ASITTAWANDAS 2ª SÉRIE
Asittawandas I – 29 junho 2023
os olhos me contemplam, olhos cegos,
órbitas lisas sobre seu marfim,
vistas agudas como finos pregos,
quais
olhos coloridos de jasmim,
será
que podem mesmo contemplar
as
suas pupilas voltadas para mim?
poderão
tais olhos me avaliar,
com
seus rituais esconsos lá no antanho,
será
que podem, de fato, me julgar?
Asittawandas II
desmedido dos olhos o tamanho,
a refletir o poder da luz solar,
é natural o seu brilho tão estranho?
olhos
que possam, talvez, fotografar
e
retirar de minhalma um fragmento,
para
fazê-lo do passado retornar?
será
que existe ali entendimento,
sem
que possam com lágrimas regar
o
meu presente como um júri atento?
Asittawandas III
mal sei se os olhos têm calor humano,
a me espiar das laterais de bicos,
olhos egípcios contemplando algum romano
na
compreensão aviana os olhos ricos,
que
necessitam só de lado me espiar,
nas
hieroglíficas figuras de seus picos,
temíveis
esses olhos a brilhar,
olhos
sumérios, persas ou assírios,
olhos
totêmicos em seu suspeitar?
Asittawandas IV
olhos hititas de cerosos cílios,
a multidão das vistas babilônicas,
as divindades já esquecidas pelos sírios.
em hohle fels contemplam-me ctônicos,
de
corpos humanos com cabeças de leão,
quem
esculpiu tais seres tão agônicos?
por
toda parte encontrados são,
até
ao esplendo grecorromano,
direta
origem da atual civilização.
Asittawandas V – 30 JUN 2023
tem ao contrário humanos os semblantes,
mas corpos totalmente de animais...
alguns romanos adoraram elefantes?
mesmo enre os helenos, ditos
racionais,
há multidão zoomórfica, composta
por minotauros de feições bestiais;
cada centauro ou fauno nos arrosta,
com expressões sensuais ou de
sarcasmo,
em que o humano ao animal se encosta.
Asittawandas VI
ainda os encaro com meu olhar de pasmo,
tantas figuras de asas variegadas,
quais pesadelos revestidos de marasmo.
de onde nos chegam tantas visões
sagradas,
seres totêmicos serão tão só
imaginários
ou nos perseguem em figurações
aladas?
são nossos anjos de idênticos
fadários,
assim dotados de poderes sobrehumanos
ou os demônios nas catedrais
atrabiliários?
Asittawandas VII
mostram alados a cada querubim,
desde aqueles da arca da aliança,
gentil aspecto mostra cada serafim,
até o ponto em que o zoomorfismo nos
alcança,
os santos trazem só auréolas nas
cabeças,
não dispõem, porém, da alada
segurança,
salvo em modernas figurações de
espessas
zombarias dos escarnecedores,
que a salmodia recomenda-te que
esqueças!
Asittawandas VIII
a pictórica tradição dos benfeitores
os apresenta quais humanos totalmente
e iguais humanos igualmente pecadores,
porém gárgulas retornam novamente,
que mais não seja para esvaziar as
calhas
das catedrais erguidas no ocidente,
figuras deformadas em tais malhas,
lá do alto melancólicas assim,
como avaliando dos cristãos as
falhas!
Asittawandas IX – 1º julho 2023
qual a razão de tanta persistência?
será somente o imaginar totêmico
ou de visões reais a consequência?
quando surgiu entre nós o epidêmico
propalar de serem deuses astronautas,
esse fenômeno foi tido por endêmico,
as evidências reunidas em suas
partes,
através da pintura e da estatuária,
tão facilmente a seduzir mentes
incautas.
Asittawandas X
porém não vejo na literatura multifária
dessa real existência a afirmação,
pobres mestiços de aparência pária,
apresentada em majestosa situação
quando não deuses, figurando os reis,
na glória impura dessa miscigenação,
mas se eu consigo imaginar, também
podeis
que no passado ocorresse sua
existência,
tais semi-humanos a nos impor suas
leis.
Asittawandas XI
será que existe aqui só referência
a uma mistura com os neandertais,
numa troca de genética influência,
mencionados depois como animais,
por não mais se recordar a sua
aparência
ou até mesmo como seres minerais?
mas não recordo de ver seres vegetais
miscigenados com seres humanos,
ninfas mostradas mais como
espirituais.
Asittawandas XII
as hamadríades e silfos mais arcanos
representados em sua encarnação
como seres de algum modo sobrehumanos,
mas que podiam ter real concepção,
seus filhos totalmente
antropomórficos,
sempre dotados de heróica carnação,
só imagino se esses seres zoomórficos
em sua mistura de humanos e animais,
existiram de fato em rituais órficos!
Asittawandas XIII – 2 julho 2032
eis uma coisa que sempre me intrigou:
por que, ao redor de todo o mundo,
o mesmo tipo de figuras se criou?
igualmente algum monstro furibundo
na escandinávia concebido foi
e entre os ameríndios de igual fundo,
aos quais a luz solar a vida rói
e os transforma em pedra facilmente,
duro processo que por certo dói.
Asittawandas XIV
o mesmo sol que ao vampiro onipresente
faz desmanchar em cinzas ou em poeira,
nessas lendas que conhece tanta gente;
o vento sopra seus restos nesta
esteira,
um fenômeno bastante similar:
uns viram pedra, outros em areia...
por que tais lendas podemos encontrar,
sem que partilhem de um recôndito
profundo,
elocubrações já de um cunho milenar?
Asittawandas XV
e o olhar da górgona, que em pedra te transforma,
qual estátua de perfeita parecença
tal como se a uma origem mineral voltasse?
mesmo na bíblia de tão vasta
onipresença,
fez-se em estátua de sal essa mulher
de lot:
por que olhar para trás foi tanta
ofensa?
seria outra alusão à mesma mó,
algo de atávico retornando à raça,
gens recobrando por um instante só?
Asittawandas XVI
é realmente curioso que se faça
tanta alusão a um fenômeno prosaico,
mas que cada ciclo de lendas ainda abraça,
tal
qual brotasse desse inconsciente arcaico
qualquer lembrança de cunho secular,
na autocombustão que provocou arco
voltaico.
e a mesma ideia volta-me a espantar,
que nunca nas escolas se ensinasse
a evolução lemuriana a relembrar!
Asittawandas XVII – 3 julho 2023
e assim retorno ao fac-símile de mim,
que poderia dividir-me em duas metades,
uma animal e outra humana, enfim
e por efeito de tais calamidades,
separaria de mim a face obscura,
capaz de cometer iniquidades,
daquela outra de aparência pura,
que traduziu livros e poesia ainda
escreve
e o sumo-bem até hoje procura.
Asittawandas XVIII
algum receio assim me surge breve:
serão do dr. jekyll ou de mr. hyde os escritos?
qual deles vir à tona mais se atreve?
ou talvez qual dorian grey, cujo
horror
manifestava-se somente no retrato,
sua figura ainda em puríssimo lavor.
sei lá no fundo de mim convive o fato
de antepassado monstruoso assim,
em mim mostrando o seu pendor
ingrato.
Asittawandas XIX
ainda há pouco, entre os povos primitivos,
horror existia ante a fotografia,
que repeliam com os gestos mais altivos.
será que algo ali se achasse temeriam
que algum passado terrível
desvendasse
e assim suas faces bestiais
libertariam?
de Asittawandas na face se mostrasse,
ao invés de seu sorriso assaz
benevolente,
qualquer horror que do arcano se
estampasse?
Asittawandas XX
que o antigo rei, na pedra já impotente,
não fosse apenas cópia de um artista,
mas de fato uma fera ali presente,
que aos estragos do tempo ainda
resiste
do império hitita perdido o seu
passado,
mas que viver neste porvir ainda
insiste,
mesmo sem ser em semibesta
transformado,
traços humanos conservando vivos
de um rei de fato há milênios
sepultado?
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