A FADA
ARANHA VII — Revisado 17 jan 22
(Louis XI da França, chamado "o Rei Aranha")
“Segundo
afirma o meu bom tesoureiro,
essas
aranhas são hermafroditas (*)
e
conseguem a si mesmas fecundar,
igual
minhocas, para a espécie continuar...
Mas
sangue virgem deve obter primeiro...”
“Majestade,
não pode meu sangue receber?...”
“Obviamente,
sendo mãe, você é mulher...
Já sua
menina, tendo apenas cinco anos,
nos
satisfaz completamente os planos:
conseguiremos
aranhazinhas bem bonitas!...”
(*)
Animais inferiores, cada qual com ambos os sexos.
“Ah, Majestade, suplico seu perdão!...”
E dirigindo-se aos demais presentes:
“Nobres senhores, não tendes caridade?
Nem ao menos um triste pingo de bondade?”
Mas ninguém veio mostrar-lhe compaixão;
alguns até a parecer rir à socapa,
bocas cobertas por chapéu ou capa...
Belezzar os encarou, severamente:
“Não há motivo para qualquer riso indecente:
é um sortilégio que nos vem de antigas gentes!...”
E disse o rei: “Entreguem-lhe o punhal!”
“Majestade, como quer que a filha eu mate?”
“Eu poderia ordenar a outra pessoa,
mas o crime foi seu e outrem destoa:
só você pode reparar seu próprio mal!
Prefere o macho?” “Não, por
quanto é santo!”
Leora exclamou, já debulhada em pranto.
O rei fingiu seus conselheiros consultar
e então falou: “Terceira chance vou-lhe dar;
não haverá outra, caso essa não acate!...”
“Então me
diga qual é, meu soberano!”
“Você
pode outra aranha fêmea ir procurar.
Dizem que
existem algumas lá no norte,
talvez
até de extraordinário porte...
Eu lhe
darei um dia e mais um ano!...
Se dentro
desse prazo não voltar,
a sua
menina alguém irá sacrificar
e seu
sangue virgem servirá de refeição
para
causar a hermafrodita mutação!...
Aceita
esta, ou também vai recusar?...”
A FADA
ARANHA VIII – Revisado 18 jan 22
“Na sua
ausência, será a menina bem tratada;
não lhe
negaremos o quanto precisar;
somente
será conservada no castelo,
como
refém, a garantir o seu desvelo;
se não
voltar, ela será sacrificada
e por sua
própria culpa irá pagar,
a aranha
macho seu sangue a alimentar!...”
“Eu o
farei!” – exclamou Leora, com coragem.
“Pois
muito bem. Levem-na à torre de menagem,
(*)
onde o
retorno de sua mãe irá aguardar!...”
(*) A
torre principal e mais fortificada de um castelo.
Leora não pôde despedir-se ou dar um beijo
na filha presa em seu vítreo caixão.
“Pois muito bem,” – disse o ímpio Belezzar.
“Numa caverna costumavam-nas avistar,
porém lhe aviso que há gerações o ensejo
de contemplá-las não alcançou qualquer pastor;
anteriormente, as combatiam com ardor,
pois costumavam comer as suas ovelhas
os machos negros mais do que as vermelhas:
tem pela frente uma longa expedição!...”
“Procurarei, Majestade...” – disse Leora,
“e dentro de seu prazo eu voltarei!”
“Terá de ir sozinha, compreendeu?
Tendo uma escolta, não será mérito seu...
Mas lhe darei certos favores nesta hora:
Você receberá o Manto da Tristeza,
a Água da Angústia e, com plena certeza,
o Pão da Mágoa... E em sinal de minha bondade,
levará os Tamancos da Adversidade...
E mais um saco de moedas lhe darei!...”
“Obrigado,
Majestade, sei seres um rei justo.”
“Não é
justiça, porém necessidade:
precisa o
reino de seu total sucesso
e assim
aguardarei o seu regresso;
deu-lhe o
Conselho estes dotes de alto custo:
o Manto é
tecido de poderosa teia;
com os
Tamancos, do que pisar não se arreceia;
um Anel
de Pelo do macho irá levar; (*)
como a Água
e o Pão, só o deverá utilizar
com grão
critério e muita sobriedade!...”
(*) Feito
de espículas e não de pelo igual ao dos mamíferos.
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