segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

 

FAUNOS DA MENTE I – 2 JAN 23

(Celeste Holm & Lynda Carter. dias "Miss Marvel)


É tão frequente algum sonho perceber

como algo de concreto em meu passado,

cabeleiras, olhares, peito alçado,

quanto recorda algum antigo alvorecer,

tomado assim o outrora em seu poder,

alicerçado na memória de outro fado,

explodindo na mente, no esfaimado

anseio por um alterno transcorrer,

que manifestar não pode.  Por real

que seja o belo e novo sentimento

nunca é concreto esse pretenso amor,

por mais que nos reluza em seu fanal,

sempre é silhueta de um singular portento,

falsa a certeza desse sonho sedutor.

 

FAUNOS DA MENTE II

Retorna assim o mesmo antigo ziguezague,

a mão esquerda a tirar o que a direita

nos havia oferecido dessa feita,

até que a esperança toda apague,

e a cada vez que esse iludir me alague,

eu torno a acreditar, na toleima mais perfeita,

que minha vida se mudou e então se ajeita

até que fado sorridente o sonho esmague;

mas tal é a vida de todo o ser humano,

assaz difícil é se ter felicidade,

essa espuma furtiva e multicor,

que se esgarça tal qual precioso pano,

nesse momento de estranha ambiguidade

em que o tecido puxa o sonho num tremor.

 

FAUNOS DA MENTE III

Mas seja o sonho embora só um tecido

que não possa resistir forte pressão,

revela nova maravilha em seu rasgão,

que sonho é sonho e não pode ser rompido,

só o real pode ser reconstituído

por agulhar de cerzimento na ocasião,

a marca fica até evidente ante a visão,

embora forte, seu vigor já foi perdido,

porém o sonho permanece na consciência,

mesmo mutável, o sonho se refaz

e em claro dia ainda pode ser lembrado,

em sensação poderosa de impotência,

num devaneio que mais real se faz,

qual cicatriz em coração magoado.

 

CENTAUROS DA MENTE I – 3 JAN 23

Sendo a vida como um círculo vicioso,

a cada ação corresponde a reação,

tudo tem preço, incluso a tua ilusão,

no desperdício diário mais teimoso

e assim como o bosque mais viçoso

às motoserras cede sem razão,

permitindo de maus versos a impressão,

compra guardada num sótão tenebroso,

o melhor mesmo é impedir de se gastar

as ilusões criadas pela mente,

jovens cortadas de suas redes neurais,

sendo, portanto, melhor não publicar

para os olhos incrédulos da gente

tantas palavras que nos doeram mais.

 

CENTAUROS DA MENTE II

Mas nada impede que se usufrua a natureza

sempre que a usemos com moderação,

que predatória possa ser civilização,

poderá também ser sábia, com certeza,

que o manual da ecologia assim nos reza:

ao renovável se dar substituição,

o biodegradável se entregar ao chão,

enquanto ao poluente se despreza,

mas quanto livro existe por aí

que foi somente um desperdício de papel,

queimado nos altares da vaidade!

Mas é por isso que os rascunhos decidi,

elaborados aos centos e a granel,

que deem a restos de cartão utilidade...

 

CENTAUROS DA MENTE III

De forma igual, os dias esquecidos,

em que nada se fez nem se recorda,

podem ser costurados desde a borda,

falsos destinos que jamais foram cumpridos,

porém tais tempos que seriam antes perdidos,

nos antanhos cavalgando como horda,

recordações da angústia que nos morda,

nos possam ser deste modo revividos,

não como foram, mas qual podiam ter sido,

reescritos como no reverso de cartões,

falsas verdades em suas recordações,

monomaníaco destino a ser ferido,

cortes de orgulho sendo ali revisitados,

passados a limpo e de novo descartados.

 

HAMADRÍADES DA MENTE I – 4 JAN 23

Esse meu jeito de dizer o que é o amor

possivelmente é bem diverso desse teu,

que há muito tipo de amor que já foi meu,

alguns pudicos, outros isentos de pudor:

há muitas formas, de múltiplo valor,

umas guardamos, mas outras se perdeu,

algumas dadas, quaisquer outras se vendeu,

que amor existe de múltiplo pendor;

que existe amor dependente de favor,

enquanto outro à força se conquista,

outros ainda a a revelar-se em explosão,

breve seu tempo, dissoluto o seu ardor

e mal se pode de algum rever a pista,

desse carinho que nos devora o coração.

 

HAMADRÍADES DA MENTE II

Mas reconheço que mesmo para mim

amor se envolve em muita mascarada,

em fantasia por beijos disfarçada,

doce que seja, impermanente assim,

que existe amor no trautear de um arlequim,

que só deseja possuir mulher roubada

e existe amor na dor desesperada

de quem percebe como amor tem fim;

existe amor no canto mais sensual,

igual que amor isento de paixão

e existe amor em desolado texto,

qual um amor poético e irreal,

rachado espelho dos neurônios da razão,

narcótico de versos em singular pretexto.

 

HAMADRÍADES DA MENTE III

E amor existe que desconhece amor

e que o interpreta da forma mais estranha,

de hesitação envolta em rude manha,

sem se atrever a interpretar o seu calor,

a timidez a esconder-se em seu favor,

com autoestima dolente de vergonha,

que se o possa obter sequer se sonha,

alma ferida que recusa ter valor;

e outro que busca a conquista em despudor,

querendo outrem ganhar só para si,

sem em troca coisa alguma oferecer.

Não sei qual seja, enfim, o teu pendor,

nem sei que amor no final eu escolhi,

pois todos podem só a ti mesma pertencer.

 

 

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