ANIL
DO SONHO I – 10 JUL 2022
No
silêncio azulado deste mundo,
eu
me acorrento a atividades azuladas,
consciente
de mim mesmo em isoladas
missões
que me atribuí só de iracundo;
tudo
o que faço é com ardor profundo,
mais
do que fazem as pessoas recordadas:
horas
sem fim à filatelia destinadas,
ou
quando sonetos em teu olhar inundo.
Houve
tempos em que trabalhava sem parar
em
labores braçais o dia inteiro,
que
nem ao menos executar eu precisava
ou
quando imaginei um museu escolar
e
correspondência enviei, só de altaneiro
a
todos os governantes que lembrava!
ANIL
DO SONHO II
No
silêncio azulado desta vida,
me
entrego inteiro à névoa de meus sonhos;
durante
o dia talvez sejam mais bisonhos,
porém
de noite me tomam de vencida,
mais
importantes para mim do que a comida,
de
pesadelos ausentes, são risonhos;
alguns
talvez se demonstrem mais tristonhos,
todos
se expandem qual vaga incontida.
Durante
um tempo a compor me dediquei,
sem
exagero, talvez mil e quinhentas obras,
na
maior parte consumidas por incêndio,
ou
instrumentos dias sem fim eu estudei,
sem
professor aprendendo suas manobras,
sem
qualquer lucro obter desse dispêndio...
ANIL
DO SONHO III
No
silêncio azulado de minha mente,
escuto
música praticamente o dia inteiro:
de
mais de três mil discos eu me abeiro,
mesmo
que um possa escutar somente
de
cada vez. Às melodias sou paciente
e
apesar de tanto acervo, é costumeiro
que
ponha um disco a repetir primeiro,
talvez
semana, aos demais indiferente.
De
modo igual, talvez tenha uns cinco mil
livros
em casa, embora antigamente
o
dobro desse número então tivesse;
mas
de que serve tal coleção nada sutil,
se
só um livro posso ler integralmente,
tal
qual exalto de cada vez uma só prece?
PURPURINA
CORRUPÇÃO I – 11 JUL 22
Encontro
muitos tipos de devassidão:
um
homem bêbado é conhecido por devasso,
mas
na mulher menciona-se outro traço,
devassa
é aquela que faz sexo em ocasião,
com
qualquer um que despertar a sua paixão
momentânea,
sem temor nem embaraço,
mas
quem no jogo gasta inteiro o seu espaço,
de
igual merece receber conotação.
Hoje
em dia, é mais devasso quem se droga
ou
mesmo aqueles que comem demais,
ou
alguém promíscuo com seu próprio sexo,
talvez
devesse chamar-se assim quem roga,
não
só em igrejas, mas a guias mais casuais,
de
qualquer santo em busca de um amplexo!
PURPURINA
CORRUPÇÃO II
Talvez
devasso seja esse que passa
a
noite inteira no vício da leitura!
Ou
esse que num game faz procura,
o
dia inteiro a digitar a vida escassa;
mas
hoje existe até coisa mais devassa:
quem
tecla em celular sua alma impura
e
se afasta dos demais quase em loucura,
ou
quem busca em exercícios toda a graça.
Todo
e qualquer excesso poderia ser assim
classificado
na armadilha desse nexo,
quem
sabe mesmo um colecionador de selos?
Desde
que esse se agrilhoe a um só fim,
e
não apenas quem se exceda em sexo
ou
deposite na bebida os seus desvelos!
PURPURINA
CORRUPÇÃO III
Quiçá
esteja exagerando essa amplitude,
mas
que dizer de um pintor desatinado,
que
começa um quadro após ter outro terminado?
Ou
quem se enlaça sem razão à vida rude
de
um anacoreta dos homens isolado,
ou
quem se prende à vaidade do penteado,
da
manicure ou em maquiagem grude?
Qualquer
vício pode assim ser rotulado,
mesmo
o que julguem ser o mais inocente,
ou
qualquer busca pelo lucro demasiado.
E
o que dizer de um poeta tresloucado,
preso
nos versos, a se esquecer da gente,
seu
descanso a desgastar de aposentado?
VERDE
É A PALAVRA I – 12 JUL 22
Certa
parábola lembramos do Senhor,
sobre
esse esforço durante a semeadura,
de
sol a sol, nesse trabalho que perdura:
nada
vem fácil para o semeador!...
mas
o tempo vai passando e o ceifador
também
se apresta para a segadura;
o
eito é longo e sua tarefa e dura,
mas
recolhe sua colheita com ardor!
E
para cada grão que foi ali semeado
o
seu trabalho vê recompensado,
a
quarenta, cinquenta e cem por um
e
com o Reino desse modo é comparado,
que
as boas ações que fizemos no passado,
jamais
se esquecem por motivo algum.
VERDE
É A PALAVRA II
Porém
isto se refere ao Reino Eterno,
em
cujo seio aguardamos recompensa
e
entre os prêmios e castigos que se pensa
existe
o quente verão e o frio do inverno;
o
Salvador nos narra, em canto terno,
quanto
se deve fazer para que vença
os
percalços da vida em plena crença
e
assim se possa superar o mundo externo.
Contudo
em tal estoicismo filosófico,
para
a Terra conquistar não há receita,
semear
o Bem é um vão procedimento!
A
religião tem o seu cunho teosófico,
a
mente humana sendo muito mais estreita,
busca
somente o sucesso de um momento!
VERDE
É A PALAVRA III
Nas
nuvens gris os pássaros se enredam,
tentam
pousar em vão no cataclismo;
ninhos
de vento em meu solipsismo
eu
construo para mim em véus que cedam
palavras
simples ou idéias que concedam
mundos
inteiros dentre os quais eu cismo,
não
vejo ali verismo ou romantismo,
somente
impulsos que na mente medram.
Não
costumo falar assim tanto de mim,
que
te interessa o que eu sinta ou pense?
Prefiro
muito mais falar de amor...
Mas
nem sempre minha mão prefere assim,
deixa
na folha algo mais que ali se adense,
do
coração a escorrer sem estridor...
VERDE
É A PALAVRA IV
E
como os pássaros constroem seus ninhos,
eu
fico a recolher paina e algodão,
que
me perseguem sem pausa ou noção:
são
minhas nuvens que constroem passarinhos!
E
os passarinhos debicam meus carinhos,
para
levá-los à casuarina em que já estão,
mas
casuarinas não me trazem proteção:
são
cobertos de galhos meus caminhos!
Os
meus caminhos a vida me percorrem
e
não procuro a vida em tais veredas,
elas
que passam velozmente por meus pés!
Só
os algodões do sonho me socorrem,
construo
o céu com as ilusões mais ledas
e
só em palavras intangíveis ponho fés!...
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