ASAS DE
BORBOLETA I – 3 JANEIRO 2
(Faith Domergue, coadjuvante do apogeu hollywoodiano)
Sempre
senti atração pela vagina
e não realmente
por razão sexual,
de fato a
vulva, sua capa natural,
quando a
criou, Deus fez obra-prima;
para mim,
porém, a atração jamais se inclina
para essas
mamas de alimento primordial,
tampouco as
nádegas de ondulação sensual,
cuja beleza
principal aqui termina,
mas pelos
lábios delicados, protegendo
puro
clitóris em promessas de botão
e mesmo sua
uretra veja com circunspecção,
mas amo as
asas de borboleta lado a lado,
que só se
esbatem para transmitir carinho,
em seu odor
mais excitante do que o vinho.
ASAS DE BORBOLETA II
Como foi tola essa sua ocultação,
durante décadas brancas de escultura,
somente um traço a indicar a sua frescura,
coxas cerradas na pudicícia da emoção!
Como foi tola essa lenda sem razão
de que pudesse cheirar mal coisa tão pura,
óleo de almíscar em tal meiga textura,
que chame a vida em máxima atração!
Ou quem sabe? será mesmo o contrário,
que assim se oculte o seu odor tão vário,
até o momento de sua fecundidade,
como surpresa final da exaltação,
como abertura final do coração,
a concluir toda a libidinosidade!
ASAS DE BORBOLETA III
Que para mim esvoace a borboleta,
duas flores a saudar o meu desejo,
seda e pelúcia aguardando por meu beijo,
real perfume que essa gruta me secreta...
Quanta delícia mais que o mel excreta,
quando se abre no mais leve adejo,
jasmim e rosa a provocar ensejo,
que mais que o corpo a alma inteira afeta!
Mas borboletas com rede se captura,
enquanto a mim capturam essas asas,
o seu probóscide no clitóris se mistura,
suave a leveza da pubiana levedura,
amo essa rede que para mim faz casas
e nos meus lábios derrama a sua doçura.
FERRÃO
DE VESPA I – 4 JAN 2024
Já o
pênis é apenas o instrumento,
lança
em riste contra o hímen da mulher,
esforçando-se
a cumprir o seu mister,
dilacerando
assim o impedimento!
Melhor
seria não aguardar por tal momento,
porém
provar com antecedência o bem-me-quer,
sem
nervosismo se experimentar sequer,
que
seja mais por emoção e sentimento,
não
haja dor nem ultraje em julgamento,
mútua
carícia, quase em brincadeira,
que a
borboleta bata as asas bem certeira,
na
aceitação do primeiro excitamento,
sem
alfinete a prendê-la em papelão,
nem
qualquer éter a apagar sua pulsação.
FERRÃO DE VESPA II
Pois quando o ato é praticado com amor,
as suas asas farfalhando a borboleta,
que seja então a captura mais completa,
amor de um par, não de colecionador.
Mas o que importa ser o primeiro atleta,
se a rede púbica é lançada com ardor,
qualquer ação de um sonho multicor,
nesse consolo que todo o mundo afeta?
O que importa, realmente, é conservar,
o último ser -- até o final da vida,
as asas acarinhando em incontida
duração peremptória em tal calor,
nessa partilha arcana e milenar,
em que alma e corpo encontrarão guarida!
FERRÃO DE VESPA III
Mas sendo assim potente minha atração,
não a cobiço qual fruto sexual,
vejo ali porta muito mais sensual,
tal como a flor resultante de um botão,
não que não queira beijá-la na ocasião,
mas muito mais vejo no extremo triunfal,
da inflorescência que se abre divinal
e se revela em plena exultação,
na qual enxergo muito mais que biologia,
mesmo no instante final desse apogeu,
só me surpreendo que um tal tesouro seja
meu
e na
verdade muito mais suspeitaria
que a esse escrínio afinal pertenço eu,
tapete mágico e cornucópia da magia!
FITAS
LILÁS I – 5 JAN 2024
Os
versos chegam nus em minha mente,
por
roupagens de emoção são revestidos,
de suas
mortalhas no pensamento desvestidos,
cada
qual clama por um fado diferente,
mas
pela mente, em turbilhão fremente,
ficam
os versos mutuamente perseguidos,
não
trazem roupas, os pobres destituídos,
só cabe
a mim lhes dar voz mais permanente;
destarte,
eu os puxo com anzol,
de
minha mente consciente, um certo esforço,
alguns
se grudam aos outros, como em rede,
mas os
separo à luz de meu farol,
qualquer
fratura reduzida com reforço,
enquanto
o cardume mais atenção me pede.
FITAS LILÁS II
Certamente, só cabe um no samburá,
de cada vez que ao anzol é atrelado;
chega magoado, pelas unhas arranhado
dos que deixei ainda lá ao deus-dará;
mas que fazer, se admito não será
nanhum deles, sem ser antes ataviado,
para a boda ao computador ser digitado:
tanga de pixels se lhes atribuirá.
Contudo, insisto em criar metalinguagem,
pois não sei como se formam realmente
os mil projetos de versos tresloucados
pela ânsia de empreender a sua viagem,
expelidos de meu ventre inconsequente,
umbilicais uns nos outros enredados.
FITAS LILÁS III
Na verdade, só lhes dou a vestimenta,
sua carne e ossos prontos me chegaram,
por minha capela sixtina deslizaram,
meu papa interno a insistir panejamentos;
a sociedade tem caprichos e portentos,
até acredito que hoje muitos desprezaram,
pelas bermudas e biquinis que ostentaram,
tantos versos vejo nus em espraiamentos!
Contudo os meus ainda trato com respeito,
calçados lhes darei de rimas puras,
chapéus de métrica, coletes de cesuras,
terno de ritmo, branco em seu trejeito:
talvez alguns se tornem senadores,
de brasília a invadir os corredores!
OSSOS
CASTANHOS I – 6 janeiro 2024
Não
quero ser em cemitério sepultado,
muito
melhor me será a cremação
ou pelo
menos que me enterrem pelo chão,
meu
olhar a ser por terra devorado,
tal
qual diziam, mui antigo esse ditado:
“Juro
pelos olhos que a terra,” meu irmão,
“há de
comer,” sem as tábuas de caixão,
bando
de insetos na catacumba alimentado.
Se for
no chão, seráo os vermes da terra
e não
as larvas de moscas e mosquitos,
ouvido
algum há de escutar meus gritos,
quando
minha boca tanto torrão encerra:
outros
serão os que me devorarão,
sem
exprimir de qualquer nojo a compulsão.
OSSOS CASTANHOS II
Reconheço ser este um tema recorrente,
por morar a quadra e meia do cemitério;
li do Incidente em Antares o despautério,
não que acredite em mortos-vivos realmente;
exumações já realizei frequentemente,
meus pais, minhas tias, até algum estranho,
nunca senti de algum temor o acanho,
talvez saudade de qualquer parente;
mas ao contemplar esses ossos ensacados,
dando lugar ao falecido mais recente,
sempre pensei seria melhor fossem cremados,
sem recordar suas boas ações ou seus
pecados,
só o corpo espiritual a ser presente
no dia final em que serão todos julgados.
OSSOS CASTANHOS III
Se é que ainda haverá tal julgamento,
se ocorrer, então já nos ocorreu,
fora do corpo é que Deus nos recebeu,
nesse Seu trono de triunfal assento.
Mas ainda há pouco, exumei com sentimento
os ossos de minha mãe, que lugar outro
recebeu,
sua cor amarela, quase marrom, me
surpreendeu,
outras ossadas de puro branco portamento;
estavam lá em outros sacos os despojos
de alguns parentes e até de algum estranho,
sem me inspirarem luto ou quaisquer nojos
e desse modo enviei todos para o ossário,
por que guardar para o porvir o antanho,
após cumprido o final rito funerário?
Nenhum comentário:
Postar um comentário