terça-feira, 10 de janeiro de 2023


 

 

ESTERNUTAR DOURADO I – 5 JAN 2023

(Dale Arden, a eterna namorada de Flash Gordon)

 

Em um espirro sinto que a alma esternutei,

A meu redor a ser assim lançada,

Por novo espirro no entorno procurada,

O seu caminho tão pródigo orientei.

 

Tudo depende de quão longe o projetei.

Se por novo espirro não puder ser alcançada,

Como ir buscar essa alma projetada

Em perdigotos que nas paredes derramei?

 

Que me acontece durante um resfriado,

Em que um ao outro o espirro se repete,

Minha pobre alma sem saber o que fazer?

E quando troco algum beijo de pecado,

Alma por alma que o sexor assim afete,

Em mil suspiros que mal pode se conter?

 

ESTERNUTAR DOURADO II

 

Era comum entre os reis de antigamente,

Quando esta crença parecia bem real,

Que seu bobo da corte ou algum jogral,

Tivesse o cargo de uma função premente.

 

Coçar as narinas do rei impenitente,

Até que a nova efusão esternutal

Trouxesse a alma de seu destino ao mal

E o caminho lhe indicasse competente.

 

Coisa terrível seria um rei sem alma!

Talvez se transformasse em desalmado,

Em seu sentido inicial de rei cruel,

Mas se ao invés ficasse preso em calma,

Por coisa alguma a sentir-se interessado,

Deixando o reino em abandono e fel?

 

ESTERNUTAR DOURADO III

 

E o que ocorreu durante a pandemia?

Ficava o espirro em máscara guardado,

Contra as bochechas seu caminho recortado,

Será que o caminho do nariz atinaria?

 

E como tanta gente então espirraria,

Se de sua máscara houvesse um canto alçado

E a alma travessa, num gesto descuidado,

Por esse fortuito buraquinho então seguia?

 

Será que existe definida diferença

Entre a passagem de um a outro resfriado

E em outro nariz entrasse sorrateira?

Ou entre pólen de concentração mais densa,

Qual na primavera talvez tenhas sentido,

Tua incauta alma fosse sofrer uma rasteira?

FLOR DOURADA I – 6 JAN 2023

 

Amor nunca é demais, jamais importa

Isso que alegue qualquer presunçoso,

Sempre existe no amor algo formoso,

Que o nosso tédio e sua maldade corta.

 

Amor real jamais é letra morta,

Por mais que o termo se empregue sem garboso

Significado ou o considere ser dengoso,

Por mais falsa a reação que o amor entorta.

 

Pois quem é humano, precisa desse amor,

Mesmo aquele mais cruel e abrutalhado,

Que em sua infância quase nada recebeu

E que lhe nega a existência com fervor,

Que possa somente ao sexor ser comparado,

Se o amor de mãe sequer um dia conheceu.

 

FLOR DOURADA II

 

Quem recebeu durante a sua infância

Algum carinho em proporção normal,

Mais o buscará de forma natural,

Em recompensa natural de cada instância.

 

Mesmo sem perceber toda a importância

Que amor contenha em dom espiritual

E assim o limite à acumulação sensual,

Por quem lho dá só mostrando tolerância.

 

Muitos transferem tal necessidade

Para a conquista de coisas materiais

E de amor chamem seu desejo de poder,

Mas onde quer que viver a humanidade,

Até por razões biológicas finais,

Novas mudas de amor semeará e irá colher.

 

FLOR DOURADA III

 

Mas nisto tudo só o medíocre menciono.

Que coisa existe que já não foi ponderada

Constantemente por tanta alma enamorada,

Por quem não tem, por quem de amor é dono?

 

São pobres versos em que nada mais ressono

Que a frase antiga tantas vezes derramada

Sob os olhos de quem lê a frase airada,

Para os ouvidos em repetitivo tono.

 

Contudo algo ainda me leva a repetir

As próprias frases que de mim plagiei,

Nesses milhares de sonetos passageiros

E que talvez ainda possa me iludir

Que escrever possa o que nunca antes pensei

Em meus sonetos contenciosos e altaneiros!

 

RENOVAÇÃO DOURADA I – 7 JAN 2023

 

Muito mais coisas posso dizer do amor,

Talvez algumas de que nunca disse nada,

Essa temática jamais será esgotada,

Enquanto humanos precisarem de calor.

 

Mesmo em quem for limitado por sexor,

Amor é sempre o eclodir de uma alvorada,

Sempre que surge em animação inesperada,

Parece nova sua liturgia de fervor.

 

Ainda quem se apaixonou vezes sem conta,

Acha surpresa que lhe domina a mente,

Ninguém fica a um novo amor indiferente,

Ainda que o julgue ser de pouca monta,

Até quando o encare com condescendência

E o guarde preso no limiar de sua consciência.

 

RENOVAÇÃO DOURADA II

 

Nem todo amor por certo é amor sexual,

Quem pode negar que existe amor materno?

Quem pode desdenhar do amor fraterno,

Ou do espantoso amor do divinal?

 

Acha-se amor na devoção de um animal,

Acha-se amor pelo acontecimento hodierno,

Quando se relate a algum ideal superno,

Ou observado por curiosidade natural.

 

E a muita coisa chamam pecado capital

Que não é mais que outa versão do amor,

Que é a gula, senão o amor do paladar?

Que é a vaidade, senão o amor do individual,

Que é a inveja, senão o amor tão constritor

Por bem alheio que preferíamos tomar?

 

RENOVAÇÃO DOURADA III

 

Que é a avareza, senão amor à posse,

Que é o ódio, senão do amor o inverso,

Como é fácil ser esse amor mais controverso

Por sentimento alheio que o endossa?

 

Ou esse amor que o colecionador engrosse,

Mais e mais itens de um teor diverso,

Função do orgulho, que é um amor reverso,

Qual filigrana pintada em antiga louça?

 

E há tanto amor que é lançado em projeção,

O amor-próprio projetado no poder

O amor da pátria projetado no dever,

O amor aos filhos projetado em devoção,

Qual se projete em Deus o amor ideal

Que assim preencha nosso vazio espiritual?

2 comentários:

  1. Lindas poesias, meus parabéns.

    Arthur Claro
    http://www.arthur-claro.blogspot.com

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  2. Belos versos em lirismo singular. Sempre um gosto a leitura. Abraços

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