SINCERO OUVINTE I – 28
JAN 2022
(Faith Domergue, da época de ouro de Hollywood)
Quando me falas, tens
o que dizer
e sinto agrado só de
te escutar;
mesmo diversa opinião
a acalentar,
ainda assim, te escuto
com prazer.
Talvez não possa mesmo
te entender,
mas nem por isso me
ergo do lugar;
não vou à praia para
ver o mar,
porque prefiro teu
rosto sempre ver,
a me contares qual
seja a tua verdade;
por mais que esta da
minha assim difira,
sei que não mentes e
para ti é verdadeira:
assim te escuto com
toda a boa-vontade,
por mais que um
argumento até me fira,
mas só querendo te compreender
inteira.
SINCERO OUVINTE II
Não me parece que ajas
de igual modo,
a cada vez que te
conto minha verdade.
Em teu olhar só vejo
opacidade,
sem partilhares desse
mesmo nodo.
Sem nem sequer me
lançares um apodo,
com o qual contraries
essa minha ansiedade.
Sem demonstrares para
mim dualidade
e minhas palavras só
se atolem nesse lodo,
em especial, depois
que o celular
ocupa tanto de teu
tempo ativo,
nos seus botões a
digitar constante,
quando apenas às
paredes vou falar.
Por mais meu drama
pareça-me incisivo,
mas para ti pouco ou
nada relevante.
SINCERO OUVINTE III
Mas nisso vejo certo
teor angelical,
no indiferir com tal naturalidade.
Não que percebas em
mim a falsidade,
somente abaixo de teu
nível primordial;
e assim aguardo e o
lábio mordo no final,
sem que intentasse a
tua integridade
abalroar só por ter
necessidade
da minha verdade, para
bem ou para mal,
ser escutada,
invadindo o teu limite;
e só me resta outro
momento de escutar
a tua verdade, tão da
minha diferente,
porém que é tua, por
mais que isso me irrite.
Que só em ti mesma eu
venha me centrar
e assim te queira com
aceitação crescente...
HÁBIL CONTESTADOR I – 29 JAN 22
Mohandas Karamchand, esse famoso
Mahatma Gandhi, foi estudar direito
em uma faculdade britânica, sujeito
a um professor bastante rigoroso.
Certa ocasião, seu almoço saboroso
levou à mesa, em que sentou-se, safisfeito,
junto a seu professor, que por despeito,
lhe falou, em tom de voz bem orgulhoso:
“Senhor Gandhi, porcos e pássaros não comem
na mesma mesa, o senhor não sabia?”
“Desculpe, professor, já vou sair
voando...”
Por pretencioso, de fato, não o tomem,
já que um insulto sem motivo recebia,
por ser Hindu, só da injúria se cobrando...
HÁBIL CONTESTADOR II
Mas não ficou a coisa desse jeito:
logo a seguir, desafiou-o o professor:
“Senhor Gandhi, por acaso, se o senhor
caminhasse pela rua e a seu proveito
encontrasse uma bolsa, com legítimo direito
de escolher qualquer que fosse o seu teor,
sabedoria ou dinheiro, a qual pendor
daria preferência, em grau perfeito?”
“Eu pegaria o dinheiro, certamente.”
“Em seu lugar, deveria ser a sabedoria!”
“Acontece, profssor,” Gandhi ressaltava,
“que cada um escolhe, claramente,
aquilo que não tem; o dinheiro escolheria
e a sabedoria para o senhor deixava!”
HÁBIL CONTESTADOR III
O professor buscava sua vingança,
mas Gandhi era estudioso e não errava
qualquer questão que em prova apresentava;
certo dia, por pura manigância,
escreveu em seu teste, sem bonança,
a palavra “Idiota!” e a entregava,
mas Gandhi também esta lhe ganhava:
“Professor,” cobrou ele, sem tardança,
“O senhor não colocou minha nota,
somente apôs a sua assinatura!...”
E como testemunhas ali havia,
o professor a corrigi-la se devota,
sem encontrar nela a menor rasura
e a nota assim de aprovação lhe conferia!
GUERRILIZAÇÃO I – 30 JAN 22
O que chamamos de “civilização”
é, na verdade, sucessão de guerras,
assolando desde praias até serras,
onde quer que haja humana habitação!
Parece haver entre nós a compulsão
de querer conquistar alhures terras;
muito lamento encontrar ditas encerras,
sempre que algo desperte uma ambição,
sem precisar de desbravar o trampolim
ou as riquezas que alguém reuniu assim.
Tudo o mais serve apenas de pretexto:
política, religião, qualquer ofensa,
pura desculpa para a inveja densa,
caso estudemos de nossa história o texto.
GUERRILIZAÇÃO II
A própria Bíblia a nos mostrar, constante,
a sucessão de guerras de conquista,
ou a intenção de interromper-se a pista
de um exército invasor em tal instante.
A história grega a revelar bastante:
cada cidade-estado ergue sua crista,
que o território alheio assim insista
em assolar, como em ciúme delirante;
após de Esparta a forte hegemonia
tendo durado por mais longos anos,
os envolveram em lutas de extermínio.
Como Plutarco tantas vezes nos diria,
que se não fossem embates tão insanos,
não sofreria a Grécia seu declínio!
GUERRILIZAÇÃO III
Longe de mim afirmar a inocência
dos animais, também movidos por cobiça,
mas que não reúnem suas tropas para a liça
e exercem apenas por breve tempo sua
potência.
Também se veem as guerras sem clemência
de tribos de formigas, a quem atiça
lutar por território ou, por preguiça,
tomar da outra a econômica prudência;
E no entretanto, não serei por vez primeira
a afirmar que a guerra traz progresso,
que sem ela menos teríamos avançado.
Somente que a litigar ainda queira:
por que nosso proceder é tão espesso,
que prossigamos só depois de haver matado!
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