BRINDE I – 18 fev 2018
Minhalma busca em ti o
amor-perfeito
e meu espírito anseia te
possuir,
que o abstrato se possa
compartir,
a luz da mente dividida sem
defeito.
Quero encontrar em ti igual
conceito,
parelhos gostos, ideais a
reluzir,
à noite os sonhos de igual
tremeluzir,
de máos dadas partilhando o
mesmo eito.
Sejam os dias tais quais
sorriso puro
nesse mesclar de nossas
mentes nuas,
teu pensamento semelhante
ao meu;
porém deparo com um real
mais duro,
pois são minhas mãos que
acariciam as tuas
e é só meu ventre que
procura o teu.
BRINDE II
E nessa entrega a tal físico amor,
não estarei abandonando o
amor real?
Aquela íris luminosa de
fanal
por que suspiram os anjos
com calor?
Mas não têm sexo os anjos,
que o Senhor
todos criou inteiros no
total,
não há neles esta falha
material
de duas metades a buscar-se
com fervor.
Que amor de anjos nada tem
de humano,
porque dele nunca podem
duvidar,
diuturnamente cumprindo o
seu mistér,
Sem que entendamos um tal
místico arcano,
sem que algo físico os
possa perturbar,
sem que abandonem seu mundo
soberano.
BRINDE III
Mas eu sou carne e não apenas mente:
falam alguns que amor é coração,
outros que o fígado senhor é da emoção,
outros ainda que só o sexo é presente.
Não há partilha de um amor onisciente,
mesmo que exista tão só a ideal paixão,
pois são outros pensamentos que ali estão
e a tal metade ideal é sempre ausente.
Por mais que se converse, é bem melhor
não confessar a real intimidade –
não correspondem
sempre os sentimentos
e o desaponto poderá ser bem maior
quando se escuta a tímida verdade,
tão divergente de nossos julgamentos...
BRINDE
IV
Esse
perfeito amor é inexistente,
bem mais real, contudo, a aceitação
das diferenças de cada coração,
ambas condutas em domínio mais potente,
o preconceito que no cérebro é inerente,
os desejos disfarçados de emoção,
brinde imanente e gentil da perdição
de cada sonho que jamais se fez presente.
Assim te amo, não por te ver nua,
embora busque de ti essa visão,
amo-te mais porque não podes dar
a ilusão que no sonho ainda flutua,
mas tão somente discordante sensação
desse imperfeito amor a me brindar.
CELEBRAÇÃO I
– 19 FEV 2018
O altar és tu
e nele me debruço,
Meu vinho a
consagrar o teu cibório,
Teu ventre a
se tornar meu ostensório,
Pura óstia
cada pelo do teu buço.
Sobre teu
ventre o meu amor remoço,
Na diletante
propina desse espólio,
Em ti a
imperfeição inteira eu tolho,
Quando
derramo em ti o amor que endosso.
Quando
esternuto em ti algo da alma,
Nessa ilusão
de rito haver espiritual,
Por mais que
te consagre minha esperança,
Nessa prece
de orgasmo que me acalma
E por
instantes faz-te inteira divinal,
Durante os
passos dessa mais antiga dança.
CELEBRAÇÃO II
Vejo a eucaristia transmutada em
carnaval,
Sem qualquer falta ou teor pecaminoso;
Divino é o amor e nunca pernicioso,
Quando tingido por este amor ideal.
Pois se entreveram os corpos, afinal,
Mas não somente por um auge prazeroso,
Nenhum de nós recusando haver um gozo,
Sinal externo, visível, material,
Feito tangível todo o amor espiritual.
E se nos dizem ser igual aos animais,
Qual o pecado na cópula das feras?
Mais do que a nossa é somente material,
Feromônios no cio desses rituais,
Buscando apenas a franquia de outras
eras.
CELEBRAÇÃO III
Seria
o sexo eternamente benfazejo
Se não o maculasse o preconceito,
Vindo, em geral, de quem está
sujeito
À repressão social do seu desejo.
Quando ao cálice de vinho dar um
beijo
É ate mesmo proibido por direito,
Que essa rodela de trigo contrafeito
Da Última Ceia só mascara o puro
ensejo.
Se desse modo se alterou a
Comunhão
E o sexo mais despreza que não o
tem
Ou que já teve, mas ter não pode
mais,
Que se celebre a eucaristia então
,
Com outro corpo a consagrar
também,
Vinho sorvendo dos lábios dos
demais!
EGÓLATRA I – 20 FEVEREIRO 2018
Vejo “o fan tasma de meu próprio
ego”,
Como dizia Freud, a trabalhar
Nesse mundo interior, a me ajudar
Na busca inútil pela qual me
apego.
Não sou “o covarde mentiroso e
cego”
Que mencionou Chamisso; em meu
andar
Não delego muito tempo ao elaborar
Desse meu Duplo que mesmo até
renego.
Mas aqui eu lhe rendo minha
homenagem:
Se não fora a exaltação de
Dionyso,
Que assim habita nas profundas de
meu ser,
Eu não teria nem tempo e nem
coragem
De enfrentar tanta coisa que
preciso
E ao mesmo tempo mil poemas
escrever.
EGÓLATRA
II
Esse
duplo de mim é meu fantasma
Que adeja a
meu redor constantemente
E que me
impele a lutar mais arduamente,
Quando
ejacula nos poemas em que orgasma.
Dele e de mim
em cada verso espasma
Clímax breve
em seu ardor pungente –
Esses
rascunhos que rabisco diariamente,
Revoluteando
a meu redor feito um miasma.
Mas quando ao
Alter-Ego assim respeito
E lhe
atribuo, com rasgos de humildade
Tantos poemas
de brilho ou neciedade,
É a mim mesmo
então que rendo preito:
Sei muito bem
o quanto é parte de minhalma,
Que assim me
impele sem deixar-me calma.
EGÓLATRA III
E assim confesso ser egolatria
Quando dou a esse outro a atribuição
De tantas frases que me brotarão
Sempre que abro a portinhola da poesia.
E cada vez que a inspiração eu louvaria
Como vinda de fora, a afirmação
De ser apenas o canal por onde vão
Encaixar-se uma a uma, em romaria,
Essas palavras em que antes não pensei,
Mas que me vem escorreitas no papel,
Sei muito bem que sempre estou consciente,
Que alma e espírito são meus e louvarei
Estes meus manes, lusco-fusco de ouropel,
Que um é o Orgulho e a Vaidade o segue rente!
SEGUIDOR I – 21 fev 18
Quem sabe assim se explica a produção
que consigo realizar diariamente:
possuo duas vidas, destarte bem
frequente
que em mundo paralelo minha ilusão
componha estes poemas com paixão
e que me reste o trabalho, tão somente,
de escrevê-los no mundo meu presente,
quando sou eu que controlo a própria
mão.
Melhor seria, de fato, que pudesse
esse meu duplo os digitar também
no mundo paralelo e só mandar-me
os arquivos já prontos... Que tivesse
seu próprio e-mail, sem se atrever,
porém,
nem sequer por um momento, a
controlar-me!
SEGUIDOR II
Mas sou eu mesmo. Se assim me multiplico
é por ter dentro da mente um
cabedal
que poucos têm. Possuir algo de carnal
na medida das células que aplico
desse meu cérebro, ainda novo e
rico;
por mais que esteja idoso no real,
da mente a força conserva-me
sensual,
inda que, aos poucos, menos forte
eu fico.
Contudo... aceito que haja outros
de mim
em mundo paralelos... Em
dimensões,
qual era dantes o costume
mencionar.
Nada de novo em se pensar assim,
que há séculos as mencionam
tradições
e até os milagres estima-se
explicar.
SEGUIDOR III
E se vamos nessa linha continuar,
dizem os mestres que de Deus a Lei,
mesmo que seja um portentoso rei,
nem Ele mesmo a possa quebrantar.
E assim, se prece mais fervente alçar,
algum que anseie, como eu mesmo ansiei,
para outro mundo algures, que não sei,
a Divindade o possa transportar,
e que nela o ansiado desejo realize,
ou troque apenas breve parte dele
e o milagre possa assim tomar lugar
nesse outro mundo que um duplo nosso pise
e que, talvez, milagre inverso apele,
duplo portento para assim se realizar...
SEGUIDOR IV
Mas há um preço a pagar. A dimensão
que nos seja paralela só difere
da nossa por detalhe que se espere,
para um milagre de pequena concisão...
Mas se é algo de maior compensação
diferencial maior assim confere:
outras coisas ademais também refere,
delas sendo forçada a aceitação.
Diziam os Romanos, já no antanho:
“Cuidado com o que pedes! Pode
haver
um deus a te escutar em tal momento,
de teu desejo a fazer real o amanho,
com consequências que mal podes
conceber,
toda a alegria a empanar de tal evento.”
SEGUIDOR V
Porém maior ainda pode ser
o preço da maravilha conferida.
Nesse outro mundo também foi
concebida
outra versão de ti, a padecer
nesse momento da troca, o
desprazer
que te levou a ali pedir guarida,
que esse teu duplo assumirá tua
vida
e no lugar de ti irá sofrer!...
Que igual troca suplique é
improvável,
o milagre é só teu, mas dissabor
para esse outro de ti que não o
queria
e por seu sofrimento és
responsável,
move-se o pêndulo da vida com
fervor
e cedo ou tarde o seu mal te
atingiria!
SEGUIDOR VI
Sabe-se lá o que podes perder
e quanto no futuro a lamentar,
após portento vero realizar,
a libertar-te de um frágil padecer!
E novamente, volto a recorrer
a uma aliança, que possa celebrar
com certo duplo e com ele me alternar,
num vaivém de constante transcorrer!
Assim
talvez consiga se explicar
de meus poemas gigantesca quantidade,
meus Alter-Egos sempre a labutar,
a me enviarem e-mails de qualidade,
computador da mente a funcionar,
para em meu mundo finalmente digitar!
FOGO DE CHÃO
I – 21 FEV 2018
DURANTE A NOITE, QUANDO O FRIO APERTA,
VINDO O MINUANO AS COSTAS ARREPIAR,
COMO DEDOS DE FANTASMA A ME TOCAR,
NESSA CALIGEM DE UMA COVA ABERTA,
ACENDO O FOGO NA VASTIDÃO DESERTA,
SOBEM CENTELHAS QUANDO O VOU AVIVAR,
POUSAM NA BARBA E NA NUCA, A ME
TISNAR...
A LABAREDA, PORÉM, ME DEIXA ALERTA...
E QUANDO PENSO EM TI, ME AQUEÇO MAIS,
MUITO EMBORA TUA SAUDADE ATÉ ME QUEIME
E ALGUMAS VEZES ATINJA MEUS REFOLHOS,
RUGAS DO ROSTO APROFUNDANDO POR DEMAIS
ESSA LEMBRANÇA QUE NAS VISTAS TEIME
DAS MIL CENTELHAS QUE SAEM DE TEUS
OLHOS!
FOGO DE CHÃO II
ANTIGAMENTE, AO SE BATER AS BRASAS,
QUANDO AS FAGULHAS BAILAVAM PELO AR,
AS COZINHEIRAS DIZIAM, A BRINCAR:
“ESSAS LUZINHAS AÍ, BATENDO AS ASAS,
SÃO AS MENINAS SAINDO DE SUAS CASAS
PARA À PORTA DO COLÉGIO SE APRESSAR...
MAS TEM CUIDADO, PODEM TE CEGAR,
MESMO SEM CHAMAS SÃO FOGUEIRAS RASAS...”
FOGO DE CHÃO, IGUAL FOGO DE LENHA,
FOGO DE LENHA, FOGO DO CORAÇÃO,
QUANDO BATIDOS, SOLTAM MIL CENTELHAS
E É BEM POSSÍVEL QUE DE DENTRO VENHA
CERTA MENINA, GRAVADA NA EMOÇÃO
DESSA SAUDADE QUE DE TI MESMA
ESPELHAS...
FOGO DE CHÃO III
SAUDADE QUEIMA QUAL BRASA VERMELHA,
DA MESMA COR QUE TRAGO AO CORAÇÃO.
POR MAIS AZUL QUE SEJA ESSA EMOÇÃO
É A CHAMA AZUL QUE A MENTE ME DESTELHA.
SOBE DOS OLHOS PARA A SOBRANCELHA,
MENINA ARTEIRA, NÃO TEM PRECAUÇÃO,
POUCO LHE IMPORTA CAUSAR A QUEIMAÇÃO,
MESMO A QUEIMAR-SE EM EMOÇÃO PARELHA...
FOGO DE CHÃO, SAUDADE QUE ACOMETE,
ELA É BEM CÁLIDA NO LUGAR QUE QUEIMA,
MAS AO REDOR, ATIÇA MAIS O FRIO
E ENTÃO O VENTO DA TRISTEZA SE
INTROMETE,
ARREPIOS A NOS CAUSAR EM LONGA TEIMA,
CENTELHAS VIVAS DE UM JÁ DEFUNTO CIO!
AMOR EM CRIA I – 22 FEV 18
Em certas datas, as pessoas põem em cria
égua e cavalo, bom reprodutor,
quando o touro cobre a vaca, sem amor,
e o carneiro a cada ovelha que possuía.
O porco toma a porca em sua folia,
faz-se o galo das galinhas o senhor,
o bode as cabras agride com ardor
e cada pássaro no seu ninho pia.
É a mesma dança da insaciável natureza,
enquanto o pênis na vagina se aconchega,
sem intenção de demorar-se ali demais,
faz,em geral, com rápida firmeza.
Somente o cão à cadela mais se apega
e um nó se forma nos seus entreverais!...
AMOR EM CRIA II
Já os gatos são mais escandalosos,
miando à Lua para nos incomodar;
talvez a gata até aprecie o seu cantar,
de sua urina brotam cheiros tenebrosos!
Ou então lutam, buscando, vigorosos,
seus territórios para sempre demarcar;
é dos telhados que desejam se apossar...
Latem os cães em despeito, portentosos!
Depois... a gata de raça pega cria
de um campeão da luta nos telhados,
mistura ímpia de multidão de raças,
enquanto a dona guardá-la se iludia
para os machos nas gaiolas conservados,
do tipo étnico a conservar as graças!...
AMOR EM CRIA III
Já entre nós não existem essas datas,
que o homem e a mulher podem amar
físicamente, so por se aproximar
o desejo em quaisquer ocasiões gratas.
Nao chiam para os machos essas gatas,
nem é costume as unhas lhes mostrar.
Talvez brutal, talvez terno abraçar,
desde os desertos até as espessas matas.
Pois em geral, no amor apaixonado,
se ali existe algo mais do que o sensual,
um prazer místico se busca conceder.
Mais longo tempo fica o pênis conservado
no ninho de ouro da carne consensual,
orgasmo mútuo no final a padecer!...
OLHOS VERMELHOS
I – 23 FEV 18
Embora
o sangue nos atice a vista,
não
são comuns os olhos sanguinados,
só os
albinos olhos têm mais encarnados,
como
no coelho e na lebre a gente avista.
Rubor
no rosto no momento da conquista,
brilhem
os olhos, talvez, entusiasmados;
por
melanina, porém, são dominados,
guardam
suas cores, mesmo que se insista.
Olhos
castanhos, azuis, olhos gateados,
sem
que o vermelho os domine no total,
suas
íris têm completa afirmação.
Só nos
instantes após longos pranteados
as
escleróticas avermelham-se, afinal,
em
fios de sangue fantasiado de emoção.
OLHOS
VERMELHOS II
Para
os vampiros há múltiplas versões
e
nalguns deles os olhos são vermelhos;
também
se afirma que só os vampiros velhos,
sangue
roubado de tantos corações,
é que
adquirem essas tais colorações,
dos
sofrimentos humanos sendo espelhos,
o
tempo a açoitá-los com seus relhos,
nos
dias mortos, de noite em vagações...
Mas
com o sangue, quiçá bebam igualmente
a dor
e a paz, carinhos e rancores...
E não
serão, afinal, mais sofredores,
ao
buscarem para si, integralmente,
a
multidão das penas dos humanos,
dos
quais se mostram algozes soberanos?
OLHOS
VERMELHOS III
Nem
sempre é a dor moral que rubros torna
os
nossos olhos. Talvez uma picada,
de
algum inseto a entrada inesperada
ou do
famoso “argueiro”, qual bigorna,
que
entra pela vista e desadorna
a
lucidez do olhar, em dor aguada;
após
as lágrimas, a ofensa é derramada
e a
pouco e pouco esse amargor se amorna...
mas o
que faz o vampiro, quando o argueiro
entra
em seus olhos? Ou nas vistas dos albinos,
que
compartilham igual seu vermelhor?
Choram
lágrimas do sangue de um terceiro,
ficam
rosados seus olhos pequeninos
ou
toda a púrpura desgastam em palor?
PARTO NA BIBLIOTECA I – 24 FEV 2018
TENHO CENTENAS DE LIVROS EM MEU QUARTO,
TALVEZ MILHARES... E DE CADA UM
PODE BROTAR INTEIRO MAIS DE ALGUM
PERSONAGEM QUE ALI VIVA, EM PLENO PARTO.
MAS PRIMEIRO É PRECISO A CIRURGIA
EXECUTAR E AS PÁGINAS ABRIR-LHES,
PARA A TODOS ESSES SERES REVESTIR-LHES
DA VITAL FORÇA DE ESPECULAR MAGIA.
PORQUE ESSE POVO TODO SÃO REFLEXOS
DE MINHA PRÓPRIA MENTE E POUCO IMPORTA
QUEM TENHA SIDO O AUTOR DA NARRATIVA,
POIS É SOMENTE SE OS LEIO QUE OS COMPLEXOS
MEANDROS QUE SUA VIDA ASSIM COMPORTA
RETIRAM DE MINHA MENTE A LUZ FURTIVA.
PARTO NA BIBLIOTECA II
TALVEZ SEJAM TAIS HERÓIS A VISITAR-ME
NESSES MEUS SONHOS PLENOS DE AVENTURAS,
NOS QUAIS BEM RARAMENTE HÁ DESVENTURAS,
NOS QUAIS NÃO CESSO DE MOVIMENTAR-ME...
ESSES MIL ROSTOS SEMPRE RELEMBRADOS,
MAS QUE DE OLHOS ABERTOS SEMPRE ESQUEÇO,
ESSES PALÁCIOS QUE VEJO, DE ALTO PREÇO,
SÓ RARAMENTE EM TAIS SONHOS PENETRADOS...
PORQUE CAMINHO PELAS RUAS, EM GERAL,
OU POR VEREDAS FÁCEIS OU DIFÍCEIS,
CUJOS MEANDROS ME SÃO SEMPRE FAMILIARES,
VEZES SEM CONTA, IGUAL QUE ALGUM PARDAL,
SOBREVOAANDO, OU SALTANDO COMO MÍSSEIS
EM MEUS PASSEIOS ASSIM TÃO PECULIARES...
PARTO NA BIBLIOTECA III
É CLARO QUE JÁ OUVI OUTROS FALAREM
DE CHAMAREM DOS LIVROS PERSONAGEM.
OU MESMO, NALGUM TIPO DE MIRAGEM,
VINDOS DA TERRA, EM LIVROS PENETRAREM.
PODEM SER MUSAS PARA ALI ENCONTRAREM
OU, AO CONTRÁRIO,VILÕES DESSA PAISAGEM,
QUE ENFRENTAR ENTÃO POSSAM COM CORAGEM
OU OS HERÓIS QUE COMO AMIGOS SE MOSTRAREM
E SE FOR FORTE BASTANTE O DEVANEIO,
SENTAM-SE AO LADO DE UM LEITO E, DE PERMEIO,
OS TOMAM PELA MÃO... E OS PUXAM A PASSEAR...
E EM SENDO DAMAS DE ASPECTO SENSUAL,
PODEM FINGIR-LHES ATÉ UM AMOR CARNAL,
MAS SÃO FIGURAS TÃO SÓ DO IMAGINAR...
PARTO NA BIBLIOTECA IV
COMIGO NÃO É ASSIM. MEUS
FRAGMENTOS,
ESPÚRIAS VÍTIMAS DAS PÁGINAS VAZIAS,
NESTES SONETOS DE TANtAS VILANIAS
GEMEM COM FORÇA ESTÉRIL SEUS ASSENTOS..
TALVEZ ATÉ CERTAS PALAVRAS APROVEITE,
MAS AS CONDUZA A UM PONTO INESPERADO,
POIS NUNCA SEI COMO SERÁ FINALIZADO
CADA INÍCIO A QUE CONFIRA O MEU ACEITE.
MAS AS FICTÍCIAS FIGURAS DESLA LIRA
JÁ NÃO PERTENCEM AOS AUTORES MAIS FECUNDOS,
TORNAM-SE CACOS TÃO SÓ DO MEU PENSAR,
QUE NESSAS PÁGINAS FECHADAS ENTÃO GIRA
E OS VERSOS TOMAM FORMA, MAIS ROTUNDOS,
MAS SEM QUALQUER INTENÇÃO DE OS PUBLICAR...
VERDUGO DA BIBLIOTECA I
– 25 FEV 18
De minhas estantes,
livros aos milhares
gritam dentre suas
capas esquecidas,
enroladas em plástico,
protegidas...
Caracteres a me fitar
em seus esgares...
“Por que então nos
compraste, aos azares
desse leilão de almas
espremidas,
nesses símbolos
impressos refletidas,
espelhos mágicos sem
teus contemplares?”
Porém eu, que tantas
vezes refleti
no espelho de meu rosto
tais imagens,
de novos livros me faço
o carcereiro
e nessas obras que, às
centenas, traduzi,
dou vida temporárias
aos personagens,
transmito o arquivo e
esqueço seu berreiro.
VERDUGO DA BIBLIOTECA
II
Certo recordo esses
livros traduzidos.
Foi um trabalho,
afinal, por que fui pago.
Qualquer vestígio
dentro dalma trago,
porém são os seus
detalhes esquecidos.
Talvez nas redes
neurais sejam contidos
e assim, por indução de
qualquer mago
ou fio de cérebro de
caráter vago,
posso buscá-los nos
labirintos lidos.
Mas preferia bem mais
poder lembrar
esses milhares de
versos que escrevi,
nesses rascunhos que
ainda me surpreendem
ou as centúrias que
cheguei a digitar
nos eletrônicos
meandros que incluí,
que bem ou mal à minha
memória atendem.
VERDUGO DA BIBLIOTECA
III
Ao mesmo tempo, de
fato, sou verdugo
desses mil livros que
não cheguei a ler;
comprei deles demais,
para jamais poder
submeter-me às
exigências de tal jugo.
A mente, aos poucos, para
alguns alugo,
nas várias línguas que
sei compreender.
Duas dúzias à cabeceira
eu posso ver
e quaisquer páginas de
cada um enxugo
com meu olhar e para
outros passo,
enquanto os olhos dos
livros ao redor
ainda me fitam com
ressentimento;
com minha visão sempre
a alguns abraço,
fito as molduras e
anseio, em meu pendor,
abri-los todos em
qualquer futuro evento...
VERDUGO DA BIBLIOTECA IV
Eles me encaram, porém,
com desconfiança;
tão numerosos são, que
até duvidam,
nessas estantes
apertadas em que lidam,
que um dia os leia,
numa final bonança.
Talvez, se retornasse a
ser criança.
tivesse tempo para
todos que convidam
serem abertos, mas que
já se olvidam
de ter de minha atenção
pura esperança.
E nestes tempos de
celulares digitais,
em que as leituras não são
mais materiais,
nem cedê-los a alguém
adiantaria...
Resta esperar que em
décadas futuras,
conseguindo dominar as
minhas agruras,
cada página, que em
carinho ainda leria...
TEMPERATURA I – 26 FEVEREIRO 2018
Dizem que os velhos costumam sentir
frio,
Muito mais que na sua juventude,
Porém a mim, a assertiva pouco alude:
Bem raramente no inverno me resfrio.
Conserva o corpo igual calor do cio
Que experimentava, em seu vigor mais
rude;
Se algo, de fato, nesta carne ainda
mude
É que o calor me desgasta todo o
brio.
Mas vejo alguns em grossa
indumentária
(quiçá descrentes do calor humano),
Diante de estufas, desde o arrebol
Ou nos bancos das praças gente vária,
Somente achando algum calor arcano
Nos velhos ossos aquecidos pelo sol.
TEMPERATURA II
Com minha esposa acontece coisa
igual:
Queixava-se ela anteriormente só
do frio.
Agora geme no calor e eu até rio
Dessa troça que lançava-me
habitual,
Quando o calor só a mim fazia mal
E para ela só acentuava o brio...
Envelhecemos, porém não avalio
Porque a mudança surgiu nela no
final.
Emprego ainda tão só
ventiladores,
Mas fez-se fã do ar condicionado
(claro está que me sento do seu
lado),
Mas depois volto só a meus
labores,
Se bem que hoje me incomode por
demais
Esse calor que não se apaga
mais!...
TEMPERATURA III
Contudo vejo que incomoda a ela
mais
Nos longos dias em que não me
sinto bem,
Pois do calor hoje se queixa ela
também:
Consulta médicos por motivos
naturais.
Percebo hoje que há fogueiras
triunfais
Por entre as nuvens, acesas por
alguém;
Esse calor é bem maior que o que
se tem
Pela mediana dos registros
consensuais.
Assim estranho é que sintam tanto
frio
Esses que afirmam ser gélida a
velhice.
Explicações dentro da mente crio,
Meu sangue ainda a mover-se
descuidado.
Certo o calor me perturba, como
disse,
Contudo o frio só me faz
bem-humorado!
TEMPERATURA IV
Quem sabe minha mente é que produz
O combustível para tal lareira!
Minha memória permanece bem certeira
E quando algum esquecimento vem à luz
Ordem envio ao labirinto que conduz
À recordar essa palavra mais arteira.
Algumas vezes, uma súcubo lampeira
Corta a lembrança enquanto me
seduz...
É a mente ágil que conserva meu
calor,
Disso tenho certeza. Se me entrego
À complacência ou a qualquer rotina
Logo se expande em mim o seu frior.
E te aconselho, no maior apego:
Larga o desânimo! Que a mente te
assassina!
ACRÓSTICO
DE OUTREM I – 27 FEV 18
(Para
Marciano Fernandes Goulart Jr., autor do acróstico)
“Saudade traz para mim teu nome
“Lindo.” Um
amigo me trouxe a sugestão
“M”as não
meus escritos que aqui estão,
“O”utro
indicou-me a sua antiga fome.
“N”enhum
anseio a mim de acróstico consome
“E” no
entretanto este nome uma emoção
Ainda
cálida me traz ao coração:
Saudade
é coisa que sempre a todos dome.
Encontrei
em meus rascunhos, certamente,
Esta
frase de alguém que um dia amou
E aqui
recorda seus velhos sentimentos.
Aqui
registro a completação fremente,
Mas o
acróstico não se completou,
Não
inspirou meus próprios julgamentos...
ACRÓSTICO DE OUTREM II
Certamente uma Simone conheci
Que ainda desperta para mim
saudade;
Outra porém é a letra, na
verdade,
Que permeio a meus rascnhos
recolhi.
Simone Signoret em rapaz eu
vi
Em alguns filmes franceses,
nessa idade.
Nem sei que fim levou. Sem
ansiedade
Seu rosto lembro como um déja-vu.
Naturalmente, era apenas
uma atriz,
Segundo creio, nem pisou no
meu país,
Esta saudade não mais que
artificial.
Mas uma Simone certamente
eu quis,
Mais de passagem, carinho
espiritual,
Com mãos translúcidas e
pálidas de giz.
ACRÓSTICO DE OUTREM III
Existe em mim esta
convicção
De nenhum de meus rascunhos
desfilhar;
Se a frase inicial eu pude
achar,
Também lhe devo tal
poetização.
Mas não importa. Em anos
que lá vão
Certo indício de amor vi
começar,
Um inicio de desejo a
dedilhar,
A que faltou toda
concretização.
E fica aqui o acróstico
iniciado
Por meu amigo, sem ser
completado,
Dedicado nâo à minha, à sua
Simone,
Que jamais conheci. Seu
sobrenome
Nem sequer ele me disse,
por amado
Que tenha sido. Tão somente
seu prenome.
ACRÓSTICO
DE OUTREM III
Todos
tivemos na vida uma Simone,
Amiga
ou amante, mãe ou mesmo irmã.
Em
certo tempo entrou na moda tal afã,
Tanta
menina a receber tal nome!
Passou-se
a moda, como tudo some,
Tanta
Simone com cabelos cor de lã,
São
mães ou avós, sua vida não foi vã
E a
sepultura a alguma até consome.
Se
normalmente acrósticos não faço
Esta
homenagem vai mais para esse amigo
Do que
à Simone que nunca conheci...
Porém
recordo ainda na mente o abraço
De
outra Simone a quem meu peito deu abrigo,
A quem
a vida afastou e não mais vi...
QUEIXUMES I – 28 FEV 18
As nossas queixas não saem simplesmente
de nossas bocas como alívio temporário.
elas se formam no imo do sacrário
e vão crescendo ali, constantemente.
O seu poder poderá tornar-se ingente,
constantes, firmes no seu itinerário,
sempre prontas a manifestar o seu ideário,
mesmo sem fator desencadeante mais pungente.
Estão lá dentro e sempre nos influenciam,
a uns mais e a outros menos, realmente,
e a alguns dominam, sem sombra de protesto,
chega o menor pretexto e então se ampliam,
em gritaria de estridor potente,
interrompidas sem o ser por qualquer gesto.
QUEIXUMES II
Sem dúvida que há queixas bem reais,
como um ai proferido de repente,
por qualquer dor que se faz superveniente,
sem haver tempo de controles naturais.
Existem outras por dores presenciais,
mais de valor moral, seja a pungente
injustiça que se sofre bem frequente,
cargas pesadas que não queremos mais.
Mas há aqueles que se queixam sem razão,
por certo tendo o prazer de se queixar
aos demais, para inspirar-lhes compaixão,
sem que remédio realmente vão buscar,
mais em costume de perfeita aceitação;
quem os escuta é que devia se queixar!.
QUEIXUMES III
O problema é que a queixa repetida
a passo e passo se irá fortalecer,
a mente e a alma vão comprometer
desse infeliz que a ela deu guarida,
prazer e ânimo levando de vencida,
até que alguém somente venha a ser
o portador dessa queixa, sem nem crer
que ela possa alguma vez ser corrigida.
Nem o desejam. É o seu tema principal.
o que fazer, passado esteja o mal?
Que outra razão terão para a conversa,
exceto mencionar sua queixa antiga,
azucrinando a qualquer pessoa amiga,
depois que a causa, afinal, seja dispersa...
QUEIXUMES IV
Certa anedota antiga nos menciona
um cidadão deitado em dormitório
de trem noturno, lançando em responsório:
Que sede eu tenho! em voz que não se
doma.
Todo o descanso dos demais tal queixa toma,
até que um outro lhe atende o peditório
e lhe traz um copo d’água!... Esforço inglório,
ele agradece, mas nova queixa soma:
Que sede eu tinha! E prossegue a noite
inteira!
Há gente assim, só vivem para a queixa,
sem coisa alguma a pensar de mais ligeira.
Passada a causa, que lhe resta agora?
Mas descanso aos ouvintes nunca deixa,
lembrando a queixa mencionada outrora!
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