DESDICHADO
1 – 7 ABRIL 24
RHONDA FLEMING, apogeu de Hollywood
Te
encontrarei no Vale de Mageddo,
não
saberei quais serão os batalhões,
de
quem comandarás as multidões,
qual
entidade te chama com seu dedo,
ou
se descubro o cataclísmico segredo
de
que és tu a coordenar tantas legiões,
que
tu geraste essas fileiras de nações,
mas
lealdade, não obstante, eu te concedo.
Na
verdade, não sei qual seja Har-mageddon,
se
realmente tem lado o tabuleiro,
se
tu, mulher, a me escolher primeiro,
estás
sujeita a qualquer estranho dom,
se
com um dedo acionas o lado branco,
com
outro o negro em que meu sangue estanco.
DESDICHADO 2
Porém é certo que nesse
torvelinho,
tantos guerreiros e heróis a se
enfrentar,
não serão meus joelhos de poeira
milenar
que somarão mais força a teu
caminho.
Houve tempo em que jurei ter forte
espinho,
que a poderia qual guarda-costa
amar,
mas a armadura pressenti
enferrujar,
não mais de aço, porém trajo de
linho.
Que facilmente, caso entrasse em
tal combate,
seria desfeito pela ponta do
agulhão,
pobre arremedo de paladino serei
eu!
e hoje constato que a sensação me
abate,
que sempre ela foi minha vera
proteção,
que toda a força e meu ardor me
concedeu!
DESDICHADO 3
E de que modo a posso agora
proteger,
quando é a mim que garante a
proteção,
sou agudo espinho no seu coração,
pura fraqueza a proteção lhe
prometer!
Ai, bem queria em armadura sempre
a ter,
quando de suas dores lamentava a
profusão!
Em meu orgulho estulto de varão,
entre meus fortes braços a manter!
Mas foi-se a força, diminuiu minha
estatura,
já quantas vezes nas veredas
descaí,
enfim foi ela que em sua força me
acolheu;
fui cavaleiro com broquel branco
em lisura ,
toda minha heráldica dela foi que
recebi
e até o amor é só o amor que ela
me deu!
HERDEIRO 1 – 8 ABRIL 2024
Como sou grato a quem não soube conservá-la!
Essa tiara de esmeralda assaz triunfante,
de arestas apresentando fio cortante,
que de meu sangue o rubi extraiu em gala!.
Serei inteiro assim a engalaná-la,
gotas vertendo em rubro coagulante:
inteiramente fui dela nesse instante,
somente eu sendo capaz de conservá-la!
Ou quiçá não perceberam ser capazes
de com ela conviver toda uma vida:
amor casual em galardão e despedida...
Viver com ela somente os mais audazes
e aqui estou eu em minha plena deficiência,
mas até hoje a abraçá-la em consistência!
HERDEIRO 2
Que fácil não me
foi. Desde o começo
me preveniu de
quanto eu sofreria,
mas abandoná-la
jamais eu poderia,
à luz difusa de seu
olhar de apreço;
pois desafiou-me, em
um esgar de gesso,
nos fragmentos dessa
noite eu juraria,
houvesse quanto
houvesse, jamais a deixaria
e a vastidão desse
voto ainda hoje eu meço!
Mas aos audazes
sempre auxiliou Fortuna,
sofri os golpes no
osso de meu peito,
reconhecendo que um
dia tal direito
lhe concedera,
gravado em arcana runa.
Sei que ela sabe o
quanto a amo e amei,
que de seus braços
jamais me afastarei.
HERDEIRO 3
Mesmo não mais
estreitada entre meus braços,
nem acolhido de seu
ventre no tesouro,
mesmo a ser
repreendido em meu desdouro,
de meu amor
percorrerei amplos compassos.
Mesmo ferido,
alquebrado nos meus traços,
nesses momentos que
me feriu qual Mouro,
escondidos nos
degraus chifres de touro,
minha virilidade
recolhida nesses paços,
que me agredisse em
tal momento de fraqueza,
meu coração
amarfanhado de surpresa,
mas por ser alvo de
sua ira merecer,
com todo o velho
amor do antigo preito,
por minha afronta eu
consagrei o seu direito
das tantas vezes em
que me fez sofrer!
TRÊS INJÚRIAS 1 – 9 ABR 24
“O homem não amei!” – ela afirmou.
Contudo, entre os braços do arlequim,
ela gemia: “Nunca fiz amor assim!”
Foi por despeito que seu amor negou.
“Eu não amei o poeta!” – então clamou.
Mas quem teve o poeta em seu jardim,
a recitar-lhe seus versos de carmim,
pelos quais, sem fingimento, se encantou.
“Nunca gostei de teus versos!” – protestou,
mas quando em fogo nossa casa se queimou,
deu-lhe uma pasta em que centenas conservara.
Por certo é justo que mereça o seu desdém,
ação incompreensível para mim também,
eu que por noites sem fim somente a amara...
TRÊS INJÚRIAS 2
Mas os fatos são
assim – toda a verdade
subiu à tona na
odalisca bela,
tão formosa para mim
essa donzela,
de cujo amor soube
sondar profundidade,
de cujo amor refleti
a veracidade,
mas cujo orgulho meu
feio ato congela
e nessas frases de
rancor feito sovela,
perfurou-me o
coração sem ter piedade.
Não a condeno –
mereci o meu castigo,
foi só no seu amor
que tive abrigo,
nesta minha vida de
fatal deformidade;
mas num instante,
tal qual em verso antigo,
esquartejou-me entre
seus dedos por maldade:
perdoar jamais
sequer a mim eu não consigo!
TRÊS INJÚRIAS 3
Nem sei qual homem
retornou entre seus braços,
se é de fração de
seu amor merecedor,
tão maculado assim
em desvalor,
mais ainda ansioso
por demais de seus espaços!
Não sou o poeta que
a encantava em seus abraços,
um pobre estulto a
demonstrar-lhe seu vigor,
que tudo deve a seus
instantes de calor,
a escorregar pela
mágoa de seus traços...
Mas sei dos versos,
que tantos foram seus,
Inanna deusa, bem
mais que Dionysos,
Recebidos cada qual
de seus incisos.
São versos dela, que
nunca foram meus:
não mereci a
inspiração do frio Apollo,
mas a sorvi na
doçura de seu colo!...
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