AMOR
ELETRÔNICO I – 13 JAN 2022
(LEILA DINIZ E MARIETA SEVERO)
Como
um elétron ao redor do núcleo gira,
tal
qual planetas ao derredor do Sol,
igual
que nuvens circundando o arrebol,
qual
mariposa que contra a luz se fira,
meu
olhar contra o teu apenas mira,
todo
atraído por tal duplo farol,
alucinantes
são tais jóias de escol,
esses
teus olhos em que a razão expira.
Mesmo
a luz ali se esfuma de mortiça,
enquanto
passam meses de arremedo,
já
não preciso a toda hora te esquecer;
pois
então vens e se renova a liça,
eu
giro em torno a ti e ao sol do medo,
sem
a certeza de que te possa merecer.
AMOR
ELETRÔNICO II
Mantém
o elétron, é preciso recordar,
sempre
distância de seu núcleo, constante,
revolta
a órbita em círculo gigante,
as
devidas proporções a se tomar;
não
é assim que gostaria de girar
em
torno a ti, qual escravo delirante,
quero
chegar mais perto a cada instante,
que
enfim alegre eu possa te abraçar.
Tampouco
espero que sejas o meu sol,
por
que me queimaria ao chegar perto?
Já
é cálido o bastante o meu ardor,
basta
que sejas assim como um farol,
a
luz que aquece meu coração desperto,
sem
que minhalma se chamusque no calor.
AMOR
ELETRÔNICO III
De
qualquer modo, sempre estou à espera
de
teu retorno após vãs meditações,
quando
um olhar menos mortiço me depões,
após
tua ausência em qualquer distante esfera;
não
sei qual pensamento então se gera,
durante
o ciclo de tuas modulações...
Será
que assim se comportam as multidões
de
mil mulheres, quais ondas em galera?
É
bem possível serem menos complicadas,
somente
tu a me oscilar mil faces,
enquanto
aguardo, sincero, os desenlaces;
mas
não serão jamais por ti trocadas,
sou
elétron só em teu átomo a orbitar...
Que
mais fazer, se não consigo te deixar...?
AMOR
TEMPORAL I – 14 JAN 2022
O
tempo que medimos é só o breve contato
entre
as lembranças e as possibilidades;
vê-se
o passado travestido de saudades,
vê-se
o presente a escorrar em desacato;
por
mais se busque o futuro, triste fato,
por
nós escorre sem materialidade,
só
no presente se vê tangibilidade,
todo
o porvir num só instante nato.
O
então desliza sem nos dar sequer adeus,
tola
esperança que em vão vamos reter,
logo
se perde nas brumas do passado;
e
os teus passados nunca foram meus,
mesmo
lembranças em comum vão-se perder,
sem
me deixar satisfeito ou desolado.
AMOR
TEMPORAL II
Não
se pode esperar tenha ciúme
dos
namorados que tiveste outrora,
se
estás presente aqui nesta minha hora,
sem
dar motivo para inveja ou azedume;
é
de teus lábios que o passdo vem a lume,
eu
o escuto, em tua lembrança mora,
desfias
histórias qual rosário de quem ora:
que
o teu viver atual para mim rume!
Certamente
que não posso ter rancor
por
quem te desfrutou na juventude,
o
que eu lamento são os dias perdidos,
em
que não pude usufruir de teu amor,
mas
nem ao menos tal percepção me ilude
nesses
presentes por nós juntos consumidos.
AMOR
TEMPORAL III
Não
poderei reviver o teu passado,
nem
poderás jamais viver o meu,
sequer
os dias em que já fui teu:
de
nosso antanho nunca nada é retomado;
pois
quantos dias teu corpo ao meu colado
se recolheram no passado que os perdeu;
toda
lembrança só na mente reviveu,
mas
já difere de algum dia ultrapassado;
e
em vão eu busco segurar este presente,
em
que te vejo plena do meu lado,
já
se foi para trás em meu lamento;
mesmo
o início do soneto está jacente,
resta
o amanhã a cada instante despertado,
sempre
em temor que não renove o sentimento.
AMOR POLÍTICO I – 15 JAN 2022
Em nossa terra, quase ninguém morre de fome,
milhares morrem é por desnutrição:
matam suas fomes tão só com água e pão
e assim disfarçam a falta que os consome;
são infelizes, mas esse pouco que se come
é o suficiente para sua conservação;
o que é espantoso é essa grande divisão:
assim foi sempre, desigualdade nunca some,
porém nunca se reuniram tantos bens,
dos quais só poucos os conseguem desfrutar,
num contraste com arestas de terrível;
e se as classes sociais pesares vens,
não se compreende que não vão se revoltar,
mas que demonstrem essa paciência inexaurível.
AMOR POLÍTICO II
Não é de admirar que no Sudão
ou na Somália se vá morrer de fome;
todo o alimento bem depressa se consome,
não existe margem para redistribuição;
mas entre nós é bem diversa a situação:
os pobres veem na tevê quanto se come
em restaurantes e banquetes de renome,
enquanto sofrem de sua desnutrição;
em vão existe compensação de cesta básica,
bem diferentes das copiosas refeições,
que veem ser apresentadas nas novelas;
e seu emprego é coisa ainda mais fásica,
para que servem tais distribuições,
senão para irem mendigar sob as estrelas?
AMOR POLÍTICO III
A Sexta-Feira Negra vêm mencionar agora,
para indicar dos preços redução,
mas que ironia!
Foi a Grande Depressão
que o mundo inteiro nos assolou outrora!
A fome a espalhar-se sem demora,
os suicídios em fatal repetição,
quando ocorreu essa terrível situação:
usam o nome e disso ninguém cora!...
Mas Roosevelt resolveu essa tragédia,
sem dar dinheiro, mas a criar empregos
e é isso que se deveria repetir,
só que ainda insistem em tal tragicomédia
e sem ter dignidades, apalpam cegos,
dia após dia, tão só a subsistir!...
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