A BOLSA DO CANGURU I – 29 JULHO 2016
“Foi depois do Dilúvio. Um
viandante” (*)
seguia bem depressa pela estrada,
acompanhada por toda a filharada...
Surgiu o Quati e interpelou-a nesse instante:
(*) Citação de um verso de Castro Alves em Vozes d’África.
“Aonde vai, Comadre? Está bem
elegante...”
“Vou à festa que Tio Noé tem preparada...”
“Mas duvido que consiga nela entrada!
Seu convite foi bem claro e dominante...”
“Só os animais que na Arca viajaram,
nenhum filhote e nem qualquer criança...”
“Mas meu marido está longe, foi saltando...”
“Até a Austrália, a ver se as águas já baixaram;
de retornar para lá nossa esperança...
Abandonar não podia este meu bando...”
“Mas não adianta! Foi um convite taxatório:
só os adultos para a festa
convidados...
Tio Noé é gente boa, mas malvados
os filhos dele. O texto foi peremptório!”
Crianças deixam tudo num mictório!
Há assuntos sérios para serem combinados.
Pelas crianças nós seremos perturbados:
fazem muita gritaria, é bem notório!...
Chegaram o Macaco, a Paca e o
Coelho.
“Mas por que não os deixou na sua
casinha?
Estão os meus bem quietos na
toquinha,”
Disse o Coelho. “Toma conta o meu mais velho.”
“E o meu marido ficou assando
pão,”
falou a Paca. “É bem gentil de coração...”
“E a minha Macaca ficou na sala,
fofoqueando
com a Orangotanga, a Guariba e a
Chimpanzé.
De nossas crias assim cuidam bem,
até...
Só a um de nós o Tio Noé foi
convidando...”
“Mas com quem os meus nenês iria
deixando?
Nossa choupana é toda feita de
sapé...
Tentei fazer com que dormissem,
por minha fé,
só que o mais velho estava sempre
despertando...”
“De toda a turma enchi bem a
barriguinha,
mas insistiram para vir comigo à
festa!
Atrás de mim vinham pulando na
floresta!”
“Fui obrigada a trazer toda a
turminha!...”
“Os seus filhos malcriados é que
são,”
disse o Quati. “Tudo vem da criação!...
A Cangurua até ficou meio ofendida:
“Eles são bem criadinhos, sim, senhor!
Mas apegados são a mim, que é um amor!
Ainda mais com o pai estando de saída...”
“E depois, esse convite até invalida
a minha vinda, indelicado que é um horror!
Venha sozinha, sem os
filhos, por favor
É lá isso convite que se receba nesta vida?”
“Não é assim,” falou o Quati. “Nem
há lugar
na casa grande ou no pátio de Noé:
cada um dos bichos já arranjou urna filharada!”
“Chegando todos, até a comida iria faltar;
vão quebrar tudo, copos e pratos até!...
Dona Noé iria ficar desesperada!...”
A BOLSA DO CANGURU II
“Só imaginem se o Compadre Rato
aparecesse com a imensa filharada?
Eles roeriam tudo, sem deixar mais nada!
E se os caçasse nosso Compadre Gato?”
“Lembra os filhotes do Compadre Pato?
Iriam fazer uma tremenda gritalhada!
A pular e a sujar na mesa armada!
Que lá não devam chegar é um puro fato!”
“Pior ainda, já pensou nos leitõezinhos?
Não há nada que não sujem tais bichinhos!
Transformariam a festa inteira num chiqueiro!”
“E se viessem então gafanhotinhos?
Iam fazer da festa uma tristeza!
Comendo tudo, até a toalha da mesa!...”
“Mas o que é que eu faço?” –
indagou a Cangurua.
“Vejo só uma solução,” – disse o
Macaco.
“Volte agora para casa. Em algum barraco,
há de encontrar qualquer vizinha
que se atua.”
“Cuidar concorde seus filhotes
até que a Lua
os faça adormecer em seu
buraco...
Depois da festa, para ela leve um
naco
do bolo... Não se dá bem com a
Perua...?”
“Tem a Comadre Ornitorrinca, mas
não sei
se vai querer... Dona Koala é minha amiga,
mas seus maridos viajaram com o
meu...”
Com alguma delas minhas crias
deixarei,
caso a turminha convencer
consiga...
Vamos voltar, guris, que já quase
escureceu!...”
Porém quem disse que seus
canguruzinhos
queriam saber de para a casa
retornar?
“Quero ir à festa!...” – se
puseram a berrar,
“para comer bastante bolo e mil
docinhos!...”
Finalmente, a Cangurua decidiu:
“Macaco amigo, empreste-me seu
saco!”
“Mas está cheio com a roupa para
a festa!”
“Eu quero me trocar...” Mas ela insistiu:
“Seja bonzinho, como um gentil
Macaco!...”
“Vou-me sujar no caminho da
floresta...”
“Coloque a roupa nesta minha maleta,
a minha trouxe, também, para trocar
e dentro dela ainda há um bom lugar...”
E o Macaco de reclamar se aquieta.
“Vocês me ajudem agora...” – disse inquieta.
Logo os amigos a se prontificar.
“Vamos à festa, então!” – pôs-se a chamar
e seus filhotes retornaram como seta!...
E foram sendo abraçados, um a um,
E ali enfiados, numa manobra pura,
dentro do saco todos apertados,
que ela prendeu como bolsa na cintura,
sem conseguir se escapar nenhum
e numa bolsa são até hoje carregados!...
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