sexta-feira, 29 de julho de 2022


 

AMOR SÍNOPLE I – 25 JUL 2022 (*)

(*) A cor verde em heráldica.

(Rhonda Fleming, Hollywood Golden Age)

 

Recordo o título de uma canção que ouvi

de Country Music, mas que não lembro agora

do autor da letra ou melodia nesta hora,

simplesmente há muito tempo que esses vi.

Send me the pillow that you dream on, então eu li:

“Envia-me o travesseiro” em que demora

a tua cabeça e em que sonhos teus de outrora

foram gerados... Essa a razão por que o pedi.

 

Não sei se fui em tais sonhos incluído,

mas realmente isso em nada importa,

são sonhos teus e guardam teu calor;

sobre a almofada deitaste o teu ouvido

e a presença do tecido me conforta,

qualquer que fosse a razão de teu amor.

 

AMOR SÍNOPLE II

 

Amor em sendo amor não é egoísta,

porém tudo quanto é teu ele aprecia,

por breve fosse o tempo em que te via

por longo seja em que perdi tua pista.

Nesse tecido a tua imagem se conquista,

de certo modo ali entranhada ela estaria

e o teu perfume junto a ti dormia,

nele algo de tua mente ainda se avista.

 

Mas, por favor, não laves o travesseiro

antes que te disponhas a me enviar,

quem sabe a água cause grande estrago

e essas lembranças de que então me abeiro

desbotadas já estejam por lavar

e não partilhem comigo igual afago...

 

AMOR SÍNOPLE III

 

Quiçá o teu perfume ainda respire,

esse travo sutil de teus cabelos,

das faces que beijei em meus desvelos,

das ilusões de um sonho que ainda gire...

Mas sobretudo, que minhalma mire

os sonhos que tiveste, para eu tê-los:

nada haverá em sua trama que me fire.

 

Pois só queria era partilhar tua mente,

por mais que teu rosto vá distante

e certamente também nele irei sonhar,

nessa quimera de que nele estás presente,

que teu amor para mim seja constante

e que em teus sonhos de mim possas lembrar.

 

AMOR JALDE I – 26 JUL 2022 (*)

(*) A cor amarela em heráldica.

 

Alguma coisa me diz que é a força do destino

que nunca olhos azuis me olhassem com amor,

castanhos foram todos que me amaram com fervor,

seu brilho o peito a percutir-me como um sino,

que nele despertasse meus sonhos de menino,

que relembrasse da infância algum calor,

tudo esse tempo já olvidado e sem valor,

submetido ao peneirar mais fino.

 

Certo é que amei a olhos de outra cor

e que até mesmo me tenham acalentado,

mas nunca o amor foi neles revelado,

sem na verdade, provocarem qualquer dor,

quando esse olhar castanho é conquistado,

mas de meus olhos torna-se o senhor.

 

AMOR JALDE II

 

Talvez qualquer psicóloga comente

que eram castanhos de minha mãe os olhos,

recordando-me avelãs em seus refolhos

e por isso um olhar azul me descontente;

mas olhos verdes também espreitei frequente

e até mesmo naufraguei nos seus escolhos,

suas lágrimas a me cobrir de santos óleos,

mas tal amor nunca mostrou-se diligente.

 

Na verdade, explica-me a ciência

que toda íris contém só melanina,

toda castanha em sua pura natureza

e que olhar azul, com toda a sua potência

é só uma disposição que ao frio se afina,

por mais que os grânulos componham sua beleza.

 

AMOR JALDE III

 

Na verdade, mesmo a bela borboleta,

que em Castro Alves “zunia azuis as asas”,

se em microscópio a sua visão embasas,

mostra vermelha sua composição secreta;

porém olhar azul que o olhar afeta,

que em minhas próprias íris fez suas casas,

sobre minhalma realizou suas vazas,

por longo tempo na quimera mais dileta...

 

Mas nada resultou dessa intenção,

era só meu o amor que se irradiava

e o olhar azul somente me avaliava,

depois focado em nova direção;

foram castanhos os olhos que me amaram,

doces espelhos que jamais me desprezaram.

 

AMOR GOLES I – 27 JUL 2022 (*)

(*) A cor encarnada em heráldica.

 

Paixão existe mais forte que corrente,

a qual por nós escorre em turbilhão;

é muito mais que uma simples emoção

que de repente no coração se assente;

que o assentamento nos chega de repente,

a dominar a carne inteira em ilusão,

amor torrente em sua firme brotação,

que então nas veias escorre complacente.

 

Amor existe assim e busca-se esperar

que seja mais que a corrente caudalosa,

que por nós não passe e siga adiante;

a gente quer essa torrente segurar,

mais do que água é o sangue de uma rosa,

que de surpresa todo o peito encante.

 

AMOR GOLES II

 

O problema é que uma rápida paixão

depressa flui, por sua própria natureza,

por mais que seja a visão de tal beleza,

por mais que nos atinja a comoção,

esse amor logo se perde em combustão,

quente demais para nos trazer firmeza,

por demais avassalador em sua certeza,

nunca se deixa prender em nossa mão.

 

É amor de água e não do coração,

um amor adolescente que se esvai,

sem nos deixar de si sequer um ai,

amor levado pelas águas que lá vão,

toda torrente a descer por seu caminho,

mais um castigo de fato que um carinho.

 

AMOR GOLES III

 

Mas enquanto em nós está é onipresente,

cada fibra, cada célula invadida,

uma infecção que não pode ser vencida,

o antibiótico da paixão é inexistente,

inflamação a dominar-nos cegamente,

a mente inteira adormecida para a vida,

por transitória essa paixão de breve lida,

mas imortal, eterna e onipotente.

 

Mas quando cessa, deixando só um vazio,

esguio fantasma a nos acompanhar,

por entre nuvens de algodão nosso marchar,

essa paixão que corre como um rio,

em cuja margem ficamos, sem pensar

que nova chegue que nos possa dominar.

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