QUATRO
FÁBULAS DE LA FONTAINE:
O CÃO GULOSO I -- 5
out 2017
Era uma vez um cão
muito ambicioso
que sua comida jamais
queria repartir
e até a enterrava,
para não a dividir
com qualquer outro cão
mais pretensioso.
Ele julgava cada osso
um fabuloso
tesouro, que roía até
dormir,
patas em cima, para
nunca permitir
que o roubasse rival
mais ardoroso!
É claro que gostava do
tutano
e preferia que carne
ainda tivesse...
Se outro cão
encontrasse, ele rosnava
como um resmungo de
feroz tirano,
até que o outro do
desejo se esquecesse
e assim comendo
sozinho ele ficava!
O CÃO GULOSO II
Mas certo dia, passando sobre ponte,
com belo osso preso nos seus dentes,
latindo sempre, para espantar valentes,
viu outro cão parado nessa fonte!...
Grande e mau como ele, num reponte,
rosnando alto! E nos seus
beiços quentes
mantinha um osso de tamanhos surpreendentes,
petisco grande que sua gula mais remonte!...
E começou suas presas a mostrar,
mas lá embaixo já o outro fez igual...
Quer o meu
osso, mas não me vai tirar!
Quem sabe o
dele eu possa então ganhar?
Com a boca cheia, ladrava mal e mal:
também o outro se estava a arreganhar!
O CÃO GULOSO III
E tanto o cusco assim
se enfureceu
que acabou em
ladridos, ferozmente;
abriu o focinho e o
osso, infelizmente,
em queda livre, para o
rio desceu!
E o outro cão já não tinha mais o seu!
Os dois acuavam de
forma impertinente,
nenhum dos ossos
percebendo visualmente,
pois sob as ondas o
osso se perdeu!
E com um pulo, nas
águas se lançou,
mas a iguaria já
descera na corrente
e não se via mais
sequer o outro cão!
Desapontado, enfim
raciocinou:
Mas era eu mesmo, não outro diferente!
Perdi um osso, mas aprendi uma lição!
A GALINHA E A ESPIGA I
-- 6 OUT 2017
Certa galinha espiga
inteira achou
e como era bastante
empreendedora,
pensou: Vou plantar meu milho agora!
E bem depressa seus
amigos convidou.
Com o galo, o pato e o
ganso ela falou:
"Quem me ajuda a
roçar por uma hora?"
Todos disseram
precisarem de ir embora
e então a pobre
galinha se esforçou
e deixando a espiga
escondidinha,
foi debicando toda e
qualquer erva daninha,
até arranjar um
terreno de plantio...
Mas a terra estava
dura e ela pediu:
"Quem me ajuda a
escavar esta terrinha
até estar pronta para
plantar a hortinha...?"
A GALINHA E A ESPIGA II
Mas foi o galo tão só cacarejar,
o pato espadanando na lagoa,
o ganso só ciscando numa boa:
"Temos mais coisas com que nos ocupar!"
Assim a galinha precisou bicar
a terra inteira debaixo da garoa,
os seus amigos só passeando à toa:
pobre galinha, de trabalho a se matar!
Depois pediu: "Quem vem agora me ajudar
a plantar cada grão em sua covinha?"
"Por que não come logo a espiga, sua tolinha?"
Ela sabia o que queria... e o solo foi cavar,
abrindo as covas com assiduidade,
três grãos soltando com regularidade!
A GALINHA E A ESPIGA
III
Depois, ela pediu:
"Vamos limpar,
para o milho poder
crescer bem alto e forte!"
Mas de novo não teve
melhor sorte:
nenhum amigo
decidiu-se a lhe ajudar...
E quando veio a hora
de apanhar,
dando um saco de milho
de bom porte,
nenhum de novo veio
ajudar no corte:
teve sozinha de tudo
carregar!...
Transportou tudo para
a sua cozinha,
colocando o milho novo
na panela,
bem trancadinha lá no
fundo de sua toca!
Sentindo o cheiro,
veio a turma depressinha,
mas ela disse:
"Fiz sozinha a obra bela,
e hoje sozinha vou
comer a minha pipoca!"
A GALINHA DOS OVOS DE
OURO I -- 7 OUT 17
Um certo dia, ao
chegar ao galinheiro,
um lavrador percebeu
estranho brilho...
Será que pingou chuva em grão de milho?
Logo ficou muito
espantado esse granjeiro!
Pois era um ovo de
ouro no poleiro!
Montou a cavalo, da
vereda tomou o trilho,
recomendando muito
firme para o filho:
"Guarde bem essas
galinhas no terreiro!"
E na cidade, logo
vendeu o ovo de ouro,
comprando uma porção
de mantimentos,
contando tê-lo achado
na floresta!...
Já no outro dia,
encontrou novo tesouro:
comprou um cavalo,
roupas, implementos,
juntou a família e
fizeram uma festa!
A GALINHA DOS OVOS DE OURO II
E assim foi, durante uma semana,
até que veio a guarda e confiscou
a maior parte dos ovos que ele achou:
"A prefeitura da floresta é a soberana!"
"Vamos ter de nos mudar com breve gana!"
falou para a mulher: "A guarda nos roubou
quase tudo que no poleiro se encontrou!
Se não entrego, me botariam em cana!..."
Disse a mulher: "Pois olhe dentro da galinha,
que ela deve ter no papo muito ouro!
Em algum lugar pelo mato andou ciscando!"
Não descobriram o local de onde ela vinha,
nem a origem de um tão vasto tesouro,
por mais que o ponto andassem procurando!
A GALINHA DOS OVOS DE
OURO III
E vendo mesmo que
deveriam se mudar,
o camponês conversou
com sua mulher,
decidindo não esperar
mais dia sequer,
mas a pobre galinácea
esquartejar!...
E depois de a avezinha
degolar,
procuraram no seu
papo, mas sem ver
e nas suas tripas
foram remexer,
sem sequer uma pepita
ali encontrar!
Voltou a guarda e os
artigos que comprara
levou consigo, dizendo
ser o imposto
e o casal ficou assim
sem a galinha
e sem as coisas que
antes alcançara,
no desaponto do maior
desgosto,
perdido assim até o
pouco que antes tinha!
A PELE DO URSO I -- 8
OUT 17
Um caçador, durante a
primavera,
notou os rastros de um
urso na floresta.
Disse à mulher:
"Vamos fazer a festa!
Muito dinheiro se
encontra à nossa espera!"
"Eu vou caçar
depressa aquela fera
e a carne nós salgamos
dessa besta
e a pele inteiramente
que então resta
vamos curtir, que
grande preço gera!"
Disse a mulher:
"Vai-nos dar muito dinheiro?"
"Ora, se
vai! Podem fazer um bom casaco
ou, quem sabe, um
grosso cobertor!"
"E assim
compramos boas coisas bem ligeiro!"
"Os meus sapatos
já estão num caco!"
"E os meus
também! Já nem me dão calor!"
A PELE DO URSO II
"Só que não posso matar o urso a tiro,
que vai fazer feio buraco no pelame
e nem a flecha ou lança que o inflame,
enquanto o cabo com cuidado eu giro!"
"Tenho cuidado a cada vez que miro,
mas se furar já nos acaba com o reclame;
vai ser difícil consertar, caso se dane!
Com a adaga é complicado, mas me viro!"
"Querido, não vai ser muito perigoso?"
"Não vou negar. Para
evitar esse perigo
uma armadilha vou tentar -- mais vagaroso,
"vai dar trabalho, mas não sou um preguiçoso!"
E assim abriu uma cova funda e fez abrigo:
pensava ao urso dar destino tenebroso!...
A PELE DO URSO III
Então ficou a esperar
pelo animal
e quando o urso,
enfim, apareceu,
viu a armadilha,
recuou e se escondeu...
E o caçador, em
decisão fatal,
tentou matá-lo com a
adaga no final
e do buraco à sua
frente se esqueceu!
Pisou em falso e na
cova se perdeu,
pedindo ao urso:
"Não me faça mal!"
Mas riu-se o bicho:
"Ora, eu não como gente
e o seu casaco não tem
nada de belo!...
Naturalmente, posso
rasgá-lo em postas..."
"Mas que lhe
sirva de lição, seu imprudente!
Nunca fará outro
casaco com meu pelo,
enquanto ainda o tiver
sobre minhas costas!"
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