E é a própria imagem que me espelha,
em sua risada que solta derradeira,
quando partiu-me, no final,
meu coração.
ABELHAS CARMESIM I (2009)
(Colleen Moore, cinema mudo)
A pele contra a pele... Imaculado
é o ato de amor com quem se ama,
que muito mais ao coração reclama
do que outro coito apenas esboçado.
Não é o vazio do corpo entrelaçado
preenchido por outro que derrama
sangue de fel no ato em que proclama
tersa paixão em rojão deliberado,
num vácuo de despeito, luz sem brilho:
é jaça de diamante, é voz calada,
escuro no horizonte, negro sol,
apenas a explosão com que te encilho
e mil nêutrons em corrida amargurada
à radiação repentina do arrebol.
ABELHAS
CARMESIM II (2 setembro 2011)
Eu te darei
leite e mel pela manhã
e lamberei
doces gotas nos cabelos,
depois te
lembrarei de meus desvelos,
na comunhão
de vinho e de romã.
Eu te darei a
graça mais louçã,
na tessitura
de pele e peitos belos
e deixarei
sobre teu ventre os selos
da melopeia
suave e temporã.
Pois serás
minha, desnuda e revestida,
na cadência
pueril da aurora muda
de teu
antanho toda engalanada:
de
madressilvas e pitangas, luz e vida,
na secular
harmonia que te escuda,
pela certeza
de saber-te amada!...
ABELHAS CARMESIM III
E pela tarde, de novo me darás
o mel que de tua boca se refina
e o leite destilado da vagina,
o leite e mel que de manhã receberás.
E enquanto sobre nós vela a cortina
e impede nos perturbem vistas más
ou as galhofas de mil nuvens de gás
do hálito mau que ao amor sempre assassina,
eu te devolverei leite de amor
e minha própria seiva será doce,
enquanto me recobre teu suor,
como se mirra e especiaria fosse;
e na urna de alabastro o meu calor
mais uma vez a extinguir-se expôs-se.
ABELHAS
CARMESIM IV – 10 dezembro 2023
E quando
me hospedar no camarote,
para a
viagem a que o vento me impulsiona,
canto das
ondas na cocleia me ressona,
peixes de
fósforo voejando sobre o bote
e assim o
rosto teu, como lingote
de ouro
puro, envolto nessa coma
de
estrelas cintilantes, nessa goma
de visgo
e de azevinho, no chicote
que teus
cabelos vergastam em minha face;
e que
tuas coxas me prendam, exigentes,
sem
permitirem me afaste um só momento;
que seja
o seio o aroma que perpasse
toda a
réstia de sonhos refulgentes,
a me
toldarem inteiro o julgamento.
ABELHAS CARMESIM V
Mas os mamilos de rosa aureolados
são iguais a duas abelhas carmesim
a picarem minha lingua, pois assim
ferrão me cravam nos lábios inclinados.
Então irei preencher os teus alados
véus membranosos de um ideal comum,
enquanto ela sorri-se no sem-fim
desses beijos de amor descompassados.
E que tuas mãos segurem minha cabeça
e a prendem firme contra o púbis nu,
ansiando ser permanente o movimento,
lábios e língua de que jamais se esqueça,
nesse sabor que me derramas tu,
qual elixir do eterno esquecimento.
ABELHAS
CARMESIM VI
E que te
faça gritar entre meus braços,
nesse
arremedo de dor de tua expressão,
quando em
teus olhos se rcvela a exultação,
nesse
prazer supremo dos abraços,
que
reconheça no esgar dos traços
a dor que
manifesta em confissão
dessa
entrega total, pura paixão,
na luz
esquiva de teus olhos garços!
Coma
dourada em orgasmo cintilante,
que seja
o teu prazer que mais me afoga,
que me
espedace nas falésias de teus beijos
e que
seja só nosso o eterno instante,
em que
nas nuvens a casa inteira voga,
na implosão
incontrolável dos desejos.
ABELHAS CARMESIM VII – 11 dezembro 23
Que então me tomes em sofreguidão,
primeiro a glande em farejar secreto,
depois a língua a implorar afeto,
depois os lábios em maior exploração
e a boca inteira me recolha então,
em compassado ardor mais indiscreto
e que de novo a língua, como inseto,
abelhas carmesim colha em botão!
A minha boca na tua boca de segredos,
a tua boca na espada da lascívia,
enquanto os corpos sobre o leito giram
e sobre a carne das nádegas os dedos
ainda corram sobre a pele nívea,
enquanto a derradeira gota me retiram.
ABELHAS
CARMESIM VIII
Porém que
seja por momento breve
e após de
novo tua boca me ilumine
e de teu
hálito o cheiro me fascine,
para
depressa concluir minha greve,
que
novamente sobre ti meu corpo deve
esforçar-se
à função que se destine,
enquanto
tua testa se erga e bailarine
e a um pas-de-deux com mais vigor se atreve
e
novamente os teus gemidos misturados
sejam aos
meus, embora mais contidos,
enquanto
orgasmos procuram ser retidos,
até que
sejam os fluidos derramados
e quantos
gritos de paixão havidos,
antes que
sejam em zigotos combinados.
ABELHAS CARMESIM IX
Entre as avencas do ventre há outra abelha,
oculta em suas folhagens carmesim,
tripla armadilha de pudor assim,
para escudar a raça que se espelha;
pois no clitóris encontra-se a corbelha
e o zângão a ela se projeta enfim,
em seu voo sideral, qual
Aladdim,
lustrando em âmbar sua lâmparina velha,
que assim lhe surja um gênio multicor,
mais um botão da magia que se assanha
e só conceda um tipo de desejos,
na geração do fruto desse amor,
depois que a flor o lavrador amanha
e a desperte como mãe de muitos beijos.
ABELHAS
CARMESIM X – 12 dez 2023
De certo
modo, meu destino se assemelha
ao fado
curto de qualquer macho de abelha;
criado
apenas para a fecundação
da
abelha-mestra, cumpre sua função
somente
por um dia esse zângão
e logo
morre sem mágoa ou pranteação,
enquanto
o macho humano tem parelha
permanência
nessa vida, em que se espelha
na fêmea
humana de tão frágeis crias;
se assim
não fosse, de mui pouco servirias,
tu, homem
meu irmão, na natureza,
senão
para menter em segurança
a mulher
grávida que qualquer fera alcança,
nessa sua
glória pesada e sem leveza...
ABELHAS CARMESIM XI
Por isso é que se pode fantasmar
e erguer odes fantasiadas de poesia,
nesse amor puro de pura idolatria,
nesse mais que puro e simples procriar.
Por isso é que se pode assim louvar
o arcano ato da sexuada alvenaria,
em que a criança se constrói e cria,
pelo impulso fulgurante de orgasmar,
enquanto vê-se essa vasta maioria
dos mamiferos tão próximos de nós
abandonar esse muro bem depressa,
enquanto dos humanos a flébil cria
durante anos não se deixa a sós,
que em nós buscar amparo nunca cessa.
ABELHAS
CARMESIM XII
É assim
que a pele, em plena juventude
trescala
um cheiro de límpido sabor,
que sobre
a língua espalha o seu olor
e como
sede o nosso olfato ilude,
que é
armadilha, sim, que Deus me ajude!
Mas só no
sexo não se alcança tal amor,
por mais
que tanto o tenha descrito com ardor
e no
entretanto possa às vezes ser bem rude!
Contudo
existe amor na madressilva,
amor
suave tal como a melopeia,
enquanto
ressonamos lado a lado,
porque
esse amor igual serpente silva
e se
crava venenoso em nossa ideia
e o
zângão morre em tal carinho conservado.
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