ODALISCAS
DA MENTE &+ Novas
Séries de WILLIAM
LAGOS 4 a13 de Setembro de 201717
ODALISCAS DA MENTE i a IV -- 4 SET 17
TEIAS DE HURIS I a IV -- 5 SET 17
REMINISCÊNCIA I a IV -- 6 SET 17
PARADA TEMPORAL I a IV -- 7 SET 17
AMOR SECRETO I a IV -- 8 SET 17
RABISCOS I a III -- 9 SET L7
SOMBRAS SECAS I a v -- 10 SET 17
SONHO EM VERRUGAS -- I a
III -- 11 SET 17
ROUBANDO TEMPO -- I a IV -- 12 SET 17
SUMMERTIME IN LONDON -- I a III -- 13
SET 17
(Odalisca com Escrava, Auguste-Dominic Ingres, 1842)
ODALISCAS
DA MENTE I -- 4 SET 17
Do
conhecimento é a cadeia em que me insiro,
herdeiro
humilde de muitas mutações:
ganhei
de Homero as épicas canções
e
de Arquimedes a ciência sempre miro;
porém
é mais entre os Romanos o meu giro:
de
Cícero ainda aprecio as exortaçoes
e
dos Plínios as mais antigas citações,
entre
poemas e ciência a mente firo;
porém
do Iluminismo é que prefiro
as
primeiras notações de sua ciência,
pesquisas
e indagações naturalistas,
contudo,
do Medieval eu me retiro,
da
hilaridade de sua presciência,
raciocinada
pela marcha dos cientistas.
ODALISCAS
DA MENTE II
Durante
o medioevo os alquimistas
perseguiram
odaliscas de metal,
em
seu ácido desejo imaterial
de
vida eterna ou tesouros em conquistas.
Elas
dançavam em vaporosas pistas,
sem
nunca se entregarem no final;
como
eunucos tais magos, afinal,
só
as contemplavam no clarão das vistas.
Então
mudavam a hora, o dia ou o mês,
enaltecendo
do zodíaco a alvorada,
que
esses astros lhes trouxessem namorada,
sem
que dessas oficinas em que os vês
fossem
às ruas, em busca de carinho,
dedos
lambendo na acidez de seu cadinho. (*)
(*)
Recipiente para derreter metal.
ODALISCAS
DA MENTE III
E
as contemplavam, centelhas de ilusão,
nas
experiências esperando ter sucesso,
desde
que a vida pagassem como preço,
o
Sol e a Lua companheiros de ocasião,
a
derrubarem mentais grades de prisão,
seguindo
os métodos de Celso com apreço;
local
não importa, só importa o endereço
da
hora exata em que os planetas são
os
mais propícios em sua exata conjunção,
que
então da lâmpada um gênio fluirá
ou
a água em bênção se transmutará,
sem
que o Ascendente lhes dê a precisão,
sendo
o chumbo em ouro transformado
ou
o corpo velho em jovem transmutado!
ODALISCAS
DA MENTE IV
E
as odaliscas revoavam pela mente,
a
um ponto tal que no exterior se viam
seus
vultos ondulantes em que criam
da
comissura dos olhos no presente.
E
assim confiava essa raça ardente
e
aos consulentes alguns deles diziam
os
futuros possíveis e os gerariam;
que
por magia a sua vitória se apresente.
Tais
promessas do futuro como iscas,
muitos
deles, sinceros charlatães,
honestamente
seus horóscopos traçavam,
porém
os signos eram apenas odaliscas,
riscas
de luz bailando em suas paixões,
enquanto
os sonhos fugidios vislumbravam.
TEIAS
DE HURIS I -- 5 SET 2017
Não
percebo por que sonhar não possa,
ao
mesmo tempo que trabalho em vão,
de
um pensamento alheio em tradução,
escorrendo
por mim, sem deixar mossa.
Porém
encaro tais sonhos como troça,
não
mais que devaneios sem razão,
nunca
confiando em tal expectação:
qual
seu vigor na realidade nossa?
Contudo,
esse direito eu me concedo,
de
mastigar diariamente sonhos de ouro,
no
cerebral a tecer tapeçarias...
Apenas
para mim guardo o segredo,
são
sonhos meus e mostrar o meu tesouro
seria
o mesmo que lançá-lo a zombarias...
TEIAS
DE HURIS II
Se
Muçulmano eu fora, hurís teria
ou,
pelo menos, é um preceito do Alcorão,
formosas
virgens em total disposição,
depois
que a esse outro mundo passaria!
Bem
mais tênues promessas me daria
a
Teologia prometida a algum cristão,
harpas
e asas, fraca a imaginação,
bem
diferente tal Éden me seria!...
Poucos
se animam a descrever o Paraíso,
salvo
em teor indefinido e abstrato;
aos
ignorantes, com menor recato,
um
lugar de diversão e alegre siso,
naturalmente
sem presença das hurís,
bem
diversa a mensagem que nos diz!
TEIAS
DE HURIS III
Se
Bramanista eu for, reencarnação
na
antiga roda, Sansara, eterna escala,
labirintino
esplendor de uma mandala,
em
cada vida a se cumprir nova missão.
Até
este ponto, também lhes dou razão,
porque
a voz da consciência não se cala,
que
missão deva realizar sempre me fala,
não
de minha escolha, mas de ordenação.
Mas
nem por isso se torna meu destino,
que
escolhas tenho, eu mesmo toco o sino,
com
indolência ou determinação.
São
todos sonhos, afinal, nevoeiro fino,
mas
que seria de meu coração,
se
não o pudesse envolver nessa ilusão?
TEIAS
DE HURIS IV
Com
tapetes de Aubusson eu sonharei,
mil
artefatos de Arte Nouveau,
sem
esquecer, porém, de quanto sou,
eu
sonhos de Lalique abraçarei...
No
travesseiro macio não viverei,
nem
sobre um piso modelado em Art Decô;
nessas
esteiras simples em que estou
a
minha tarefa diária cumprirei.
E
ai de quem de seu sonhar se esquece!
Ou
nele deixa esmaecer o seu viver,
que
o Paraíso não se atinge só por prece;
permeio
ao sonho, a vida se emudece
e
no labor o sonho pode-se esquecer;
pois
sonho em sono, sem que viver não cesse!
REMINISCÊNCIA
I -- 6 SET 2017
Com
o tempo a memória é transformada,
lembrança
apenas da última lembrança;
quem
demais pensa em tempos de criança
torna
sua infância pouco a pouco transmutada.
Alguns
aos poucos a têm glorificada,
esquecendo
seus castigos e a lambança;
as
doenças e as feridas, numa dança,
são
afastadas e alfim se fazem nada.
Ou
ao contrário, as más recordações
se
digladiam por domínio da consciência
e
o que de bom viveram se desfaz,
memória
sendo tão apenas coração,
nossa
índole de bom-humor ou malquerença,
tela
pintada que diariamente se refaz...
REMINISCÊNCIA
II
Já
outra coisa é voltarmos ao passado,
para
vê-lo novamente transcorrer,
mas
mesmo assim, melhor seria querer
que
fosse antes do prazer antecipado
que
tivéramos certeza do gozado,
ao
invés desta incerteza do viver
e
que ao chegar finalmente esse poder,
visitássemos
de novo o bem amado.
Mas
se esse ciclo refletido no insondável,
por
delícia recordada em tal momento,
nos
invocasse, quiçá, aborrecimento?
E
se voltássemos a um presente pouco amável,
conosco
a transportar apenas tédio
dessa
lembrança submetida a assédio!
REMINISCÊNCIA
III
Sabendo
embora que muitos querem reviver
seus
períodos de infância e adolescência,
eu
não o quero -- só me dá impaciência
essa
lembrança do passado em meu sofrer.
Só
quereria esse tempo perceber
em
que uma estrela de vaga incandescência
cortou
dessa ampulheta a transcendência,
que
não dá margem a seu interromper.
Que
então pudesse saborear um beijo
por
um tempo de infindável duração,
ao
conservar um corpo entre meus braços
e
não apenas rememorar o ensejo
nos
longos dias de tediosa encenação
em
que aos poucos esmaecem-se teus traços...
REMINISCÊNCIA
IV
Mas
os atos repetidos se misturam,
mil
instantes de amor se superpõem,
das
refeições os gostos se antepõem,
dos
passeios as datas não perduram;
restam
lembranças que, às vezes, nos torturam
ou
essas outras que a confiança nos repõem,
as
que menos nos marcaram se pospõem,
enquanto
algumas das piores se depuram.
Mas
se buscar tão somente aquele beijo
de
um ente amado, que não se repetiu,
como
se doura tal lembrança azinhavrada!
Lembrança
apenas do singular ensejo,
olhos
fechados, quando um rosto mal se viu,
salvo
o sabor e o cheiro em revoada!...
PARADA
TEMPORAL I -- 7 SET 17
Pudesse
o tempo retomar seus dias,
provavelmente
seria até desagradável,
igual
que um banho tornado incontrolável,
depois
que as águas se fizessem frias
e
continuando assim em tais porfias,
inversa
espuma do sabão, inabalável,
subindo
pelo rosto, no incontável
aspirar
de seus filetes, afogarias!...
De
modo igual, que um verso já escrito
corresse
para trás e desfizesse,
perante
nossos olhos, seu condão!
Ou
que a tela ou papel assim descrito
todo
o nosso vigor nos rejeitasse,
no
reverter de toda a inspiração!...
PARADA
TEMPORAL II
Mas
se o tempo parasse, então seria
pior
ainda, estátuas sem desvelo,
entre
sons mudos o coração de gelo,
ver-se-iam
cores, porém sem harmonia,
porque
o próprio pulmão nos pararia
e
qualquer percepção de quanto é belo
esvoaçaria
sem derradeiro apelo
e
todo o amor da vida mataria!...
Igual
seria que a paz da sepultura
contudo
estando vivos e o calor
de
nossos corpos jamais se dissipasse,
sem
ao menos sentirmos a amargura
que
faz parte integrante de um amor,
que
nesse estático momento se esgotasse!
PARADA
TEMPORAL III
Se
fosse o tempo para trás, seria
primeiro
o esvaziamento dos pulmões
antes
de enchê-los -- e nossos corações
dando
inversão ao sangue que corria,
em
que as válvulas tal retorno trancaria,
oxigênio
roubando sem perdões,
venenos
a espalhar-se em profusões:
pereceríamos
nesta invertida orgia...
De
modo algum nos serve esta inversão:
as
imagens do olhar se apagarão
até
que toda a melodia se acabara;
e
maior ainda seria a perversão:
pois
cada amor em que o corpo se inflamara
só
lembraríamos quando já terminara!
PARADA TEMPORAL IV
Este
seria o triunfo da entropia:
quando
o tempo nos corresse pelo inverso,
todo
alimento em energia converso
rapidamente
se dissiparia!...
E
todo o adubo se recolheria
aos
intestinos de que fôra disperso,
a
terra seca em tal pendor perverso
e
enfim, a vida toda acabaria!...
Assim
corridas nossas vidas para trás,
sofrendo
o atroz pavor do encolhimento,
nos
tornaríamos crianças e nenês!...
Voltando
ao ventre... e a gravidez desfaz
ao
ver do sêmen seu recolhimento,
até
sumir-te o quanto agora vês!...
AMOR
SECRETO I -- 8 SET 17
Para
muitos, amor é igual que mariposa:
de dia
se esconde, só surge ao anoitecer,
quando
há intenção de amor sexual fazer
e só
então se requesta amante ou esposa.
A noite
é tida por mais esplendorosa,
em
segredo sob a lua mais prazer,
na
escuridão o adultério a cometer
ou
mesmo o permitido mais gostoso!...
Por
isso, uma visita feita às claras,
seja de
tarde ou mesmo de manhã,
qualquer
suspeita dilui em confusão,
ações
de amor julgadas ser mais raras
no
intermédio do labor ou de outro afã
e é
natural bater-se à porta na ocasião...
AMOR
SECRETO II
Contudo,
quando alguém pratica a sesta
e a seu
lado se deita esposa ou amante,
é bem
comum seu prazer levar por diante,
quando
em braços um do outro fazem festa.
Após a
refeição, fazer amor "não presta",
que
esse "esforço" sexual é delirante:
pode
causar "congestão" um tal instante
ou um
"derrame", assim o povo atesta.
Um tal
problema, contudo, eu nunca tive,
que
muitas centenas de vezes fiz amor,
após o
almoço, sem sofrer qualquer revés
e meus
orgasmos cintilantes não contive,
já de
noite a repetir igual ardor,
sem que
a semente "se acabasse" dessa vez!
AMOR
SECRETO III
Assim
se contradiz mais uma lenda:
a de
que existe só um certo suprimento;
com
muito sexo, há de chegar momento
de
esgotar-se o produto dessa prenda...
Talvez
esta assertiva o povo venda
considerando
da menstruação o alento;
de
fato, a ovulação, em seu portento,
tem um
limite que à gestação atende.
Mas
certamente a semente masculina
por
muitas décadas bem se reproduz,
mesmo
que sofra de menor potência,
quando
alguns espermatozóides têm a sina
da
morte prematura antes da luz,
mas sem
que isto diminua a sua frequência!
AMOR
SECRETO IV
Os
tempos mudam e hoje a liberdade
é bem
maior que em tempos de minha infância
e nas
"baladas" se pratica com constância
sexo
oral, sem qualquer dificuldade!
E outra
lenda se espalha, de inverdade,
que a
semente deglutida nessa instância
não
provoque de DSTs contaminância (*)
e assim
procedem na maior tranqulidade!
(*)
Doenças Sexualmente Transmitidas.
Já que
esta prática hoje está na moda
e
muitas vezes se faz abertamente,
e nas
reuniões de jovens é ingrediente!
E sem
falsa moralidade nesta roda,
que
também nisso empreguem "camisinha",
ante a
armadilha que de tantos se avizinha!
RABISCOS
I -- 9 setembro 2917
A
maior parte dos versos que hoje escrevo
me
brota de lugares que nem sei localizar,
mas
me é preciso constante acompanhar
esse
murmúrio que sob as unhas levo.
Mas
sobre mim escrever pouco me atrevo,
bem
mais difícil eu acho me expressar,
sem
Dionyso para as frases sussurrar
e
me informar quais rabiscos grafar devo.
Em
português antigo, "rabiscar"
só
indicava recolher essas espigas
deixadas
para trás por segadores;
e
com frequência me ponho a imaginar
que
tais sonetos de tão variadas ligas
sobras
somente são de antecessores...
RABISCOS
II
Outros
criaram grandes poemas, realmente
e
grandes fardos com alegria sobraçaram;
cada
estrofe que do inconsciente retiraram
mil
grãos por um produziu-lhes bem frequente.
Com
suas penas de ganso, a antiga gente,
ou
com estilos sobre cera que marcaram,
alguns
pincéis sobre papiro ainda pintaram
ou
sobre argila a gravar pacientemente.
E
mesmo assim, criaram meus modelos,
restolho
apenas deixando para mim,
cereais
e a fruta que no chão se espalha;
tiveram
esses a colheita dos desvelos:
medas
de trigo e o doce mosto, enfim,
deixando
para mim somente a palha.
RABISCOS
III
Não
me acho aqui a pedir-te um elogio,
pois
minha modéstia é pura e verdadeira;
nem
é de fato pela vez primeira
que
desta herança reconheço o brio.
Se
Dionyso me legou o desafio
de
palmilhar por sua tão velha esteira,
percebo
bem a origem hospitaleira,
pois
de outrem brota o verso que hoje crio.
Mesmo
porque só existe um Criador
e
Nele ponho toda a minha esperança
e
neste Espírito Santo que me anima
de
que avatar foi Dionyso em esplendor
e
sua coroa de parreira em mim descansa,
na
grande honra que acolheu minha sina.
SOMBRAS
SECAS I -- 10 set 17
A
pretensão nutri, um certo dia,
de
descrever cada humano sentimento,
da
gama da euforia ao desalento,
nestas
miríades de versos em porfia.
Mas
normalmente descrever não poderia
o
prazer de causar algum tormento
ou
em zombaria de meu próprio julgamento
que
a mim ou a outrem não molestaria.
Nem
ao menos a gozar desse usufruto
poderia
colocar-me por vingança,
ou
em momento de descaso e de paixão
e
nos piores instantes seria arguto,
para
a maldade minha mente não balança,
nem
ódio medra no meu coração.
SOMBRAS SECAS II
O que posso descrever -- e o fiz, por certo
é a maneira como outros assim agem
e até mesmo por um ato de coragem,
entre os iníquos marchei de peito aberto.
Poderia descrever, com algum acerto
os sentimentos dessa alheia vassalagem;
de qualquer deus antigo a criadagem;
ante qualquer criatura do deserto...
José Carlos Santos Silva fez soneto,
não totalmente de parca perfeição,
que inspirou Alberto Nepomuceno.
Sua "Oração ao Diabo" um tal afeto,
a que posso respeitar, sem dar razão,
nem aceitar de coração sereno.
SOMBRAS SECAS III
Por ti respira meu coração, somente,
por ti apenas bate forte meu pulmão;
sempre o amor me causa esta inversão,
meu cerebelo em galardão opalescente.
Não escreveria um tal soneto, certamente,
pois nem sequer acredito em tal "leão
que ruge" -- na escritural afirmação,
para minhalma devorar esse insolente!
As sombras giram em torno, secamente,
em melancólico dançar de depressão,
um que outro mal a me gerar no coração.
sem que demônio se faça aqui presente,
que o mal se gera em nossa mente impura
ou provocado por acessos de loucura!
SOMBRAS SECAS IV
Ao "diabo" se atribui toda a maldade,
a voz maligna de toda a tentação;
tristezas secas em sombras saudarão
toda a inveja provocada por vaidade.
A Caixa de Pandora, na verdade,
é metáfora para o humano coração;
todos os males só dele brotarão,
fica a esperança em verde opacidade.
Não são, de fato, coisas materiais
esses temores e maus pressentimentos,
são sombras secas e descalcificadas,
esses arquétipos não mais que artificiais,
tomando forma nos teus pensamentos,
sem umidade que as faça realizadas.
SOMBRAS SECAS V
Contudo, elas vagueiam por aí,
até encontrarem propiciatório ambiente,
sanguessugas de energia, realmente.
(é bem verdade que jamais as vi).
Mas na maldade alheia sempre cri,
sem precisar de um demônio mais valente
que cada coração seduza e tente,
para nova refeição achar ali!...
E refazer a umidade desse pó
depende só de ti, de teu engano:
sopras-lhe vida, sem dar conta do perigo.
Dentro de ti sombras ancoras com um nó,
de artérias feito, do coração em desengano,
tuas veias secas demarcando teu jazigo!
SOMBRAS
SECAS VI
Mas
não te iludas -- há quem te sopre o mal
e
quando passa, sua sombra ressecada
vai
deixando para trás, descompassada,
mesmo
de forma involuntária e até casual.
Ficam
as sombras nos assoalhos, afinal,
à
espera de ocasião mais apropriada,
ao
te encontrarem, em percepção desavisada
para
em tua mente perfurarem um portal.
De
ti depende evitar melancolia;
recorda
sempre seres a centelha
de
um Criador Eterno, Jeová ou Brahma
e
tuas tarefas cumpre então com alegria,
que
o coração algum bem sempre te espelha,
por
mais opaca te pareça a antiga chama!
SONHO EM
VERRUGAS I -- 11 set 17
Que são meus
versos senão verborragia,
palavras tontas
ao vento, realmente,.
acotovelam-se
do fundo de minha mente,
tal qual se
incêndio poderoso ali rugia...
Que nelas tenho
obrigação me sugeria
essa voz que me
cochicha, complacente.
Eu
obedeço. Afinal, se faz presente
torrente e
fluxo que nunca se alivia...
Mas que mérito,
afinal, me traz o verso
que tantas
horas de minha vida suga,
entre o labor e
o prazer em mim disperso?
Não obstante,
contemplo num reverso
meus dedos a
verter sonho em verruga,
não mais que
poça dágua que se enxuga...
SONHO EM
VERRUGAS II
Não que desta
atividade desilude,
só não consigo
crer que seja minha;
a inspiração
constante se avizinha,
cresce nos
dedos e o olhar me ilude.
Se não redijo,
preço é bastante rude:
da mão na palma
uma verruga pequeninha
aos poucos
cresce, torna-se rainha,
até que em
versos tal calo se transmude.
Só destarte a
excrescência diminui
e se dilui na
multidão desses rascunhos:
se não os
passar a limpo, tudo esqueço!
Já que a
enxurrada permanente flui,
frequentemente
em contraditórios cunhos
e me desperta
quando acaso me adormeço.
SONHO EM
VERRUGAS III
Quando criança,
uma verruga tinha
na perna
esquerda. Outra surgiu no joelho,
que arranquei
em instante de estrambelho,
contra um
degrau, na porta da cozinha.
Com esparadrapo
prendi a pobrezinha,
que da maior
decerto era um espelho;
logo sumiu o
crescimento velho,
sem que uma
outra crescesse ali novinha.
Mas a verruga
da palma é só um sonho:
sinto-a apenas
sob a forma de pressão,
nada se ergue
na palma desta mão,
Figura de
linguagem só aqui componho
e até encaro
com um certo atrevimento,
desafiando-a a
aparecer um só momento!
ROUBANDO TEMPO I -- 12 setembro 2017
Meu coração eu ergo sobre a testa,
qual se coroa fosse ao plenilúnio;
ali gravo sentimentos e infortúnio
e quanto mais a mente me molesta
não sobra tempo para dias de festa;
de minhas ações o meu final pecúnio
é limitado no reluzir do solilúnio
além das penas pouco ou nada resta.
Mas isso não me importa, realmente:
meu coração é minha coroa a glória
de meus anseios e loucos pensamentos
E embora em minha ações, eu finalmente
controle seus impulsos de vitória,
meu sangue ainda avermelha os julgamentos.
ROUBANDO TEMPO II
E quando vejo a um outro, descuidado,
seu tempo em desperdício sem sentido,
meu coração se torna ressentido,
imaginando como possa ser furtado
tanto tempo visto assim desperdiçado
e lança um raio de luz em tal olvido
e assim consegue um tempo mal havido,
meu rubro coração empoderado!...
Mas nada roubo, de fato -- cai na rua
todo esse tempo, jazendo na sarjeta
ou pisoteado ao longo das calçadas;
se o tomo para mim, a mente estua (*)
e o coração devora essa completa,
irreal refeição de tantos nadas!...
(Se enche de energia.
ROUBANDO TEMPO III
Existem tantos que o meu próprio, realmente,
vêm-me pedir, na maior desfaçatez;
para conversa nunca falta-me um freguês:
debato um pouco, sem querer ser impaciente.
Mas o tempo não retiro dessa gente,
embora o teu bem peça que me dês;
a escolha é tua, ou pelo menos crês,
quiçá te prenda, implacavelmente,
nestas linhas sem fim de meu consolo...
E tanto escrevo que há quem acredita
que nem ao menos durma em cada noite.
Porém, não é assim. Mas
guardo um bolo
de tempo descartado em vil desdita:
banho lhe dou, alimento e bom acoite
ROUBANDO TEMPO IV
Tanto tempo ali guardado, o bolso fura!
Com esparadrapo o preciso remendar,
se à costureira não me lembro de o enviar,
trancando o tempo numa sacola dura!...
De minhas feridas temporãs me cura,
quando tarefa ainda preciso terminar
ou quando o meu alguém vem-me roubar,
mercúrio-cromo aliviando tal agrura!
E assim envio esse meu desatinado
poema a emular surrealismo,
com um toque de vampírico teor,
quando perfura o teu olhar cansado
e ali desperta teu próprio saudosismo
do antigo tempo de mais moço amor...
SUMMERTIME IN LONDON I -- l3 set 17
Outro
dia recebi fotografia
de
um soldado londrino, um granadeiro,
que
buscara o auxílio de um barbeiro
para
aparar o pelame em que o cingia
seu
capacete, um shako, em nostalgia
do
século dezenove, um derradeiro
e
napoleônico vestígio por inteiro
desse
mundo que algures já sumia...
Naturalmente,
só aplicação de photoshop;
jamais
um guarda da rainha tentaria,
mesmo
no auge do mais feroz verão,
desfazer-se
do uniforme que lhe ensope
de
suor o pescoço e de agonia,
nessa
climática e inesperada variação.
SUMMERTIME
IN LONDON II
Acredito
ser incômodo e pesado
esse
shako de cunho napoleônico;
mostram
as modas teor bem camaleônico,
abandonando
os estilos do passado.
A
pompa imitam ou pelo prático é trocado,
algumas
vezes com efeito cômico,
de
outras vezes até mesmo tragicômico,
se
de outro povo vem uniforme a ser copiado.
Pois
quando os traços do rosto se assemelham,
fica
às vezes muito fácil confundir
o
inimigo com o próprio companheiro,
especialmente
quando ambos se emparelham,
espiões
ou desertores a incluir,
a
língua apenas divisor mais derradeiro.
SUMMERTIME
IN LONDON III
Incrível
mesmo é que entrassem em combate
tantos
soldados ofegantes no passado,
tremendo
peso assim por eles carregado,
enquanto
o shrapnel inimigo vem e os bate!
Pois
marchavam lado a lado para o abate,
as
próprias vidas oferecendo sem cuidado,
sob
o comando de general bem abrigado,
tréguas
pedindo para que os mortos cate!
Total
desprezo pela artilharia,
total
descrença na metralhadora,
a
mastigar fileira após fileira!
E
o capacete de pele rolaria,
sem
garantir proteção mais duradoura,
juncando
o solo de mortos como esteira!
Recanto das Letras
> Autores > William Lagos
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