ESTRELAS DE ESTRELAS
NOVAS SÉRIES DE WILLIAM LAGOS
26 DEZEMBRO 2018 / 4 JANEIRO 2019
EstrelaS de estrelas (v) – 26 dez 2018
Runas recentes (IV) – 27 DEZ 2018
BARREIRAS MORTAIS (IV) – 28 DEZ 2018
HOMO UNIVERSALIS (IV) – 29 DEZ 2018
CELIBATO (iii) – 30 DEZ 2018
AMOR DE SOMBRA (iii) – 31 DEZ 2018
CANÇÃO DOS DIAS (vi) – 1º JAN 2019
DEMOLIÇÕES (iii) – 2 JAN 2019
SOFÁ AO RELENTO (iv) – 3 JAN 2019
ROLO DE MASSA (v) – 4 JAN 2019
ESTRELAS DE ESTRELAS I – 26/12/2018
em mim ressoa dos Anjos o clarim
e cada uma das Trombetas soa em mim
eu trago em mim as canções dos Serafins
e a majestade marcial dos Querubins
eu tenho em mim o troar das Potestades
e dos Arcanjos as aladas realidades
em mim revelam-se os Tronos poderosos,
Dominações de decretos portentosos
sou parte mínima da Comunhão dos Santos,
da Hagioeukomenis os sempiternos cantos
em arcanos tempos estive na Anasthasis
e o Redentor me acolheu em Apocalypsis
se agita em mim toda a Milícia celestial,
gota minúscula da Infinitude divinal
dormem em mim os Santos do passado,
qualquer que seja a extensão de seu pecado
ressoa em mim dos Apóstolos o coro,
com os Reis Magos ao presépio vou e adoro
dos Profetas habita em mim congregação,
aos quatro ventos proclamando sua missão
em mim os Mártires entoam salmo triunfante,
em seu desfile marchando sempre adiante
mas há em mim a negação dos Confessores,
não necessito de tais intercessores
faço parte do Ourobores serpentino,
a eterna Ecclésia de esplendoroso sino
já marchei com a Igreja Triunfante,
porém a Roda transportou-me adiante
em minha Sansara, sou Igreja Militante,
mas à política recuso-me constante
em meu futuro, sou Igreja Expectante,
desse tapete eterno um só barbante
mas tudo está em mim, que em Deus habito,
mesmo nos tempos de lástima ou conflito
pois Nele vivo, existo e sempre novo
a cada instante me reforça seu Renovo
sua Criação em mim é Continuada,
qual Leibniz proclamou com voz alada
e habita em mim Espinoza, esse judeu
que em Panteísmo o universo descreveu.
ESTRELAS DE ESTRELAS II
sou uma parte do total da Divindade,
pertencente e incluído na Deidade
há muitos séculos Parmênides afirmou
o Ser Perfeito em que tudo começou
e se é Perfeito, nada Dele existe fora
e se é Perfeito, ainda domina sobre o agora
lugar não há para a cronicidade,
somente existe a Simultaneidade
não há lugar para o próprio movimento,
pois abrange todo o espaço em um só momento
já Aristóteles foi um pouco mais além,
tornando imóvel a esse Deus também
e sendo imóvel, existiria na inação,
todos Seus Atos em sincronia estão
e se concebe no temporal o movimento,
diacrônico sendo todo o pensamento,
para Aristóteles esse Deus atemporal
nem sequer pensa sobre o Bem e o Mal
mas não é o Ser que Parmênides mostrou,
sendo infinito, de Si tudo criou
sendo infinito, tem Poder ilimitado,
dentro de Si em movimento continuado
sendo infinito, de tudo tem concepção
e multifários seus Pensamentos são
sendo infinito, não pode se expandir,
mas dentro em Si consegue se infundir
nesse contínuo existindo o Tempo e o Espaço,
ambos aspectos de um e o mesmo traço
nesse contínuo das probabilidades,
no Ilimitado das possibilidades
sendo infinito, também Onipotente,
Onisciente e em tudo Onipresente
sendo infinito, não há limite em Seu Poder,
seria finito sem poder crescer
sendo infinito, não se limita a Sua Razão,
seria finito o seu Pensar sem conclusão
sendo infinito, o Todo já criou,
nada de novo que qualquer homem pensou
sendo infinito, não se limita em sexo,
é Pai e Mãe e em variações conexo
ESTRELAS DE ESTRELAS III
sendo infinito, não pode ser descrito,
não há palavras em um cérebro finito
e no entretanto... é possível conceber
que em Ponto Quântico finito possa ser
e se essa ideia surgiu em ser humano,
em algum ponto há um Finito soberano
sendo infinito, contém igual a Finitude,
contradição que só ao humano ilude
sendo infinito, contém os mil Fractais,
repetições das concretudes naturais
sendo infinito, está do tempo Alheio,
mas em seu Seio o diacrônico tem veio
na infinitude o saltitar dos Quanta,
que se interligam pelo Poder que imanta
só desta forma a ser possível o Milagre,
que o imaginar também Nele consagre
se alguém em tal espanto possa crer,
certamente o Infinito o irá conter
alguns nos dizem haver Mundos Paralelos
a nosso lado, sem podermos vê-los
e desse modo, segue a Proposição
que em alguma feita nos extenda a mão
e nos transfira para diverso Plano
em que se faça possível tal arcano
se é infinito, é o Sumo Bem perfeito
e se é perfeito, nele a Ausência não tem leito
a própria ausência uma parte da Presença,
presente a ausência no fulgor da crença
e se ausência não há, tampouco existe o Mal,
do Bem a ausência sua definição real
contudo os seres materiais são imperfeitos,
por isso a Ausência neles rasga os eitos
não se percebem integrados no Abstrato
e assim o Mal dentro deles vive em fato
pela própria Ausência do Bem da Perfeição
e na Presença do Imperfeito nosso irmão
e por nos conhecermos Limitados
nesses vazios de Mal apelidados,
então possível a concepção do mal também
pela ausência imperfeita desse Bem
ESTRELAS DE ESTRELAS IV
o Bem Supremo também nos concebeu
e a Contingência assim nos concedeu
limitados que somos e imperfeitos,
na diacronia dessa Ausência feitos
mas no conjunto em plena Emulação,
ainda capazes de conceber a Perfeição
dentro de nós habitando o Bem e o Mal,
que concebemos como algo de vital
também assim nós fomos constituídos,
como Infinitos em imperfeição perdidos
por isso vivo e creio no impossível,
no concreto, o Milagre é inatingível
mas se imagino o milagre no Abstrato,
certamente é algures claro fato
não há portanto qualquer dicotomia,
tal qual Descartes nos insistiria
mas corpo e alma aspectos irmãos
na deiscência de mil sonhos vãos
essa serpente que forma a raça humana,
em que há mil séculos Ouroboros se proclama
e se é possível imaginar a Recorrência,
de que tudo e todos tenham dependência
então o Sono de Brahma é assim possível,
que expira e inspira em constância imarcessivel
e se podemos conceber a Expansão
do Universo, o Big Bang
em formação
para depois em Big Crush
se esmagar,
quando ao Princípio tudo há de retornar
sendo possível imaginar, então se encontra
e em qualquer parte esse Brahma se demonstra
mas se apenas respira e o mundo sonha,
não interfere em ocasião boa ou medonha,
pois tudo que hoje ocorre já Ocorreu
e no futuro por igual desvaneceu
para então retornar, todo e completo,
desde uma estrela até o menor inseto
se isto é concebível, de algum modo o é,
não sendo apenas uma questão de fé
para quem creia em tal concepção,
dessa eterna recorrência na imersão.
ESTRELAS DE ESTRELAS V
mas este deus da eterna recorrência
que tão somente respira a intermitência
não foge assim ao conceito do infinito
ou de outra forma também nele se acha inscrito?
e novamente eis a Relatividade
do tempo e espaço em face da Deidade
tudo o que existe sendo apenas Atributos,
sem dar razão para alegria ou lutos
contudo esse Deus Infinito não dormita,
indiferente a quem suplica e grita
se é infinito, por natureza é Bom
e sobre nós esparge esse seu Dom
mas o que é bom na verdade é o Cumprimento
dessa Obra que constitui nosso Talento
e se julgamos bom ou mau o que nos traz
é que alegria dá ou infelizes então faz
e sendo em natureza limitados,
seres do tempo, na Matéria concretados,
como podemos encarar a grande Imagem,
tapeçaria de imemorial paisagem?
pequenas células capazes de Inquietude,
que a cada qual fome e sede ainda ilude,
em sua busca antropocêntrica de um bem
que na sua Essência todo o mal contém
células somos que a um corpo pertencemos
e nessa Infinitude nos perdemos
Anjos e Arcanjos, doces Serafins,
Tronos, Dominações e Querubins
na gradação das divinas Potestades,
somente aspectos de Universalidades
que estão em mim como parte do Infinito,
no mar eterno da Deidade em que me agito
não há motivo para revolta ou incompreensão
dos Avatares em sua imensa multidão
e um Demiurgo igualmente em mim habita
que ao Microcosmo construir me incita
igual que esse Reitor de toda a Terra
que toda a imperfeição governa e encerra
e assim a leva a crescer e aperfeiçoar-se
para ao Deus Infinito então lançar-se
ESTRELAS DE ESTRELAS – EPÍLOGO
em cada Estrela se localiza um Trono
a governar suas instâncias com entono
e em seu conjunto se achará Dominação
a presidir sobre qualquer Constelação
e nas Galáxias dominam as Potestades
a se curvar perante excelsas Majestades
estrelas de estrelas formando as Sete Ordens
a refutar do Caos toda a desordem
e somos deuses por fazer parte do Todo
a aceitar o que nos cabe com denodo
e somos santos na nossa imperfeição,
um só Intercessor nos extendendo a mão
e assim entoo as canções do Serafins,
marchando ao lado dos augustos Querubins.
runas recenteS 1 – 27 dez 2018
Amor, perpetuidade passageira
que se abandona sem nunca se soltar,
que traz o fim já antes do começo,
que tem começo depois de terminar!
amor egoísta, emoção interesseira,
em busca fútil por perpétuo apreço,
amor pingente, a se usar como adereço
sobre o próprio coração a palpitar...
o que se espera que em ti eu possa
achar
que no passado qualquer outro não
achou?
o que dizer, quando nada existe novo,
quando tantos já te puderam revelar,
neste meu verso TRANSITÓRIo que eu
estou
inutilmente a distribuir ao povo?
runas recentes 2
amor que tanta vez JÁ NAvida descrevi,
desde versos de um poeta apaixonado,
desde os ingênuos do amor atribulado,
quantos milhares já fui deixando por
aqui?
mas pouco importa esse muito que
escrevi,
o que interessa é o amor que tens
guardado,
que no teu peito se encontra bem
cuidado,
amor diverso, porém igual ao que eu
senti.
pois todos nós nascemos feitos desse
amor,
por gentil que tenha sido o
crescimento,
por inseguro todo o nosso avivamento,
ainda algo sempre em nós mostra calor,
nem que seja o amor de um só momento,
que se descarta por nos trazer
padecimento.
runas recentes 3
amor de mãe, que a maioria já teve,
amor de um par a quem se acarinhar,
amor exíguo que nos brota do sonhar,
amor da glória, sempre escassa e breve.
amor que ao coração manjar lhe ceve,
amor solerte no lusco-fusco a acampanar,
amor perfeito a nos acompanhar,
amor de mãe ou pai que a gente deve.
amor de sentimento que envergonha,
amor que até se finge desprezar,
amor de runas por batalha a se travar,
amor por versos em que um poeta sonha
e a poetiza até prefere nao mostrar,
por nao querer ser tomada por bisonha.
runas recenteS 4
mas sempre amor pelo mundo perseguido,
qualquer que seja o nome que lhe dês,
amor por deus ou santo no qual crês,
amor por um bem ganho ou mal havido,
pois bem conheces o amor em ti contido
e é somente em redundância que me lês,
dentro do peito está o amor real que
vês,
dentro da alma, qual tesouro recolhido.
mas sem amor quem vive, cara amiga
ou bom amigo, mesmo que seja por ti
mesmo,
esse amor pálido que já sofreu intriga
ou esse amor pela lembrança tão antiga
ou esse amor infeliz, lançado a esmo,
mesmo quando um outro amor não se
consiga?
BARREIRAS MORTAIS I – 28 DEZ 18
Para falar francamente, eu me cansei
de escrever versos, tal qual eu desgastei
o meu ideal de amor, tal qual se foi
essa parelha paralela que gozei.
A vida é assim: aos poucos, ela rói
o bem e o mal; o tempo tudo mói;
em meu porvir outros ideais também terei,
mas essa perda dos antigos ainda dói.
Essa a razão de meus versos enlameados,
atolados em desânimo, empoeirados,
que não quero mais mostrar e entanto o faço,
sem brilho intrínseco, somente um fulgor baço,
de quem queria e não mais deseja abraço
e assim descrevo só meus sonhos descuidados.
BARREIRAS MORTAIS II
E no entretanto, por mais que esteja farto
de escrever versos, novos versos surgem,
de ser lançados ao mundo ainda me urgem,
pelas mil dores minúsculas de um parto,
cada soneto fibrilação de enfarto,
enquanto mil duendes em mim rugem
e os monstros de meu Id ainda mugem,
um Boi Ápis a escoicear quarto por quarto.
Frequentemente, a menção de uma barreira,
um “bloqueio de escritor”, assim chamado,
eu li algures ou então tenho escutado;
contudo, para mim a força inteira
se destina a impedir esta parada
de cada lástima e alegria derramada.
BARREIRAS MORTAIS III
Já muitas vezes pretendi parar,
mas pouco a pouco, insidiosa palavrinha
corria pelos dedos e assim tinha
de um novo rascunho elaborar,
em três ou mais a cada dia me atiçar,
cada soneto a protender gavinha,
que já em novo poema ou ladainha,
com azorrague fazia-me anotar.
Só conseguia mais garranchos empilhar
por um período sem nada digitar
e enfim na pilha de versos me afogava,
numa barreira mortal a me forçar
e no teclado novamente me empenhava
para uma parte do entulho dispersar...
BARREIRAS MORTAIS IV
Será que este, afinal, é algum dom
ou antes uma espécie de castigo,
para os autores que recebi comigo,
poetas mortos a me dar seu tom?
Do inconsciente coletivo o largo som,
de um avatar dionisíaco em abrigo,
de alguma pena que até hoje não consigo
completar, mas que na alma trago com?
Neste exercício de real futilidade,
a expandir em vão estas barreiras,
que em contrapeso ainda se fazem mais grosseiras,
porém que enfrento com serenidade,
nesta completa inversão de minha vaidade,
acumuladas assim desde as primeiras.
HOMO UNIVERSALIS I – 29
DEZ 2018
Eu me sinto flutuar em
gelatina,
na superfície mole de
minha vida,
nessa lama dolente e
emurchecida
nem nado e nem afundo em
triste sina.
Tão somente eu balanço
essa cortina,
pastosa e transparente,
comprimida
ao longo do futuro,
amortecida,
frouxa demais para
mover-me acima
e vejo a vida assim,
convalescente
de medos e incertezas, de
alegrias,
em paladar inócuo, que
nem provo
e nas braçadas inodoras,
repelente,
envolto nesse gel que em
vão escovo,
na odisseia multicor das
zombarias...
HOMO UNIVERSALIS II
Não é inteiramente de
minha vida
a superfície sobre a qual
flutuo,
mas composta de mil
vidas. Eu aguo
as flores secas de
geração perdida,
as semprevivas da massa
comprimida,
dos séculos de corpos que
hoje amuo:
é a semente das eras que
hoje suo,
na gelatina dos
ancestrais contida,
no grande abismo
plurimultissecular,
em que deixaram seus
rastros permanentes
antepassados por mim
indiferentes.
Mas que da cova vêm-me
suportar
e sobre essa multidão
ensimesmada
minhas próprias penas nao
representam nada.
HOMO UNIVERSALIS III
Mas o protoplasma da
carne que me aquece
é cópia autêntica do
sêmen projetado,
de cada óvulo para o
mundo derramado,
de cada maldição, de cada
prece
da gelatina que flutua e
me estremece
e afaga a alma de meu
peito renovado,
na derme das mil almas do
passado,
nesse místico espírito
que em mim desce
e assim levanto a
cortina, pouco a pouco,
sem realmente ter vontade
de ver nada,
mas a memória celular em
mim se agita.
E cada aspecto de cada
sonho louco
dessa lembrança racial em
mim gravada,
torna-me a ponta da
facetada fita.
HOMO UNIVERSALIS IV
Mas sei que a ponta sou
apenas temporária,
outros de mim no passado
ali estiveram,
em seu esperma também me
recolheram,
com seus óvulos a
explorar a almaviária
e com os versos da rima
multifária,
tantos milhares ou mais
me sucederam,
quando eu me for os que
me compreenderam
pelas pontas seguirão da
chama vária
e assim me encontro no
passado medieval
e remanesço no presente espiritual,
como tantos de antanho em
mim se encontram,
desta minha raça
derrotada e triunfal,
entre a perfídia e a
glória que demonstram,
na circonvexa convecção
do bem e mal.
CELIBATO I – 30 DEZEMBRO
2018
Amor tão decifrado e tão
enigma
que abrange inteiramente
as multidões,
tangendo cérebros,
palpitando corações,
ao pecador enobrece, ao
santo estigma.
Amor codificado em viés
de sigma,
essa mão pálida que dá
cor às emoções,
pastor de sonho e ovelha
de ilusões,
em seu contrátil
esplendor de esfigma.
Amor que é pássaro, pois
sempre de nós voa
aonde deseja, onde talvez
possa pousar,
onde mais possa alegrar,
onde mais doa,
amor que é flor perpétua
e emurchecida,
que dentre um mar de
cinzas vem brotar,
por tanta vez nem sequer
reconhecida...
CELIBATO II
Pois não é bom que o
homem esteja só,
considerava já o Gênesis
antigo,
no fundo dalma devo dar
abrigo
a tal prodígio que em
pouco vira pó,
amor que espera
compartilhar o dó
de um coração com coração
amigo,
esse amor que no ventre
tens contigo,
mas que teu fígado aperta
em forte nó.
Amor estrela que explode
pelo olhar
e interpenetra outra
estrela passageira,
amor que pode perdurar a
vida inteira,
mas que é tão raro
poder-se permutar,
quando amor desce e nao
encontra o ideal
e se conforma finalmente
ao desigual!...
CELIBATO III
Amor sexual feito igual
celibatário
quando um corpo se
desposa e a alma não,
quando a mente não
penetra, amor anão
no gigantesco limiar, só
amor diário,
amor saudade de um mágico
contrário
que se reveste de
nostálgica emoção,
enquanto o espírito
renega essa paixão
e a seu redor se revolve,
perdulário.
Amor que surge no canto
das pupilas,
na inesperada magia
periférica,
mas que encarado é o
balançar de um galho,
amor desnudo, quase amor
de esquilas,
enquanto a alma de
descasca em dor homérica,
em sua odisseia que só
provém de um ato falho.
AMOR DE
SOMBRA I – 31 DEZ 2018
Amor
noturno, amor tentacular
de
sombras longas vertidas no passado,
enquanto
o Sol, de seu berço encantado,
nascia
jovem, ilusório e secular.
Amor
diurno, mas também crepuscular,
sombras
projeta para o ignorado,
amor
tocaiador, todo embuçado
nesse
porvir que só se pode imaginar.
E fica o
jovem de coração airado,
olhando a
seu redor, quer encontrar
esse amor
de esperança, amor eivado
de uma
certeza que não se pode achar,
esse amor
inserido em brando mar
de cada
feromônio respirado.
AMOR DE SOMBRA II
Amor de adulto, que se sabe conformar
com a breve sombra que o meio-dia produz,
pequeno círculo em que a espera não reluz,
sem sua fantástica expansão mais esperar.
Mas tão real nesse seu irrealizar,
amor secreto por tal furtiva luz,
braços abertos, sem apoio em cruz,
em cruz alheia buscando-se apoiar.
Amor que busca guardar em sua gaiola
essa emoção que alimenta com carinho,
com néctar de sonho, mel e vinho,
amor que prende a vida, amor argola
contra o grilhão da quimera já perdida,
mas que em suspiro pode ainda ser contida.
AMOR DE
SOMBRA III
Amor de
sombra, já estendido no passado,
com todo
o bem e o mal que revelou,
amor que
tanta esperança esmiuçou,
falsos
tesouros que em nós teve acumulado.
Amor de
aliança com o ensejo confirmado,
amor
chibata por desdém que nos mostrou,
amor
diverso do amor que se sonhou,
porém em
tudo amor real e vivenciado.
Amor de
vento cantando na galhada,
por ser
amado que nunca apareceu,
porém que
às dádivas do sonho pertenceu,
enquanto
a vida material ensimesmada,
sombra de
espelho em que não mais refletes,
fez-se
fantasma já desfeito em mil confetes...
canção dos dias I – 1º de
janeiro de 2019
Um dia a outro
dia canta uma canção
E uma noite aviva
conhecimento a outra noite,
Sem fala e sem
palavrasm sem se lhes ouvir a voz;
Contudo a Voz do
Senhor atinge a extremidade da Terra
E ali pôs uma
tenda para o Sol.
mais outro ano para mim
se concluiu,
ainda que seja tão só no calendário,
já defasado de seu real
fadário,
que a precessão dos
equinócios diluiu
ao fim do ano, toda a
tristeza nos ruiu,
nessa ilusão de um sonho
plurifário;
que o novo ano será
inteiro solidário,
nova esperança desde
Janeiro nos fluiu.
que assim seja, talvez,
para quem crê;
bem gostaria partilhasse
desse anelo,
que o novel ano, de fato,
seja belo,
mas para mim nada
especial me lê
mais este dia do zodíaco
alijado,
que nem sei se se
adiantou ou está atrasado...
canção dos dias II
contudo, não distingo divergência
entre esse branco esperar
da humanidade
e o ceticismo com que
encaro essa saudade,
em nostalgia por sua
ínclita impotência;
nem equinócios de gelidez
ou ardência,
nem solstícios de real
desigualdade
subsistem entre nós com
claridade,
só a astronomia é que
demarca sua existência.
mesmo nas datas que
proclama o calendário,
há dois mil anos se
demarcou o Juliano,
há seis séculos ou mais o
Gregoriano
e certamente necessitam
de reforma,
enquanto a Terra a seu
redor se torna,
do Sol bebendo seu brilho
perdulário...
canção dos dias III
como verdade real é só a
passagem
dos dias claros como bons
harpistas,
noites de breu que mal e
mal avistas:
talvez se brindem num
esconso de estalagem;
em minha epígrafe deixei
como mensagem
a frase arcaica de tão
vetustas pistas
que bom tropeço causou a
alguns cientistas
em sua insistência
contrária à vassalagem
do Sol à Terra, que a
Igreja defendia,
em Geocentrismo, a
condenar por heresia,
igual que a Lua e os
Planetas a girar,
em torno ao solo em que
nasceu o Salvador;
como ao Sol iria pagar
então penhor
ou as Santas Escrituras
contrariar?
canção dos dias IV
se nossa Terra possui
extremidades
de que modo ostentaria a
redondeza?
mil teólogos pregando na
defesa
da Terra Plana contra as
veleidades
dos filósofos pagãos de
antiguidades,
a afirmar, em impiedade,
sua certeza
de que houvesse rotação,
vendo em lerdeza
na poesia a descrição de
irrealidades.
e no entretanto, esta
“tenda para o Sol”,
só uma belíssima figura
de linguagem?
mas então seria este
Hélios ou Apolo,
um deus pagão com morada
ao pôr-do~sol,
após de carro percorrer
toda a paisagem,
e no Ocidente acampar-se
sobre o solo?
canção dos dias V
e contudo, e contudo...
não sou eu
o primeiro a sugerir que
o imaginado
no mundo seja por nós
realizado:
só o que se pensa após
isso sucedeu.
montanhosa Gaia no início
pareceu,
o conceito de planura
consagrado
na equipolência entre o
monte mais airado
e a planície que até a
praia se estendeu.
e se, de fato, só então
tornou-se plana,
já foi progresso sobre a
inicial concepção;
e quando enfim a
redondeza se afirmou,
fez-se redonda, talvez
apenas desde então;
e a cada vez que o
imaginar se inflama,
mais complexa a criação
então tornou!
canção dos dias VI
redonda sendo a Terra, se
pensou
no movimento dos astros
em entorno
e de fato, foi o Sol o
nosso adorno
até Copérnico, que só
morto publicou
o seu trabalho que a
doutrina contrariou
e mais além as
constelações em torno
foram galáxia e o
pensamento morno
em Multiverso ao Universo
transformou!
será que a Relatividade
só surgiu
depois de Einstein? E o
Quântico criou
Niels Bohr, na vez
primeira em que o pensou?
e na simples natureza
hoje há fractais...
nenhum Universo Paralelo
ainda se viu...
mas no futuro,
imaginaremos quanto mais?
DEMOLIÇÕES I – 2 jan 2019
A meu redor, a cidade se desmancha,
bem diferente do que foi
na minha infância;
tantas as casas dessa
primária instância
já demolidas, para dar
espaço e cancha
a um novo prédio, aerodinâmico como lancha,
a projetar-se em esguia
manigância,
enquanto os bairros,
cheios de inconstância,
se disparam ao redor, em
vasta mancha
e se demolem as calçadas
dos fantasmas,
que em breve nem mais
podem se orientar;
de antigos passos não
conseguem encontrar
os vestígios e mal e mal
os miasmas
que nos deixaram enquanto
vivos foram,
desalojados dos abrigos
em que moram...
DEMOLIÇÕES II
alguns prédios se dizem
preservados,
na afirmação de seu valor
histórico,
mas só depois do
desmanchar já estentórico
dos mais antigos, que
deviam ser guardados.
as lembranças dos infantes espantados,
quando a fachada
colonial, com toque dórico,
já não encontram, porque algum teórico
decidiu poderem ser já dispensados.
pleno descaso de seu
plano diretor,
recompensa pecuniária em
seu favor,
enquanto insistem em
conservar cem casinholas,
porque a propina a seu
bolso não chegou,
para o progresso mal
disfarçadas molas,
quando o “tombar” por já
tombado desprezou.
DEMOLIÇÕES III
assim calçadas antigas
rebentadas
pelo pretexto de ajudar
os deficientes,
rampas inúteis ao lado de
existentes,
feias feridas ali
superfaturadas!
e quantas almas dos
corpos descarnadas,
aqui voltando para ver os
seus parentes,
não verão mais antigas pedras existentes
e ao cemitério volverão, desarvoradas!
isso é o progresso,
segundo me disseram,
porém o mundo inteiro
reconstrói
o que a guerra ou
terremoto destruiu
e nós aqui, a quem os
santos protegeram,
mais roedores do que o
tempo rói,
baldios deixamos o que o
tempo nao ruiu!
SOFÁ AO RELENTO I – 3 JAN 2019
Em minha rua existia um prédio antigo,
Mais de cem anos, talvez cento e cinquenta
Que a Esquina Maurity por longo ostenta,
Com dois andares e janelas de postigo.
No período da ereção, raro alguém tenta
Mais de um andar construir para consigo;
Não sei quem o elevou, nem que inimigo
O velho prédio herdou, que se sustenta
Por décadas a fio, sem se arruinar;
Há poucos anos haviam feito uma reforma,
Mas talvez fosse difícil de alugar
Ou o IPTU que a Prefeitura informa
Alto demais se acabasse por tornar
E o proprietário não quisesse mais pagar.
SOFÁ AO RELENTO II
Apenas vi um dia, ali passando,
Seis operários a fazer demolição
E um suspiro soltei de compaixão
Pela estrutura que já estava desabando.
Um tapume alguém depois foi colocando,
Meia calçada a tomar em agregação,
Na rua estreita provocando confusão
E certamente algum fiscal foi reclamando
E desta forma foi o tapume reerguido,
Porém sem mais agredir o meio-fio,
Do exterior das residências no sentido;
Porém caiu e foi erguido novamente,
De arame farpado passando mesmo um fio,
Firmando o resto que estava ainda pendente.
SOFÁ AO RELENTO III
Porém deixado assim tão mal fechado,
O capim a crescer onde era o assoalho
(algumas tiras de mármore, em ato falho
Eu fui pegando do solo abandonado),
Como depósito de lixo a ser usado,
Sacos de plástico, bolsas já com talho,
Para os mosquitos criadouro esse retalho,
Na pobre esquina só um fantasma apalermado,
Até que alguém da alma-penada teve pena
E ali jogou um sofá meio estourado,
Final recanto para ali ser assombrado
E a Prefeitura nem sei se algo condena!
Está o sofá como convite a algum mendigo,
A disputar ao abantesma o seu jazigo!...
SOFÁ AO RELENTO IV
Até parece que esta história é inventada!
Fica esta esquina na parte mais antiga
De minha cidade e é preciso que se diga,
Com a rua principal entrecruzada!...
Do outro lado da rua está a fachada
De um orfanato, hoje escola, em que se abriga
Uma joven multidão que ali consiga
Reprodução de uma doutrina autorizada.
Mas os mosquitos transmissores de doença,
Sem atenção demonstrar à velha crença,
Ali encontram vasto e belo criadouro,
Entre os tufos de capim e erva daninha,
Alegre adeja cada alada mosquitinha,
Seus filhotinhos a brincar no logradouro!
ROLO DE MASSA I – 4
JANEIRO 2019
Determinou-se aplicar
tornozeleira
e nem por um instante se suponha
que a aplicação a um
agressor me oponha,
de forma preventiva e
corriqueira.
Assim se evita agressão
mais derradeira,
em que o ciúme outra
ferida ali reponha
quem restrição obedecer
nem sequer sonha,
arma contra o feminicídio
bem certeira.
Mas a moeda sempre tem
dois lados...
e quando a sogra ou a
mulher é a agressora,
estereotipada com seu
rolo de massa,
quando os maridos é que
são os espancados,
quando de casa em ameaça
alguém os corra,
sem a seus filhos visitar
deixar que o faça?
ROLO DE MASSA II
E nesse caso, a quem pode
se queixar?
Deixar a ação nas mãos de
advogado,
cada processo enganchado
no passado
é sugestão até de se
troçar!
Como à Delegacia da
Mulher irá levar
o seu registro por ser
igual lesado
que uma mulher que
tivesse ele atacado...?
Será que ouvidos alguém
irá lhe dar?
Não sei se existe já
jurisprudência,
mas raro o homem a tomar
essa atitude,
de ali encontrar só
zombaria não se ilude
e assim aceita seu
destino com paciência
ou acaso a lei mandará,
por vez primeira,
que seja a sogra a usar
tornozeleira?
ROLO DE MASSA III
E como fica a questão homossexual?
Em toda relação há um dominante
e um dominado desde o primeiro instante:
será o casal de dois maridos, afinal
ou um dos dois é a parte fraca do casal,
sendo espancado ou levado por adiante?
A quem se queixa esse triste litigante?
Tornozeleira impõe ao outro ordem legal?
E se o dominado é mais a esposa
e assim procede de maneira natural,
irá queixar-se na Delegacia da Mulher
e por mais feminina essa sua prosa
será tratado como um homem, afinal,
sem um registro obter-se ali sequer?
ROLO DE MASSA IV
Contudo, há mais... E se
o relacionamento
tem um lésbico caráter
mais social,
esposa-esposa, ou de
forma artificial
a dominante é o marido em
tal momento?
E que não haja aqui
constrangimento,
uma jovem minha amiga, em
um tal casal,
era a mais fraca por
motivo consensual,
a sua Alpha a dominar o casamento.
Pois a espancou até
causar-lhe a morte!
A Delegacia da Mulher
acolheria
uma queixa da infeliz antes
do corte
final de sua vida nesse
norte
e a dominante forçada
então seria
a usar tornozeleira de
igual porte?
ROLO DE MASSA V
Neste caso, a questão é
só teórica,
a minha amiga já sofreu
feminicídio,
nesse tempo ainda a
chamar-se de homicídio
(para mim, isso não passa
de retórica!)
mas se existisse uma
ficha já histórica,
com um registro de
agressão por esse ofídio,
dessa mulher demonstrando
seu insídio,
seria a pena algo mais do
que simbólica?
E não se pense ser algo
excepcional,
que em muitos casos
existe espancamento
ou outra forma de domínio
aqui aplicado...
Pois eu reclamo a
proteção do homossexual,
tantas facetas nesse
relacionamento,
que nem se trata de
moeda, mas de dado!
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