NASREDDIN
E A NOIVA VII – 23 JUL 2022
(Mary Allin Travers, de "Peter, Paul, and Mary")
“Sou
um lobo encantado, semi-humano...”
“Um
lobisomem? Agora mesmo o mato!”
“Não
faças tal. Um mago desumano
lançou
em mim um terrivel desacato!
Porém
só caço para me alimentar:
perdoe-me
a vida e serei seu fiel amigo!”
“Não
preciso de quaisquer lobos ter comigo,
sequer
um cão me decidi a criar!...”
“Eu
não costumo comer carne de ovelha,
alimento-me
com nozes e raízes,
vou
colher frutas quando me dá na telha
ou
as bagas de arbustos em que pises;
e
além disso, cuido de horta e de pomar,
para
mim bastam esses vegetais,
mas
ficam insatisfeitos com eles animais,
tivesse
um cão, o teria de alimentar!”
“Mas
não pretendo te servir dessa maneira,
contudo
posso garantir o teu futuro,
um
bom caminho colocar a tua dianteira
e
até mesmo um casamento bem seguro!”
“Não
sei como é que consegue falar,
porém
bem sei que pode me mentir;
caso
eu o poupe, irá logo fugir!
De
forma alguma me poderá ajudar!”
“Mas
eu posso. Vou voltar à forma humana,
essa
pedrada com que de longe me atingiu,
com
precisão quase sobrehumana,
como
lobo profundamente me feriu,
mas
dê-me tempo para me transformar,
faz
também parte do meu encantamento
que
por pior que me afete um ferimento,
eu
consiga velozmente me curar!...”
Nasreddin
pôs sua faca na bainha:
“Pois
se transforme então, só quero ver!
Mas
não me venha com traição mesquinha,
não
vai me atacar, ferir ou até comer?”
“De
modo algum. Nunca ataquei pessoas,
os
próprios lobos só o fazem raramente,
quando
interferem em caçar quase iminente,
mas
nunca atacam as gentes que são boas!”
NASREDDIN
E A NOIVA VII – 23 JUL 2022
Sem
esperar mais, o lobo transformou-se,
não
somente trocou pelo por pele,
mas
em roupagens ricas apresentou-se.
Nasreddin
temeu que o seu destino sele,
pois
era homem de uns quarenta anos,
alto
e robusto, até de espada portador;
como
poderia resistir-lhe algum pastor?
De
perto a funda só lhe traria desenganos!
“Não
se assuste, poder-me-ia ter matado
e
não o fez. Portanto, tem minha gratidão
e
não se arrependerá de me ter perdoado,
terá
uma noiva da mais alta condição!”
“Não
me interessa ter qualquer mulher...”
“Mas
há dias que o venho observando,
com
bela jovem vi que estava conversando,
por
certo a esta recusar não quer!...”
“Mas
como obter me poderá Zalina?
Da
última vez, ela me disse claramente
que
não me amava, teria uma outra sina...”
“Que
ela o ama, para mim é evidente,
mas
está certa de que não o aceitarão,
nem
o seu pai, nem a família dela;
por
que lhe daria esperanças a donzela,
quando
acredita não se realizarão?”
“Queria
mesmo acreditar no que me diz,
mas
acho bem difícil ser verdade,
somente
minha amizade é que ela quis
e
eu tolamente expus a minha ansiedade
e
foi assim que claramente a afastei...”
“Não,
meu amigo, raramente uma mulher
confessa
logo seu amor a quem mais quer,
mas
lhe asseguro que a questão resolverei!”
“Mas
nem sequer eu sei onde ela mora!”
Não
se preocupe, que eu descobrirei,
prossiga
aqui com seu trabalho de hora em hora
vou
abrir caminho e depois o chamarei!...”
E
transformou-se em lobo novamente,
saiu
correndo, sem sinal de ferimento;
bem
funcionara o seu encantamento;
logo
à distância já sumira inteiramente.
NASREDDIN
E A NOIVA VIII – 24 JUL 2022
Nasreddin
continuou com suas ovelhas,
cuidando
de suas feridas e de espinhos;
pastoreava
à noite para um redil com telhas,
meio
descrente de ter novos caminhos...
Se
aquele lobo se transformara em homem
e
já na linha do horizonte se afastara,
quem
sabe a mulher que o seu peito dominara
seria fruto de ilusões que seu amor consomem?
Contudo,
o cavaleiro era sincero
e
tão logo se aproximou de uma fazenda,
reconheceu-a
como seu destino vero,
mudou
de forma e penetrou na senda,
que
na verdade, tal lugar bem conhecia:
corria
o boato que a mulher mais bela
de
toda essa região era a mesma donzela
que
com Nasreddin conversava no outro dia!
E
assim foi avançando ousadamente
para
a fazenda do pai de Zalina,
que
se chama Zalinski, certamente,
de
quem ouvira muita história fina;
dizia
o pai que só daria em casamento
sua
bela filha a um homem inteligente,
que
o demonstrasse com razão potente,
conseguindo
enganá-lo em um momento!
Tal
fazendeiro era bastante orgulhoso
de
suas ideias e sua cultura, com razão;
já
muito jovem chegara esperançoso,
que
de sua filha lhe concedesse a mão,
mas
após travarem breve conversação,
Zalinski
com firmeza os despedia:
“Minha
filha facilmente o enganaria,
até
a mim vence com sua erudição!...”
“Se
não consegue enganar sequer a mim,
será
um fantoche nas mãos de minha Zalina,
que
em discussões sempre me ganha assim...
Não,
meu amigo, vá buscar outra menina!”
E
como tinha muitos empregados,
alguns
deles a servir de guarda-costas,
as
visitas não se sentiam predispostas
a
enfrentar tantos homens bem armados!
Nenhum comentário:
Postar um comentário