domingo, 12 de dezembro de 2021


 

 

PRAIA VERMELHA I – 8 DEZ 21

 (Luise Rainer, atriz do cinema mudo)


A inspiração se agacha de tocaia

e morde quando quer.  Apenas traço

a vereda incluída em cada passo,

meu coração aguilhoado de azagaia.

 

A linha impura dessa estranha laia

só me permite o controle mais escasso

e sem poder impedir, caio no laço,

qual garanhão contido numa baia.

 

Contudo, quando a musa se menstrua

e não me quer amar por esse dia,

eu me masturbo em novo resultado,

 

lançando versos amargos para a rua,

meio duros e incolores nessa via,

quando sua falta me deixa amargurado.

 

PRAIA VERMELHA II

 

Amor, contudo, é um sonho avermelhado,

que em si mesmo nos traz coloração;

cheios de cor tais versos sairão,

mesmo que amor os tenha abandonado.

 

O problema é que amor foi deslocado

e não se pôde manifestar em gestação,

a morte chega nessa menstruação:

quantos milhares perecem nesse fado!

 

Porém se a musa espia lá do alto,

pouco importa que amor não tenha sexo

ou que se perca em dobras de algodão,

 

que para outros nascimentos dá ressalto

e nessa ausência da carne traz um nexo

que mesmo à morte dá uma certa remissão.

 

PRAIA VERMELHA III

 

Assim me lanço bem disposto na armadilha!

Sempre se pode abraçar a quem se quer:

algum perfume se aspirará qualquer

dos feromonas que se alçam de sua bilha.

 

Quem ama pode percorrer segunda milha,

só acompanhando os passos da mulher,

diante da graça da presença que trouxer,

lado a lado a tropeçar na mesma trilha...

 

E é assim que aceito o golpe da azagaia:

se algum filho surgir, é um sonho meu

que em mim talvez gerou o seu odor,

 

que minha narina aspirou em nuvem gaia,

quando seu ventre pouco ou nada concedeu

mas em minhalma gerou versos de amor!...

 

TÍTULO ESQUECIDO I – 9 DEZ 21

 

Por um motivo que nem mais recordo,

como um título futuro de poesia,

o nome “Idanoh” registrei um certo dia

e francamente, nem sei se mais concordo

 

em ainda o utilizar ou se discordo –

tantos rascunhos ainda encontraria!

Por que motivo Idanoh contemplaria

com uma parte do tempo em que me acordo?

 

A única referência que encontrei

é que seja minúscula cidade,

em Staffordshire... Mas por que

 

fui anotar esse nome?  Em que pensei?

Que inspiração me traria na verdade?

Qual o motivo que em tal cartão se lê?

 

TÍTULO ESQUECIDO II

 

É indubitável que me serve de pretexto,

certo exercício para agradar a Apollo,

mas não me trouxe magia sobre o colo:

em nada Dionyso me bafejou seu texto...

 

Somente ocorre que em qualquer contexto,

ou por virtude ou por manhoso dolo,

ora estas linhas me servem de consolo

e outro soneto por aqui se escorre presto...

 

Só me pergunto a quem possa interessar

isso que escrevo agora em desfastio,

se nem em mim sequer algo desperta!

 

Mas se essa tinta estou a esperdiçar

e me parece que só tolice isso que eu crio,

para o impossível conservo a mente aberta.

 

TÍTULO ESQUECIDO III

 

Certamente encontrei numa leitura

essa palavra assim tão desusada,

que no passado tornou-se registrada:

o que esperava dessa memória impura?

 

Mas em momento de esquecida agrura

a minha lembrança foi por ela espicaçada

e para possível inspiração marcada;

então a escrevo, sem grande compostura.

 

Sem ter qualquer noção do seu final,

mas nada creio que me venha por acaso:

se o nome eu registrei, foi decisão

 

que a meu porvir demarcou algum fanal...

Quem sabe se cumpriu hoje esse prazo

e essas palavras para alguém mesmo servirão?

 

TONICIDADE  RARA I – 10 DEZ 21

 

O problema das Proparoxítonas

é a dificuldade das rimas encontradas;

seriam com prazer mais empregadas

do que as rimas femininas Oxítonas.

 

É bem mais fácil empregar Paroxítonas:

de quaisquer verbos poderão ser derivadas

e como rimas masculinas são chamadas

(Em Espanhol até há Preproparoxítonas!)

 

As Oxítonas gerariam rimas femininas,

segundo afirmam (ou será o contrário?)

Rascunhos crio qual respirar diário,

 

Mas Proparoxítonas são palavras finas,

que apreciaria até usar com mais frequência,

mas que é preciso incluir dentre a cadência!

 

TONICIDADE  RARA II

 

Tenho a impressão de que só posso usar

a maioria, por mais que delas goste,

com rimas tônicas de que me desgoste,

somente à métrica podendo apaziguar!

 

E fico aqui neste contrabalançar

bem feminino com a masculina hoste,

mais como um exercício a que me arroste,

quando real inspiração venha a faltar!

 

Não obstante, me submeto ao crivo crítico

na redação de meu dever poético,

sem ser de fato um compromisso ético

 

e me ponho a procurar um novo dístico,

que gravarei no mármore mais lítico,

mas cujo efeito ainda me deixa cético!

 

TONICIDADE  RARA III

 

Às vezes, é assim.  Pago tributo

a Apollo e a Dionyso diariamente,

com três sonetos de cunho intermitente

ou a alexandrinos darei salvo-conduto;

 

mas se algum dia não sinto qualquer luto,

nem de um amor a inspiração premente,

embora desse amor seja consciente,

para o proparoxitonal não é arguto.

 

Porém os deuses da rima me avassalam

e exigem da tarefa o cumprimento,

mesmo que as musas tenham ido para a praia;

 

e destarte versos vagos se intercalam,

na tarde quente de meu padecimento,

sem merecer aplauso ou qualquer vaia!

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