sexta-feira, 19 de maio de 2023


 

 

A REDENÇÃO PELO PECADO I -- 9 OUT 2017

 

Segundo afirmam, o monge Rasputin

descria do Pecado Original,

certeira, a salvação espiritual

só pela Graça se alcançaria assim.

 

Mas sem haver um pecado carmesim,

não haveria da Graça o bom caudal;

era preciso dar-lhe forma material

para alcançar de Deus tal Graça, enfim.

 

O monge russo assim interpretou

de Paulo Epístolas no Novo Testamento:

sem ter pecado que a Graça não se achasse!

 

E às seguidoras então recomendou

que acumulassem até o arrependimento

esse tesouro em que o pecado se tornasse!

 

A REDENÇÃO PELO PECADO II

 

Era contrário a seu temperamento

de a seu próximo qualquer coisa furtar

e sem motivo não poderia matar,

contra a mentira sentindo impedimento.

 

Como vivia no mais total comedimento,

não estava em sua natureza cobiçar,

sendo um bom russo, a mãe iria respeitar

a seu pai obedecendo em algum momento.

 

Em um só Deus ele cria realmente,

sem adorar imagens de escultura

e sem de Bog tomar o Nome em vão! (*)

(*) "Deus", em russo.

 

Para pecar, o que fazer, então?

De um mandamento apenas a ordem pura:

dedicando-se a infringi-lo com paixão!

 

A REDENÇÃO PELO PECADO III

 

Sobrava assim tão só um julgamento,

o "Não Adulterarás", ou seja, o sexo

fora do matrimônio, cujo nexo

aceitaria sem maior impedimento...

 

Com as discípulas praticava a bom contento

a velha arte do amoroso amplexo,

que na verdade nada tinha de complexo:

tantos praticam sem precisar de tal assento!

 

E convenhamos ser bastante conveniente

acumular-se uma dívida com a Graça

tanto mais vezes quando mais se abraça!

 

Mas com os homens ele era indiferente:

o que apreciava mesmo era a mulher,

sempre com elas mais Graça a requerer!

 

A REDENÇÃO PELO PECADO IV

 

Qual Rasputin, existe tanta gente

que destarte justifica o seu desejo

de gozar com frequência de algum beijo,

sem compromisso qualquer com a lei vigente!

 

Mas poucos têm um porte assim valente

e muitas vezes deparam mau ensejo,

que algum marido irá cobrar seu pejo,

provocado pela ação desse insolente!

 

Não é preciso haver pecado original

e nem ao menos quebrar os Mandamentos

para que o Espírito sobre nós derrame a Graça!

 

Porém em nós há a tendência natural

de condenar-nos pelos próprios julgamentos,

na amarga culpa que o peito nos perpassa!

 

A REDENÇÃO PELO PECADO V

 

No extremo oposto estão os confessores,

que passam garimpando algum pecado

para depois absolver o confessado

que antes nele nem notara tais pendores!

 

Mas de seus púlpitos espalham os terrores

de um inferno de sofrer atribulado,

de um purgatório que deva ser atravessado

antes que o Cristo distribua Seus favores!

 

Foi tal doutrina que conduziu às indulgências,

comprada assim alguma salvação,

bastando para isso a excelsa mão

 

de sacerdotes flexíveis de consciências,

com o pretexto de dispor de algum tesouro

para perdoar Cristão, Judeu ou Mouro!...

 

A REDENÇÃO PELO PECADO Vi

 

E ainda existem os místicos sinceros

que se atormentam em cilício e no jejum,

em suas consciências encontrando sempre um

pecado a expiar em gestos feros!...

 

Alguns deles se demonstram muito austeros

e realmente se convencem ter algum

pecadilho de orgulho; e, sem nenhum,

cobram de si os menores lero-leros!...

 

Mas nisso tudo contrariam as Escrituras,

que nos declaram somente haver um sacrifício,

pelo qual sobre os humanos desce a Graça;

 

basta aceitar essa doutrina sem pirraça,

sem penitência para o próprio benefício,

de São Paulo a seguir doutrinas puras!

 

ESVAIMENTO I -- 30/3/2006

 

eu vi Teu vulto a se escoar aos poucos,

iluminado em forma intermitente

por luz que se filtrava; indiferente

fulgor, que a meu olhar ouvidos moucos

 

fazia, enquanto a sombra de alguns tocos

de árvores cruéis, malevolente,

recobria Teu busto, competente

e Teus quadris somente esgares loucos

 

podiam divisar...  até o instante

em que Te foste enfim e, de meu peito,

saiu largo suspiro temerário,

 

daquela queixa o arauto palpitante:

por que dormes sozinha no Teu leito,

enquanto eu durmo em leito solitário?...

 

ESVAIMENTO II -- 10 OUT 2017

 

que infausta coisa é Teu afastamento!

Tu que já foste tão grande para mim,

ir encolhendo, a diminuir, enfim,

guardada a proporção de meu lamento...

 

que estranha coisa o calmo movimento,

em que Teus braços, aroma de jasmim,

foram girando e Teus quadris, assim,

um pouco a balançar em manso alento...

 

e vais ficando cada vez menor,

ainda que sempre guardada a proporção,

só meu lamento é que nunca diminui!

 

perdida toda a proporção, se faz maior,

de Tua longa ausência em expectação,

enquanto toda a esperança ao redor rui!...

 

ESVAIMENTO III

 

posso afirmar tão só que, enquanto vejo

Teu corpo diminuindo até sumir,

contigo a transportar todo o desejo

para a incerteza que não há de diminuir,

 

dentro da mente não se pode diluir

reminiscência sutil de um simples beijo,

expandido, em solidão a se imiscuir,

loucamente a reviver o antigo ensejo.

 

vais-Te escoando ao longo da calçada

e quando esperava Te ver, mesmo pequena,

sem ter mais pena, dobras uma esquina,

 

minha visão a tornar despedaçada,

na amargurada coesão da mágoa extrema,

pois mesmo a sombra nos ladrilhos já se fina...

 

ESVAIMENTO IV

 

não sei dizer se Te percebo qual menina

ou no constante suspeitar de um manequim,

se nem a sombra mais acena para mim

e só imagino o vago odor que me fascina.

 

como lamento não seguir parelha sina,

casca de amor em botões de gergelim,

casas rasgando das veias no jardim:

para fechá-las eu corro e dobro a esquina...

 

e Te persigo, mas não mais estás na rua,

entraste em alguma porta e não me vês,

em minhas pupilas Te concebo toda nua,

 

mas é somente um vulto esquivo de fumaça,

sem que outro beijo solitário ainda me dês,

rude fantasma, que me assassina e passa!

 

SINGULARIDADE I -- 31/3/2006

 

Sempre uma sorte de amor,

Porém nunca amor sem sorte,

Pequeno ardor sem fragor,

Porém vasto ardor de porte,

 

Amor de ardor de valor,

Lançado em árduo reporte,

Singelo em seu destemor,

Audaz em seu vasto esporte

 

De compreensão só mental,

De afago ter racional

Amigo amor nesta hora

 

Gera espanto e exultação,

Na espera da avaliação

De quanto amor nos devora.

 

SINGULARIDADE II -- 11 out 17

 

Amor brisa tão ligeira,

Em umidade no ar,

Costura tão singular

Quando do peito se abeira

 

Fechando a ferida inteira,

Mas permanente a ficar,

Passageiro a se escoar

Nessa ausência verdadeira

 

Doce amor que a mente rói

E ocupa o espaço vago,

Amor que nos olhos trago,

 

Amor que em meus ossos dói,

Que ocupa veia e tutano,

Fraturar de cada ano.

 

SINGULARIDADE III

 

Amor sendo singular

Quando plural se queria,

Amor sentido imortal,

Quando morto se fazia.

 

Amor doce que iludia

Em redondilha fetal,

Que em poema se dizia,

Eivado de bem e mal.

 

Amor de um amor sem sorte,

Mas que sorte sempre o é,

Por mais se julgue ser má.

 

Melhor amor ter que a morte,

Morta sorte sendo até

O amor que comigo está.

 

SINGULARIDADE IV

 

Amor que não se perdia,

Que não surge nunca mais,

Amor feito de jamais,

Em dourada nostalgia...

 

Amor da melancolia

De sonhos feitos carnais

Em mil ausências mortais

De um parto que não viria...

 

Amor singularidade,

Tal qual explode universo,

Até hoje a se expandir,

 

Esse amor sem caridade

Que se acorda no meu verso

E depois não vai dormir.

 

CONGREGAÇÃO I - Wm. Lagos, 21 OUT 03

 

Se duvidas de Deus, contempla as flores:

Elas existem, belas e concretas.

Não precisam de ti, pois são completas,

Nem compartilham tuas fomes, teus temores.

 

Se duvidas de Deus, contempla as flores:

Elas existem, meigas e perfeitas,

Mas não escutam tuas preces contrafeitas

Nem se comovem ao peso de tuas dores.

 

Elas existem, em plena natureza,

Perfumam teu olfato, com certeza

Agradam teu olhar e até murmuram

 

Ao farfalhar do vento; até pensas, para ti...

No pensamento e coração perduram.

Elas existem... mas vivem para si.

 

CONGREGAÇÃO II -- 12 OUT 17

 

Se duvidas de Deus, pensa em estrelas,

Na plenitude da luz sempre invisíveis,

Na escuridão a se mostrar inexauríveis:

Para o mundo do vazio abrem janelas...

 

Se duvidas de Deus, pensa em donzelas,

Convertidas por amores indizíveis

Nessas purezas de prata, imperecíveis:

Nesse manto da noite as mil fivelas...

 

Elas existem, por mais que a luz da Lua

As possa esmaecer durante a noite

E que a canícula, em todo o seu açoite

 

Não te permita vê-las de tua rua,

Mas ainda brilham nos seus mil cantinhos,

Porém não brilham para os teus caminhos.

 

CONGREGAÇÃO III

 

Se duvidas de Deus, pensa no espaço,

O qual percorres, porém sem poder vê-lo,

Somente o vento aliciando o teu desvelo

E até imaginas receber dele um abraço.

 

Se duvidas de Deus, contempla o passo

Do zéfiro nas moitas, pelo gelo,

A sacudir sem ter mãos, com forte zelo,

Mil folhas farfalhando em peri passo... (*)

(*) Simultâneas.

 

Que todo o espaço percorres sem o ver,

Mas consegues duvidar que exista o ar?

E como podes percorrê-lo sem o ver?

 

Ou quando alguém se aproxime, a bom correr,

A sua minúscula aragem a agitar...?

O espaço existe, sem ser teu para o prender...

 

CONGREGAÇÃO IV

 

Se duvidas de Deus, pensa no amor,

Essa bênção total, mas intangível,

Pelas palmas de tuas mãos nunca preensível;

Sentes no peito tão só algum calor.

 

Se duvidas de Deus, lembra da dor,

Que dentro ao coração é inatingivel,

Por mais que queiras descartar essa insensível,

Mesmo que afirmes ter só hormonal valor.

 

Existirá algo tão certo mas abstrato

Como esse amor de força tão total

Que já habitou em teus antepassados?

 

Que amor existe, vibrante e sem recato,

Mas não o tocas, nem Deus vês, afinal,

Transformado teu futuro em mil passados.

 

 

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