O TERCEIRO HÓSPEDE V
(EL CHARRO -- O SEGUNDO HÓSPEDE)
Já em casa, depois de se banhar,
ia sentar-se, finalmente, à mesa.
Sua mulher lhe servia, com certeza,
uma tigela de batatas com feijão,
mas via os filhos e só de compaixão,
a maior parte acabava por lhes dar.
E enquanto as crianças disputavam
e a mulher o olhava, consternada,
ele fazia uma prece apaixonada:
“Ai, meu Deus, eu queria só pra mim
um peru inteiro, para comer assim,
sem precisar dividir com os que me olhavam!”
Depois, ia dormir, louco de fome,
mas o ditado diz: “Quem dorme, janta...”
E antes da hora em que passarinho canta,
vai ele encher no poço sua taquara,
prender ao cinto o facão por uma apara,
e logo, logo, pela mata some...
O TERCEIRO HÓSPEDE VI
E a história se repete, diariamente:
ele traz o quanto pode para casa,
mas a panela fica sempre rasa...
A comida nunca chega para tantos
e ele lenha, por trancos e barrancos,
dando o dinheiro a Rosicleia inteiramente.
Mas na hora de comer, a criançada,
que comeu pouco e ainda está faminta,
nada lhe pede, mas fazem que ele sinta,
com a força de seus olhos esgazeados
e ele cede sua tigela aos esfomeados,
comendo muito pouco ou quase nada!
E sempre ergue seus braços para o céu:
“Ai, meu Deus, eu queria só pra mim
um peru inteiro, para comer assim!...”
Logo em seguida, se joga a ressonar,
a fome adiando, sem poder matar,
nessa tristeza que o envolve como um véu.
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