domingo, 2 de outubro de 2022


 

 

O FADO DO REMORSO I – 25 SET 22

(Betty Grable, da época de ouro hollywoodiana)

 

Existe um certo tipo de mulher

que prazer sente quando é maltratada

e até mesmo ao saber-se violentada,

que algum castigo parte dela aspira e quer.

Não sei que culpa a conduz a tal mister,

porque deseja ser mesmo castigada,

qual é sua inclinação tão desviada

que um vero amor não sentirá sequer.

 

Caso alguém surja que lhe dê carinho,

lá no seu íntimo não o julga merecer

e para outro logo volve o seu querer,

que a conduza para um mau caminho,

em que usufrua a plenitude do sofrer,

na indignidade encontrando seu prazer.

 

O FADO DO REMORSO II

 

Talvez sentira em sua adolescência

algum desejo ao edípico inclinado,

por um Complexo de Electra mesclado,

por sua vergonha buscando penitência;

quando seu corpo emerge em sua potência

e seu impulso sexual é despertado,

para seu pai tendo sido desviado,

amor de espinho em dolorosa ardência.

 

Não que deseje, em sua plenitude,

roubar da mãe, em vascas de ciúme,

seu genitor para que seja apenas seu;

mas de algum modo a si própria se ilude,

que esse amor inocente de azedume

foi realmente uma falta em que incorreu.

O FADO DO REMORSO III

 

Amor de sonho, não mais do que ilusório,

mas que marcou o seu viver hodierno,

no desaponto pelo amor paterno,

mesmo que seja apenas transitório,

que o pai a ama, mas sem desejo escório,

ainda envolvido com seu par materno,

sem intenção de ligar-se a apego alterno,

seu sentimento por recusa merencório.

 

De certo modo, em ódio transformado,

por se sentir pela mãe qual preterida,

sem conseguir o impuro amor manifestar,

na adolescência seu proceder airado,

com que disfarça a dor de sua ferida,

em que somente a si pode magoar.

 

O FADO DO REMORSO IV

 

E desse modo, na vergonha do desejo

e no temor de ver-se repelida,

caso a qualquer intimidade se convida,

satisfação procura em qualquer beijo,

mas que não seja de um gentil adejo,

pois dessa culpa merece ser punida,

em tal castigo manchando a própria vida,

de amor gentil afastando-se com pejo.

 

Mas não do amor que reabre sua ferida,

mesmo que seja em abstrata chicoteada,

sua fantasia sem permitir desmascarada,

na qual rejeita a relação querida,

imerecida por sua alma esfigurada,

que mais e mais anseia ser punida.

 

O FADO DA MALÍCIA I – 26 SET 2022

 

Claro que a culpa lhe poderá ser implantada

de outras maneiras, às vezes desde a infância,

culpada seja e repreendida com constância

por qualquer coisa pueril, mas dilatada,

porque sua mãe é igualmente amargurada,

traz seu remorso em permanente instância,

que lhe perfura a alma como lança

e assim desconta em sua filha dominada.

 

Em caso agudo, por ter sido molestada,

assim julgando que a culpa seja sua,

o que ela fez para tornar-se vulnerável,

talvez buscando até ser estuprada,

rasgões abertos dentro da alma nua,

até a ideia de um perdão ser impensável.

 

O FADO DA MALÍCIA II

 

Talvez sua culpa seja mesmo involuntária,

alguém que a ama sentindo dela certa inveja;

e se for a genitora que hoje a beija,

mas a percebe como rival primária

no amor de seu pai e em manobra arbitrária

sua própria culpa na menina então reveja,

mesmo quando nem perceba o quanto esteja

a amargurá-la desta forma inecessária.

 

Tantas razões para mim sendo possíveis

para entranhar algum pecado na infeliz,

de que a Igreja certamente participa,

quando essa graça de perdões incríveis

de lado é posta, porque melhor se quis

enfatizar esse pecado com que a equipa.

 

O FADO DA MALÍCIA III

 

Sendo mulher, irá de Eva conservar

a curiosidade fatal dessa serpente,

que para o fruto do amor o corpo alente,

no qual irá o Paraíso transtornar.

O mundo patriarcal depressa irá perdoar

Adão, a quem mulher culpada tente,

não tendo culpa da falha e nem pressente,

foi pela esposa induzido a seu pecar.

 

Ainda mais quando apelam para o sexo,

como se fora o tal Pecado Original

e se a mulher por amor sente desejo,

é equiparado pelo mesmo torpe nexo,

por recorrer a infração tão primordial,

mesmo que tenha praticado um simples beijo!

 

O FADO DA MALÍCIA IV

 

Por muitos anos da Igreja ensinamentos,

em sua ênfase de combater o adultério,

pouco ou nada a lhe servir de refrigério,

bem ao contrário a condenar seus sentimentos,

na própria Missa a invadir-lhe os pensamentos,

nesse contrito exigir confessionário,

no êxtase esperado ante o sacrário,

sente-se exposta aos terríveis julgamentos!

 

Por seus pecados a ter condenação,

totalmente inconsciente de uma graça,

empolgada por demoníaco remorso,

até abraçar a própria danação,

afundando mais e mais em sua desgraça,

que arrepender-se nem sequer lhe vale o esforço!

 

O FADO DO PATRIOTA I – 27 SET 22

 

Meu coração sempre foi verde-amarelo,

não obstante, sei que sou subversivo,

qual Monarquista meu coração ativo,

ao Parlamentarismo seguindo meu apelo

e defendendo um tal duplo desvelo,

que da Constituição faz-se contrário ao crivo:

não cooptei com meu voto incisivo

os congressistas que lhe deram selo!

 

Esses tais que a si mesmos proclamaram

como sendo uma Assembleia Constituinte,

sem para tal receberem meu mandato;

não é pois de surpreender que tanto erraram,

leis e incisos a contrariar-se com acinte,

numa mistura infeliz de desacato!

 

O FADO DO PATRIOTA II

 

Contudo, será preciso que confesse

que meus ideais defenda só em teoria,

contra essa lei jamais eu me ergueria,

não pronuncio contra deveres que me desse;

mas no país em que vivo, isso acontece:

vendo essa gente que a meu redor sofria,

ante a política que ao povo só iludia,

eu me envergonho até de fazer prece!

 

Assim declaro ser Parlamentarista,

contra a República Presidencialista

e o adjetivo “republicano” até me ofende,

se por sinônimo de “democrático” se insista,

porque uma coisa a outra não se prende,

por tão faccioso sendo o que pretende. 

 

O FADO DO PATRIOTA III

 

Porém afirmo que prefiro um rei,

no molde e pauta do bom Pedro Segundo,

por sua deposição fui sempre iracundo,

uma injustiça com que jamais concordarei.

Não me parece que algum dia verei

renovado entre nós líder profundo,

seu preparo desde a infância bem rotundo,

bem mais que alguém que por voto escolherei,

que no Presidencialismo qualquer um

pode ascender ao trono e ser tirano,

“Se o Zeca pode, também eu ser poderia”,

nessa disputa sem sentido algum,

apenas a ânsia de poder é seu reclamo,

sem que na pátria qualquer deles pensaria!

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