OLHOS DE SOL I (26 JAN
11)
(Isis Valverde)
Ela se ajoelha, pronta para o bote:
seu biquíni tem escamas de serpente;
lábios abertos para um beijo
ingente
ou já prepara desde já sua glote...?
Seu corpo inteiro exuberante dote,
à beira-mar sereia refulgente...
Quem saberá furtar-se a esse fremente
convite aberto que intenção
denote...?
Porém, quem se arriscar a tais
abraços
será aos poucos ou logo devorado:
é uma anaconda essa iara
exuberante...
Muitas mulheres partilham desses
traços,
nessa atração de um corpo assim
dourado,
que a fome esconde em uma luz
vibrante.
OLHOS
DE SOL II
Sei
muito bem que índole diversa
possuem
outras mulheres: não te buscam,
nessa
beleza com que o olhar te ofuscam
te
devoram inteiro, mas é inversa
sua
intenção de te enlaçar para conversa;
algumas
são até bastante ingênuas
e
acreditam nas mentiras mais estrênuas,
não te
buscam devorar, mas vice-versa.
Porém
a maioria quer, ainda,
por
mais que se declarem liberadas,
satisfazer
o seu instinto para o ninho
e tal
tendência continuará infinda,
enquanto
se souberem cobiçadas
e aos
homens enlearem com carinho.
OLHOS
DE SOL III
Ouso
dizer que a prostituta airada
demonstra
um grau maior de honesidade,
em sua
expressão de mercantilidade,
do que
a que busca, em solução velada,
tornar-se
logo uma mulher casada,
que
não devora o homem, é verdade,
mas o
mastiga devagar, em habilidade,
até
tornar-se dele assenhoreada.
Tanto
a modelo que cobra um alto preço
para
fingir que se deixa conquistar,
quanto
essa jovem modesta e até sincera,
usam
seu corpo qual um adereço,
até o
momento de ao bote se lançar,
mostrando
as garras como meiga fera.
OLHOS DE SOL IV – 23 julho 2023
Basta pensar na indústria do
divórcio,
em seu esforço por somente conservar
o acervo material que amealhar
custou ao homem tanto tempo e esforço
Tal matrimônio não passa de um
consórcio
para o majoritário sócio ir espoliar
ou então forçá-lo à sociedade
conservar,
para a carne sustentar a recurvar o
dorso.
É então que até a mulher mais
generosa
se esforça por ganhar maior pensão
e da partilha obter a parte do leão,
enquanto a prostituta desprezada,
paga já foi por sua união fogosa
e do cliente não espera ter mais
nada.
OLHOS
DE SOL V
Vem
Anfitrite para sua campanha,
querendo
apenas receber veneração
e dela
os homens desconfiam, porque são
marcados
antes por feminina manha.
Tanto
aquele que a emboscada mais apanha,
quanto
o que pensa ser espertalhão,
de
forma ou outra a cair na sedução,
sempre
em batalha é a mulher que ganha.
Entre
os Helenos, tudo era diferente:
às
mulheres cabia o gineceu,
podiam
os homens ter várias escravas,
mas
nosso é o mundo da monogamia complacente
e até
o nome de Anfitrite se perdeu,
que só
se encontra nas mais antigas lavras.
OLHOS
DE SOL VI
Pobre
Anfitrite , com sua noção de vida
para o
simples prazer preponderando;
pobre
Anfitrite, sua proteção mostrando
sobre
essa gente, por ambição movida!
Que
tudo quer obter, sem qualque lida,
consumações apressadas realizando,
num
mundo sem magia se atirando,
ao
material somente a dar guarida!
Ah,
não, minha deusa, difícil é a tarefa!
Eu
juro um grande esforço mostrarei,
mas é
difícil expor as minhas razões,
como é
difícil a rima nesta peça,
rimas
toantes só aqui empregarei,
na
hipocrisia de minhas próprias orações.
OLHOS DE SOL VII – 24 julho 2023
Contudo, ao contemplar essa donzela,
que donzela já não é há
muitos anos,
mas se apresenta tal qual velhos
arcanos
no suprassumo da mágoa de uma
estrela,
quando a contemplo, exuberante e
bela,
sobre os recifes da margem, escassos
panos
a recobrir-lhe a nudez, meus
desenganos
afloram todos e a mente se congela.
A perfeição de suas coxas é procela,
mas me quero atirar à tempestade
desses mamilos que apenas entrevejo
e o sol contemplo além dessa janela
dos lábios entreabertos de ansiedade,
que sei ser falsa, mas mesmo assim desejo.
OLHOS
DE SOL VIII
Ela se
ajoelha, como em homenagem
ou é
uma gata à espera de ração?
Nenhuma
imagem tem qualquer razão,
são
apenas artifícios de voragem,
simplesmente
a vender sua pura imagem,
para do
ideal masculino a sedução,
para a
inveja feminina a marcação
de um
desafio espiralando pela aragem.
Que
esse vento que desfaz os seus cabelos,
uma
das mechas cortando o seu pescoço,
como
uma foice, talvez como garrote,
parece
mesmo acariciá-la em seus desvelos,
que o
vento é amante, seja velho ou moço,
que as
rédeas puxa a lhe impedir o bote!
OLHOS
DE SOL IX
Não
obstante, em sua entrega sugerida,
essa
mulher perfeitamente transitória,
que emprega
a roupa como escudo de vitória,
a
mente doma e o peito leva de vencida.
Essa
garganta, sedentemente erguida,
em que
palpíta o sol da antiga glória,
joelhos
redondos arranhados contra a escória
dos
mil recifes aguçados contra a vida,
esses
olhos de sol, entrecerrados,
para
ocultar seu brilho entrecegante,
os
ombros por cabelos entreocultos,
a mãe
silente de todos os pecados,
eis
Antarteia, minha lua dominante,
qual
te chamavam em teus antigos cultos!
OLHOS DE SOL X – 25 julho 2023
Embora te pareça, eu não cheguei
à idade que mais fala do
que faz;
virilidade em mim ainda perfaz,
igual vigor ao que sempre demonstrei.
Mas nem por isso, tal mulher eu
buscarei,
tão só intelectualmente satisfaz
a minha poética e assim desfaz a paz
com que outras temáticas busquei.
Suas faces são cobertas de rubor,
dois outros olhos pálidos de sol,
o rosa pulcro recorda a fraca aurora
nos primeiros sinais de seu albor,
mas eu prefiro a glória do arrebol:
findo o poema, a mandarei embora!
OLHOS
DE SOL XI
E se
me traz igual inspiração,
menos
por Vênus, sob o poder de Dionyso,
que me
desfaz por instantes todo o siso,
não me
desperta qualquer perturbação
mental
ou física e nem transpiração
opressa
de desejo e nem preciso
de
fantásticas imagens, só a conciso
nestas
palavras inflamadas de emoção.
Se a
descrevo hoje, é porque é bela
e a
conservar-me à sua imagem dediquei
um
tempo de trabalho, que o lazer
transmutei
em instantes de procela
e
nestes versos tão só justifiquei
o
breve tempo que gastei neste prazer.
OLHOS
DE SOL XII
É
assim que presto contas, minha leitora!
Puz o
teu rosto no lugar da bela
que
nunca conheci, mas foi estrela
para
tanto desejo, que assim fora!...
Desconhecida,
é tua a curta hora
em que
contemplo a rua da janela,
em
plena madrugada e à luz da vela
que
arde em meu crânio desde o outrora!
Eu te
vejo passar, sem que tu passes,
eu te
sinto sorrir, sem que sorrias,
eu me
perco a noite inteira nos teus braços!
Na
espera inútil de que algum dia me abraces
ou que
marchemos pelas mesmas vias
em que
contemple de teu rosto os traços!
OLHOS DE SOL XIII -- 26
julho 2023
E quando olho para essa modelo,
ajoelhada em tal pose artificial,
pequenas dobras na virilha em natural
sinal de seus tendões em forte zelo,
de manter tal posição para o desvelo
desse fotógrafo que registra-lhe,
afinal,,
não o que é, mas o reflexo carnal
do sol sobre sua pele em claro selo,
eu vejo nela a ti, desconhecida,
que já encontrei em outras ocasiões
do passado em talvez reencarnações
ou no futuro de minha mente desmedida
ou foi talvez em algum mundo
paralelo,
que me ajoelhei a contemplar teu
corpo belo!
OLHOS
DE SOL XIV
E não
me importo ao imaginar que és feia,
velha
demais, ou jovem, ou criança:
toda
mulher é o fruto da esperança,
toda
mulher parte da alma me incendeia
e se
agora eu contradigo aquela veia
dos
primeiros sonetos desta trança,
é que
mantenho contigo esta aliança
ante o
encanto da mulher que hoje me leia.
Se
pareci algo irritado ou irracional
nesses
tais versos em que mostrei cinismo,
só
descrevi o que na vida já encontrei,
porém
teu corpo e teu rosto fantasmal,
esculpidos
pela força do idelismo,
cego me tornam para tudo o que falei.
OLHOS
DE SOL XV
Olhos
de sol serão os teus, formosa!
Tão
mais formosa porque nunca te verei;
olhos
de sol em cada rosto colarei ,
no
puro âmago de seu botão de rosa.
Olhos
de sol eu vejo em dama airosa
ou no
rosto que não passou e nem terei;
olhos
de sol também contemplarei,
mesmo
em face maquiada e enganosa.
Olhos
de sol também nessa enxergarei,
a
mulher simples que traz rosto lavado ,
nessa
mulher que passa do meu lado,
cujo
perfume eu nem sequer respirarei
e em
cada uma encontrarei o seu farol,
na
marcha ansiosa por outro olhar de sol...
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