reverso
I – 17 jul 2019
momentos
oscilantes propicias...
nunca
sei onde estou, o que fazer,
que
atitude tomar, como empreender
o
assédio a esse castelo, em que vazias
são as
ameias, torretas, barbacãs,
quais
órbitas silentes, cujo olhar
apenas
se suspeita, sem pensar
que é
um relicário vestido em preces vãs.
mas de
repente, tudo se ilumina!...
os
arautos proclamam as promessas
que me
fervilham exuis no coração...
e
então, tudo falece e me arruína!...
que
coisa estranha... quando amor confessas,
esse é
o momento de deixar-me, então?
reverso
II
na
verdade, o que protege uma muralha
são os
“merlões” e não as suas ameias,
os
quadrados que se avistam nessas teias,
enquanto
“ameia” denomina cada falha
que
intermedia a proteção da malha,
atrás
da qual arqueiros, em cadeias,
se
posicionam a evitar farpas alheias
e por
ameias cada flecha então se espalha,
lançada
ao inimigo que o castelo
sitia
na intenção dessas conquistas,
mas a
visível proteção são os merlões.
de forma
igual a ameias o olhar belo,
os
merlões sendo as pálpebras que habitas,
na
ocultação de tuas próprias emoções.
reverso
III
e
quando a paz eventual tu me anuncias,
as
seteiras se iluminam de rojões,
archotes
e torchais em mil clarões,
como o
sorriso dos lábios que me envias.
então o
arauto sobe até os bastiões
e
manifesta os sonhos em que vias
minha
própria alma recebida em alegrias,
temporárias,
quiçá, dos corações.
mas por
qualquer motivo ou sobressalto
cessam
as luzes com suas vibrações:
perante
o fosso me percebo só,
no
incompreensivel oscilar desse ressalto,
guarda
o castelo egoístas sensações,
erguendo
a ponte levadiça sem mais dó.
ESCULCA I – 18 jul 2019 (*)
(*) Sentinela, batedor, guarda avançado.
Segundo me parece, degradou-se
em seda e vidro o relacionamento:
apenas esplendeu, por um momento,
mas a seguir de novo transformou-se,
na estranha relação cristalizou-se,
de enfrentar cada dia um sentimento
completamente novo: a cada evento
uma nova mulher manifestou-se.
Mas a tudo que perpassa, sou constante:
não modifico sequer por um milímetro
a minha firme posição de lutador.
Aguardo e espero a musa delirante:
meu coração tornou-se num voltímetro,
a controlar os impulsos desse amor...
ESCULCA II
Assim eu meço tal temperatura:
até que ponto chega a eletrizante
energia dispersada a cada instante,
no entremeio da transmissão impura.
Algumas vezes, há maior fartura
e comigo se reparte, de esfuziante,
a mesma sensação que levo adiante
no coração, que em mim perpétua dura.
Mas outras vezes, há tal oscilação
que nem Tesla poderia controlar (*)
uma corrente contínua tem lugar,
sem que se alterne entre nós essa emoção,
que deveria tornar-se um vaivém,
quando a corrente alternada se sustém.
(*) Nikola Tesla, 1856-1943, inventor da corrente alternada.
ESCULCA III
Porém não nego que já me acostumei,
e minha fonte de energia acendo,
como posso conservá-la bem compreendo,
que o verdadeiro amor fui eu que dei;
e quando oscila em fluorescente lei,
de cada polo a luz a ter adendo,
o comutador perfeitamente entendo:
como mantê-lo firme eu saberei.
Assim à musa minha própria luz envio,
nos momentos de apagão involuntário
ou mesmo quando delibera a oscilação
e na minha persistência então confio,
pois meu amor é sempre voluntário
e assim aquece o seu rubro coração!
ESTALO I – 19 jul 19
Não esperava tentasses me enganar
em uma coisa tão tola e corriqueira:
uma coisinha boba, uma besteira,
por não quereres um sonho me
contar...
O problema é que em coisas tão
pequenas
observamos às grandes reação;
te achava tão sincera em relação
ao que entre nós surgiu; que apenas
me mentisses ao mentires a ti mesma.
Agora surge a fenda cristalina...
Eu sei te arrependeste e me disseste
que não confiasse em ti naquela
cisma:
capricho apenas; mas não devias,
menina,
pois me mentiste e um beijo nem me
deste.
ESTALO II
Quem sabe, então, o capricho
seja meu,
pois me deste o coração e quis tua
mente,
nela saber o que perpassa
diariamente,
no ciúme tolo do que em sonho aconteceu.
Pois reconheço, se tens um sonho, é
teu
e nem o podes partilhar tão
facilmente,
mas é minha própria incerteza,
claramente
que nesse teu negar motivos leu,
para ocultar de mim outro interesse,
seja por quem tinhas amado no
passado,
seja por quem talvez te espere no
futuro,
seja por quem no presente ainda
aparece
e dispersar te busca de meu lado,
para prender-te em seu abraço impuro!
ESTALO III
Mas deduzir qual seja a alternativa
é assaz difícil... Meus próprios
sentimentos
interferem em tais desvendamentos,
a murmurar-me, com falsa voz nociva,
degradando este amor que me cativa
e que perdura desde seus
deslumbramentos,
que na alma alicerçou seus
fundamentos
e me conserva na esteira de minha
diva.
Que uma mentira, às vezes, é carinho,
um tapa leve no rosto, sem magoar,
talvez sendo adicional prova de amor;
e desse modo, deixei de ser mesquinho
e nessa fenda cristalina vou buscar
algum diamante que incremente meu
ardor.
BATISMO I – 20 jul 19
Ela quer se fazer de imaculada...
Inda vai hesitar, talvez por anos:
Precisa se limpar dos desenganos,
Mostrando pouco a pouco um quase-nada;
Fugindo temerosa, em seus afanos,
Essa alma gentil e atribulada,
Que permanece ainda avassalada,
Por sentimentos de seus antigos danos,
Que se combatem em seu coração.
É tão difícil, afinal, pular no escuro!
Talvez, por isso, aceite a hesitação
Desta mulher, enfim, que lentamente,
Irá aceitar o meu amor presente,
Para um dia me mostrar amor futuro...
BATISMO II
Descrevo aqui esse evento corriqueiro
Que a tanto homem na vida já assombrou,
Quando um amor primeiro o rejeitou,
Por mais que o seu fosse puro e verdadeiro.
Por muitos meses persiste tal lanceiro
Na justa antiga em que antanho retornou,
Essa conquista que ao passado já falhou
A tanto ancestral seu de aventureiro
Caráter, que inimigos dominasse,
Mas sem poder dominar a dama antiga,
Em sua recusa do preito enamorado,
que todavia, insistente, perdurasse,
a enovelar-se, com fervor de auriga,
no véu da dama que já tanto o tem magoado.
BATISMO III
Pois se designa um batismo ser de fogo
A primeira intervenção em algum combate,
Sem água do Jordão em tal embate,
Sem unção milenar para tal jogo.
Assim, nesse insistir de antigo rogo,
Há um batismo também, que nos abate,
Se não fizer sobreviver perpétuo engate
Na pia batismal que um beijo, logo,
Transforma em peregrina água lustral,
Quando nos chega momento inesperado,
Quando já quase se houvera desistido
E a doçura desse beijo virginal
Nos torna para sempre consagrado,
Em tal vitória de um coração vencido...
MULTÍPLICE I -- 21 julho 2019
Para isso me serviste, mulher com que sonhei:
Para escrever meus versos; de ti nunca terei
Senão vagas promessas e pronta retirada,
Momentos só de sonhos, momentos só de nada.
Todavia, estas linhas podem fazer um bem
A milhares de outras que, como tu, descreem;
Milhões de solitárias por esse mundo afora...
Embora me desprezes neste momento, agora
Em que reluz em ti um novo sentimento
Indiferente e cru às horas de portento...
E as frases que redijo são novas; todavia
Foste tu que as criaste, num golpe de magia,
Para dar a outras tantas momentos de ilusão,
Consolo, um triste alívio e vaga exaltação...
MULTÍPLICE II
É só por isso então que os versos teus digito,
Não que deseje aqui eternizar meu nome,
Não é vaidade que o coração consome,
Porém impulsionar lançado até o infinito.
Porque estas frases com que amor concito
Se destinam somente a saciar alheia fome,
Melancolia e rancor que ali então se dome,
Pouco importando local e época que habito.
Não tenho ânsia de fama e nem de glória;
De fato em outros versos frequente registrei,
Precisamente, toda a aridez dessa ambição,
Mas que as palavras se fundam em cibória,
No pão e vinho do amor com que mandei
Pedaços de mim mesmo a cada coração.
MULTÍPLICE III
Muitas vezes pareceu-me que um soneto
Terá destino certo. Uma
alma só, talvez,
Ou para algum milhar esse poema fez
Rebrotar um sorriso quiçá muito discreto,
Ou um esgar de pena por coração inquieto
Que seu tempo gastou neste gravar em grês,
A captar palavras do éter, mês a mês,
Sem ao menos se sentir senhor de tal afeto.
Porém se uma só mente os versos receber
E sentir misticamente para si serem escritos,
Acabei de cumprir minha missão na Terra,
Sem ter nascido em vão.
Se acaso acontecer
Que sejam muitos seres libertos de conflitos,
Por um momento só, minha vida aqui se encerra.
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