo,
Especialmente os que bem pouco repetiam,
Hoje impossíveis, pois os fados já atingiam
Em corte firme, os velhos corpos por que cismo.

O tempo passa e a cada dia o dealbar
Nos traz noticias que preferiríamos não ter,.
Das companheiras ouvir contar o falecer,

Outras vivendo hoje em asilo ou lar...
Mas não consigo os velhos beijos esquecer,
Mesmo os que sei nunca mais poder buscar. 

MURMÚRIOS III

E quantas foram as rosas delicadas
Que a mim se abriram sem pudor nem pejo!
Ventres macios em cem dotes benfazejos,
Porém de mim tão brevemente separados!

Outros talvez até chamassem de pecados
A tantos atos de amor de tais ensejos,
Mas as lembranças me retornam em adejos
E se pecados foram no antanho praticados

Foram somente por não haver repetição,
Que os corpos amorosos dessas flores
De minha abelha não guardassem o ferrão

Em algum escrínio, para repetir amores
Ou que eu mesmo descartasse outra ocasião
De novamente desfrutar de seus ardores.

MURMÚRIO IV
 
Mas se os chamo de murmúrio é que hoje escuto,
Contra os lóbulos da orelhas sussurrado
Esse convite a repetir-se alado,
De que não posso conseguir novo usufruto.
 
Apenas lembro do mandamento arguto
Que toda a vida busquei ter respeitado;
Mesmo que algum cumprimento haja falhado,
Seus beijos guardo no meu peito hirsuto...
 
Bem mais perdi pela falta de ocasião
Ou pelo medo de assumir um compromisso
De que por ver no amor algo de errado.
 
Pelas raízes que lancei em brotação
Somente posso me orgulhar e atiço
Ainda a alma em cada verso terminado...

ASSOMBRO I – 05 set 1979

EU DESTRUÍ UMA VIDA NA RATOEIRA:
UM POBRE CAMUNDONGO ACINZENTADO,
CUJO SANGUE POR MIM FOI DERRAMADO
NUM SEM-RAZÃO CRUEL, POR BRINCADEIRA.

TÃO LOGO ME DESFIZ DO CORPO QUENTE
INDA PULSANDO QUASE DE UMA VIDA,
NA CASUAL BUSCA DE OUTRA DESVALIDA,
ARMEI DE NOVO O ARDIL INDIFERENTE.

FICO A PENSAR: SERÁ QUE NÃO TE OCORRE?
A TI E A MIM IDÊNTICA ARMADILHA
ARMARAM-NOS OS DEUSES, NA PARTILHA

INDIFERENTE À SORTE DE QUEM MORRE:
ISCA CHEIROSA É O SONHO QUE REBRILHA
E AMOR SENTIR É O RISCO QUE SE CORRE!...

REPASTO I - 20 SET 78

A MASSA SEM TEMPERO, TÃO SINGELA,
FEIJÃO COZIDO À MODA BRASILEIRA,
GERADO LENTAMENTE NA PANELA,
EM GESTAÇÃO DIÁRIA E CORRIQUEIRA.

ARROZ UNINDO TUDO QUAL FERMENTO,
DO BANQUETE FRUGAL MEIGO OPERÁRIO,
QUE A ESPOSA COM TERNURA E SENTIMENTO
PREPARA DA COZINHA NO SANTUÁRIO.

ALFACE VERDE A MIM PREDESTINADA,
DA HORTA COM CARINHO TRANSPLANTADA
E MISTURADA A AZEITE E CONDIMENTO,

REGADA A VINHO E PRESTES OLVIDADA,
IGUAL À COMUNHÃO, HÓSTIA SAGRADA,
QUE A ALMA DEVORA E ESQUECE NUM MOMENTO.

SIDDHARTA I – 22 set 78

Que o verso descreva a visão do Mandala!
Foi sonho de um dia, avatar delirante,
Olvidado o Nirvana e, no ardor palpitante,
Apegado a esta carne que aroma trescala.

Que Durga e Parvati curvassem-se a Kali!...
E exaltado e sublime este pobre saddhu (*)
Se entregasse à visão triunfal deste nu
E perfeito exemplar -- dançarina de Bali!...
(*) Asceta no hinduísmo ou janainismo.

Kundaline ressurge e em suas curvas me prende (*)
E o mesmo derviche o chamado já atende,
Desatento do Buddha, esquecido do Brahma.
(*) A serpente da vida.

E na arcana espiral, ele é tudo, ele é Shiva!...
E ela freme de ardor, mahadeo!... -- ela é diva,
Num mandala de sangue esguichado na cama!...

INSIGHT I – 10 fev 2006

There were reasons involved that shouldn't
Allow a friendship into romance
To develop, as she rather well wouldn't
Let herself asked again to dance

The same old tune from her grievous past.
The same sorrows wake, yes, the same
Wounds reopen that once had messed
So much with her mind, all that blame,

All that guilt, all her self-reproach,
The lack o' self-esteem, the bitterness
Of abandonment, unhealthy approach

To an early life...  and yet, above all,
That other love enwreathed in sadness
Whose sweet moments were best in her recall.

William Lagos
Tradutor e Poeta – lhwltg@alternet.com.br
Blog:
www.wltradutorepoeta.blogspot.com
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