REPOUSO INCONTIDO 1 – 1º FEV 2023
(Ann Blyth, época de ouro de Hollywood)
Repousar eu queria sem ter perdas,
que o conteúdo do sonho permaneça,
que dessas tranças belas não me esqueça
e que possa ainda enredar-me nessas cerdas,
que não me envolvam as imagens lerdas
de um devaneio que queimar não cessa
as últimas lembranças dessa peça
que interpretei e que assim não herdas.
Repousar em quero tendo só as perdas
dos conteúdos dos olhos abertos,
que se esgazeiam contra o azul do céu,
mas que percorra tão só essas veredas
em que meus anseios estejam certos,
mesmo avistados só de permeio a um véu.
REPOUSO INCONTIDO 2
Bem reconheço que o
desejado conteúdo
do mundo onírico para
mim é influenciado
por tais leituras que
tenha perlustrado,
a evolar-se de um
livro em grito mudo;
mas não é de teor
igual do mesmo estudo:
logo as damas da
onirosfera têm pintado
bem diversos tableux que esse mostrado
por qualquer autor, a
me servir de escudo.
Tomam os temas apenas
e os transformam
nos elementos desse
mundo que visito,
que não posso afirmar
seja só meu
e as friezas da vida
em breve amornam,
sem elemento a me
deixar aflito,
com que pretenda
partilhar do sonho teu.
REPOUSO INCONTIDO 3
Mui raramente o
conteúdo do sonhar
permanece comigo em
dia claro;
o que recordo
evola-se do faro,
em breve pouco ou
nada a recordar,
se estas cenas do
novo significado,
cujo conteúdo não é
bem preclaro,
ficam na mente por
cada instante raro
quando os grilhões
são soltos do acordar.
Bem em queria que
pudesse influenciar
de forma bem diversa
o meu viver,
mas não recebo de
meus sonhos profecia,
nem suas quimeras me
vêm acompanhar,
tampouco as hidras
que me dão prazer,
contra os anelos com
que o viver me perseguia.
LINGUAGEM INCONTIDA 1 – 2 FEV 23
Ao acordar, escuto só a linguagem
das coisas materiais que me rodeiam
e que em liames me prender enleiam,
que eu reconheça não sejam só
miragem,
que ver não possa além dessa paisagem
de eucaliptos e xircas que me peiam,
de jumentos e cavalos que me arreiam,
da luz do dia a servir-me a
beberagem.
Bem quereria que tudo fosse Maya,
que realmente não existisse o
material,
nem que me achasse prendido ao
temporal,
mas cá me acho envolto em Mahamaya,
nem me poder refugiar na ânsia do
irreal,
sem que em desejos me afirmar recaia.
LINGUAGEM
INCONTIDA 2
Durante
séculos a ciência combateu,
nessa
noção da pretérita ilusão,
que o imaterial
preenchesse uma noção
e o
espiritual em fantasia se perdeu;
veio a
moção pela qual então viveu,
que a Natureza
era a perfeita criação,
porém
produto tão só da evolução,
sem
divindade a que algures pertenceu.
Mas veio
a quântica após a relatividade,
todas
as coisas de pretensa solidez
não são
mais que relativas vibrações,
perdido
o tempo na astronomicidade,
somente
o espaço em sua vasta vapidez
que a
luz percorre já há tantas gerações.
LINGUAGEM
INCONTIDA 3
Algumas
vezes até consigo fazer ponte
entre
os dois mundos diversos e rivais,
determinada
visão de quânticas siderais,
prendendo
ainda o visual em seu pesponte,
mesmo
porque é a luz somente a fonte
de
cujos reflexos interpretamos os sinais,
mas
nada vemos senão espelhos materiais,
sobre
os quais a vibração da luz remonte.
Nossos olhos
só captam a impressão,
só avistada
pelo cerebral quiasma
e onde
mais é a imagem do sonho interpretada?
A luz
da memória nessa novel palpitação,
enquanto
a luz externa aos poucos pasma
e à luz
do sonho se vê interpenetrada.
FOLHA INCONTIDA 1 – 3 FEV 2023
Quando uma folha de seu pouso cai,
abre uma fenda através do ar,
que então resiste, sem se querer
cortar
e só ondulante então a folha vai;
de escaninho da mente a ideia então sai,
irá os condutos dos nervos recortar,
em faixas de sinapses mal se podem
encaixar,
quando esse pensamento do novo ali
recai.
Mas a folha que ondula suavemente
por fim acaba tombando em seu
destino,
sua boda a celebrar com a
serapilheira.
Enquanto a ideia é sacudida
firmemente,
no fim restando só um núcleo
pequenino,
a se tornar de outra ideia a
companheira.
FOLHA
INCONTIDA 2
Mas se
do talo qualquer sumo escorre,
será
mais denso que uma ampla folha,
que a
resistência aérea mais recolha,
indo
depressa para o chão que forre,
mas o grumo da seiva assim não morre
pois
sobre as folhas secas que então molha
um
espaço circular aos poucos colha,
que a
luz do sol só lentamente torre.
Enquanto
a gota de ideia que invadiu
uma rede
neural, já ali encontrou
essa
umidade que lhe confere o sangue
e sendo
tese, na anterior já se imiscuiu,
do
conteúdo neural já partilhou,
ali
contida sem se tornar exangue.
FOLHA
INCONTIDA 3
Que mais
convém, ser folha ou ser ideia,
com
seus destinos iguais mas diferentes,
a ideia
presa em tons subjacentes,
a folha
ressequida após breve epopeia,
qual
melhor adormecer nessa odisseia,
sem as
doutrinas a dominar do dantes.
Se eu
fosse folha em nada achar prementes,
só a
triturar-me até fazer parte de aleia.
Porém se
eu fosse uma ideia intrometida,
ingressando
por um olhar ou por ouvido,
não poderia
jamais ser apagado,
por mais
longe permanecesse nesta vida,
por
mais mil outros preceitos perseguido,
em mil
neurônios dividido e aprisionado.
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