NA
TOCAIA DA VIDA I –18 NOV 2022
(Joanne Woodward, época de ouro de Hollywood)
não
quero ser um anjo: quero a vida
e
que possa gozá-la entre teus braços,
diariamente,
no espelho de teus traços,
ver
o meu rosto em poeira recolhida,
que
nos teus olhos só veja refletida
a
imagem do sorriso nos abraços,
que
em ti preencha todos os espaços
e
te acompanhe até a despedida
e
que sejam teus cabelos meu laurel,
na
estimativa de louca premiação
e
que nos meus eu sinta o teu marfim,
nesse
colar de espuma, luz de mel,
que
assim pendure em torno ao coração
e
que pertença unicamente a mim.
NA
TOCAIA DA VIDA II
eu
não me curvo ao mundo facilmente,
mas
é claro que se impõe, sou impotente
para
negar a sua limosa adjacência,
só
não me entrego ao dia, simplesmente;
faço
ainda planos, mas de teor descrente,
porque
os vejo desfeitos, na frequente
devassidão
da alheia incompetência,
que
me força a nova escolha descontente
e
sinto, às vezes, andar num lodaçal,
em
que não tenho pé, mas não afundo,
mas
que ainda me suga parcialmente,
para
perder meu sonho natural,
enquanto
nesse ambiente um tanto imundo
eu
sobrevivo, passo a passo indiferente.
NA
TOCAIA DA VIDA III
mas
como é anã a vida, sem ter sonho!
as
quimeras adormecem suas mil flores,
minhas
aurículas trabalham estertores
e
o som ventricular se faz medonho...
quero
a ilusão guardar, mas onde a ponho?
a
noite se agiganta, em multicores
devaneios
em que idílios são ardores,
que
empalidecem se à luz do dia os exponho;
se
bem num sonho para tudo ache lugar,
durante
a vida acanhada e quotidiana
meus
lupanares mentais são enrolados,
tapeçarias
a perder seu roçagar,
somente
as franjas a captar a luz arcana
de
alguns alegres pesadelos rodilhados...
NA
TOCAIA DO SONHO I – 19 NOV 2022
meus
sonhos não são bênçãos, são estigmas,
marcados
em minha testa, fundamente,
quais
promessas que deuses, mansamente,
me
tremeluzam em rasgos de querigmas;
meus
ideais são medidos em esfigmas,
se
expandem por um lado, de repente,
fazem-se
veios de esperança transcendente,
refletidas
pelas fendas dos enigmas
e
a cada vez que vejo a lamparina,
a
bruxulear na fímbria do horizonte,
sabem
as fadas que corri empós
mas
essa luz amarela de estearina
logo
se apaga quando chego à fonte
e
as parcas riem de meu destino atroz!
NA
TOCAIA DO SONHO II
só
me acompanha sempre o meu desejo,
que
meu amor eternamente dure,
que
essa anuência para mim perdure,
enquanto
tiver forças para um beijo;
que
se repita diariamente o ensejo,
que
essa companheira a mim depure
e
de meus males íntimos me cure,
que
dos males exteriores me despejo;
que
seja assim, amor tão permanente
quantos
forem os dias que me restem,
quantas
sejam as surpresas que me esperam,
que
seja assim, mesmo ilusão frequente,
a
despeito dos desgostos que me infestem,
nestes
mil versos que os despeitos geram.
NA
TOCAIA DO SONHO III
sempre
o perfume perdura no meu peito,
mesmo
que seja o abraço descontente,
que
amor se faz, enquanto amor presente,
porém
se afasta para meu despeito,
mas
tenho de aceitar, tirar proveito
desses
caprichos de mutação frequente,
sempre
seguindo o pêndulo que está quente
de
todo esse oscilar que mal aceito;
que
a cada vez que se mostra carinhosa,
eu
chego a me encolher internamente,
sem
saber qual a futura reação
dessa
mulher que me corta, deleitosa,
toda
a esperança de meu ideal descrente,
nos
cem caprichos de seu coração!
NA
TOCAIA DA SOMBRA I – 20 NOV 2022
ela
chegou e me causou tristeza,
justamente
por se achar tão à vontade,
na
miscelânea sensação da liberdade
de
estar comigo, mas sem querer me amar;
ela
chegou-me em plena gentileza,
como
a maré durante a baixamar,
deixando
após só um rastro de luar,
na
afirmação mais pura da amizade;
ela
chegou, deixou-me aberta a veia,
que
após o rastro escorre-me em filete
de
sangue roxo, tão frio como a saudade,
meu
sangue sólido em tantos grãos de areia,
o
vento a desafiar, feito um ginete,
enquanto
ela se afasta, sem maldade...
NA
TOCAIA DA SOMBRA II
tudo
nisso se resume: quando longe,
eu
posso imaginar sua companhia,
que
me abrace dadivosa numa orgia
de
corpos enlaçados sem descanso,
mas
quando perto, eu sinto qual um monge
que
só quebrar seus votos gostaria,
perante
a imagem que tanto lhe sorria,
mas
qualquer iniciativa de mim lanço,
pois
parece que está perto e se renova,
mas
nada está como antes o sonhei,
somos
amigos, apenas, sem cuidados
e
é quanto finjo, perante cada prova,
sem
confessar o quanto desejei,
em
meus momentos de sonhos separados...
NA
TOCAIA DA SOMBRA III
parece
sempre ver a sombra do meu lado,
seu
corpo ainda tão jovem de aparência,
a
alma antiga em hibernal frequência,
nessa
regência triste de meu fado,
por
lembranças noite e dia atormentado,
pelos
fantasmas vagos da impotência,
por
meus espíritos em circunferência,
na
madrugada virente do passado;
porém
ficou, na mais plena inocência,
sem
chegar a brincar com meus ideais,
ai,
como eu gostaria fossem dela!
e
no entretanto, tudo aceito em complacência,
eu
me queimei em seu olhar demais,
sem
perceber quão fogosa era minha estrela!
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