quinta-feira, 14 de outubro de 2021


 

 

COSMOLOGIA PESSOAL I – 5 OUT 21

 

A narrativa do Gênesis até parece

indicar cronologia e movimento,

mas para onde prossegue esse portento,

se o infinito ao menor rincão já tece?

É muito mais um ladainhar de prece

que do tempo ou do espaço um só momento:

só em termos humanos tem alento

esta noção de que o poder divino desce,

que na verdade, desde sempre é a criação

e para sempre e sempre durará,

“séculos dos séculos” não somente indicará

o futuro a distribuir-se em profusão,

porém compreende todo o antanho acumulado,

todo o prsente em seu correr atribulado.

 

COSMOLOGIA PESSOAL II

 

O Todo, o Uno, o Fiel do Infinito

não é igual ao fiel de uma balança,

não existem pratos a mover-se nessa dança,

não há éons a correr em mudo grito.

Só existe tempo na Terra em que eu habito

e existe o espaço que meu pé alcança,

mas se fores examinar com temperança,

nem neste mundo existem em que me agito.

O Presente é só essa tênue linha

que corta em faixas o Futuro que não é

e o deposita no Passado que já foi

e esse Porvir só no irreal se alinha,

mil caminhos a depender de escolha e fé,

enquanto o Presente o tempo inteiro rói.

 

COSMOLOGIA PESSOAL III

 

Pois o Espaçotempo é mais do que um conceito,

é um contínuo em que o Tempo fica imóvel

e o Espaço não se expande em teia móvel,

que um chama o outro e desse outro é feito;

bem velozmente o Tempo se contrai,

enquanto o Espaço avança inexorável;

não existe um Espaçotempo mensurável,

tudo é ilusão que só o viver humano atrai.

Porém o Gênesis para humanos se escreveu

e seus parâmetros foram mais simbólicos,

os dias mencionados são retóricos,

somente a sucessão é que ocorreu,

mas apenas para nós, a Humanidade perecível,

sem impor limites à Divindade incognoscível

 

DENOMINAÇÃO PESSOAL I – 6 OUT 2021

 

Há muitos anos conheci uma mulher,

com quem quase iniciei caso de amor:

Mi nombre es Nadie!  -- respondeu-me com calor,

porém me chame de “Nádia”, se quiser...

“Meu nome é Ninguém!” – nesse dizer

só arremedava ao velho embarcador,

Ulysses ou Odysseos, nesse temor

da caverna de Poliphemo, o horrendo ser,

este filho de Netuno, de um só olho,

o “Cíclope”, como também já foi chamado,

embora houvesse vários outros semelhantes,

que arremessou a rocha como escolho,

porém seu barco sem conseguir ter afundado,

preservados assim tais navegantes...

 

DENOMINAÇÃO PESSOAL II

 

Já muitas vezes se empregou também

esse artifício para qualquer ocultação

da identidade, fosse qual fosse a razão:

dizem que o nome dá poder a alguém

sobre quem ou o quê seus olhos veem;

mas por igual motivo de omissão,

simples desejo de casual satisfação,

sem compromisso com o par que então se tem.

“Meu Nome é Ninguém!” – por causa alheia,

quando existe alguém que inferior se sente

ou se revolta por ser inferiorizado;

tanta coisa a negativa assim permeia,

quais variados  comportamentos se apresente

ou quando ferve por exclusão marcado.

 

DENOMINAÇÃO PESSOAL III

 

Metaforicamente, ainda se descobre

o Capitão Nemo e seu submarino,

o Náutilus, com seu reino pequenino,

sob os oceanos, que a tantos mais sossobre,

sob o pretexto  de que assim se cobre

de algum suposto malefício; e assassino

se transforma...  e Kirk Douglas, de inopino,

frustra seus planos de coração tão dobre!

E finalmente, há o personagem de cartum

de “Procurando por Nemo”, em inversão,

mas ambos ‘nemos’ quais ninguéns não são

e para mim ela empregou lugar-comum

para esse caso de amor que não durou,

por que sua identidade a jovem me ocultou?...

 

BARCA PESSOAL I – 7 OUT 12

 

Afinal, sempre existe outro navio;

 posso pedir ao capitão que me transfira

antes de arribar, num escaler de gira,

por entre as vagas em vago corrupio;

de seu lampião transformo-me em pavio,

bebendo querozene que me fira;

sob minha luz mortiça o mundo mira

os aventais da multidão no cio;

sou poliglota da mudez eterna,

sou quem sempre deseja demonstrar

que existe algo por detrás da luz dos olhos;

que cada um por si então discerna

o que lhe tem sua rota a revelar,

antes que o barco sossobre em seus escolhos.

 

BARCA PESSOAL II

 

Afinal, não fui simples marinheiro

nessa nave que Aronnax comandou,

nem esse Nemo a mim cooptou:

nenhum dos dois me teve por inteiro;

mas meu registro é longo e hospitaleiro,

em seis naves meu nome se embarcou

e passo de um a outro, se deixou

de ser seguro seu destino derradeiro;

posso ser sempre assim mais do que um,

nunca “ninguém” oculto em meu plural,

meu nome informo sem temer o mal,

sou “Yo-ho-ho e uma garrafa de rum”,

sou passageiro de mim mesmo no caudal,

na vicissitude  de ser sempre mais algum.

 

BARCA PESSOAL III

 

Não uso pseudônimo, mas foi longa demais

esta carga de meu nome de batismo, (*)

que hoje limito sem ter grande saudosismo,

sou seis em um, por motivos oficiais;

quem me conhece, tem escolhas naturais

desses seis nomes, mais o breve nihilismo

de um apelido, porém sem “ninguém-ismo”,

pois tenho escolhas bem mais amplas que os demais;

e quem não me conhece, o nome emprega

pelo qual se inicia o registrado:

sempre protesto que não seja esse o empregado;

mas é impossível contrariar ao que se apega

a sociedade, que me obriga a ser Alguém,

com tantos nomes que me impedem ser Ninguém.

(*) Luis Humberto William Lagos Teixeira Guedes

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