IRONIA CAPILAR - 30 AGO 2017
Tempo
houve em que eu tinha mais cabelos.
Cheguei
mesmo a deixar a cabeleira
crescer
até meus ombros por inteira:
Jesus
Cristo interpretei em meus desvelos...
Não que
sumissem! Posso ainda tê-los,
porém
muito mais ralos... A bobeira
dessas
loções de mim sequer se abeira:
pouco
me importa recobrar tais pelos...
Não
trago calva ainda. Tenho meus bonés,
que uso
desde os tempos de criança,
um
costume realmente mais francês,
que me
protegem contra os cafunés
que não
desejo mesmo! E sem poupança,
lavo a
cabeça quinze dias por mês!...
IRONIA
CAPILAR II
De
qualquer modo, há meio século me cresce
barba
no rosto e o bigode cultivei;
nunca
crescer demais ambos deixei:
somente
até meu gogó a barba desce...
É bem
verdade que por força de uma prece
Jesus
Cristo na cruz representei
por
sete ou oito vezes, porem não aceitei
que
minhas palmas algum cravo transpassase!
(Isso é
que fazem os crentes Filipinos!)
Cravaram
pregos no meio de meus dedos
e como
os pulsos amarraram bem,
nem
sequer protestaram os vivaldinos,
pois de
longe não viram tais segredos,
nem o
mercúrio ao invés de sangue vêem!
IRONIA
CAPILAR III
Naqueles
tempos, a minha cabeleira
chegava
aos ombros, muito bem penteada,
mas por
efeito de xampus foi estragada...
É bem
verdade que só houve a caideira
após os
meus cinqüenta anos, bem traiçoeira,
que até
então pensei seria conservada;
meu
primo-irmão já não tinha quase nada
aos
seus dezoito anos! Foi bastante mais ligeira
a sua
falha capilar. Mas se a verdade for
contada,
meu pai
e meus avós tinham careca
e os de
minha mãe, no final, ficaram ralos!
E mesmo
os de minha avó, pobre coitada!
De seus
cabelos, metade levou a breca,
sem lhe
servirem sequer a cobrir "galos"!
REGIMES
– 31 AGO 2017
Nunca me queixo de minha corpulência.
Isso faz parte de mim. Ora se engorde,
ou se emagreço, a depender do que se
morde,
mesmo do ar respirado em impaciência!
Pouco me importa, contemplo com
leniência
as ditas variações que o tempo
aborde;
regime é coisa de que minha índole
discorde,
em minha vida sedentária de
impotência!
Trabalho sem cessar... E pouco tempo
para exercício encontro. Doze horas,
mesmo quatorze ou dezesseis em cada
dia,
se não me ocorre qualquer
contratempo;
portanto, no labor dessas desoras,
emagrecer eu por certo deveria!...
REGIMES II
Eu caminhava com frequência. Mas parei
há uns dez anos, desde que deixei
de dar aulas e a seguir me aposentei:
quatro quilômetros desde a faculdade!
Eu descia até em casa, na verdade,
mas de repente, sem mais haver
necessidade
sem ser, de fato, um escravo da
vaidade,
somente em meu pecê eu trabalhei!
Até que um dia, minha esposa bela,
com
gentileza, me fez um ultimato:
"Vais mastigar menos comida
agora!"
"Não é possível sequer ver uma
costela!
De emagrecer precisas, isto é fato
e um bom regime te aplico, sem
demora!"
REGIMES III
Na realidade, como só para viver:
foi meu estômago que ficou guloso!
Tanto alimento, por certo, era
gostoso,
mas na verdade, não tinha esse prazer
desses que vivem tão só para comer
e assim me submeti, destemeroso;
o resultado foi um tanto vagaroso,
mas a banha vi aos poucos se perder!
Só que um detalhe não havia
pressentido:
primeiro queima-se a massa muscular
e só depois vem o panículo adiposo!
Deste modo, fui primeiro acometido
por sarcopenia e, quase sem notar,
perdi os músculos de que era tão
vaidoso!
REGIMES IV
Não percebi quando meus braços
afinaram,
porque ali permanecia ainda a
gordura!
Exercícios não fazia, em minha
tontura:
só no teclado meus dedos martelaram!
E quando mala levantar um dia
tentaram
meus pobres braços, com surpresa
dura,
mal conseguiram e, nessa hora escura,
os braços de minha filha me ajudaram!
Dou-lhe um conselho, portanto, meu
amigo:
se conservar quiser musculatura,
primeiro evite de fazer regime!...
Pois nesse evento o que corre mais
perigo
é a massa muscular!... E a sua
gordura
irá voltar tão logo o braço afine!...
REPRESSÃO – 1º SET 2017
Nem
todos pensamentos são escuros:
alguns
se encontram plenos de alegria,
nessas
lembranças em que o sonho se assumia,
em que
poemas grafavam sobre os muros.
Nem
todos dias se revelaram duros
assaltos
contra quanto eu mais queria:
existem
dias leves, que a agonia
banem
depressa, inconsequentes, puros...
Porém
ao ver que são hospitaleiros,
não os
aproveito para minha diversão:
são
nesses dias em que mais trabalho,
enquanto
os duros dias derradeiros
ainda
transponho no sono da ilusão
e para
o esforço totalmente falho!...
REPRESSÃO
II
Maus
pensamentos costumam vir de fora!
Se por
acaso me encontro em depressão,
os meus
neurônios com preguiça estão
e nada
criam na merencória hora!...
Mas
chega um sonho alheio e triste chora!
Pede-me
cama e algum naco de pão!
Sei bem
traiçoeira ser tal aparição
e
normalmente a açularia embora!
Mas se
estou triste, fraco ou indolente,
preguiça
tendo para fechar a porta,
o
pensamento penetra, sorrateiro
e
quando dentro em mim se faz presente,
minha
força e energia fácil corta
e vem
dormir em meu próprio travesseiro!
REPRESSÃO
III
Como é
difícil repelir este inquilino!
Abre um
processo, contrata advogado,
sem em
despejo oficial ser enquadrado,
do bom
humor se torna um assassino!
No
campanário da mente toco um sino,
a
ensurdecer tal pensamento malfadado;
só
assim expulso o infeliz deste meu fado
e minha
cabeça lavo, esfrego e afino!
Mas o
bandido se esconde na caveira
e fica
embaraçando meus cabelos,
pelos
ouvidos ainda busca me emprenhar!
E ao
menor pretexto já se abeira:
não
pode esmola, porém força seus zelos,
até que
eu possa novamente o expulsar!
REPRESSÃO
IV
"Emprenhar
pelos ouvidos" é um ditado
bastante
difundido e bem corrente!
Porém
tal nexo sequer pertence à gente
e é
preciso ser depressa descartado!
Ficando
o tal pensamento abandonado
vira
caspa nos cabelos, bem frequente
e com
xampu anticaspa e detergente
ao ralo
do banheiro é então forçado!
Mas que
coisa mais chata! Em vez de ir,
o
desgranido pensamento malicioso
se
enfia nos meus pés, por entre os dedos!
E vai
na toalha ou na meia se imiscuir,
tal
qual bicho de pé, sempre teimoso,
vira
micose ou nos calos faz enredos!
ROUBO DE AMOR – 2 SET 2017
SEI BEM O QUE FUNCIONA, QUANDO AMOR
NÃO MAIS EXISTE E A GENTE APENAS FINGE,
SE A INDIFERENÇA MANSA NOS ATINGE
OU MESMO QUANDO CRESCE ALGUM RANCOR
A QUE NÃO DEMOS CAUSA NEM ARDOR,
MAS MESMO ASSIM VINCHA DE FOGO CINGE
À NOSSA TESTA E O CORAÇÃO NOS PUNGE
COM DESDÉM INSUPORTÁVEL DE PENDOR.
ENTÃO SE INVESTE MAIS EM DEMONSTRAR,
POR NÃO SE DESEJAR SEPARAÇÃO,
ENQUANTO A MÁGOA A GENTE ENGOLE EM SECO
E LOGO O OPOSTO SE VÊ MANIFESTAR
TALVEZ SURPRESA POR ESSA REAÇÃO
E EM TAL TERNURA, POR AMOR, EU PECO!
ROUBO DE AMOR II
QUANDO A MULHER CONTRA NÓS FOI INSTIGADA
NEM SEMPRE A GENTE O SEU MOTIVO ENTENDE
E ALGUMA DOR AO CORAÇÃO SE PRENDE
E A UMA PERGUNTA, DIZ: "NÃO TENHO NADA!"
E DESSE AMUO DIFICILMENTE É RETIRADA
UMA RESPOSTA, CUJO PREÇO CARO VENDE!
SE A GENTE CHAMA, NÃO ESCUTAR PRETENDE;
E QUE FAZER COM TAL ESPOSA OU NAMORADA?
SE POR ACASO LHE TRAZEMOS UNS BOMBONS,
ELA PROTESTA: "NÃO GOSTO DESTA MARCA!"
E ENTÃO VAI-SE COMPRAR BUQUÊ DE FLORES
QUE SÓ RECEBE NOS MAIS AMARGOS TONS:
"É UMA COROA QUE TROUXE E QUE ME ABARCA
O MEU CAIXÃO, APÓS MEUS ESTERTORES!"
ROUBO DE AMOR III
"ROUBAR UM BEIJO" É DITADO MUITO ANTIGO.
AO INVÉS DISSO, EU JÁ BUSQUEI ROUBAR AMOR
E SEU PEITO FUI ABRIR COM MEU CALOR:
SEU CORAÇÃO COM MINHAS UNHAS FIZ AMIGO!
PARA FORA EU JÁ O PUXEI, MAS SEM PERIGO,
ALI MEU NOME ESCREVENDO COM FERVOR;
DEPOIS DE NOVO O INSERI EM VASTO ARDOR,
SEGURO AGORA PARA MIM ESSE JAZIGO!
MELHOR ME BATE O CORAÇÃO ASSIM ROUBADO,
NO QUAL MEU NOME DEIXEI FUNDO GRAVADO
E SE QUALQUER OUTRO NOME ALI ENCONTREI,
EM MINHA MALÍCIA DE AMOR O FUI TIRANDO
E NA RUA, POR JANELA, O FUI JOGANDO,
POIS TODO O AMOR QUE HAVIA ALI ROUBEI!
MENESTREL – 3 SET 2017
No mais secreto de meu
coração
Tenho um banco de
mármore, minha amiga
E um alaúde, para
dedilhar cantiga,
Caso desejes escutar a
minha canção.
Sua chave já conservas
em tua mão;
Não precisas ter receio
do jazigo:
Não contém mortos - só
te acharás comigo,
Por ti esperando com
trepidação!
E te convido a sentares
de meu lado,
Nesse banco esculpido e
trabalhado
Por artesãos da melhor
marmoraria;
E quando entrares, ainda
tímida e hesitante,
Meu alaúde te saudará,
vibrante,
Tua voz suave a
completar minha alegria.
Menestrel 2
Quero que uses vestes
bem compridas,
Tecidas de cetim e fios
de seda,
Teus pés descalços pela
grama leda:
Não há rosetas para
causar feridas!
Lírios do campo em
pétalas fendidas,
Trevos de quatro em
sorte apressurada;
No meu jardim nunca
serás desconsolada;
Minhas notas voam e no
chão ficam perdidas!
Mas a seguir, no solo
reverdecem
E se enraízam, notas são
de flores,
Crescem gavinhas,
caramanchão de amores
E novas flores em teus
cabelos descem,
Sempre adubadas pelos
teus rubores.
Sem que os olores de
voejar nos cessem!
Menestrel 3
Ali te encaro, apenas
sorridente,
O teu lugar a indicar
com um meneio;
Junto de mim - vem e
senta sem receio:
Sequer meus dedos
estenderei, silente,
Já ocupados a extrair o
som plangente
Deste instrumento, no
colo de permeio;
Porém de ti aguardo um
som alheio,
Que entoe para mim um
canto ardente.
E se quiseres... podes
estender
Teus dedos em carícia de
minha face,
Que saberei recebê-los
como um beijo,
Meu coração a ansiar por
te acolher,
Perto de mim, sem que
sequer te abrace,
Só a melodia a te
implorar o meu desejo!
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