AMOR
DE CÂMARA I
(Brenda Blethlyn, atriz britânica,
presentemente a detetive em "Vera")
Sou
auditivo: a música me atrai
imensamente;
e me prende a atenção,
a
ponto tal, que mesmo na emoção
de
um beijo de amor é o som que me distrai
E
sigo a melodia em todos seus compassos,
a
orquestração, figuras, a harmonia...
É
meu primeiro amor... A nostalgia
faz-me
até esquecer de quem nos braços
eu
tenha no momento. E o sexo
é
diluído no gozo da elegia,
torna-se
palha arrastada pela melgar... (*)
(*)
Ferramenta agrícola,
É
no silêncio que o amor encontra nexo...
Quem
mais que tu assim me induziria a
fazer
amor ao som de Lorde Elgar...?
AMOR
DE CÂMARA II
Amor,
eu te busquei intensamente.
Foste,
acima de tudo, um dom presente,
em
cada verso meu, em cada ponto
que
breve conduziu-me ao desaponto.
Por
nunca te possuir, embora a alma,
internamente,
em tresloucada calma,
pusesse
ardentemente a teu serviço:
meu
peito renascido, a mente e o viço,.
totalmente
inclinados para ti.
Mas
foi obra de um dia, tão somente;
sorriste
uma só vez, nesse inclemente
ardor,
que não sentiste qual senti.
E
agora te esqueci, por mais que chames...
Que
estou fazendo amor ao som de Brahms.
AMOR DE CÂMARA III
Cantando te encontrei e fiz meus versos;
também fizeste os teus, inda que poucos.
Os meus foram suaves, foram roucos,
foram altivos, humildes, nos diversos
concatenares de amor inesperado;
paralelismos de amor subcutâneo;
transmigrações de ardor tão subitâneo,
quanto é funesto o amor avassalado.
E assim me vejo em música envolvido.
Quando te abraço é como uma canção,
que, em melodia estranha, poucos ouvem.
Meu corpo inteiro faz-se diluído...
E até parece que dissolve o coração
fazer amor ao som de Van Beethoven...
AMOR
DE CÂMARA IV
A
melodia foi meu amor primeiro.
Depois
veio a poesia, de iludido.
Ou,
realmente, meu coração ferido
poderia
transportar-se, por inteiro,
ao
propalar da arte requerido.
Mas
encontrei teu abraço derradeiro,
fui
teu escravo e a música, ligeiro,
abandonei,
mas sempre condoído.
Que
nesse orgasmo eu gero a mim de novo,
imerso
assim nas garras da ilusão,
pois
nesse amplexo, eu sinto-me infiel.
E
é por isso que procuro, num renovo,
para
não desfatiar meu coração,
fazer
amor aos acordes de Ravel...
AMOR DE
CÂMARA V
O
que eu desejo, aquilo que mais busco
é
alguém que não somente me compreenda,
mas
que caminhe pela mesma senda
e
que meu braço ampare ao lusco-fusco.
Alguém
que pense em mim com mais carinho
do
que até hoje tive. Amor estranho
que
me faça sentir, como de antanho,
ser
meu cajado e a luz no meu caminho...
Porque
aquilo que busco, eu não perdi,
e até
o que não buscava, consegui,
embora
seja muito mais o quanto quero...
Não
é um amor comum, que assim espero.
Anseio
um grande ardor, que então me ensine
A
amor fazer... ao som de Bononcini...
AMOR
DE CÃMARA VI
Os
homens se combatem, fazem guerras,
ao
passo que as mulheres, por vaidade,
competem
mutuamente, sem piedade,
umas
e outros por épocas e terras...
Mas
quando o homem combate com a mulher,
uma
derrota ao outro; e o outro vence,
nessa
junção dos corpos, que convence
ser
das batalhas a que mais se quer...
Quando
teu corpo noutro se emaranha:
uma
vitória em que jamais se ganha,
uma
derrota em que jamais se perde...
Que a
adversária então nos acompanha,
no
mesmo galardão que enfim se herde:
fazer
amor com a música de Verdi.
Nenhum comentário:
Postar um comentário