MAGIA &
MAIS
William Lagos
MAGIA I – 2 JUL 14
Eu tenho um “A” na palma de minha
mão
e não o “M” que ostenta a
maioria;
a mão esquerda, no entanto,
acataria
normal imagem para sua
interpretação;
E no centro da palma, estrelas
são;
uma grande, com quatro pontas,
mais esguia
e longa ponta, que um cometa
então seria;
ao canto esquerdo, uma pequena em
filiação.
Só em parte a configuração se
mostraria
na palma esquerda, só estrela
expectante,
com apenas três pontas
delineadas;
mais um triângulo em pé então
seria,
entre as linhas do “M” dominante:
só é parcial o meu dom de
profecia...
MAGIA II
Dizem que a estrela indica a
profecia,
porém completa e sobre a palma
esquerda,
não na direita, qual a minha se
herda:
só propensão para aceitar certa
magia...
Porém jamais demonstrei a
sobranceria
de buscar os pentagramas por
minha perda;
para o irreal minha propensão foi
lerda,
pois na razão sempre me
concentraria...
Não obstante, sempre amei a
fantasia,
se bem que fadas e gênios jamais
vi...
Porém, que importa, se na mente
dançaria
a multidão de criaturas de
harmonia,
que na França chamaram Peuple Léchy
e quanto menos os vi, mais neles
cria...
MAGIA III
Crer em magia é questão de
romantismo,
mas não a crença em qualquer
adivinhação;
amo os sumérios por sua
civilização,
mas não da astrologia o seu
modismo...
Embora traga estrela sobre a mão,
não posso crer em estelar
influencismo;
estão estrelas em mui longínquo
abismo,
das quais algumas até mortas já
estarão.
Mas o zodíaco reservado para o
Sol,
dez mil anos atrás, já não é
percorrido;
diversos signos não inclui mais
no seu caminho
e de alguns outros só vê a ponta
do farol...
De qualquer modo, por que um
astro bem nascido
qual nosso Hélios, vai precisar
de tal carinho?
MAGIA IV
Se me dissessem que o Sol
influenciaria
ou então que a Lua nosso fado
presidia,
talvez até me conformasse à
fantasia:
afinal, uma está presa e o outro
nos prende!
E cada vez que a luz solar
acende,
com sua paleta de cores nos
surpreende,
enquanto a Lua da prata a luz nos
vende
e influenciar nossos destinos
poderia...
Um nos dá os anos e as várias
estações,
enquanto a outra os meses e as
marés,
sendo evidente o seu cíclico
poder
no corpo físico e nas
imaginações;
mas que o futuro dependa dessas
sés,
com ceticismo apenas posso
conceber...
MAGIA V
Porém constelações são
inexistentes:
tão só desenhos contemplados
desde a Terra;
milhões de anos-luz o espaço
encerra
e aparta as estrelas no zodíaco
presentes.
Os fulguratores
estudavam, reverentes,
as longas riscas de raios sobre a
serra;
o herpetólogo de cada vítima
descerra
fígado quente nos seus cálculos
frementes.
Outros divinam por folhas de chá
ou por desenhos em borra de café
ou pelos pássaros a pressagiar
assim,
ou lançam búzios para um orixá;
também judeus um manto tinham,
até,
lançando sortes na magia do
Purim...
MAGIA VI
De tudo isso, eu apenas admito
que nossas palmas possam mostrar
dileta
mensagem do destino, mas profeta
ainda não sou e nem sequer a tal
me incito.
No ventre ainda, o movimento
aflito
forma estas riscas, de maneira já
completa
ou o nosso deeneá neles se
insecta:
traz do passado seu derradeiro
grito...
Porém as fadas em mim ainda
vivem,
nesse poder de aos monstros
dominar,
presos em jaulas, meus versos a
compor
e a cada noite, sei novo dia ativem
desse futuro que não posso
desvendar,
contudo aguardo, sem o menor
temor...
FUTEBOL I – 3 JUL 14
Chutar caveiras é ato bem mais
primitivo
que suspeitar que os espíritos
retornam;
os Neandertais em tal costume se
conformam,
bem dedicados a tal esporte
ativo,
cem mil anos atrás. Por tal motivo,
talvez em degenerados é que se
tornam;
da evolução os infelizes não se
adornam,
mas fica o povo ao progresso mais
esquivo.
Ao invés de irem caçar, jogavam
bola
e quem perdesse, decerto
devoravam:
outra caveira para o seu
esporte!...
Admirável não lhes crescesse a
cola,
enquanto os Cro-Magnons se
aproximavam,
a pouco e pouco lhes trazendo a
morte...
FUTEBOL II
O futebol é a loucura nacional
e através dele faturam
espertalhões,
brincando assim com as tristes
ilusões
de um povo ordeiro, que não
suspeita o mal.
Só Freud explica esta inocência
natural
com que manejam as grandes
multidões;
mendacidade em seus
vales-refeições
ou vales-votos, em sua compra
individual.
E nesta incrível improvisação,
quanto dinheiro corre e se
desvia;
segundo dizem, isto até
favoreceria
o comércio (e os impostos) em
profusão,
enquanto a obra necessária se
esquecia,
comprometendo o futuro da nação.
FUTEBOL III
Até acredito que se possa
divertir
quem joga com os colegas a pelada;
mas qual o bem que traz a
arquibancada
para a saúde de quem lá foi se
iludir?
Mais influência se deveria
introduzir
no atletismo ou corrida, em
demarcada
dança rítmica e natação
sincronizada
e em outras áreas para a saúde
garantir.
Mas que se matem tão só por
futebol
esses rapazes da torcida
organizada!
Dessa nova religião o
fanatismo!...
Enquanto apagam da cultura o seu
farol,
nesta nação cada vez mais
neandertalizada,
massificada neste falso
desportismo...
GOLPE DE PUA I –18/7/06
e é só por pressentir as Agonias
de ver os outros ter o que eu não Tenho;
ao ver beijos de amor, não me Contenho,
em ânsia transitória e Nostalgias.
dor passageira, embora, é Lancinante,
um desejo, afinal, sem Fundamento,
pois eu nem quero ter, não me Apresento
ao singular combate Expectante.
mas é que a mágoa chega, de Repente:
só num momento a dor é Cintilante,
depois escorre e pinga e já se Vai.
fica a memória apenas, Complacente,
do momento de inveja Acidulante,
que domina por instante e então se Esvai.
GOLPE DE PUA II (4 JUL 14)
não é que queira participar da Rinha,
com o peito estufado, bico Aberto,
duas puas de metal e golpe Esperto,
que o adversário assim melhor se Espinha;
nem que por qualquer medo então Continha
os meus impulsos no passado Certo,
menos ainda no futuro Incerto:
é mais a indiferença que me Alinha;
é só no instante de assistir esse Desejo
naturalmente satisfeito com Prazer,
enquanto apenas contemplo tal Ensejo,
que por momentos invejo aquele Beijo,
sem desejar que me venha a Pertencer,
que bato as asas e em meus versos Cacarejo!
GOLPE DE PUA III
mas quanta gente existe neste Mundo
que a outros mata por ciúme e por Inveja;
quando veem um par feliz, então um Corteja,
buscando desmanchar seu bem Profundo;
passa um solteiro a pensar, Meditabundo,
ou uma solteira em plena rua Adeja
e não despertam a cobiça que se Enseja
ao contemplar desse par o véu Rotundo,
tal como as duas partes se Encontrassem
da velha fábula apresentada por Platão,
arredondando assim as duas Metades
e iguais rancores aos dos deuses se Estampassem
nesses olhares arroxeados de Ambição
e lhes quisessem interromper Felicidades!
GOLPE DE PUA IV
e é tão comum essa inveja de um Casal
de repente aparecer em plena Rua,
numa lascívia súbita que Estua:
menos desejo do que ânsia pelo Mal,
sem ser ao menos rivalidade Natural,
mas a vontade de cravar golpe de Pua,
por ver o sangue a correr, ferida Nua:
só pretensão de um amor Artificial;
e quanta vez vão de fato Separar
os que viviam em alegria Cintilante,
para depois, simplesmente, Abandonar
aquela vítima, vampiros da Inconstante
necessidade de ver alguém Sofrer,
sem essa fome jamais Satisfazer!
FAIXAS DE SEBO I – 5 JUL 14
Sem ilusões, eu sei que teus olhares
apenas me avaliam e, depressa,
cálculos feito, vão adiante nessa
conspiração dos ventres familiares.
Mas eu posso fingir que os deuses lares
abençoaram a progênie que não cessa
de embaralhar-se pelo olhar que meça
possíveis coalizões e mil vagares.
E como eu minto para mim, talvez
em busca apenas de uma inspiração,
quiçá também enganem a si mesmas
e nos seus olhos despertem, em insensatez,
longos romances, lendas de cem resmas
em que me envolvam numa teia de ilusão...
FAIXAS DE SEBO II
Não que eu seja assim tão suscetível;
para mim é brincadeira, na verdade,
um jogo puro de infantilidade,
quanto mais o imaginar é inexaurível.
Mas a ninguém prejudico, nessa incrível
piada de um harém de opacidade,
em que as mil odaliscas da vaidade
dançam apenas, com ventre incognoscível.
Será que sabem do processo que iniciaram,
nesse seu jogo pueril de sedução,
no qual apenas se querem desejadas?
Na angústia morna que tais rostos me mostraram
vejo a importância de tal competição
contra rivais não mais do que esboçadas...
FAIXAS DE SEBO III
Bem certamente não são faixas de seda
que projetam essas vistas pegajosas
dentre as pestanas de disfarce umbrosas,
qual brilho incauto de presença leda.
Talvez de lágrimas uma faixa se conceda:
gotas salgadas, mas sempre perigosas,
por ombro quente a suplicar, ansiosas,
quiçá na busca de relação mais queda.
Mas não nos trazem qualquer relacionamento
de caráter mais um pouco permanente;
em geral somente sondas a lançar.
Se eventualmente perdura esse momento,
então recuam, no ardil de antigamente,
na velha dança ao amor preliminar.
FAIXAS DE SEBO IV
Assim, no meu passar pelas calçadas,
observo enquanto espiam nas vidraças,
no truque conhecido das pirraças,
só para ver se estão sendo observadas
ou avaliando se estão sendo avaliadas
pela extensão das femininas graças
ou se as faixas que lançam roem traças,
deixando as próprias armadilhas reveladas...
De olhar altivo, expressão de desfastio,
mas pelo canto das vistas contemplando,
sem ter ao menos o menor toque de cio,
sua autoconfiança apenas ampliando,
até o momento de apertar o fio,
novas faixas de sebo projetando...
FAIXAS DE SEBO V
É um jogo apenas, tão só um treinamento
e por isso lançam faixas sem firmeza;
logo escorregam, terminada sua proeza,
após ver quem capturam no momento!...
Claro que existe quem tem conhecimento,
essa partida a jogar com esperteza,
lançando faixas de maior dureza
e a vela acendem no sebo do portento.
Pois nessa dança de ardilosidade
derrete aos poucos a fibra do pavio:
o sebo escorre após ter sido luz,
deixando faixas retorcidas, na verdade,
contra essa vela que faleceu no frio
desse namoro que nada mais produz.
FAIXAS DE SEBO VI
Sei muito bem não ser nada agradável
este título que hoje eu escolhi;
faixas de sebo em cada teia eu vi,
faixas de sebo na flor mais apreciável,
prendendo o inseto de forma irreparável;
faixas de sebo em cada engano que sofri,
faixas de sebo na paixão que usufruí,
mas derretidas de maneira imponderável.
Existe sebo que a pele nos conserva
e não a deixa gretar-se pelo frio;
e o sebo prende esta caneta serva
e calafeta meu barco desde o lio
e igual que a seiva protege a flor da erva,
das minhas costas afasta o calafrio...
UIVOS DE GELO I – 6 JUL 14
Meu rosto se reflete em mil facetas,
cintilado pelas rochas; e flutua
na bacia especular, na vista nua,
nas lágrimas que escorrem mais secretas.
Meu rosto se desfaz em tons estetas
nesse semblante iluminado pela Lua;
também no Sol igual feição estua,
nos pingentes de gelo em brancas setas.
Mas é o vento que carrega meu dilema,
desfaz-me aos poucos a fisionomia;
vejo minha face esparsa na campina,
em cada gota de orvalho, longa pena,
minha cara espreita pela pradaria,
compartilhando toda a humana sina.
UIVOS DE GELO II
Só imagino o que a estes rostos acontece,
quando os deixo para trás, em meu andar;
será que as gotas simplesmente irão mostrar
qualquer outra criatura que ali vê-se?
Ou nelas fica a minhalma, que padece
em algo de mim que não temi abandonar
ou então acabo por tudo influenciar
no algo que deixo como estranha prece?
É de pensar se há responsabilidade
na compartilha do impulso criador
ou se me viro em adubo, simplesmente,
toda a luz a se tornar opacidade,
meus traços a esvair-se, sem ardor
ou meu reflexo tornado permanente?
UIVOS DE GELO III
Será que em gota de orvalho que eu afete
ou no dorso de cada escaravelho
que me serviu de transitório espelho
a mente inteira viva e ali se inflete?
Ou em cada gota de orvalho que derrete
morre um pouco de mim nesse parelho
evaporar de mil faces ou no velho
besouro que falece se introjete...?
E no final, cada vez mais me limito:
fico mais pobre por aquilo que projeto
ou subo ao Sol na gota que evapora?
Ou em cada pingente de gelo sobe o grito
para um lugar de minha audição secreto
e mais eu vivo na nuvem dessa hora...?
AVENDAGO I – 7 JUL 14
Conduzirei minha mente até o Sol,
para secar da mágoa a inundação;
ao invés de água, darei calefação
aos pontos mais distantes do arrebol.
Usarei também a Lua por farol,
regando as gretas secas da razão
encolhida ao sabor da insolação
da sombra nua das nuvens em seu rol.
Vou desfazer as mangras do passado
e renovar este clima atribulado,
que então se faça ameno em toda parte,
o mais gentil que seja para a gente
trabalhar sem cansaço até o poente
e se expandir até que o mundo farte.
AVENDAGO II
Talvez Avendago te pareça incompreensível
ou te acarinhe a mente qual afago;
não são frases de filósofo, mas de mago,
que me falou de região incognoscível,
mas com suas sugestões a mente alago
de um mundo paralelo intransponível,
conhecimento arcano e inexaurível,
seguindo apenas os conselhos de Avendago.
As mil palavras coloco em caldeirão
e a lenha da fogueira é sentimento;
adiciono os condimentos e açafrão
e os remexo com a pá dos julgamentos,
tal qual em transe ou em pura confusão,
no caldo espesso de abstrusos pensamentos.
AVENDAGO III
Essa tisana então derramarei
onde quer que encontre erro ou confusão;
inesperados os resultados são:
menos por menos como mais computarei.
E nestes versos que hoje te enviei,
na sopa amarga de minha desilusão,
despertarei diversidade de emoção,
pois todo engano assim dissiparei.
Em minhas letras ensopadas misturei
conhecimentos de teus antepassados,
que se esqueceram, talvez, de te contar;
pois de algum modo suas mentes acessei
de tantos erros e culpas resultados
adormecidos até fazê-los despertar.
AVENDAGO IV
Mangras desfiz que havia na bainha
de minhas próprias mangas esgarçadas,
contra o tampo de minha mesa de esfregadas
e transformei-as no bordado que se tinha
na túnica adornada da rainha,
nas vestimentas que foram descartadas,
nos vestiários de castelo abandonadas,
corrido o fio e já perdida a linha.
O manto não é meu, mas te pertence;
foi costurado em frases compassadas,
longa essa fímbria que no chão se arrasta.
Calo Avendago e seu poder se vence:
restam somente dez palavras balbuciadas
no surreal deste poema que me basta.
BEIJOS DE BARRO I – 8 JUL 14
Dorme o amor na sombra da poesia,
sob pesada carga de lamentos,
sob os cones de cem impedimentos,
cortado o trânsito que por ali corria.
Dorme o amor na mornidão da fantasia,
já dissociado em vários elementos,
para a vaidade e orgulho os alimentos,
na impenitência a que chamam de harmonia.
Dorme o amor no plenilúnio que se via
por trás dos olhos, em cada devaneio;
mais vale o amor que floresce em solidão
do que esse amor que se desgasta e cria
tanta esperança eivada de receio
no descontrole em que palpita o coração.
BEIJOS DE BARRO II
Dorme o amor no pavio da almotolia,
aquecido na gordura desse azeite;
nessa lâmpada de barro, sem aleite,
apenas emoção a mente cria.
Dorme o amor na Sandália da Judia,
uma orquídea, afinal, de algum deleite;
dorme amor no contrato que se aceite
com a cristã, matrimônio em que se fia.
Dorme o amor nas grossas roupas europeias,
enroscado no leito, contra a neve;
dorme o amor na nudez das angolanas,
das caravelas nas longas epopeias;
nas muçulmanas com o dote que nos leve,
nas carnes todas com que a tua irmanas.
BEIJOS DE BARRO III
Porém se amor na sombra da poesia
adormece, sonha ter vastas potências
que acordado, vê serem impertinências:
melhor sonhar na luz que te aquecia!
Porém se amor na morna fantasia
devaneia, suspirando redolências
ou a si mesmo presta condolências,
melhor sonhar no calor que te alumia!
Porém se dorme amor no plenilúnio,
deixa de ver a vastidão da prata
e se limita ao diurno mais dourado;
antes que venha o escuro do infortúnio,
melhor que sonhe com a vastidão da mata,
entre as águias de um porvir almiscarado.
BEIJOS DE BARRO IV
Porém se amor na luz da almotolia
cochila apenas, na mecha desse barro,
melhor que sonhe com farol de carro
que o transporte ao lugar que mais queria.
Porém se amor dorme em sandália fria,
de seu perfume já esvaziado o jarro,
melhor que sonhe barco em que eu amarro
toda a esperança que em suas velas via.
Amor de barro quebra bem depressa,
amor de sonho no sono permanece,
amor por roupas desgasta-se em vaidade;
melhor amor então essa caleça
que nos conduz, veloz como uma prece
a essa prisão em que dorme a liberdade.
PERDA IRREPARÁVEL 1 – 9 JUL 14
Se o mundo fosse meu para criar,
Cada paisagem por mim fabricada
Bem certamente não surgiria do nada,
Porém de mim
deveria algo tirar;
Se me possível fora
o inteiro mar
Eu o encheria com a água derramada
Pelo meu sangue, logo desbotada,
Porém seu sal inteiro a conservar.
Se me possível fora o imaginar
Dessas miríades de marinhas criaturas,
As tiraria de
minhas circunvoluções,
Todo o cérebro
lentamente a desgastar.
Soltando o belo e conservando as amarguras,
Mais o coágulo ressequido das paixões.
PERDA IRREPARÁVEL 2
Se a atmosfera eu devera assim criar
Não poderia empregar só fantasia,
Minha potência tampouco chegaria
E meus pulmões eu
teria de esvaziar,
De cada alvéolo um
pouco a expirar
Até que ao céu enchesse a galeria
Que, pouco a pouco, azul eu deixaria
Pela impureza de meu próprio respirar;
Contudo estrelas precisaria retirar
Das lágrimas dos olhos e a secura
Passaria cada vista
a quebrantar;
Mas de onde o Sol
de imenso rebrilhar?
Talvez a Lua, com sua beleza pura,
Mas esse astro mal poderia imaginar!
PERDA IRREPARÁVEL 3
Caso as montanhas coubessem-me elevar,
Empregaria nelas os meus ossos;
Em seus espaços só deixaria fossos
E de que forma
poderia caminhar...?
E se a terra das
planícies completar
Também fosse minha tarefa, os mais grossos
De meus músculos, os órgãos em seus poços
Me obrigaria, finalmente, a descartar.
E de que modo poderia usufruir
Dessa riqueza toda assim criada?
Seria um fantasma a
chorar meu desatino!
E nem pouso teria
onde dormir,
A própria alma desfeita e amarfanhada
Caso tivesse da criação vasto destino!...
PERDA IRREPARÁVEL 4
Não posso então imaginar que o seja,
Forte que fora o meu solipsismo;
Bem mais real, em puro romantismo,
Que qualquer mente
alheia me proteja;
Talvez a mente que
meu sonho beija,
Talvez a chama concebida em saudosismo,
Talvez a sombra de meu surrealismo,
Talvez quiçá algum rosto que se veja...
Um mundo assim imaginar eu posso
Do qual minha sombra seja uma conquista
De uma mente
feminina a criação
De quem cada desejo
assim endosso
E a quem pleno direito então assista
De me apagar após cansar-se da emoção...
TEOLOGIA I – 10 JUL 14
SEMPRE ENCAREI COM CERTO CETICISMO
ESSAS CRENÇAS BROTADAS DO ORIENTAL,
COMO A YOGA, COM SEU LONGO CARNAVAL
DE ASANAS A REQUERER GINASTICISMO.
SEMPRE ENCONTREI PERANTE TAL MODISMO,
NESSA RECUSA DA VIDA OCIDENTAL,
ALGUM FRACASSO NO ALHEIO CABEDAL
DE ADAPTAR-SE AO PURO REALISMO.
SEI COMO FATO QUE FOI NO OCIDENTE
QUE SURGIU TODA A CIÊNCIA DO PRESENTE,
A VASTIDÃO DA CLÁSSICA HARMONIA,
O ACERVO TRANSITÓRIO DA POESIA,
OS FUNDAMENTOS DA RELIGIÃO MAIS PURA,
POR DEFORMADA QUE SEJA EM SUA TORTURA.
TEOLOGIA II
PORTANTO, EU NADA VEJO NO BUDISMO,
SALVO A PURA NEGAÇÃO DO MATERIAL,
EM SEU DESPREZO POR INVÓLUCRO CARNAL
PELO NIRVANA DE TOTAL NEGATIVISMO;
DESSES MONGES E BONZOS SEMPRE CISMO
SEREM SOMENTE CHARLATÃES DO ESPIRITUAL,
EM SEUS MOSTEIROS ALIMENTADOS, AFINAL,
PELAS OFERTAS DOS FIÉIS EM ALTRUÍSMO.
ERA COSTUME NOS EUROPEUS MOSTEIROS
TEREM HORTAS E TRIGAIS A CULTIVAR,
GADO E OVELHAS IGUALMENTE A PASTOREAR,
SEM DESCURAR DOS DEVERES ALTANEIROS
DE DIÁRIAS MISSAS E LONGAS COMUNHÕES,
BEM DIFERENTES DOS MOINHOS DE ORAÇÕES.
TEOLOGIA III
SÃO TAIS MOINHOS ESSE ORIENTAL COSTUME
DE DAR VOLTAS EM METÁLICAS ROLDANAS;
COM CADA VOLTA, CEM ORAÇÕES PROCLAMAS
SEM OS ROSÁRIOS QUE CATOLICISMO ASSUME;
E A GENTE AFIRMA QUE DE LHASA, LÁ NO CUME
DO HIMALAIA HÁ SABEDORIAS SOBREHUMANAS,
QUE SÓ LONGA INICIAÇÃO NOS TRAZ A LUME.
MODERNAMENTE, SURGIU NOVA RELIGIÃO
TOMANDO O MUNDO INTEIRO NOS ABRAÇOS
E QUE TRANSMITE MATERIAL CONHECIMENTO.
É A TEOLOGIA DA DIGITAL COMPUTAÇÃO,
A NOVA YOGA QUE NOS CANSA OS BRAÇOS:
DA INTERNET A IMPONENTE REDENÇÃO!
TEOLOGIA IV
UMA VEREDA APELA A UM VAGO MISTICISMO
PARA UMA FUGA DA PRÓPRIA SOCIEDADE;
A OUTRA ACENA COM GRANDE LIBERDADE,
MAS ESCRAVIZA AFINAL EM SEU MODISMO;
GRANDE PUREZA EM TAL ESPIRITUALISMO
NÃO SE DESTINA AO COMUM DA HUMANIDADE;
PARA MUITOS, A DIGITAL CAPACIDADE
FAVORECE O TRABALHO EM REALISMO.
NÃO OBSTANTE, O QUE FAZ A MAIORIA
DOS ADEPTOS DESTA NOVA RELIGIÃO?
CONVERSA APENAS, ENTUPINDO A REDE,
NA VASTA REPETIÇÃO QUE IMITARIA
OS ORIENTAIS MOINHOS DE ORAÇÃO,
QUE A VIDA UMA E A OUTRA A PRECE IMPEDE.
AMOR DE PRIMAVERA I – 11 JUL 14
Amor floresce como jovem planta
a cada vez que retorna
a primavera;
durante o inverno
assume longa espera,
no aguardo do calor que a desencanta.
Amor floresce como espiga santa,
a balançar no ar o
grão que gera,
igual que a abelha
fabrica o mel e a cera;
amor aquece qual lanosa manta.
Apela amor aos jovens corações,
com a nova sensação da
descoberta,
isenta ainda de seu desapontamento,
tornando novas as velhas emoções,
na interpretação das
quais ninguém acerta,
intercaladas tal qual nos sopra o vento.
AMOR DE PRIMAVERA II
Bem claramente amor habita o ar,
alimentado por
perfumes bem secretos,
incrementado no
zumbido dos insetos:
zéfiro chama a essas flores para amar.
Pouco se entende no primeiro despertar
ou do primeiro surgir
dos desafetos;
cada qual julga ter
amores mais completos,
sem perceber os estar somente a renovar.
É o mesmo amor de tantas gerações
desinibido ou às vezes
reprimido,
talvez gozado em plena liberdade,
talvez regido por determinações,
mas a cada primavera
repetido,
na floração da nova humanidade.
AMOR DE PRIMAVERA III
Amor de primavera é amor paixão;
desaparece no outono,
facilmente,
deixando certa
tristeza irreverente,
ante os auspícios de qualquer nova emoção.
Amor, enfim, quer geral reprodução,
para depois ir seduzir
a outra gente;
seu ciclo circanual
sempre inclemente,
depois fenece, tal qual seca a floração.
Como a flor despetala após botão,
Como as abelhas se
escondem na colmeia,
Qual morre o trigo que deixou de ser colhido.
Mas como é mágica a varinha de condão
Que sobrevive do verão à epopeia
E deixa o inverno em primavera revestido!...
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