O PEQUENO HERÓI (MALI PAPRIKA)
(Folclore sérvio, versão poética de William
Lagos, 16 set 2014)
(A letra J se pronuncia em sérvio como I; e o grupo ZH como
J. Mali
Paprika significa “Pimentãozinho”. O
episódio do dragão é bastante semelhante a uma das peripécias da história de
João e Maria, conforme recolhida por Silvio Romero e já narrada em versos por
este autor.)
O PEQUENO HERÓI I
Em uma aldeia sérvia morava uma
mulher
casada há anos, que não tivera
filhos
e suplicava a Bozhe (Deus), diariamente,
que ao menos um ela pudesse ter,
mesmo que fosse mirradinho em
parecer,
do tamanho de um pequeno pimentão...
E tanto ela seguiu da prece os
trilhos
que Deus Pai compadeceu-se,
finalmente,
enviando fada que lhe disse: “Hoje é
mister
que eu te atenda, pois tens fé no
coração!...”
A pobre aldeã se horrorizou com a
aparição
e se lançou por terra, apavorada:
“Sou muito pobre, não me faça mal
e não me cegue pela sua
presença!...”
“Ksenija, vim atender-te a crença;
o Santo Bozhe ouviu o seu pedido!...”
“Deus Pai me ouviu?” – disse ela,
desconfiada.
“Sim, Bozhe, o Santo Pai!... E seu torchal
trago brilhante na concha de minha
mão!
O seu desejo será hoje atendido!...”
“Erga a cabeça, Ksenija, para
mim!...
“Como conhece meu nome?” – quis
saber
a pobre camponesa. “Porque sou fada:
eu sou Dobenka e foi Deus quem me
mandou.
Vou repetir-lhe: suas preces escutou
e lhe dará esse filho que deseja...”
“Dobenka, a Fada? Mas o pope
ouvi dizer
para escutar aos anjos e a mais
nada...”
“Eu sirvo a Bozhe, que enviou-me assim
Para o milagre efetivar que hoje se
enseja...”
Ora, Dobenka, no passado, era
invocada
na proteção do parto e dos nenês:
ela expulsava a Lâmia e a
Feiticeira...
Mas com a chegada da nova religião,
fora objeto da mesma maldição
imposta aos deuses da religião
antiga...
“Se crês no Santo Pai, em mim tu
crês.
Ergue a cabeça para a chama
alvissareira!...”
Ksenija se ergueu e assim foi
abençoada
pela chama que lhe trouxera a fada
amiga...
O PEQUENO HERÓI II
Quando a flama tocou em sua cabeça,
sentiu calor a percorrer-lhe o corpo
inteiro
e uma certeza de que iria
engravidar...
“Santa Dobenka,” – atreveu-se a
perguntar,
“já estou esperando?” “Teu marido irá ajudar...”
sorriu-lhe com ternura a mensageira.
“Nasce a semente quando posta no
terreiro,
mas tua esterilidade fiz hoje
terminar.
Assim que teu trigal dois palmos
meça,
nesse dia irá dar fruto a
sementeira...”
“À tua horta vai daqui a uma semana;
lá colherás o mais vermelho
pimentão;
come-o inteiro, de forma natural,
sem cozer, sem pôr sal e nem azeite;
será o reforço para o teu deleite
e após sete meses e um dia, bem
contado,
à luz darás o teu próprio botão,
bem pequenino, sem dor ou qualquer
mal;
cuida bem dele, que aos heróis se
irmana;
leva-o à igreja, para que seja
batizado...”
“De Berislav o nome lhe darás:
terá saúde e grande robustez,
porém será pequeno e irá crescer
somente após realizar um grande
feito,
que ser mirrado não é nenhum defeito
e foi isso que pediste, não é
mesmo?...”
Ksenija concordou, com timidez.
“A São Cirilo mandou Deus o livro
ler
e lhe disse: Nenhum registro encontrarás,
então o inscreve, que não nasça a esmo...”
A Fada Dobenka, em clarão desvaneceu
e ficou ainda assombrada a
camponesa.
Mas era Bozhe, o Grande Deus, que a havia mandado!
Por que um anjo não poderia ser mulher?
Parecem homens porque um pintor o quer!
Mas estava certa de ter sido
abençoada
e daí a uma semana, com certeza,
foi colher o pimentão recomendado
e quando dois palmos seu trigal
cresceu,
teve certeza de haver
engravidado!...
O PEQUENO HERÓI III
De fato, após sete meses e um dia,
um menino lhe nasceu, sem dor nem
mal
e só depois é que chegou a parteira,
muito espantada com o tamanho da
criança...
“É tão pequeno! De viver não há esperança!
Só mais dois meses e teria melhor
nutrir...”
Mas o levaram até a pia batismal,
sua parentela reuniu-se, bem
ligeira.
“Seu nome é Berislav!...” – ela
dizia
E o pope o batizou sem discutir...
Passou-se o tempo e o menino não
crescia,
embora falasse e bem ligeiro
caminhasse,
forte e corado, igual que um
pimentão!...
De Mali Paprika logo o apelidaram...
Ingenuamente, os pais logo revelaram
a história do pimentão e toda a
profecia,
embora Dobenka nenhum deles
mencionasse,
talvez com medo de alguma punição...
Logo o menino pelo capim corria;
como floresta o trigal lhe
parecia!...
A pobre Ksenija de vergonha padecia
com o apelido que lhe impuseram os
demais;
Mali Paprika, porém, não se
importava,
embora não tivesse companheiros...
Montava escaravelhos nos terreiros,
contra as formigas combatia com
espinho,
lascas de pedra como espadas
naturais
e já no uso da lança se adestrava;
minúsculo arco seu pai lhe construía
para defesa contra aranhas no
caminho...
Porém a mãe chorava, ao entardecer,
vendo os filhos das outras, que
cresciam;
porém a Bozhe não se mostrava ingrata:
pedira um filho que fosse mirradinho
e Mali Paprika era qual
pimentãozinho...
Deus a atendera, bem exatamente...
Mas pai e filho já melhor se
entendiam,
enquanto a mãe o acariciava como
gata,
ao rapazinho depressa a aborrecer,
com o treinamento do pai bem mais
contente!
O PEQUENO HERÓI IV
Mas completados nove anos e um dia,
apareceu-lhe Dobenka, novamente
e lhe disse: “Ksenija, não deves
chorar mais,
logo teu filho para o mundo sairá
e seu magnífico futuro encontrará.”
“E depois disso, não mais o
verei...?”
“Após onze anos e um dia,
justamente,
terá a glória obtido e no ademais
será alto e forte, tal que só o
reconheceria
um olhar de mãe... Poderoso como um rei!”
De fato, na manhã do dia seguinte,
Berislav, ou Mali Paprika,
apresentou-se
diante dos pais, pedindo permissão
para o mundo percorrer em
aventuras...
De Dobenka recordaram as frases
puras
e o pai o abençoou, sem discutir.
A receber qualquer dinheiro ele
negou-se:
“Moedas de cobre são pesadas e farão
que menos força e habilidade no
requinte
de minhas armas eu consiga
usufruir...”
“Sou tão pequeno que qualquer
frutinha eu como
e caso entrasse pela porta de
estalagem,
o mais provável é que me pisoteassem!
Bandos de ratos precisaria combater;
todo esse peso só me irá
enfraquecer...
Basta levar comigo uns biscoitinhos,
em um saquinho feito de aniagem...”
Considerava que suas armas lhe
bastassem.
“Se me cansar, escaravelho eu domo,
para me transportar pelos
caminhos!...”
“Queridos pais, não esqueçam a
profecia:
quando eu voltar, serei homem
valente,
robusto e alto, igual que algum
gigante
e ainda rico e poderoso como um
rei!...”
E lá se foi, cumprindo a antiga lei,
sem ter amigos de quem se despedir,
ponta de sílex em sua lança potente,
espada feita com espinho; e
oscilante
na sua aljava, cada flecha que
trazia
e que seu pai o ensinara a
desferir...
O PEQUENO HERÓI V
Durante muitos dias caminhou,
mas avistava ainda ao longe a aldeia...
Como as proezas assim realizarei!?
Então encontrou uma libélula
pousada...
Com uma liana fez-lhe uma laçada,
já encilhada quando tentou voar!...
E de cair nem um pouco se arreceia,
mas pelos ares sentia ser um rei!...
E muito além o inseto o transportou,
até num galho de árvore pousar!...
Olhando em volta, era o pátio de um
castelo
e se encontrava no meio de um
pomar...
Assentada na raiz, jovem chorava!...
Mesmo pequeno, possuía uma voz
forte,
sem revelar quão minúsculo era seu
porte;
e sem descer do galho, ele indagou:
“Por que, princesa, vos estais a
lastimar?”
Ela espantou-se ao ver quem lhe
falava:
“És um elfo ou algum duende
belo?...”
“Não, só um humano que ao nascer
mirrou...”
“Mas como sabes que sou uma
princesa?”
“Ora, me encontro no pomar de teu
castelo,
tens ricas vestes e és muito
formosa...
Que és princesa, fácil é de
adivinhar...
Não és rainha, sem aliança a
ostentar...
Meu nome é Berislav, mas me chamam
Pimentão,
ou Mali Paprika, pelo tamanho e cor
do pelo...”
“Então és filho de alguma fada
poderosa?”
“Meus pais são camponeses, linda
Alteza...”
“Meu nome é Lyubitsa,” – ela falou
com emoção.
“Linda Lyubitsa, tão amável quanto
bela,
não me contaste o que é que te
lastima...”
“Ah, Berislav, ocorreu-me uma
desgraça!
Conforme adivinhaste, eu sou
princesa
e meu pai, o Rei Mihajlo, convocou
toda a nobreza
para um grande milagre apresentar,
pois três maçãs de ouro quis a sina
que da macieira brotassem, em plena
graça
e meu pai me encarregou: Pura donzela,
minhas três maçãs somente tu podes guardar!”
O PEQUENO HERÓI VI
“E assim, ao pé da árvore me
assentei,
porém esta manhã chegou um dragão,
cuja aparência me deixou horrorizada
e dessas três maçãs se apoderou;
para sua toca sob o lago ele voou
e não sei como o vou contar ao pai,
pois de vergonha terá grande comoção
quando a nobreza por ele convocada
pensar que foi mentira de seu
rei!...
Acreditar na minha história ninguém
vai!”
“Eu acredito e talvez descubra a
solução,”
então lhe disse Berislav. “Tens confiança
em dois criados robustos e bem
fortes?
Ordena-lhes que matem dois carneiros
e em quartos dividam os dois
inteiros,
pondo os pedaços em dois sacos de
bons portes.
Duas cordas finas mas de robusta
trança
também precisarei, dessas de longos
cortes;
E que os coloques à minha
disposição,
pois da obediência dependerão as
nossas sortes.”
Lyubitsa mandou chamar os dois
criados
e ordenou que matassem os dois
carneiros
e que ficassem à sua total
disposição,
em tudo que o rapaz lhes ordenasse;
que a integridade do reino se
salvasse
dependeria de seus atos, afinal!...
Os dois voltaram com os sacos, bem
ligeiros,
e os dois rolos de corda pela mão.
E do palácio saíram, ainda
espantados
com o anãozinho e sua montada
artificial...
Chegaram ao lago em que morava Tzimey,
o dragão que as maçãs arrebatara;
a libélula de Berislav pousou na
margem
e ele ordenou que as cordas
amarrassem
em troncos fortes de árvore e o
baixassem,
preso a uma delas, até o fundo da
lagoa;
os dois sacos de carne ele amarrara
na outra corda e foram descidos com
coragem.
Para voltar, com três puxões
avisaria:
“Mas me icem logo, sem gastar o
tempo à toa!”
O PEQUENO HERÓI VII
Mali Paprika era pequeno, porém
forte
e firmemente prendeu a respiração,
até chegar, sem passar por grande
mágoa,
do lago ao fundo e lá ele encontrou
bastante ar e depressa respirou...
Pisava agora dentro de um jardim,
no meio do qual se erguia uma
mansão,
sob uma abóbada toda feita de água
e foi correndo, mesmo com pequeno
porte,
até alcançar a grande porta,
enfim...
Sem mesmo saber como, conseguiu
os dois pesados sacos arrastar,
contendo os oito quartos de
carneiro.
Por sorte, ele encontra a porta
aberta
E com sua carga não se
desconcerta...
Viu Tzimey em frente a um caldeirão,
a sua forma humana a apresentar
e uma velhinha, com ar meio brejeiro
que com colher o caldo inteiro gira,
conversando em linguagem de
dragão...
Um saco abriu e com seus músculos
potentes
jogou um pedaço de carneiro pelo
chão!
Tzimey foi atraído pelo cheiro,
lançou-se à carne, a devorar
avidamente,
mas a velhota do caldeirão
indiferente...
Mali Paprika, porém, lançou outro
pedaço
e a mulher transformou-se num dragão
e à nova carne se atirou ligeiro;
à sua passagem os dois meio
inconscientes,
ele correu ao caldeirão, em veloz
passo!...
E ali encontrou as três maçãs
fervendo!
Pegou a primeira e depressa
retornou,
para atirar aos dragões mais dois
pedaços
e enquanto cada qual mais devorava,
as outras duas maçãs ele agarrava
e corria para a porta, as
carregando...
Abriu o segundo saco e lhes lançou
mais dois pedaços, em seus
sangrentos traços
e para fora se escapou, rapidamente,
na sua corda três puxões depressa
dando!
O PEQUENO HERÓI VIII
Enquanto os dois criados o puxavam,
Tzimey o estratagema percebeu
e projetou-se pela água, velozmente,
mas Berislav o resto da carne lhe
lançou
e o dragão não resistiu e a devorou!
Mas o rapaz viu a libélula menor
e então notou ter sido ele quem
cresceu!
Desatrelou sua montaria, gentilmente,
subiu nos ombros de um dos que o
esperavam
e fugiram bem depressa, em seu
terror!
Ele entregou as maçãs à princesinha,
que o cobriu com agradecimentos,
mas ele despediu-se e foi embora;
um dos criados o soltou fora do
castelo;
cortou a casca de uma árvore com o
cutelo
e novas roupas bem depressa
costurou,
rasgadas as anteriores nos momentos
em que crescera, sem o notar na
hora.
Logo encontrou um filhote de doninha
e em sua nova montaria o
transformou!...
Deste modo, ao chegarem os
convidados,
mostrou o Rei Mihajlo, em uma
bandeja,
as três maçãs de ouro, com os talos
ainda verdes e sem endurecer;
ninguém conseguiu da história
desfazer,
mas Lyubitsa contara ao pai sobre o
dragão
e o anãozinho, cujo valor enseja
a vitória sobre o monstro e seus abalos:
por via das dúvidas, confirmou com
os dois criados....
Porém silêncio ordenou o velho rei.
Um dragão vindo furtar as minhas maçãs!
Um anãozinho enganando um tal dragão!...
Que vão pensar sobre isto os meus barões?
E o Patriarca pode enxergar conotações
com a religião que anteriormente foi banida!
Ou o povo pode nutrir ideias malsãs,
dessas que vem-lhes perturbar o coração!
Melhor não lembrar à minha obediente grei
a velha lenda do Tzimey, hoje esquecida!...
O PEQUENO HERÓI IX
E assim, organizaram o seu festim,
dizendo o rei que as maçãs,
naturalmente,
haviam caído da macieira ao chão...
Talvez algum de ourives desconfiasse,
mas como os talos nas maçãs os enfiasse?
Seria precisa tremenda habilidade!...
E constataram na macieira,
realmente,
marcas de talos contra o galho e
então,
foi bem difícil duvidarem ainda
assim
que das maçãs a brotação fosse
verdade!
Mas logo tudo se veio a confirmar,
porque quanto o rei temia, sucedeu!
Sobre o castelo voou Tzimey,
furioso,
algumas torres chegando a chamuscar,
com o fogo das narinas a bufar!...
Eram dezoito em suas nove
cabeças!...
Lançaram flechas, porém nada
aconteceu:
grossas escamas tinha o bicho
pavoroso!
Com vasta voz, então, pôs-se a
berrar
a sua vingança, por lhe pregarem
peças!...
“Quero agora uma donzela por semana,
para cozer em meu vasto
caldeirão!...
Cada semana me pagarão o preço!...
De minha fome saciar por longos anos
eu me abstive, porém meus desenganos
compensarei com multas e com juros!
Se uma semana meu resgate não me
dão,
sobre a cidade veloz então me
apresso
e a queimarei, do castelo até a
cabana,
exterminando essa raça de
perjuros!...”
Alguns anciãos foram parlamentar,
do vasto lago pairando junto à
margem,
propondo um pagamento diferente,
mas o dragão os queimou com
labareda!
Soubesse a gente qual fora a real
vereda
que Mali Paprika havia antes tomado,
o prenderiam e o culpado da voragem
seria entregue pelo povo, bem
contente!
Nas próprias casas os criados a
revelar
o que de fato havia se passado!...
O PEQUENO HERÓI X
Mas ninguém descobrira o paradeiro
desse pequeno herói inusitado
e desta forma, decidiu-se por
sorteio,
para escolher qual donzela da cidade
seria entregue à feroz rapacidade
desse dragão malvado e canibal!...
E um cortejo, num lamento desolado,
levou a primeira, tremendo de receio
até a praia. Veio Tzimey, ligeiro,
e arrebatou-a no abraço seu
fatal!...
Nada se soube dela, desde então
e novamente foi lançada a sorte
e outra vez entregue uma donzela,
parentes e amigos lamentando mágoas,
pelo dragão carregada para as águas!
E cena idêntica se repetiu por seis
semanas,
mas na sétima, foi sorteada para a
morte
a própria Lyubitsa, a sua princesa
bela!
O Rei Mihajlo explodiu em
imprecação:
“Oh tu, azar, que a todos nos
irmanas!...”
Enfim, deixaram a Lyubitsa amarrada
e por medo do dragão, foram
embora...
Mas de repente, já montado num
cachorro
(pois nesse ínterim crescera mais um
pouco),
surgiu Berislav, correndo como um
louco:
“Eu estive investigando por aí;
do acontecido só soube nesta hora...
Eis-me aqui, portanto, em seu
socorro,
bela princesa, mas a encontro
abandonada...
Nenhum guerreiro permaneceu
aqui...?”
“Meu rapaz, todos temem o dragão...”
“Se eu o vencer, você casa comigo?”
“Era um outro que devia me salvar,
mas meu pequeno herói não
retornou...”
“Lyubitsa, não percebes quem eu
sou?”
“Você é Mali Paprika? Mas cresceu!...
Reconhecê-lo já quase não
consigo!...”
“Minha profecia se está a realizar:
proeza eu fiz de heroica avaliação
e o Santo Bozhe seu favor me concedeu!...”
O PEQUENO HERÓI XI
“Hoje pareces quase um adolescente!
Mas é claro que contigo eu casaria,
porém duvido que possas me salvar...
Pela cidade eu sou a vítima
escolhida:
fuja depressa e vá salvar sua vida,
que ninguém pode combater esse
dragão!”
“Se fosses tu morrer, também eu morreria,”
disse Berislav, a nova espada a
afiar.
“Ele verá um homem à sua frente!
Sou jovem e pequeno, mas de forte
coração!”
Quando Tzimey do seu lago emergiu,
viu um rapaz revestido da armadura
que Dobenka lhe dera, mais a espada,
disposto e pronto para o
enfrentar...
E logo pôs-se a rugir e a chamejar:
“Prefiro carne de donzela, mas a sua
eu comerei, após fervida em
cozedura!
Esses seus ferros não vão servir de
nada!”
Porém queimá-lo o dragão não
conseguiu...
“Ora, não importa! Comerei sua carne crua!”
Mas a espada do rapaz era robusta
e de um só golpe, cortou-lhe uma
cabeça!
As chamas envolviam-lhe a armadura
e até queimaram de Lyubitsa as
cordas,
porém só as alcançaram pelas bordas,
já que o corpo do herói a protegia,
que foi cabeças decapitando a toda
pressa,
cortando a última em uma só talhada
pura
e na areia tombou a fera tão
vetusta:
embora morta, sua cauda ainda
tremia!...
Primeiro ele de Lyubitsa foi cuidar,
mas não tinha queimadura ou
ferimentos.
“Princesa, ir-me-á cumprir a sua
promessa?”
Ela jurou e então pediu-lhe, por
penhor
o seu lenço chamuscado no calor...
Morta a fera, pegou as cabeças,
calmamente,
cortando as línguas, sem
padecimentos
e enrolando-as no lenço, sem ter
pressa...
Depois lhe disse que não a iria
acompanhar,
mas retornasse a seu castelo
incontinenti...
O PEQUENO HERÓI XII
No seu cachorro montou e foi embora,
já ofegante com seu peso... Lyubitsa
retornou,
mas no caminho encontrou um
cavaleiro
de uma família das mais ricas do
país,
que ouvir-lhe a história de imediato
quis,
mas afirmou que não podia
acreditar...
Colocou-a na garupa e assim voltou
até a beira do lago, bem ligeiro;
vendo o dragão ali morto, nessa hora
um estratagema depressa a
arquitetar...
Pegou as cabeças e guardou-as na mochila;
sacou então da espada e a apontou
diretamente da princesa ao coração:
“Eu vou matá-la, se não confirmar
que foi a mim que viu o dragão
matar!”
Lyubitsa ficou muda de terror
e Bojan, o cavaleiro, então marchou
até a cidade, afirmando à multidão
que ao dragão matara, sem feri-la
e exigiria recompensa de valor!,...
O Rei Mihajlo em Bojan acreditou,
ficando Lyubitsa totalmente
silenciosa,
mas a Bojan concedeu-a em casamento
e para tal foi preparada a igreja...
Logo Berislav escutou o que se
enseja
e apresentou-se, já montado num
cavalo,
quase um gigante, mas de expressão
formosa
e protestou contra o falso
juramento;
como prova as nove línguas ao rei
mostrou,
Lyubitsa como seu salvador a
confirmá-lo!...
“Majestade, repare que as cabeças
não têm língua nenhuma, que as
cortei!
Esse traidor só chegou depois de mim
e agora mente que matou o dragão,
que decapitado foi tão só pela minha
mão!...”
E Lyubitsa quanto ele dizia
confirmou.
Porém Bojan se curvou ante seu rei:
“Majestade, nada se passou assim!...
Lyubitsa fugira na maior das pressas
e o Tzimey morto na praia ali
ficou...”
O PEQUENO HERÓI XIII
“Esse farsante tudo espreitou,
decerto
e as línguas em minha ausência ele
cortou;
não reparei no momento em que as
guardei!...
Decerto da princesa é o namorado,
mas para a luta ele ficou
acobardado!...
Ela só nega porque me acha feio,
mas foi a minha bravura que a
salvou!
Minha recompensa novamente exigirei;
como sou nobre, sempre estive perto,
mas por estranho ir me trocar já me
arreceio!”
Ficou Mihajlo bastante confundido...
Então Berislav o lenço lhe indicou:
“Majestade, esta prenda é da
princesa;
ela me deu para as línguas
conservar,
que melhor prova podeis agora
desejar?”
Contudo, Bojan era bastante esperto:
“Ora, Lyubitsa durante a fuga o
descartou!
Chamuscado não mais servia, com
certeza...
Decerto o encontrou esse bandido:
roubou-me as línguas, tudo ali era
deserto!...”
Em confusão, o Rei Mihajlo declarou:
“Sempre será amanhã o casamento!
Lyubitsa com o primeiro pretendente
casará
que na catedral vier para a
esperar!...
Já decidi, sem mais nada a
acrescentar!...”
Pegou Lyubitsa e arrastou-a por um
braço.
Ficou Bojan muito feliz com o
julgamento:
Mas meu adversário aqui não pousará!
A seus asseclas ele logo declarou:
“Livrem-se dele, sem deixar-lhe um
traço!...”
Mas a um gigante tão forte e de
armadura
os seus esbirros não ousaram atacar.
Berislav montou em seu cavalo e se
afastou,
Parecendo até da disputa desistir...
Fora das portas da cidade iria
dormir!
Mas acontece que a mulher-dragoa,
que era a mãe de Tzimey, fora
encontrar
o cadáver sem cabeça onde Bojan o
deixou
e jurou matá-lo, na maior tortura!
Mas era velha e já quase não mais
voa...
O PEQUENO HERÓI XIV
E disfarçada de mulher veio à
cidade,
vindo a saber do referido casamento
da princesa com seu valente
salvador,
ferozmente planejando a sua
vingança,
mas no meio do povo não o alcança...
Ficou então escondida atrás da
igreja,
aguardando com paciência o seu
momento,
para cobrar-se do malvado executor
que o pobre filho degolara sem
piedade,
nesse primeiro momento que se
enseja...
Enquanto isso, Berislav cavalgou
até a beira do lago e ali despiu
cada pesada peça da armadura
e então nas suas águas mergulhou.
Logo o jardim submerso ele encontrou
e bem depressa entrou pela mansão.
Bem amarradas, as seis donzelas viu,
todas elas de grande formosura,
que a dragoa em escravas
transformou,
libertando-as com grande
exultação!...
Para a praia transportou-as, uma a
uma;
pôs duas no cavalo e caminhou
com as outras quatro até a sua
cidade,
gastando nesse passo a noite
inteira,
levando em conta a vaidade
interesseira
que Bojan de madrugada mostraria...
E dito e feito! Mal a aurora despontou,
lá estava ele, todo elegante, na
verdade;
para casar com a princesa ele se
apruma,
sem perceber onde a inimiga se
escondia...
E de repente, a mãe de Tzimey,
em dragoa de novo transformada,
atirou-se sobre Bojan e o
devorou!...
Logo alçou voo por vez derradeira,
mas com o peso sofreu queda bem
certeira,
caiu no lago e nas águas se
afundou!...
Ruiu a mansão, num instante
derribada,
foi-se o jardim, quando o encanto
terminou...
Somente os ossos ali encontrou o
rei,
quando a dragagem de suas águas
ordenou!...
EPÍLOGO
Mas isso foi depois. O herói chegou
antes da noiva, com suas seis
donzelas
e alegremente celebrou-se o
casamento,
as seis famílias na maior felicidade
por suas filhas recobrarem, de
verdade!
Pouco depois, o Rei Mihajlo faleceu;
Lyubitza e Berislav, em roupas
belas,
Coroados sem questão nesse momento;
tempos depois que no trono se
assentou,
agiu Berislav conforme Dobenka
prometeu...
Com um grande cortejo, foi à aldeia
em que seus pais, já bem velhos,
habitavam,
cumpridos onze anos e um dia,
exatamente,
depois que o mundo fora correr em
excursão.
Já as maçãs eram três ovos de
dragão,
que ali eram postos para amadurecer
e ao invés de serem chocados,
cozinhavam...
E Berislav se afastava justamente
Para crescer, no casulo de uma teia
Com que Dobenka o estava sempre a
proteger...
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