AMOR AMORTECIDO I – 6
JUN 19
Quando se ama alguém,
não há como parar,
Se pensa a cada
instante, de noite e em claro dia,
Não como a obsessão que
alguém descreveria,
Mas qual um pensamento
que se quer acalentar.
Quando se ama alguém,
não há como pensar,
Pois nem se considera o
fim dessa elegia,
Para nós tal sentimento
eterno duraria,
Por cem anos e um dia,
mais um mês e sem cessar...
De fato, não se para em
busca de razões,
Já que a mente nos
afasta do verdadeiro amor,
Que abranda seu fulgor,
se sujeito a analisar.
Esse foi o meu erro:
olhei as emoções,
Em busca de motivos
para seu ideal calor
E esvaiu-se em neblina
que nem sequer pude beijar!
AMOR AMORTECIDO II
Deixei que amor se
fosse, sem nem tentar segui-lo;
Há um certo sentimento,
de fato, que é melhor
Apenas na memória
conter, manter de cór,
Como ideal cintilante,
sem refazer-lhe o estilo.
A traça é que nos
prende no vão no seu sigilo,
Revelador de um nada
que era ainda maior
Do que esse ardor
interno, profuso regador
De artérias perfuradas,
sem conceder asilo
Ao sangue hemorragiado
que esguicha no papel,
Nessa visão de túnel de
arguta inflorescência,
Tricúspide e mitral a nos
rugir do coração;
Melhor então deixar que
escorra essa paixão,
Na morte de si mesma,
sem mais correspondência,
Salvo em mágoa amargosa
de cem favos de fel.
AMOR AMORTECIDO III
Não haverá final, se
não me achar presente;
As coisas são assim,
por mais que seja inglória
Essa onania mental
esfeita em pó e escória,
Depois achincalhada em
poema descontente.
Não há como fugir: o
completar da história,
Quando não nos calcina
em confusão ardente,
Requer o seu gatilho
apertado incontinenti,
Por tuas próprias mãos
a suicidar tua glória.
Assim, do mesmo modo
que a mente me reclama,
De modo igual que o
corpo constante assim me exige,
Amor amortecido
processa suas demandas,
Restos mortais de cinza
que um rubro ainda proclama,
Pingos de sangue gris
que um coágulo redige
E igual que em
calmaria, se estanca em velas pandas.
LEQUE OFUSCANTE I – 7
JUNHO 2019
Ainda busco em mim um
sonho sintomático
Desse buquê de ardis
que a alma me devora,
Da ampla variedade de
aptidões de outrora,
Em manso digladiar sem
em nada ser enfático.
Quando há um só caminho
para um destino tático
E em nada mais se pode
agir na incerta hora,
É fácil tudo mais poder
mandar embora
E seguir nesse
sendeiro, por mais seja lunático.
Mas quando deparamos
com tais facilidades,
Tanta senda de fato
podendo percorrer,
Ficam a nos exigir mil
planos nascituros,
Em que se possa ver
quais oportunidades
Que de outra estrada
mais nos possa demover
E assim tentamos todas,
das nobres às impuras.
LEQUE OFUSCANTE II
Somente houve um
caminho de eterna recorrência,
Ainda a persistir sobre
o lodo da sapiência,
A debater-se sempre
contra múltipla exigência
Da arte, da oratória,
dos ramos da ciência...
Por entre as tentativas
que a nada me levaram,
Embora tenha tido
sucesso em quase todas,
Apenas uma prenda
remanesceu nas rodas:
Aonde quer que eu
fosse, mil versos me alcançaram...
E hoje em dia, enfim,
que me acho aposentado
E posso me manter com a
renda que obtive,
Mais uma vez eu cedo ao
mesmo ideal alado,
Embora muita vez já o
tenha rejeitado,
Abrindo uma outra porta
que ainda redivive,
Forçado a ser poeta em
sonho indesejado.
LEQUE OFUSCANTE III
Contudo, estes
rascunhos redijo em mil cartões
E seu reverso atrai com
frequência minha atenção,
Ás vezes para a
história breves frases chamarão,
Em outras para as
línguas de que tenho dotações.
Apesar de minha idade,
amplio as coleções
De palavras e frases
que produz cada nação
E a memória sujeito a
tais flores em botão,
Enquanto me recolho “a
pensar com meus botões”,
Na espera de meu sono,
devaneio hipnagógico,
Longas listas de
palavras, cem frases a compor
Em qualquer língua
alheia àquela em que eu escrevo;
Para os sonhos
moribundos lanço um canto demagógico
E dos sonhos
sintomáticos mal posso ver pendor,
Senão na noosfera a que
então meus passos levo.
A RUSSA RECLINADA I – 8 de junho de 2019
Sempre existe uma coisa que não posso compreender:
É porque tantos julgam ser algo de excitante,
A perfazer contraste com a nudez exuberante,
Saltos altos nos pés da modelo ainda se ver!...
De fato, muita vez já aconteceu-me ter
Exposto a meu olhar um vulto assim vibrante,
O corpo inteiro exposto, despudorado instante,
Cabelos longos soltos, gentis como se quer...
Contudo ainda trazendo nos firmes tornozelos
As tiras dos sapatos, no acréscimo da altura,
Como novo complemento de sua figura esguia
Ou então só encaixados nos calcanhares belos,
Como o suporte falso de calculada jura,
Tais saltos altos que hoje a moda ainda aprecia...
A RUSSA RECLINADA II
Acho a nudez perfeitamente natural,
Essencial e complemento à sua vaidade,
Mármore e óleos já com vivacidade
Mostram há séculos o corpo material.
Quando Coco Chanel moda inicial
Deu aos banhos de sol em liberdade,
A consequência lógica, em verdade
Era nas praias essa nudez total...
Foram as roupas aos poucos descartando,
Para poder “bronzear” um trecho a mais,
Chegou o biquini, de início bem discreto,
Mas que depois foi-se aos poucos encurtando,
Até o monoquini, os seios e o demais,
Sem que exista na mulher qualquer ponto secreto...
A RUSSA RECLINADA III
Se uma jovem pretende agora ser modelo
E para o book se faz
fotografar,
Hoje em dia é necessário se mostrar
Completamente nua em seu desvelo.
Expondo ao mundo até o seu órgão mais belo,
Abertamente e às claras, de forma a declarar
Que não é um travesti, ali pronta a ostentar
A prova clara e firme do atual ideal de gelo
Que tanto nos expõe que a excitação se esvai
E para os jovens, pouco a pouco, a embaça,
Deixa de ser do corpo o fruto proibido...
Talvez por isso hoje é que tanta gente vai
Das estranhas perversões sair à caça,
Para a libido retomar com seu gemido.
A RUSSA RECLINADA IV
De fato, essa modelo é até discreta:
Expoe os seios com naturalidade,
Sinal feliz de sua fertilidade,
De lado mostra o corpo e só afeta
Sorriso pálido de timidez dileta;
Curvilínea se encontra na realidade,
Não mais no ideal de emagricidade
Que o padrão de Hollywood antes completa.
Faz muito bem em mostrar-se como é,
Pois há o castigo transitório ao feminino,
Provavelmente, aos poucos, vai engordar,
Especialmente se demonstrar sua fé
Por esse fato natural em seu destino,
No ato sagrado de seu engravidar!
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