segunda-feira, 7 de junho de 2021


 

 

A BARCA DE AELOS I – 6 JUN 21

 

Se observares o mapa das alturas,

verás que as nuvens buscam mais a terra

que a superfície que no mar se encerra:

sobe o vapor da terra e das planuras.

Esse vapor do mar traz mais agruras,

pois logo se condensa e forte berra

do furacão o uivo e então se emperra

na tromba d’-água, em violências duras.

 

Pois até mesmo o tornado ao continente

prefere, que às planícies desse mar;

percorre a terra em gigantesco parafuso,

tudo desmancha no fragor mais impaciente,

enquanto apenas pode naufragar

uns poucos barcos em rodopiar confuso.

 

A BARCA DE AELOS II

 

Itens perdidos numa enciclopédia

que ninguém consulta nunca, esta cultura

humana que se esvai na sepultura,

que tantos denunciam qual tragédia

e outros tantos chamaram de comédia,

assim a nivelar qualquer altura,

ou então a enfeiar a formosura,

pois o tempo nos tange, mas a rédea

 

firme está presa no pulso da vaidade,

cujo apelido é morte e que saudade

teve só por sobrenome e já o perdeu,

quando se entrega ao estranho casamento,

vidas inteiras nos verbetes de um momento,

itens perdidos que ninguém nunca mais leu.

 

A BARCA DE AELOS III

 

Formam-se às vezes, nos gatos e ovelhas

bolas de pelos, por tanto se lamber,

aos poucos o estômago a encher

por tal massa crescente de guedelhas.

Denominam bezoar  tais bolas velhas;

calcificadas, são jóias de se ter

em vitrinas de museus e a recolher

para bruxedos de malevolentes grelhas.

 

Já nos humanos a coisa é diferente:

há quem se calcifique inteiramente,

por mais bondade possa te mostrar

e a lástima que tenho assim consiste

pelo destino dessa gente triste,

que em lugar de um coração têm bezoar.

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