AMPLO
AMPLEXO I – 17 janeiro 2024
(Sharon Tate, que morreu assassinada)
O
que é verdadeiro? É o amor espiritual,
Esse
que os medíocres chamam de platônico,
Esse
amor mais profundo, amor ctônico,
Que
não se atreve a pedir amor carnal?
Em
sua expectativa, tem seu toque divinal,
Mas
em gemidos de lascívia, é um evento sônico,
Engolfado
em si mesmo, é mais icônico,
Que
poucos sentem, habilidoso e triunfal.
Sempre
que te vejo, ao menos em minha mente,
Só
imagino qual delícia que seria,
Ansiando
em ti o delírio do prazer,
Sob
o olhar da solidão mais complacente,
Sei
bem o quanto minhalma vibraria,
Mesmo
que nunca me possas pertencer.
AMPLO AMPLEXO II
Abraços são abraços no final,
Por mais duráveis, têm começo e fim,
Por mais egoísta seja ouvir um sim,
Por mais altruísta em proteção do mal,
Pois cada abraço é um amplexo material,
Perfumado como as flores de um jardim,
Que se ressecam e se perdem para mim,
Que se desmanchem no canteiro é natural.
Ou como flor que muito mais perdura,
Revestida de importância emocional,
Entre as páginas de um livro tal guardado,
Mas ressecada, sem cor, final agrura
E assim o abraço, por mais sendo triunfal,
Tão irreal quanto a sombra de um pecado.
AMPLO AMPLEXO III
Por longa seja a duração da espera,
Quando se espera, aguarda-se o possível,
Essa quimera por um tempo inexaurível,
Que tanto pálido ardor no peito gera.
Mas caso a espera acabe, como altera
O sentimento antegozado incrível,
Em nada é igual ao sonho imperecível,
Pois todo abraço é a realidade mera.
Já aconteceu e não mais pode ser mudada
Nessa figura de sonho tão buscada,
Esse escrínio variegado e multicor;
Assim não peço teu abraço, minha querida,
Por mais que belo, deixará desiludida
Toda a esperança imaginada com fervor.
INTROSPECTIVISMO
I – 18 JAN 24
O
poema é teu, que mo mandaste pelo vento,
Entrou
em minhas narinas, porém não nos ouvidos,
Em
meu cérebro enraizou versos perdidos,
Sem
ser criado por alegria ou desalento.
O
poema é teu, nascido em teu tormento,
Só
o desaponto em versos malferidos...
Eu
os escutei então, despercebidos,
Para
depois lhes dar forma e portento.
E
o poema é dele, que morreu suflando
Suas
dores últimas para o respirador,
Em
sua agonia deu-lhe restos de calor
Dessa
poesia que jamais foi publicando,
Que
o poema é vida esgarçada nessa calma,
O
poema é a morte ressurreta em tinal palma.
INTROSPECTIVISMO II
Por minhas narinas entraram seus refolhos,
Sem que ao menos os percebesse assim,
Mas o poema é meu, que só existe em mim,
Depois que o degluti pelos meus olhos,
As minhas mucosas transformadas em antolhos,
Em mim somente encontrou destino e fim,
Cada verso em seu perfume de alecrim,
Cada estrofe recobrada dos abrolhos.
Cada soneto me insuflaram os antigos
E não apenas pela cópia dos modelos,
Em minhas narinas se esbatendo como relhos,
Sobreviventes de tantos mil perigos,
Mas meu espírito recolheu os sonhos belos,
Vertendo as fáceis lágrimas dos velhos...
INTROSPECTIVISMO III
Ou quem sabe? foi apenas
o teu pranto,
No meu momento desta introspecção,
A captar de ti a antiga solidão,
Que espalhaste pelos ares como um manto.
Ou quem sabe? foi a magia de teu canto,
Que permitiste escapar sem proteção,
Nos momentos mais gentís de tua emoção,
Cantando a alma qual novena de algum santo.
Só sei que eu captei, vindo do espaço,
Esse perfume que me ressoa nas cocleias,
Que pouco ou nada tem a ver com o olfato,
Frases dolentes que acolhi no meu abraço,
Nesse arcobotante constritor das epopeias,
Que se espalhou em mim ao teu contato.
REITERAÇÃO
I – 19 JANEIRO 2024
Ainda
embora tenha já te escrito tanto,
Mal
reconheço que de fato me empolguei,
Frações
apenas de mim então lancei,
Por
mais chorasse, nunca mostrei meu pranto,
O
que mostrei foi muito mais o canto
Que
brotou de minhalma e que plantei
Profundamente
– dentro ao solo o enraizei,
Paródia
minha de tudo quanto é santo.
Nem
é que nada te quisesse revelar,
Mas
há coisas que se trancam na garganta,
Sem
querer nunca sair e nem me espanta
Não
ter a força para o amor esternutar,
Soltando
apenas o que dissolve minha saliva,
Na
maior parte o puro ideal da mente esquiva.
REITERAÇÃO II
Nem sei se algum dia lerás o quanto escrevo,
Somente sei que o quanto guardo não lerás;
Se escapasse de mim o canto mais veraz,
Exporia para ti bem mais que devo.
Destarte o sonho que em minhalma cevo,
Será a parte que nunca encontrarás,
E se a encontrares, quiçá te assustarás
De quanta mágoa dentro do peito levo.
Mas se mostrasse a ti, tanto imporia,
Que teu coração podia até assolar
E o mais possível é que te espantaria:
Não deixarias que essa agonia singular
Se acrescentasse àquela que jazia
Já em teu seio feminino a germinar.
REITERAÇÃO III
Mas essas coisas que não digo, não escondo,
Simplesmente rccusam-se a sair,
Eu pigarreio, mas não consido transmitir,
Entre as amígdalas eu as
flagro pondo
E o meu amor por ti eu vou repondo
E como estrela o vejo a reluzir,
Porque minha língua passa a perquirir,
É por si mesmas que se vão pospondo.
Mas bem queria minha úvula esvaziar
E transmitir-te inteiramente o canto
Que pelo céu da boca, em meu espanto,
Mais desejara para ti lançar,
Que sua vibração pudesse em ti zunir!
Por mais que saiba nada possa transmitir...
EXUMAÇÕES I
– 20 JANEIRO 2024
O corpo de
meu pai não puderam exumar,
Inteiro
estava dentro do ataúde,
Em mim
causando certa surpreza rude,
Os
funcionários sem chegar a se espantar.
“Isso não é
qualquer coisa singular,
Nem é
estranho que depois o corpo mude
E de toda a
sua carne se desnude
E logo em
ossos se vá aniquilar.”
“Mas agora
que foi exposto ao ar ambiente,
Em um mês
ou dois só restará o esqueleto,
Suas roupas
qual em cabide penduradas,
Que muitos
outros já se encontrou frequente,
Sem nada de
magia ou de secreto,
O ar parado
deixa as carnes conservadas.”
EXUMAÇÕES
II
“Só
não se pode aproveitar a sepultura,
Como
é costume para alguém mais colocar,
Quando
os primeiros ossos poderíamos ensacar,
Outro
ataúde a engavetar na fenda escura.
Será
preciso nessa situaçao bem dura
Uma
outra catacumba se alugar...”
É
desse modo que o cemitério irá lucrar,
De
novas mortes a ocorrência bem segura.
Porém
passado o tempo em segurança,
Outros
restos serão também ali guardados,
Serão
os ossos nos cantos colocados.
Mas
até quando nossa memória alcança,
Não
vimos almas a serem sepultadas,
Tão
só as sementes de corpos resguardadas.
EXUMAÇÕES
III
Se
por acaso um féretro se abrisse,
Mostrando
o corpo de um padre ou de uma freira,
Proclamação
de milagre seria bem certeira
E
santidade talvez então se conferisse.
Em
esquifes de vidro mesmo diz-se
Que
se guardam em igrejas, qual a verdadeira
Prova
de que a carne se conservara inteira
Por
qualquer bênção que Deus lhe conferisse.
Os
Franciscanos só no chão são enterrados,
Do
mesmo que que em algumas ordens
Também
as freiras têm igual tratamento,
Em
humildade assim sendo sepultados,
Sem
qualquer margem para propagar desordens
De
que seus corpos devam ser beatificados.
EXUMAÇÕES
IV
Mas
essa dúvida de fato é inexistente,
Falam
as Escrituras só da ressurreição
Do
corpo espiritual em exaltação,
São
Paulo nesse ponto é bem veemente,
Mas
é costume e não se mostra à gente
Ser
bem mais simples realizar a cremação,
De
cada alma a facilitar a floração:
Guardar
os corpos traz renda permanente!
Antigamente
se buscava a proximidade
De
cada altar, para garantir sua proteção,
Os
poderosos sepultados sob o chão
Dessas
igrejas antigas e mesmo hoje é verdade,
Que
reis e nobres possam assim ser conservados,
Pelos
que rezam a serem pisoteados!
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