domingo, 12 de fevereiro de 2023


 

 

Aljava de Condão 1 – 7 Fevereiro 2023

(Goldie Hawn e Kurt Russell)

 

Há quem afirme serem somente flores

Essas setas de Cupido, rijos talos

Retirados do fundão dos  férteis valos,

Destarte a transmitir seus esplendores.

 

Seguirão órgãos de plantas para amores,

Nos corações abrindo fundos ralos,

Em outros casos talvez formando calos,

Se alguém atingem com demais rigores.

 

Mas um poeta será bem mais atingido

Por essas setas de agudo perfurante,

Que tão somente lhe arranham o coração.

 

Pois tanta vez o seu peito é assim colhido

Que se conserva da aljava quase amante,

Já em outra frecha a buscar inspiração.

 

Aljava de Condão 2

 

Não sei se Amor de fato ama a poesia;

Segundo dizem, ao próprio amor é indiferente,

Para inspirar qualquer paixão é mais potente

E com enganos a causar se divertia.

 

Não sei se Amor é cego, qual ouvia

No passado dizer por tanta gene,

Mas acredito possuir visão descrente

De qualquer real amor que se sentia.

 

Pode até ser que sua mãe o tenha gerado

Para impedir se extinguísse a humanidade,

Muito mais gente em gula e embriaguez

 

E tantos mais que se tenham exterminado

Nos campos de batalha ou por maldade,

Sem sequer tempo para fazer nenês...

 

Aljava de Condão 3

 

Talvez foi isso que preocupou Afrodite,

Vendo encolher os seus adoradores

E ainda a contemplar tantos horrores

Da falsa deusa que à castração incite.

 

Pois ela é a deusa que só vida nos transmite,

Bem desgostosa ante os estertores

E falsos dogmas terríveis de pavores,

Que no seu bom coração jamais permite.

 

E assim como o pólen traz a abelha

De uma flor para outra inseminar,

O seu filhinho abastece o seu carcaz

 

Com talos longos de flores em corbelha,

Com os quais possa de paixões nos incendiar ,

Enquanto a vida reproduzir nos faz.

 

Palavras de Condão 1 – 8 Fevereiro 2023

 

Palavras há com duplo e mais sentidos

Que não conseguem claramente se expressar,

Salvo se alguém as vai interpretar

Conforme melhor lhe caiam a seus ouvidos.

 

Porém tais motes poderão ser ofendidos,

Por quem busque seu significado limitar

Ou os restringir através de liminar,

Por decisões monocráticas contidos...

 

Mas as palavras não são só instrumentos

Porém de fato consciência têm de si

E assim afirmam seus próprios sentimentos

 

E então flutuam como puros pensamentos

Invisíveis ou que ao menos jamais vi,

A nos impor seus insistentes julgamentos.

 

Palavras de Condão 2

 

Deste modo, não é qualquer dicionarista

Que as consiga em prepotência limitar

De seus verbetes não alcança o aleijar,

 Cada palavra a prosseguir em sua conquista.

 

Pela mente dos humanos segue a pista,

Sempre novo significado a compilar,

Até aceitando em seu resumo transformar

Desde que em outra mente assim persista.

 

Só assim penetram em cada celular

E pelos dedos ou pelo paladar

Vão percorrendo os estames cerebrais,

 

De algum modo então podendo conservar

As suas vidas por gerações a mais,

Sem que gramáticos as possam dominar.

 

Palavras de Condão 3

 

Para mim sempre aparece algo suspeito

Na resiliência que as palavras têm,

Por outras línguas a se espalhar também,

Em que celebram casamentos de direito.

 

Mas outras feitas concubinato é feito

E um novel símbolo então ali retêm

Para os ouvidos os as vistas dos que leem

Em um novo território a ser aceito.

 

Sempre vivi por palavras emboscado,

Talvez sejam de fato a inspiração

E não o amor, o ciúme ou a tristeza.

 

As reais musas por que sou guiado

E não os poetas com que tenha comunhão,

Nem mesmo o sonho que na alma se embeleza.

 

Amantes de Condão 1 – 9 Fevereiro 2023

 

Alguns dizem que as palavras são amor

E não o amor que em palavras se expresse,

Mas o reflexo do amor ao peito desce

Como palavras perpétuas de vigor.

 

Na incandescência consoante a seu calor

Será a palavra incendiada que enlouquece

E que nos marca bem mais que alguma prece,

Pois vem de fora em seu pleno favor.

 

Assim não posso ter em mim a pretensão

De ser o autor sequer parcial de versos,

São as palavras somente que os compõem,

 

Que quais amores digladiam por minha mão,

Meus ardores em seus símbolos conversos,

Quando os mais velhos sentimentos me repõem.

 

Amantes de Condão 2

 

Porém não quero me afastar do amor,

Mesmo que das palavras seja escravo,

Como não espero só aceitar o cravo

Da flecha de Cupido que me trará calor.

 

Bem gostaria de alguns versos ser o autor,

Em puro efeito do coração de um bravo

E as palavras com meu sangue sempre lavo

E as ilumino com a fraca luz de meu palor.

 

Mas até que ponto sou apenas induzido

Por tais palavras que me queiram dominar

E até que ponto só pretendam me encantar?

 

E não serei só por suspeitas conduzido,

Que tais palavras apraz-me de abraçar,

Quais mil amantes que só eu possa acariciar.

 

Amantes de Condão 3

 

“No princípio era a Palavra, que estava com Deus

E a Palavra era Deus”, desde o começo;

Filamentos santos do Espírito assim peço,

Que me venham conduzir com salmos seus.

 

Deusas antigas sendo avatares meus,

Do Santo Espírito a tapeçaria teço

E limitar-me em sua ação não meço,

Mesmo que certos verbos sejam réus.

 

Pois nas palavras não me acharei perdido,

Só com seus termos exprimo meus amores,

Só com palavras a uivar meus estridores.

 

E só por elas não abraçarei o olvido,

Que o verso fique quando desaparecerei,

Que à fama indiferente sempre me mostrei.

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