HIDRAS
DA MENTE 1 – 27 DEZ 2022
(Betty Grable, apogeu de Hollywood)
Em
minha mente as hidras, mansamente,
balançam
seus tentáculos sinuosos,
da
multidão dos artifícios facciosos,
que
algo se torne realidade finalmente,
elas
controlam o derredor frequente,
que
não sejam os porvires ardilosos,
seus
conceberes sempre esperançosos,
que
suas figuras ocorram fielmente,
ou
que já tenham ocorrido, não na vida,
mas
na memória do que a vida ainda seria,
na
fantasia do que o meu antanho foi,
fantasmagoria
diuturna concebida,
na
afirmação que vulto esguio nutria,
por
alimento ideal que o real destrói.
HIDRAS
DA MENTE 2
Cada
hidra propalando o seu engano,
que
ela defende com suas nove cabeças,
que
o ocorrido totalmente esqueças,
substituido
por contorno mais profano,
sem
que ao passado favoreça ou cause dano,
mas
embaralhe os dias quando os meças,
em
quixotesco conjunto no qual tudo engessas,
tal
qual moinho de vento castelhano,
que
o desígnio do desenho só te absolvirá,
quando
tua vida reescrever potente
e
o que não houve em verdade transformar,
como
um juiz que o poder abarcará
e
cada dia o reforme em impaciente,
prolatar
de um despacho a se firmar.
HIDRAS
DA MENTE 3
Porém
minhas hidras me são sempre amigáveis,
querem
somente em ilusório me adornar,
que
algo surja de que possa me orgulhar
e
não apenas dias vazios e imponderáveis,
sem
em tais manobras nada as torne condenáveis,
pois
os humanos são já propensos ao gabar
e
a mim convencem de um vigoroso realizar,
que
nunca houve, mas por que são responsáveis,
que
essas mil consuetudinárias horas vãs
tivessem
sido gastas à caça de tesouros,
conquistas
de amor e loucas aventuras,
incomparáveis
às semanas temporãs,
mais
do que nunca indiferentes aos desdouros,
em
que desperdicei a multidão das horas puras.
QUIMERAS
DA MENTE 1 – 28 DEZ 22
Eu
vou pedir gentil licença à ilusão,
que
veja o meu passar e me abra alas;
vou-lhe
pedir que cordial faça suas malas
e
me deixe abandonado só à razão;
já
me acho velho demais para a paixão,
exceto
esta que revelo só em falas,
sem
a qualquer apresentar minhas galas,
salvo
em estrofes hesitantes de canção;
sempre
de amor pode cantar o menestrel,
à
luz melíflua despejando serenata,
sem
esperar que lhe responda Rapunzel,
que
suas tranças lá do alto não desata,
quando
muito a lançar-me algum cordel,
feito
de cromo em imitação de prata.
QUIMERAS
DA MENTE 2
Assim,
quando a ilusão ceder passagem
ao
raciocínio ponderado da razão,
posso
seguir o meu sendeiro de eleição,
que
meu camelo atravesse sua miragem,
sem
haver torre de Rapunzel nessa paisagem,
mas
só casebres de pobre construção,
talvez
ao invés uma caverna de ermitão,
alguma
sombra a me dar nessa paragem,
mas
saberei que o resultado é bem real,
não
há castelo com torre de menagem,
não
mais ameias, caíram seus merlões, (*)
bem
mais seguro que dançar num carnaval,
só
uma vez por ano em sua voragem,
vazio
o tempo ao desgastarem-se emoções.
(*)
Os retângulos nos parapeitos; ameias são os espaços entre eles.
QUIMERAS
DA MENTE 3
Mas
sempre posso nos casebres descansar,
espero
que encham de água o meu cantil
e
que escutem o menestrel por preço vil,
será
sua paga inteiramente o meu cantar;
mas
se puder na sombra me abrigar
e
não me cobrem um preço senhoril,
por
essa água ali reunida em gotas mil,
como
um jogral ainda declamo o meu falar
e
desse modo posso abrir-lhes meu bornal
e
a cada ouvinte entregar simples anel,
em
cujo engaste prendi jóias de ilusão,
por
mais que o aro seja inteiro racional,
cada
palavra em melifluar de doce mel,
da
sede a seda em sonho passional.
NINFÉIAS
DA MENTE 1 – 29 DEZ 2022
Se
não houver amor, a sinfonia
não
dançará em acordes de incerteza
e
de toda majestade a realeza
não
poderá ser coroada em sua magia;
se
amor não há em quanto se queria,
jamais
se encontra do sonho a fortaleza,
a
cor se perde permeio à sua beleza,
rasgam-se
os fios de tal tapeçaria;
se
não houver amor, a sintonia
pode
até mesmo dourar uma amizade
ou
saciar um faminto em sobriedade,
mas
não a sede que por amor sentia
seja
quem for que achasse no caminho,
furado
o coração em rubro espinho.
NINFÉIAS
DA MENTE 2
Se
não houver amor, nenhuma obra,
por
mais que seja cuidada e portentosa,
alcançará
de fato ser formosa,
de
seu vigor a realidade cobra
e
para o real encanto nada sobra,
por
mais que seja cada frase deleitosa,
em
seu conjunto não mais do que uma grosa
de
versos mortos que a razão desdobra;
se
não houver amor, inutil é
compor
sonetos de gentileza ardente,
novos
quartetos expostos diariamente,
novos
tercetos em conclusão até,
pois
sem amor, o poema inteiro é morte,
só
palavras a espicaçar em breve corte.
NINFÉIAS
DA MENTE 3
Se
houver amor, mesmo a ideia mais comum,
ainda
composta na mais total mediocridade,
pode
ostentar os alamares da vaidade
e
até pareça nova, qual nenhum
tivesse
antes tropeçado nesse algum,
a
palavra a ganhar vida em realidade,
o
corriqueiro a tomar foros de verdade,
e
assim rebrilha qualquer lugar-comum;
se
não houver amor, morre a sentença,
guilhotinada
pela ponta da caneta,
fica
ali moribunda e estrangulada,
tão
só se houver amor se torna densa,
cada
ideia pontiaguda como seta,
qual
nova graça em cada peito a ser gravada.
NINFÉIAS
DA MENTE 4
Assim
espero, no momento de minha escrita,
que
o verbo brilhe em geração sagrada
e
a palavra que dos céus foi destinada
se
faça luz em cada letra que me agita
que
cada frase derramada se concita
a
rebrotar, sempre que for interpretada,
que
não seja por mente alguma desprezada,
que
seja viva em cada alma que o permita;
mas
mesmo que não seja jamais lida,
cada
fervor que assim de mim escorre,
tenha
a sua própria visão de maravilha,
tenha
o seu próprio vigor e a própria vida
que
mesmo oculta, em seu escrínio jamais morre:
soprado
o pó, pisca ante a luz e então rebrilha!
Poesias bem criativas, meus parabéns.
ResponderExcluirArthur Claro
http://www.arthur-claro.blogspot.com