CHARLAS INÚTEIS I – 8 JUN 21
Houve um tempo em que usava picareta
e com trabalho braçal lavava a alma,
queimava ao sol, sem ter cuidado, o dorso
e a lisura de minhas palmas se perdeu.
Porém um dia, de tanto abrir valeta,
a tosca dura me arrebentou a palma
e levantou o calo, que com tanto esforço
eu conseguira formar – como doeu!
Como foi grande meu desapontamento,
ao ver sumir, no corte de um momento,
a asperidez formada em tanta hora,
que tanto me custara adquirir,
no lenhar e perfurar de meu agir
e recobrar mãozinha fina de senhora!
CHARLAS INÚTEIS II
Achei novo filão e que surpresa
foi descobrir que, com ideias novas,
recuperava a ternura desses temas
que já tantos empregaram com nobreza;
talvez o que aconteça, nessa empresa,
e que as vozes gauchescas, de suas covas,
ao ouvido me soprem seus antigos lemas,
em seus poemas esquecidos de beleza.
Nunca foi que desprezasse o quanto via
a meu redor ou que aos ouvidos vinha:
bem ao contrário, gostava de assistir;
se quase nada nesse gênero fazia,
era somente porque achava que não tinha
nada de novo para nele contribuir...
CHARLAS INÚTEIS III
Eu me lembro em criança, num verão,
me rebolcava no trigo dos galpões
da Fazenda Experimental, nos brincalhões
revestir-me de palha com paixão;
era Dirceu Rosa Borba, na ocasião (*)
que dirigia a escola. Seus sermões
apresentavam aos alunos boas razões,
sem de castigo mais feroz ter precisão.
Seu filho Eber me punha na garupa,
para dar um “chá de pera” à namorada;
para mim, era tudo novidade;
mas não foi namoro sério esse upa-upa...
Nosso cavalo assustou-se de uma ossada
e meu amigo hoje advoga na cidade...
(*)
Que suas almas aceitem a homenagem!
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