segunda-feira, 21 de setembro de 2020

 

 

Opressão do Estio 1 -- 9 Jan 2018

 

A mão pesada do ar quente que me esmaga

Me empurra contra o solo.  Esse calor

Eu até em garrafas guardaria, mas aziaga

Foi a ocasião de as abrir com estridor.

 

Eu não queria, juro!  O meu ardor

Era vender fora de casa a longa praga

Que é para mim esse falso cobertor,

Mas outros as abriram, em tola e vaga

 

Esperança de ali achar algum conforto,

Permeio ao frio, por terem esquecido

O que antes fora o estio.  Memória cessa,

 

Bem mais depressa que se esvai aborto

E assim soltaram meu verão bem escondido,

Que hoje domina qual mortalha espessa...

 

Opressão do Estio 2

 

Eu realmente um negócio abrir pensara

Ao engarrafar de um verão todo o calor;

Em meu porão mil botijas eu guardara,

Curativo das frieiras seu pendor!...

 

Mas desse lucro não me tornei senhor,

Pois foi o inverno mais quente que esperara;

Alguém abrira de minhas garrafas o estridor

Pensando ser champanha e me roubara!

 

Isso porque, mesmo guardadas no porão,

As minhas garrafas começaram a estourar!

Eram de plástico, sou forçado a confessar...

 

E não do rijo vidro de antemão

E seu calor atravessou o meu assoalho,

Como castigo por meu ato falho!...

 

Opressão do Estio 3

 

Em consequência, o que perdi foi o inverno,

Vendo os passantes de bermuda pela rua,

Expondo ao fraco sol a pele nua,

Mesmo que o vento em nada fosse terno...

 

Dentro de casa, ventilador alterno

Com seu colega e todo o pó estua

De seu rotor, mas o calor flutua,

Vaga lembrança do acalentar materno...

 

Mas de repente, esgota-se a energia

Liberada da botelha que estourou

E o ventilador ventila por demais!

 

E sou forçado a desligar, porque me esfria

Bem mais do que o calor já me cremou

E essa alternância não controlo mais!

 

Opressão do Estio 4

 

O meu calor não consegui vender,

Muito embora o aceitassem de presente

E o introduzissem em coração carente,

Como resgate do frio de seu porém...

 

Mas para mim o conservar não pude ter:

Qualquer calor se expande facilmente,

Das profundezas da adega evanescente,

Para fazer de mim mesmo o seu refém!

 

Perdi o inverno no fragor desses ataques,

Vendo os demais andar semidespidos,

Durante as noites a espancar seus atabaques.

 

Quem sabe empacotar agora possa o frio

E o distribuir no verão aos mais sofridos,

Igual que um sopro sutil de calafrio!...

 

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